sábado, 31 de julho de 2021

 

PITAYA, FRUTA QUE ESTÁ TRANSFORMANDO A VIDA DE CENTENAS DE FAMÍLIAS NO SUL DE SANTA CATARINA



A cultura da pitaya está se notabilizando no sul de Santa Catarina como uma excelente alternativa às culturas tradicionais como o tabaco. Centenas de produtores conseguiram finalmente se libertar das amarras de grandes companhias fumageiras, que por décadas os tornaram reféns das políticas altamente impactantes aos ecossistemas e a saúde humana.  Em pouco mais de 10 anos a área de pitaya cultivada na região cresceu mais de cem por cento. Hoje são mais de duzentos hectares de área cultiva, trazendo rendimento capaz de garantir a subsistência das famílias envolvidas.

De uma ou duas variedades cultivadas no início da atividade, hoje já superam seis, reconhecidas e aprovadas pelos órgãos classificadores, a exemplo da Branca Comum, Golden Israelense, Vietnamesse white, Rabelonga, Pink, etc. As pesquisas nesse segmento evoluíram ao ponto de os produtores estarem cultivando em seus pomares variedades alto férteis, ou seja, aquelas que dispensam polinização manual. Por ser uma cactácea de clima tropical, originária da América Central, a pitaya é de fácil manejo, exigindo solos ricos em nutrientes, incidência de sol e temperaturas amenas.

Foto Jairo - mudas de pitaya de diversas variedades

A fruta está progressivamente conquistando o gosto da população, a cada safra mais e mais pessoas passam a conhecer e consumir a fruta. O que chama atenção nessa atividade é a radical transformação promovida às familiares de agricultores habituadas ao manejo diário de insumos químicos e técnicas mecânicas de cultivo. De repente começaram a compreender que é possível cultivar o solo sem impactá-lo. Dia após dia mais e mais agricultores se lançam a praticas sustentáveis de cultivo orgânico, agregando qualidade e valor.


Foto Jairo - Cobertura verde do solo

Com a obtenção da certificação orgânica, além de assegurar um preço mais compensador ao produtor, proporciona ao consumidor a certeza de estar adquirindo um produto saudável, livre de aditivos químicos. A organização dos produtores em cooperativas são iniciativas bem sucedidas para evitar práticas exploratórias dos atravessadores, pagando preços excessivamente baixos ao produtor.

A pitaya, no entanto, é uma fruta que se distingue de outras como a banana, mamão, que embora sejam colhidas prematuramente, o processo de maturação continua ocorrendo. A pressão do mercado e o desejo de obter mais lucros fazem com que o produtor de pitaya colha a fruta antes de sua completa maturação. Esse procedimento incorreto compromete a expansão da atividade, pois o consumidor ao experimentá-la irá reprová-la acreditando que o sabor ácido, típico da fruta ainda verde, é o padrão.

Parcela significativa da pitaya produzida no sul de santa Catarina abastece os mercados consumidores do sul e sudeste brasileiro. É incrível que ainda hoje são milhares de pessoas na região produtora que desconhecem ou nunca experimentaram a fruta. Outra constatação, os poucos locais que comercializavam a pitaya em Araranguá e Balneário Arroio do Silva, ambos possuíam em s suas gôndolas frutas inadequadas para o consumo.

Foto Jairo - Produção orgânica de pitaya - solo rico em nutrientes

Diante desse cenário nada favorável à atividade, a solução foi criar estratégias para elevar a taxa de consumidores, que por sua vez reverteria em preços mais compensadores. Usar as novas tecnologias de comunicação disponíveis se caracterizou como importantes ferramentas para divulgar a fruta. O sistema delívery, entrega em domicílio, se mostrou muito eficiente e que pode ser adotado em pequenas propriedades. 

Agregar valor à cultura da pitaya também vem se mostrando bem rentável. Além do consumo in-natura, a cactácea proporciona a elaboração de outros derivados como sorvetes, cervejas, pães, licores, vinhos, kumbuchas, vinagres, etc. Além do engajamento com cooperativas, os produtores de pitaya são assistidos pela EPAGRI de Santa Catarina. Profissionais da empresa agropecuária vêm oferecendo apoio técnico não só para a obtenção de frutos de elevado padrão comercial, mas também auxiliá-los na busca de mercados com preços mais justos. 


Foto Jairo - entrega de garrafas de Vinagre de Pitaya

 

A cada dia tanto os técnicos envolvidos no acompanhamento do ciclo produtivo quanto os produtores, ambos vem aprendendo juntos os segredos dessa rústica fruta tropical. Variedades mas resistentes e produtivas, melhor preparo do solo, tipos de doenças e pragas oportunistas são os desafios de toda uma equipe que atua nos bastidores. Os frequentes encontros, cursos, palestras, oferecidos aos produtores de pitaya lhes da garantia de empoderamento sobre o modo correto de lidar durante o ciclo produtivo dessa fruta.


Foto Jairo - algumas pragas que incidem sobre o pomar de pitaya

Depois de quase dois anos de encontros no formato remoto, no dia 27 de julho um pequeno grupo de produtores de pitaya tiveram reunidos no CETRAR/ARARANGUÁ onde participaram de um curso promovido pelo SENAR em parceria com a EPAGRI. Durante o período da manhã foi aprofundado os conhecimentos sobre práticas agroecológicas, incidências de doenças, pragas e estratégias de controles.

Foto Jairo - palestra sobre cultivo de pitaya orgânica

Sobre o manejo de doenças e pragas na cultura da pitaya, não há no Brasil nenhum agrotóxico autorizado para ser aplicado. Nesse sentindo o que resta ao produtor é a adoção de práticas alternativas. Para torná-las produtiva é imprescindível a compreensão do complexo conjunto ecossistêmico onde está inserida cactácea.


Foto Jairo - pitaya orgânica sem controle químico de doenças e pragas

O uso de adubação orgânica, como cobertura verde, por exemplo, são práticas com resultados promissores. Saber os fatores pelos quais favorecem a maior ou menor incidência de doenças e pragas no pomar é também importante.  Como tudo isso acontece na pratica foi verificada no período da tarde do dia 27 de julho quando grupo visitou um pomar de pitaya no município de Içara.

Foto Jairo - visita ao pomar de pitaya em Içara/SC

O município ainda é atualmente uns das líderes no estado no cultivo do tabaco. Alguns produtores, a exemplo dessa família na qual visitamos fez a transição da cultura do tabaco para a pitaya. Por anos ininterruptos o solo com cultivo de tabaco recebeu grande quantidade de insumos químicos e agrotóxicos. O resultado disso foi a impactação de todo o ecossistema, que necessitará de muito tempo para a revitalização do seu ciclo natural.  Um dos problemas enfrentados pelo produtor no solo ocupado anteriormente por tabaco é a incidência de nematoides no pé de pitaya. Nematoides são endoparasitas ou vermes, que permanecem grande parte do seu ciclo de vida dentro das raízes das plantas.

Foto Jairo - Cultivo de pitaya em área antes ocupada por tabaco

Recuperar esses solos degradados por práticas mecânicas repetitivas requer muita perseverança e conhecimento da dinâmica química, física e biológica dos solos. Isso  será possível estudando, pesquisando, dialogando, que é exatamente o papel desempenhado pelos profissionais da EPAGRI com os produtores de pitaya. O fato é que a pitaya ou fruta dragão está protagonizando uma extraordinária revolução no campo, provando que é possível, sim, com práticas de manejo sustentáveis do solo, obter resultados satisfatórios na produção e melhor qualidade de vida aqueles que produzem.

Prof. Jairo Cesa

           

  

 

 

terça-feira, 27 de julho de 2021

 

O FUNDÃO ELEITORAL E OS OPORTUNISTAS DE PLANTÃO NO CONGRESSO NACIONAL

O orçamento público destinado ao saneamento básico em 2020 teve um corte aproximado de 30% em comparação ao ano anterior. Portanto, dos 835 milhões investidos em 2019, reduziu-se para 661 milhões no ano seguinte.  Atualmente no Brasil, 35 milhões de pessoas não são atendidas com água tratada, e 100 milhões, 48% da população, o esgoto que produzem são lançados ao ambiente sem qualquer tratamento.

 Ao mesmo tempo em que a população brasileira sofre todas as carências possíveis na área do saneamento e agravada com a pandemia com milhões de desempregados, parlamentares oportunistas no congresso nacional aprovaram um polpudo fundão eleitoral de quase seis bilhões de reais para gastar nas eleições do próximo ano.

O que é repulsivo nisso tudo é o fato de terem sido os aliados bolsonaristas no congresso, protagonistas desse insulto a população, fazendo comentários contrários ao fundo. Prometiam de mãos postas que no instante em que o projeto entrasse na pauta de votação, votariam contra. Terminada a sessão, aqueles/as que estufaram o peito pousando de baluartes da moralidade política, votaram, sim, às pomposas verbas públicas eleitorais.

O que é assombroso nesse episódio foi a postura do presidente Bolsonaro de ter dito que não admitiria qualquer valor superior ao da eleição anterior, orçada  em dois bilhões de reais.  Há algo de estranho nesse dito “conto do vigário”, um presidente alegar-se contrário ao aumento do valor do fundo, quando todos/as os parlamentares do PSL e demais partidos, maioria do centrão, terem defendido e votado a favor do aumento.  É aqui que está a malandragem do presidente. A estratégia foi aprovar um valor bem dilatado, com a expectativa de que ele vetaria. Na sequência um novo fundo seria negociado, de três a quatro milhões, como se cogita.

Qualquer soma igual ou superior a dois bilhões aprovados serão considerados  imorais diante da atual realidade econômica. É imoral frente ao caos econômico que faz crescer diariamente o número de brasileiros em situações de miséria absoluta. Um, dois, três ou mais bilhões acordados, tornarseiam  exorbitantes quando milhões de famílias tentam sobreviver com indignos 150 reais/mês, proveniente do fundo emergencial federal. O governo Bolsonaro está sob a cruz e a espada, ou agrada seus apoiadores vetando os mais de cinco bilhões, ou agrada sua base parlamentar no congresso deixando como está.

É claro que tudo foi bem arquitetado para que Bolsonaro fosse visto como o “bom mocinho”, alguém que teve a ousadia de peitar as poderosas bancadas ansiosas por abocanhar cifras milionárias de dinheiro público. Dinheiro que seria utilizado para barganhar votos em troca de promessas ou benesses. Não podemos esquecer que o estado de Santa Catarina teve papel importante no resultado dessa vergonhosa votação. Dos 16 deputados federais que representam o estado na câmara federal, um, não votou e outros quatro votaram pela não aprovação do fundo bilionário. É preciso ficar atento a essas personalidades nas eleições do próximo ano, que certamente voltarão a enganar os/as eleitores usando discursos de moralizadores da política brasileira.  

Prof. Jairo Cesa

quinta-feira, 22 de julho de 2021

 

CUBA,  UM PROJETO DE SOCIEDADE QUE DEVE SER COMPREENDIDO NA SUA INTEGRALIDADE.


Expressar algum comentário, opinião ou julgamento sobre Cuba requer certa atenção e cuidado principalmente quando não se conhece a fundo o país e sua cultura. Nos últimos dias quem acompanhou a imprensa burguesa nacional e internacional viu e ouviu reportagens mostrando atos de depredação nas ruas de Havana, capital de Cuba. A tônica da imprensa entreguista sempre foi e será mostrar um cenário catastrófico daquele país, de um regime totalitário, uma população miserável desejosa pelo fim do regime socialista.

Por duas vezes estive em Cuba, a primeira ocorreu em agosto de 1995 onde participei de um encontro de geógrafos da América Latina. A segunda visita à ilha aconteceu dois anos mais tarde, em 1997, quando eu e minha companheira Elisa, representamos o estado de Santa Catarina, num curso de Instrutores Sindicais, na Escola Nacional de Quadros Sindicais, Lázaro Peña. Durante 21 dias lá estivemos junto com outros sindicalistas do Brasil inteiro.


Foto - Elisa e Jairo


Quanto a primeira estadia em Cuba, em 1995, o país estava passando por uma situação econômica delicada devido o fim do apoio econômico que estava recebendo da União Soviética. Em 1989, o bloco socialista chegou ao fim afetando em cheio a ilha caribenha. Petróleo, cimento, entre outros produtos essenciais chegavam à ilha trazida por navios e aeronaves russas.  Entretanto, afetado pelo embarco econômico americano, agora também sem a ajuda da Rússia, Cuba passou a enfrentar uma das maiores crises de abastecimento desde o início da revolução em 1959.  

O que mais se enxergava no país era grandes obras paralisadas sem qualquer expectativa de reinício. Nos sete dias que estivemos no país, nossa atenção ficou quase que totalmente dedicada ao encontro de geógrafos da América Latina, que aconteceu no Palácio de Lãs Convenciones, na cidade de Havana, entre os dias 31julho a 5 de agosto de 1995. O local do encontro era um gigantesco auditório onde eram realizados eventos importantes. O convidado para palestrar na abertura encontro de geógrafos foi nada mais nada menos que Milton Santos, um dos principais expoentes da geografia mundial naquele momento. 

Foto - Elisa e Jairo


Dois anos depois de termos visitado o país caribenho, surgiu outra oportunidade para retornarmos, agora com tempo mais elástico que o anterior. Na época, 1997, atuava como coordenador do SINTE regional Araranguá. O retorno a Cuba, mais uma vez não era basicamente turístico, o objetivo, no entanto, era participar de dois importantes eventos. O primeiro, um curso de instructores sindicales de vinte dias de duração, e o segundo, um congresso internacional de pedagogia.

Foto - Elisa e Jairo


Sem qualquer ajuda financeira, lá fomos nós representando o estado de Santa Catarina. O encontro de instrutores sindicais foi realizado na escola nacional de quadros sindicais “Lazaro Penha”, em Havana. Dessa vez a escola deu preferência para lideranças sindicais brasileiras, cerca de 20 pessoas estiveram lá representando todas as regiões do Brasil.

Os instrutores cubanos, Alícia Santana, Alícia Morffi e Emílio Soris, seguiam rigidamente a programação estabelecida no cronograma. Além de aprofundarmos o conhecimento de toda complexidade econômica, política e social global, o curso também nos oportunizou a entender melhor a história do país desde a ocupação pelos espanhóis, passando pela emancipação política à pré e pós revolução socialista.

Foto - Elisa e Jairo


Quanto ao episódio revolucionário que pôs fim ao regime capitalista do tirano sanguinário Fulgêncio Batista, é importante aqui destacar que os fundamentos teóricos e filosóficos do projeto socialista começaram a ser construído a partir da metade do século XIX, protagonizado por pessoas como o intelectual, jornalista e filósofo José Julián Marti Pérez, reverenciado como um mártir pelo povo cubano.      

Do mesmo modo que no Brasil existe o método de ensino Paulo Freire, em Cuba havia o método elaborado a partir das ideias de José Marti. Além de atividades teóricas em classe, o grupo participou de várias saídas de campo, como escolas, hospitais, centro psiquiátrico e uma fazenda agrícola coletiva. A escola que visitamos era uma creche.

 Diferente de muitos países latino americanos onde o ensino infantil fica sob a responsabilidade de monitores, muitas vezes sem qualquer habilitação, nas creches cubanas, a exemplo da qual visitamos, na cidade de Havana, havia psicólogas e educadores com níveis de mestrado/doutorado. Isso explica porque o país possui um dos menores índices de analfabetismo do mundo. Caminhando por havana, conversamos com um garoto aparentando ter quinze anos quinze anos de idade, o mesmo nos deu uma aula sobre o Brasil, tamanho o seu conhecimento sobre o país.  Qualquer pessoa que você conversa na rua, criança ou adulto, o nível conhecimento e consciência política é espantosa.

Foto - Elisa e Jairo


No final da década de 1990 o estado de santa Catarina estava discutindo sua proposta curricular. O que chamava atenção nessa proposta era o fato de ter sido a mesma norteada por princípios filosóficos de matriz marxista. Entretanto, no encontro de educadores latino americano que participamos em Havana, entre os dias 3 a 7 de fevereiro de 1997, havia uma expectativa de que o que mais ouviríamos nas falas dos palestrantes seria vigotsky, Lúria, Lontiev, etc., ambos considerados referências nos debates que estavam ocorrendo no Brasil.

Em umas das oficinas que participei com o tema La Vigência de lãs ideais de L.S Vigotsky, constatei que embora seu pensamento tivesse bastante penetração nos quadros acadêmicos do país, as bases do Projeto Político Pedagógico em Cuba eram alicerçadas nas ideias do filósofo José Marti, o mesmo que Paulo Freire, para o Brasil.   

Na época que lá estivemos o cidadão cubano tinha atendimento gratuito na área da saúde. Minha companheira, Elisa, havia sofrido luxação na perna e foi prontamente atendida em um dos hospitais de Havana. Lá encontramos um cidadão da Costa Rica onde estava em tratando de uma isquemia cerebral. O país era considerado pioneiro no tratamento desse tipo de lesão. Outra área também muito avançada na medicina é o tratamento do mal de Parkinson. O pugilista norte americano Mohamad Dalli, fez seu tratamento lá e cujos resultados foram surpreendentes. Outro protagonismo de Cuba é no combate ao vitiligo, cuja droga descoberta é  produzida a base de cana de açúcar.

Os índices de mortalidade infantil no país era praticamente zero. Quando fomos visitar um dos hospitais pediátricos em Havana ficamos espantados com a estética externa, parecia tudo, menos um hospital. La dentro nos deparamos com um ambiente, limpo, higienizado. Fomos até o setor onde estavam bebes prematuros. Conforme relatou um dos responsáveis pelo hospital que nos acompanhou, era quase zero o número de bebês ou crianças acometidas por infecções hospitalares.

Cuba é um dos grandes produtores de tabaco, cana de açúcar e laranja. Parte das fazendas era coletiva. Naquela ocasião nos deparamos com pessoas de diversas nacionalidades que viajavam ao país para trabalhar voluntariamente nas fazendas coletivas. Essa prática foi constatada quando visitamos uma dessas fazendas especializadas em cultivo de laranja.  Tanto em Havana quanto em outras cidades do país, como a famosa Varadeiro, havia diversos hotéis de nacionalidades estrangeiras. Itália, Alemanha, Espanha, eram países líderes na gestão dos sistemas de hotelaria no país.

 O turismo, na época que visitamos, era o quarto ou quinto setor em arrecadação no país. Isso ajudava a equilibrar parcialmente as contas do governo. O fato é que o turismo estava provocando mudanças culturais principalmente entre os jovens do país. Trabalhar no segmento turístico era uma oportunidade de os cubanos terem uma vida um pouco melhor, pelo fato de obter dólares por meio de gorjetas ou serviços paralelos.

O governo na época também estava flexibilizando o setor de restaurantes, ou seja, permitir que famílias abrissem em suas próprias residências os “paladares”, espaços para oferecer refeições aos turistas.  Tivemos oportunidade de conferir em loco esse serviço, que também é uma forma de o turista conhecer um pouco o jeito cubano de ser. O pagamento das refeições geralmente era realizado em dólares.

Foto - Elisa e Jairo


Quando se fala hoje de Cuba tem-se a sensação de que o regime produtivo na ilha é totalmente estatal.  Na realidade como qualquer economia hoje conhecida as moedas circulantes tem como lastro em ouro ou dólar. Em Cuba, embora a moeda oficial seja o peso, o mesmo segue o padrão dólar. Quanto mais dólares entram no país, mais valorizada se torna a moeda local.

Vinte e um anos depois de ter visitado Cuba, o país ainda sofre os efeitos nefastos do bloqueio econômico impetrado pelos Estados Unidos que teve início em 1959. Quando ocorreram as manifestações populares há poucos dias no país caribenho, busquei acompanhar os noticiários dos telejornais e demais veículos de comunicações digitais. Incrível que, exceto alguns, as informações transmitidas sempre ressaltavam um país asfixiado pela ditadura comunista, como se o comunismo fosse um mostro a ser extirpado imediatamente. Não há dúvida que por trás dessas manifestações tem o braço de grupos ultraconservadores cubanos e norte americanos que vivem foram do país. Isso também está acontecendo em outros países da América Latina, a exemplo da Venezuela.

Eximem-se ao máximo de realçar as conquistas do regime na educação, na saúde, etc. Mesmo com todas as dificuldades impostas pelo embargo o país consegue manter seu status de exportador de profissionais de medicina para o mundo. Qual ou quais países da América Latina têm índices melhores do que Cuba em educação? É muito raro ouvir ou assistir noticiários dando conta de existir adultos ou crianças vivendo na rua ou dormindo ao relento, embaixo de pontes e viadutos. Homicídios, estupros, furtos ou robôs, embora também ocorram, porém, são espantosamente inferiores a dos países da América Latina. 

Há muitos anos vem tendo manifestações no mundo inteiro pressionando os Estados Unidos para por fim ao bloqueio econômico sobre Cuba. A própria ONU condena o bloqueio. O Brasil, na última reunião que ocorreu para tratar sobre o tema, se absteve, ou seja, não se posicionou nem a favor e nem contra. As expectativas do povo cubano são mínimas de achar que o presidente Joe Biden vá mudar as políticas que vem asfixiando o país. O fato é que tanto integrantes do partido republicano e democrata, quanto de cubanos que residem em Miami, que almejam o fim do regime socialista em Cuba, pressionem o atual presidente a continuar estrangulando a economia da ilha caribenha.

Se o cenário econômico e social na ilha caribenha era considerado delicado antes da pandemia, depois da COVID a situação ficou ainda mais difícil. Escolas e universidades foram transformadas em hospitais para atender a demanda de pacientes contaminados.  Os parcos recursos disponíveis tiveram que ser redirecionados para a aquisição de respiradores e insumos para a fabricação de vacinas.

Mesmo diante de um cenário quase catastrófico, Cuba vem desenvolvendo cinco vacinas. Duas imunizantes, a SOBERANA e a ABDALA estão bem dizer disponíveis para aplicação à população. A agência de vigilância sanitária do país já autorizou em caráter emergencial da ABDALA. Oito milhões de pessoas no país já foram vacinadas contra o vírus. Há informações que comprovam que a vacina cubana é mais eficaz entre todas as vacinas produzidas no mundo contra a COVID -19.

Cabe frisar que com exceção a Cuba, nenhum outro país da América Latina conseguiu até o momento produzir a sua própria vacina para combater a pandemia. Imaginem só, um país que vacinará toda a sua população com um antídoto produzido no próprio território. Organizações sociais e grupos de apoio ao povo cubano estão enviando para Cuba seringas descartáveis e demais insumos necessários à vacinação.      

Prof. Jairo Cesa       

 

domingo, 18 de julho de 2021

A RELAÇÃO DOS FENÔMENOS CLIMATICOS EXTREMOS COM O AQUECIMENTO GLOBAL

Temperaturas superando os cinquenta graus Celsius no Canadá e Estados Unidos, estiagens histórias no Brasil e devastações provocadas por chuvas torrenciais em países como Alemanha, Bélgica são sinais que comprovam que o aquecimento global já é uma realidade entre nós. As próprias lideranças políticas europeias concordam que é necessário urgentemente por em ação os protocolos assinados em encontros do clima, a exemplo da COP 15, em Paris.

Imagine populações de cidades do hemisfério norte, acostumadas com temperaturas abaixo de zero durante o inverno, de repente terem que suportar calor escaldante no verão. Nem o deserto do Saara tem ou teve temperaturas tão elevadas como os 52 graus registrados no Vale da Morte, nos Estados Unidos, no mês de julho último. Sem contar os incêndios devastadores que dizimaram uma vila inteira no Canadá. É possível que o próximo encontro do clima que ocorrerá na Escócia, em dezembro desse ano, as discussões serão concentradas nesses episódios extremos do clima.

A realidade é que encontros como esses são gastos milhões de dólares nas quase duas semanas com os preparativos e as delegações de chefes de estados do mundo inteiro. Somas financeiras tão aviltantes para propor acordos que ficarão somente no discurso.     Para que seja possível minimizar os efeitos perversos do aquecimento, seria necessário repensar o atual modelo econômico que se alimenta da exploração dos recursos naturais. O uso do carvão, do petróleo e outros produtos fósseis como fontes de energia teria que ser suprimida definitivamente da face da terra.

O fato é que o mundo hoje tem sua estrutura produtiva ainda alimentada pela queima desses combustíveis fósseis. China, Estados Unidos, Austrália, entre outros, contribuem com milhões de toneladas de resíduos fósseis liberadas diariamente à atmosfera. Sem atacar esse problema, como também o combate a destruição das florestas nas regiões tropicais como a floresta amazônica teremos certamente novos episódios extremos do clima como os destacados acima.  

Prof. Jairo Cesa    


sábado, 17 de julho de 2021

 

RESSUSCITAR O VOTO IMPRESSO FAVORECERÁ A VELHA NOVA OLIGARQUIA LOCAL

Num país assolado pela pandemia onde quase 550 mil pessoas perderam a vida, milhares delas decorrentes por atos inconsequentes do governo federal e seu ministério da saúde, a ala bolsonarista no congresso tenta a todo custo aprova a PEC 135/19 na qual defende o retorno do voto impresso. É uma proposta absurda cuja intenção é intensificar ainda mais a sensação de desconfiança da população no processo eleitoral. Desde a sua implantação em 1996, como experiência em centenas de cidades brasileiras, de lá para cá ocorreram quatro tentativas no congresso nacional para a supressão do voto eletrônico, alegando ser suscetível a fraudes.

 Houve até em muitas cidades brasileiras, como experiência, a inserção de urnas com impressora, onde a cédula impressa era depositada em urna paralela. Muitos problemas ocorreram nesse sistema híbrido como falhas nos sistemas de impressão, aumentando em demasia o tempo de permanência do eleitor na fila de votação. O STF percebendo a fragilidade desse dispositivo achou melhor manter apenas o voto digital. As tentativas de retorno do voto impresso ocorreram em 2009 e 2015, porém, sem sucesso.

De repente, a um ano e quatro meses das eleições, o presidente Bolsonaro vem construindo uma narrativa, sem provas, de ter havido fraudes nas eleições de 2018, onde afirma que poderia já ter sido eleito no primeiro turno. O que é estranho quanto o assunto é voto impresso, é que seus defensores são os mesmos que apóiam pautas antidemocráticas, incluindo o fechamento do Congresso Nacional e do STF. 

O ministro do Supremo Tribunal Eleitoral, Luís Roberto Barroso afirmou em entrevista que “quando se frauda o voto eletrônico, se frauda também o voto impresso. É um paradoxo duvidar do eletrônico e confiar no impresso”. Tem sentido a fala do ministro, pois o voto impresso poderá provocar uma judicialização dos pleitos eleitorais, onde candidatos entrarão na justiça exigindo recontagem de votos, tendo a intenção única de criar confusão. Isso aconteceu nas eleições de 2012, quando Dilma Rousseff foi eleita presidente da república. Aécio Neves, o candidato derrotado exerceu esse direito questionar o resultado, mesmo sabendo que o pleito eleitoral fora transparente.

Não há dúvida que a tentativa de inserir o voto impresso já nas eleições do próximo ano é trilhar um caminho para Bolsonaro manter-se no poder. Parece que nesse primeiro round, a ala bolsonarinsta no congresso sagrou-se vitoriosa. Isso porque conseguiram impedir a votação em uma das comissões do congresso empurrando o assunto para o começo de agosto de 2021, quando acaba o recesso no congresso.

Os que são contra essa proposta afirmam que é um tema complexo que não pode ser discutido no modo como acontecem as sessões hoje no parlamento, todas virtuais. São necessários debates com a participação da sociedade brasileira. Outro     agravante na hipótese da PEC ser aprovada, além pouco tempo para os ajustes dos equipamentos para o pleito é o custo financeiro elevado, bem num momento de crise orçamentária no qual o país está passando.

O que é real nisso tudo é que o voto impresso ressuscitará sistema que sempre favoreceu as oligarquias e seus currais eleitorais. Era muito difícil principalmente nos pleitos eleitorais municipais não haver prisões de cabos eleitorais ou candidatos envolvidos em compra de votos. Eram corriqueiro números de cédulas que não correspondiam à quantidade de votantes de seções eleitorais. Outra ocorrência comum nessas ocasiões era o desaparecimento de urnas contendo votos que poderiam garantir a vitória de candidatos ou partidos que ameaçassem o status quo de grupos econômicos dominantes. Será que estamos prestes a rememorar episódios tão nefastos da nossa política eleitoral nacional?   

Prof. Jairo Cesa

https://www12.senado.leg.br/noticias/infomaterias/2021/06/entenda-a-polemica-em-torno-da-pec-do-voto-impresso

quinta-feira, 15 de julho de 2021

 

FRAGMENTOS DA TRAJETÓRIA DE VIDA DE FELIX CARBAJAL, O IDEALIZADOR DO RELÓGIO DO SOL OU QUADRANTE SOLAR, EM ARARANGUÁ

Foto - Jairo


Na década de noventa um cidadão de nacionalidade uruguaia é convidado para proferir palestra no colégio estadual de Araranguá. O convite foi pelo fato do mesmo ter sido contratado pela prefeitura para executar projeto de construção de um relógio do sol, no trevo principal da cidade Alta. O cidadão cujo nome era Felix Carbajal chamava a atenção de todos pelo modo como se vestia, sempre com roupas claras, preferência o branco, e pela sua estupenda erudição filológica em física, astronomia, matemática, filosofia, poesia, arte, etc. Falava fluentemente o espanhol, inglês, Frances, lia e escrevia em alemão, italiano, latim, grego e demais idiomas indígenas.

Lembro que depois de concluída a palestra no auditório da EEBA, eu e minha atual companheira Elisa o convidamos para tomar um chá conosco. Ficou muito feliz pelo convite. Foram minutos intensos vividos com o “senhor do tempo”, Félix Carbajal.  Na época, 1994, possuía 89 anos, embora idoso concentrava uma força interna invejável. Na realidade o seu Carbajal, como era conhecido, era um cidadão do mundo, ou seja, não possuía lugar fixo, vivia interinamente de um lugar para outro, proferindo palestras em escolas, universidades e oferecendo os seus projetos de relógios solares.

O relógio construído em Araranguá chamou a atenção da população local pelo desenho e tamanho. Impossível passar alguém nas imediações e não se deparar com o monumento. Entretanto, quase trinta anos depois de sua inauguração é possível contar nos dedos quem de Araranguá esteve no relógio, sabe como funciona e quem o projetou. Por que foi edificado naquele local e o que representam os símbolos ou desenhos registrados em alto relevo em pedaços de concreto ao seu redor.

Há cerca de um mês fiz uma visita ao relógio e constatei o terrível abandono do monumento pelo poder público. Além da destruição de uma luminária por vândalos que projetava luz ao monumento à noite, uma árvore cresceu ao seu redor prejudicando a identificação das horas.   É espantosa como a sociedade brasileira desprestigia a arte, a cultura, a história. Pesquisando na internet mais informações sobre o relógio do sol, alguns trabalhos ou pesquisas desenvolvidas nas escolas do município, consegui acessar três, dois vídeos e um trabalho de extensão postado na página da instituição responsável pela iniciativa. 

O primeiro que destaquei foi um vídeo produzido em 2014, Projeto extensão Memória Viva, em comemoração aos vinte anos da construção do quadrante ou relógio do sol. O segundo, também foi um projeto de extensão do IFSC Araranguá, cuja proposta foi Conhecer os Lugares de Memória no Município. O terceiro e último, foi um vídeo produzido por um cidadão e sua família, que visitaram a cidade em 2016.  Ficaram tão fascinados, maravilhados com o monumento que decidiram fazer um curto vídeo, porém, muito ilustrativo e informativo.

Mas afinal, o que resultou daquele senhor misterioso, apaixonado pela arte, pesquisa, ciência, que depois de inaugurado o monumento em Araranguá seguiu sua jornada como o Lobo da Estepe, obra escrita pelo alemão Hermann Hesse.  Vasculhando os vários sites disponíveis, de repente me deparo com uma reportagem publicada no portal nsctotal.org.br com o título “Os mistérios do nômade que espalhou relógios de sol por Santa Catarina”. Além dessa publicação, encontrei outra reportagem do dia 14 de abril de 2021, no site www.adjorisc.com.br  com o título O homem por  detrás dos relógios de sol.

A verdade que ambas as reportagens tratavam do mesmo assunto, ou seja, a conclusão de uma pesquisa de doutorado sobre FELIX PEIRALLO CARBAJAL, realizada pelo professor Ricardo Machado, da Universidade Fronteira Sul. Naquela ocasião, mês de abril de 2021, o pesquisador estava lançando o livro sobre a pesquisa, tendo como título O Nomandismo de Félix Peyrallo Carbajal.

Ansioso em saber mais sobre a vida e os mistérios daquele cidadão que como um cometa passou por nossas vidas e desapareceu, acessei a pesquisa do professor Ricardo, disponível em PDF na rede, lá encontrei uma obra densa de mais de quatrocentas páginas, trazendo minúcias, detalhes de quem viveu cem anos espalhando sabedoria para quem quisesse ouvi-lo.

Lendo fragmentos da obra entendi por que Carbajal era pouco compreendido nos muitos lugares que passou. Ele estava muito além do nosso espaço  e tempo mecânico, que nos estereotipa,  liquidifica, escraviza, oprime, como um produto descartável. A sua busca alucinante por respostas relativas a existência humana, a vida, lhe transformou em um andarilho, um nômade. A filosofia, a arte, a musica, a literatura, o cinema, a poesia a matemática, ambas tão estigmatizadas e relativizadas em culturas amorfas como a nossa, para Felix foram como faróis.

 É importante aqui mencionar algumas reflexões feitas pelo pesquisador Ricardo sobre a essência do pensamento de Felix referente a obstinação  de construir relógios de sol por onde passava.  São essas obras que refletem exatamente o seu pensamento. “Os relógios marcarão por séculos a felicidade dos que se libertam e a monotonia dos que se escravizam à rotina das horas cotidianas”. Para Felix o tempo moderno, o tempo da máquina, do cronômetro, se difere do tempo cósmico, assimétrico, instável, imperfeito, assim como ele próprio o era, sempre em movimento.

Os relógios de sol só existem pela ação de Felix, e por serem fruto de estranho movimento, sua presença é incômoda, instável. Quantas e quantas vezes Felix não sofrera algum ato preconceituoso em suas diversas paragens, somente pelo fato de não estar ajustado aos patrões comportais ditos normais ou normóticos. Claro que nada disso lhe abatia ao ponto de abandonar os seus planos. Sua inteligência lhe capacitava compreender as fragilidades humanas, a ponto de ter plantado em cada cidade visitada “sementes” do conhecimento que germinariam, cresceriam e dariam frutos.  Esse, portanto, foi o principal legado deixado pelo cidadão Felix Carbajal que, como Don Quixote de La Macha, lutara bravamente contra os terríveis moinhos de vento da ignorância e insensatez humana.  

Mais uma vez reiteramos a necessidade de revitalizar o local onde está o relógio do sol de Araranguá, considerado um dos símbolos artísticos, arquitetônicos e humanísticos do nosso município. Preservar a memória patrimonial, material e imaterial, é a maneira que temos para lutar contra os domínios/demônios de mentes insufladas pelo ego doentio.    

 


     

  Prof. Jairo Cesa

https://linkdigital.ifsc.edu.br/2014/12/09/projeto-de-extensao-do-campus-ararangua-leva-alunos-do-ifsc-e-de-escolas-publicas-da-regiao-a-conhecer-lugares-de-memoria/   

https://www.youtube.com/watch?v=24ijx3UJ_v8 2016

https://www.youtube.com/watch?v=FkndQCRoDtk     

https://repositorio.ufsc.br/handle/123456789/169095

https://tvjaguari.com.br/o-senhor-do-tempo-e-seus-relogios-solares-24607

http://www.humanasebolivraria.com.br/eventos/558/

 

quarta-feira, 14 de julho de 2021

 

O GRANDE RETROCESSO EDUCACIONAL EM ARARANGUÁ CAPITANEADO PELO MDB

Os retrocessos na educação pública catarinense continuam a todo vapor.  O primeiro ato foi dado pelo governo do estado com uma proposta de reforma previdenciária para os servidores públicos que poderá retroceder cem anos. Nessa época, início do século XX, professores só poderiam se aposentar com quarenta anos de trabalho, com comprovação de incapacidade para o exercício. Agora muitos municípios catarinenses cujas escolas públicas municipais adotam gestão democrática para a escolha dos seus gestores, estão sob a ameaça de prefeitos e vereadores saudosos com os tempos da politicalha na educação.

Em época eleitoral diretores e demais funcionários de escolas exerciam a força tarefa de angariar votos na comunidade para certo candidato com a promessa de permanência no cargo. Era comum candidato a vereador ou a deputado estadual lotearem todas as escolas públicas, ou seja, definir quem ocuparia cada unidade na hipótese do candidato a majoritária sagrar-se vitorioso. Na rede pública estadual de ensino de Santa Catarina a gestão democrática sempre foi uma das bandeiras de lutas da categoria do magistério.

A permanência das oligarquias e partidos tradicionais no comando da política catarinense sempre teve relação direta e indireta com o complexo sistema de controle das escolas pelo aparelho estatal. Aparelhamento político das escolas públicas se constituiu como estratégia bem sucedida dos partidos políticos no passado a exemplo do MDB estadual. Inúmeras foram as tentativas do magistério estadual para o rompimento definitivo desse vício institucional, porém a força repressora do Estado atuou com mais poder.  

Quando se imaginava que esse cancro politiqueiro já estivesse completamente cicatrizado no estado, de repente saudosistas de outrora, filhotes do atraso são eleitos nas câmaras e executivos municipais. Em vez de convergir energias para fortalecer ainda mais os processos democráticos já sedimentados, adotam uma postura contraria, tirar da população o direito de escolher aquele que vai dirigir a escola de seus filhos. Lembro muito bem das sábias palavras ditas pelo educador e militante do magistério Nilson Matos Pereira. Afirmava ele sobre eleições nas escolas: “independente do resultado o que importa é assegurar o processo democrático”.

Nilson estava se referindo ao pleito eleitoral nas escolas públicas da rede estadual de Santa Catarina, que somente foi efetivada não exatamente como se pretendia, anos após a sua morte.  Independente de bom ou ruim o candidato eleito, o fato é que deveria permanecer tal instrumento como exercício da democracia.  Em 2019 pela primeira vez o município de Araranguá teve um dispositivo legal, decreto n. 9.011/2019 que permitia a população eleger os gestores das escolas municipais.[1]

Cinco anos se passaram, e no dia 12 de julho de 2021, em uma sessão ordinária da câmara municipal, vereadores de Araranguá votaram contra emenda 002/2021 que visava alterar o art. 19 do projeto de lei 20/21 do executivo municipal que definia o cargo de diretor, entre outros, como de sua responsabilidade, ou seja, indicação política.  Não ficou só na derrota da emenda a fatídica noite do retrocesso da educação municipal na câmara. Havia uma proposta encaminhada por um vereador, que também foi rejeitada, obrigando que os responsáveis por centros infantis tivessem um ano para dar início a um curso de graduação.

Todas as teorias e estudos já realizados até o presente momento comprovam que são nos primeiros anos de vida que a criança necessita de maior atenção para o seu desenvolvimento pleno. Portanto, é no ensino infantil, que é responsabilidade dos municípios, a contratação de profissionais qualificados para o exercício da sua função docente. Os países melhores classificados no ranque educacional têm no ensino infantil os maiores aportes financeiros e profissionais com graduação superior e mestrado. Não é o caso do Brasil em que essa etapa tão importante de formação humana é entregue às pessoas com pouco ou nenhuma habilitação.

O que é mais estarrecedor é saber que entre os legisladores que aprovaram tais aberrações estão professores/as que sabem da importância da expansão das práticas democráticas nas escolas. E por que votaram contrário?  A resposta pode estar no fato de integrar o mesmo partido do executivo ou fisiologismo mesmo, votando projetos de interesse do executivo em troca de apoio para ações que favoreçam seus currais eleitorais.   

Prof. Jairo Cesa               



O Prefeito Mariano Mazzuco Neto no exercício das atribuições emanadas da Lei Orgânica do Município, especificamente o artigo 83, VII, atendendo ao disposto na Lei Municipal nº 3.346/2015, DECRETA:

Art. 1Aº O processo de escolha de diretores das Escolas Básicas da Rede Pública Municipal de Ensino previsto nesta Lei observará os princípios de autonomia, cidadania, dignidade da pessoa humana, gestão democrática do ensino público, pluralismo político, igualdade perante a lei, valorização dos trabalhadores na educação, promoção da integração escola-comunidade, legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade, eficiência e melhoria da qualidade social da educação básica pública.

 

sexta-feira, 9 de julho de 2021

 

O MARTÍRIO DO MAGISTÉRIO PÚBLICO A PARTIR DA APROVAÇÃO DA REFORMA PREVIDENCIÁRIA DOS SERVIDORES ESTADUAIS



Desde a Proclamação da República o magistério catarinense vem amargando uma terrível via crucis sem qualquer expectativa de término. As reformas estruturais em curso, a exemplo da Reforma Previdenciária que já está tramitando na assembléia legislativa, tem o propósito de retirar o pouco do que foi conquistado pelo magistério público graças a forte resistência empregada. O fato é que a reforma previdenciária pretendida pelo governo e chancelada pelo seguimento econômico, ataca diretamente os servidores com baixa remuneração.

A realidade é que a reforma proposta pelo governo catarinense, nada mais é que um plano de ajuste das contas públicas, ou seja, reduzir despesas com servidores para o pagamento da dívida pública. Nas últimas décadas tem sido insistentemente costurado um discurso equivocado atribuindo o baixo investimento público em infraestrura, saúde, educação, etc, ao elevado gasto do Estado com a folha dos servidores ativos e inativos. Inúmeras vezes tais asneiras foram rebatidas pelas entidades dos servidores com a apresentação de números que provam ao contrário.

Se analisarmos os proventos recebidos por esmagadora parcela dos membros do magistério público concluirá que os vencimentos são estratosfericamente menores que das outras categorias de servidores, a exemplo do legislativo (deputados e assessores) e dos altos escalões do executivo e judiciário. É muito mais prático atacar os servidores indefesos do magistério, de outras categorias menos remunerados que centenas de servidores comissionados e outros tantos privilegiados protegidos pelo manto político partidário.

O que é mais terrível nessa reforma é prorrogar ainda mais o tempo de permanência do/a professor/a em sala de aula. Quem conhece o ambiente das escolas estaduais chegará a conclusão que mais cinco anos de trabalho para homens e sente para mulheres é como vivenciar o martírio de cristo antes da sua crucificação. Não é porque o professor/a não tenha capacidade intelectual ou profissional para o cumprimento dessa jornada. O fato é que trinta, trinta cinco ou mais anos de trabalho em sala de aula, onde tudo falta, é muita perversidade. Além do papel de ensinar, o professor/a assume a função de pai, mãe, psicólogo, portanto, não tem mais resistência emocional suficiente para enfrentar as tensões e as dores da sociedade catalisadas pelas escolas via estudantes.

A tendência é o/a professor/a chegar ao fim da vida sem ter se aposentado. Ou quando chegar, lá pelos sessenta ou setenta anos, os minguados proventos que terão direito talvez não seja suficiente nem para a aquisição de medicamentos, ansiolíticos, antidepressivos e outras tantas drogas, para permanecer vivo. Isso não é um discurso fatalista, extremista, é uma visão realista de quem atuou na educação por quase quarenta anos. Conhecendo um pouco da história do magistério catarinense chama atenção o profundo retrocesso que resultará esse reforma ao magistério.

Foi a partir da década de 1980 com as greves históricas que o magistério catarinense deu iniciou ao seu difícil processo de profissionalização. Legislações foram criadas assegurando aos professores alguns direitos, dentre eles concursos de efetivação, pisos salariais e planos de carreiras, sendo esse último ainda não concretizado na sua totalidade.  Reforma Previdenciária em curso causará um retrocesso de mais de um século na carreira do magistério. 

Voltará à época da Jubilação, quando o/a professor/a obtinha a sua aposentadoria somente mediante a apresentação de atestado médico que comprovasse incapacidade para o trabalho. Por vinte e cinco anos o professor trabalhava sem obter qualquer gratificação. No entanto, teria algum benefício a mais em seus míseros salários somente demonstrando ter sido assíduo nas aulas e bom aproveitamento de aprendizagem dos estudantes. Agora, para ter direito a outro benefício, por mérito, teria que estar em sala de aula por quarenta anos, isso é claro, depois de ser aprovado em avaliação de distinção.

Prof. Jairo Cesa