CALAMIDADE OLÍMPICA: OS JOGOS DA EXCLUSÃO
Paradoxalmente,
os Brasileiros nos últimos anos experimentaram ou vão experimentar sensações
que geralmente são reservadas aos países com certo grau de estabilidade
econômica, política e responsabilidade ética, que é o orgulho de sediar grandes eventos esportivos
como foram o pan-americano, a copa do mundo e agora os jogos olímpicos que é
interpretados por muitos como jogos da exclusão. Não há dúvida que os legados
deixados ou que ainda deixarão, agora com o fechamento do ciclo, com os jogos
olímpicos no Rio de Janeiro, serão as obras faraônicas, caras e ociosas, o
vertiginoso enriquecimento de empreiteiras, muitas das quais investigadas pela
lava jato, o endividamento dos estados e o que é mais terrível, a remoção/expulsão
descomunal da população pobre para áreas distantes dos centros urbanos. Somente
no Rio de Janeiro, na atual administração do prefeito Eduardo Paes, o montante
de pessoas removidas é de aproximadamente cem mil.
São
cidadãos que ocupavam áreas até então desvalorizadas, que com as olimpíadas foram
desapropriados para dar lugar aos projetos urbanísticos como a ampliação de
corredores rodoviários, reformas de aeroportos, despoluição da baia da
Guanabara, expansão das linhas de metrô, etc. Somente o projeto do metrô, que
dificilmente será concluído até o início dos jogos, teve seu custo orçado em
5,5 bilhões de reais. Com os juros e outras amortizações, o custo final chegará
17 bilhões de reais. Uma obra, que segundo os especialistas além de muito
dispendiosa será de pouco valia para população pelo fato não favorecer os
bairros. Já a baia da Guanabara onde será realizada quase todas competições
aquáticas como remo, iatismo, etc., poderá se configurar como um dos maiores
vexames dos jogos devido a enorme poluição da água.
Quando
o rio foi escolhido para sediar os jogos, o acordo firmado com o comitê
internacional era de que 80% da lagoa fosse despoluída até o início dos jogos. O
resultado é que esse percentual não foi atingindo, cuja justificativa do poder
público municipal é de que o lixo e o esgoto presentes nas águas da lagoa são
provenientes de 15 municípios do entorno. Para minimizar os impactos, evitando
até que sacos plásticos, garrafas e outros objetos que boiam na lagoa,
atrapalhem o desempenho das embarcações, a administração, como medida paliativa
espalhou pela lagoa 15 ecoborreiras para conter os dejetos.
No
entanto cabe frisar que toda essa política de promoção de mega eventos, como os
jogos pan-americanos e as olimpíadas, ambos na cidade do Rio de Janeiro, em
nenhum momento ocorreu um debate popular sério com intuito de ouvir a população
quanto as necessidades ou não dessas grandes competições. Na verdade quem realmente discute a cidade, decidindo como ela
deve crescer e qual sua direção são as elites dominantes locais e com o aval do
poder público encarregado de arregimentar recursos para a sua
viabilização. Portanto, a crise que se
instalou no rio de janeiro, que levou até o governador substituto Francisco Dorneles a decretar estado de
calamidade pública, medida questionada pela justiça, tem relação direta com o
modelo de desenvolvimento equivocado, adotado pelo Estado e os gestores do
município carioca de tentar transformar a capital em “cidade negócio”.
Para
se ter noção do modo como vem sendo aplicado o maior volume dos bilhões de
reais, a sede olímpica, onde estão os prédios de apartamentos que abrigarão os
atletas fica localizada numa das áreas mais valorizadas do Rio de Janeiro, a
Barra da Tijuca. É claro que toda a área do entorno dessa região também se
hipervalorizou da noite para o dia, e que seria necessário adotar estratégias
de “higienização” da região, removendo a população pobre para bairros distantes.
Na
verdade, a primeira proposta ventilada acerca da construção do parque olímpico,
seria na região do fundão onde está sediada a UFRJ, cujos equipamentos,
ginásios e outras benfeitorias do evento, depois das competições, passariam a
serem administradas pela própria Universidade. Um exemplo de fracasso
desportivo foi à construção do parque olímpico que sediou o pan-americano no
rio de janeiro em 2008. Um verdadeiro massacre contra os trabalhadores
ambulantes que foram removidos e o agravamento da violência nas favelas.
Analisando
o histórico dos últimos jogos olímpicos a partir de 2000, em Sidney, ínfimos
foram os legados positivos deixados a partir dos bilhões de dólares investidos.
Outro exemplo de desperdício de dinheiro foi a construção do Estádio Nacional
de Pequin, Ninho de pássaro, que custou 430 milhões de dólares, que atualmente
recebe três ou quatros jogos por ano. E quanto à copa do mundo realizada no
Brasil, em 2014. As obras bilionárias como os estádios construídos em cidades
como Manaus, Cuiabá, Natal, ambos com equipes de futebol cujas torcidas
encheriam um estádio do tamanho do Heriberto Hulse, em Criciúma, Santa
Catarina. Sem contar os outros tantos bilhões não contabilizados que foram
desviados através de esquemas envolvendo empreiteiras, políticos e governos.
Se
tais mega eventos são realmente viáveis economicamente por que países como
Suécia, Noruega, entre outros com condições econômicas muito mais saudáveis que
o Brasil, seus governos se recusam em indicar seus nomes para concorrer à vaga.
Um fato curioso é que nas últimas copas
do mundo, os países sede, a exemplo do Brasil, ambos apresentavam certa
instabilidade política, devido as denúncias do envolvimento de governos em
esquemas de corrupção. Outro caso
estarrecedor foi a decretação do estado de exceção, que assegurou a FIFA certos poderes, desconsiderando a
própria Constituição Federal. Tudo para
garantir o lucro quase que bilionário de uma entidade que se constitui mais
poderosa do que os estados que promovem os eventos.
Retornando
ao drama do Rio de Janeiro, as políticas de incentivo a instalação de empresas
resultaram em 130 bilhões de renúncia fiscal. É tanto dinheiro não arrecadado
pelo Estado que, com certeza, seria suficiente para amenizar os graves
problemas que envolvem educação, saúde, segurança pública, saneamento básico,
entre outros. Empresas do setor hoteleiro, náutico e automobilístico foram as que
mais se beneficiaram com tais políticas. Um exemplo para elucidar tal aberração
fiscal foi a instalação da empresa Land Rover, cujo custo orçado em 600 milhões
de reais.
O
número de trabalhadores contratados pela empresa foi de 400 aproximadamente. No
caso das renúncias fiscais e as roubalheiras, o próprio prefeito Sérgio Cabral
está também sob investigação por suspeita de ter sido beneficiado recebendo 60
milhões em propina. O que dizer da reforma do maracanã, custo estimado em 1,2
bilhão de reais; a prisão do proprietário da Construtora Delta, que lucrou mais
de 10 bilhões em projetos de infraestrutura no Rio de Janeiro. Todas essas
denúncias de irregularidades seriam suficientes para que o comitê internacional
dos jogos olímpicos cancelassem os jogos como punição por tamanha roubalheira.
O
grau de instabilidade social e política no município do Rio de Janeiro chegaram
a um patamar que nem mesmo a principal empresa de comunicação do país, rede
globo, que tem exclusividade na transmissão do evento, está com dificuldades de
desviar ou maquiar tantas informações negativas oriundas do estado fluminense.
Professores da rede pública estadual e universidades em greve; polícias fazendo
protestos num dos principais aeroportos contra o não recebimento de salários; o
aumento da violência em áreas pacificadas, essa última uma demonstração do fracasso
de um plano de pacificação das favelas que vinha sendo concebido pelas
autoridades do rio como a “cereja do bolo”.
A
pergunta que certamente todos gostariam de ter respostas, depois dos ciclos dos
mega eventos esportivos, dos bilhões de reais investidos em infraestruturas,
muitos dos quais financiados por bancos estatais, quem pagará a conta? Enquanto
que nos países que sediaram as Olimpíadas,
como Atenas, os resultados negativos vieram depois, com a falência do país, no
Rio de Janeiro os sintomas já estão sendo sentidos com a quebradeira do Estado. A tendência é a
crise se agravar ainda mais nos próximos anos.
Isso
já é um demonstrativo que depois dos encantos e delírios das competições, dos
turistas terem indo embora, a população local e do restante do país terão que
conviver com uma dura realidade que se prolongará por longos anos. O grosso da
dívida, portanto, está ainda por vir e começará a ser paga a partir de 2017,
quando vence o prazo do empréstimo de um bilhão de reais contraído do Banco Mundial.
E como
irão se virar os trinta mil operários da construção civil que atuam em projetos
das olimpíadas, que ficaram desempregados depois dos jogos? Enquanto centenas de
atletas representando as delegações estiverem no dia 5 de agosto, data da
abertura das olimpíadas, transitando com seus uniformes típicos e bandeiras, no
interior do maracanã, aplaudidos e vistos por bilhões de pessoas no mundo
inteiro, milhares de trabalhadores, que prepararam todo o cenário das
competições, estarão certamente em situação de desespero, pois sabem que são os
novos excluídos olímpicos.
Prof.
Jairo Cezar