sexta-feira, 19 de novembro de 2021

 

OS ATROPELOS DAS AUDIÊNCIAS SOBRE A REVISÃO DO CODIGO AMBIENTAL DE SC: A FALSA LEGITIMIDADE DE PARTICIPAÇÃO SOCIAL

Foto - Jairo


Santa Catarina nas últimas duas décadas vem sendo destaque nos noticiários nacionais por se tornar palco de acontecimentos climáticos extremos a exemplo do Furacão Catarina em 2004. Tornados, ciclones bombas, tempestades severas e estiagens intermitentes prolongadas já fazem parte do cotidiano do estado. Acreditar que tais acontecimentos são ciclos da própria natureza é negligenciar a ciência que vem dando provas suficientes da influência antrópica na dinâmica climática global. O modelo econômico predatório impulsionado pelo lucro desmedido está colocando a espécie humana numa encruzilhada difícil, mudar comportamentos ou sucumbir para sempre.

Uma das tentativas para minimizar o ímpeto predatório do lado humano irracional e que estão trazendo efeitos positivos significativos são os conjuntos de normatizações formais, como as constituições. Em termo geral, a constituição de 1988 foi o primeiro documento que tratou a temática ambiental com importância devida. Códigos florestais, leis de crimes ambientais, lei da mata atlântica e outras tantas normatizações em escalas estaduais e municipais integram esse intricado e complexo aparelho jurídico de proteção ambiental.

Todo esse conjunto de regras e organizações ambientais não terá efeito positivo em Estados contaminados por vícios institucionais. A corrupção, o mandonismo, a troca de favores, as falcatruas, etc, são alguns exemplos de vícios que transformam normas de proteções ambientais em letras mortas. O código florestal de 1965 deixava claro em suas dezenas de páginas que quem desmatasse estariam suscetíveis as sansões legais. Milhões de hectares de florestas foram dizimados durante a prevalência dessa lei.

Foto - Jairo


Atendendo o lobby dos desmatadores, o congresso nacional em 2012 aprovou lei criando um novo código florestal, onde isentariam de pena todos que cometeram crimes contra as florestas até 2008.  A pressão de certos segmentos econômicos como do agronegócio vem sendo decisivo nas decisões relativas à fragilização das regras de proteção ao meu ambiente. As câmaras de vereadores, assembleias legislativas e o congresso nacional são instituições com funções de formular leis. Nesse sentido, os ocupantes às cadeiras desse poder são tão ou mais importantes que prefeitos, governadores e presidentes.

Aí explica o fato das ferrenhas disputas às cadeiras das respectivas casas legislativas, entrando no circuito decisório a força do mandonismo local e regional. Rastreando as casas legislativas municipais, estaduais e o próprio congresso, o que se nota é a expressiva incidência de legisladores filiados em partidárias de ideologias conservadoras, ou seja, que defendem a manutenção do status quo produtivo e social. Essa superioridade numérica nas casas legislativas garante a aprovação de leis favoráveis àqueles que os representam. No caso dos códigos florestais, por exemplo, raros são os capítulos ou dispositivos pensados nos benefícios ao meio ambiente.

Foto - Jairo


O polêmico e controverso Código Ambiental de Santa Catarina aprovado em 2009 e que serviu de modelo para a elaboração do código florestal brasileiro sancionado em 2012, ratifica o que foi dito acima, um documento altamente permissivo às atividades de riscos ambientais. Na época da sua aprovação estava em vigor a lei 4771/65, sobre o código florestal brasileiro. O descompasso entre as normatizações da lei catarinense e a federal resultou em uma enxurrada de ações na justiça exigindo a sua revogação.

Um dos itens mais polêmicos do código catarinense, motivo de criticas e denúncias junto ao STF foi acerca dos limites de APP nas margens de rios. Enquanto a norma geral estabelecia 30 metros para determinados cursos de água, a legislação catarinense definia apenas 5 metros nesses mesmos cursos. A justificativa apresentada pelo STF contrária à legislação catarinense foi fundamentada nos frequentes episódios climáticos extremos como estiagens, enchentes e deslizamentos de terras, como as que tiraram a vida de 135 pessoas em 2008.

   

Foto - Jairo

Doze anos depois da aprovação da lei n. 14.675/09 e vetada pela justiça, porém defendida pelo agronegócio e demais segmentos econômicos, novamente a assembleia legislativa e setores produtivos iniciaram as discussões visando à reformulação do respectivo código ambiental. Como aconteceu há doze anos, todo o processo está sendo atropelado, excluindo do debate ONGs e universidades. Em 2009 o relator do projeto era o deputado Romildo Triton, MDB, tendo nas costas vários processos por envolvimento em crimes ligados a perfuração de poços artesianos no estado.

Atualmente o presidente da comissão mista criada para discutir a revisão do código é o deputado Valdir Cobalchini, também do MDB. Além de Cobalchini, completam a comissão mista os deputados Moacir Sopelsa, MDB; Milton Hobus, PSD; José Milton Sheffer, PP e Fabiano da Luz, PT. Até pode ser justificável a participação desses deputados, exceto, Fabiano da Luz, por integrar um partido que historicamente foi construído sobre uma base popular, de defesa de princípios elementares, como a proteção do meio ambiente.

Foto - Jairo


Sua participação na comissão reflete exatamente essa ruptura com tais princípios. Visitando sua página nas redes sociais, bem como do PT, não foi possível visualizar qualquer comentário acerca do real motivo de estar integrando uma comissão, cujos demais integrantes são favoráveis a revisão do código para favorecer exclusivamente os seus pares.   

 Oitos audiências públicas pelo estado foram agendadas, onde estão sendo coletadas demandas da sociedade á ser incluída no texto base, prevista para ser sancionado ainda esse ano. Imagine são menos de dois meses para revisar mais de 300 artigos. Afinal, por que tanta pressa? A resposta foi dada pelo próprio deputado Cobalchini na pagina oficial do MDB. Lá foi dito que a revisão visa eliminar burocracia para agilizar processos de licenciamento. Disse também que defende o desenvolvimento respeitando o meio ambiente, que é preciso dar respostas breves ao setor produtivo.

Claro que toda essa celeridade como pretende o deputado deve ter um motivo muito específico, atender interesses de grupos econômicos. A flexibilização ainda maior das legislações de proteção ambiental irá escancarar ainda mais a porteira da destruição do pouco que restou dos remanescentes da mata atlântica. Essa certeza de que nossos biomas estarão realmente ameaçados com o código ambiental revisado pode ser confirmada ouvindo as sugestões e proposições encaminhadas nas audiências.

Antes de tecer opiniões ou críticas sobre o teor das audiências realizadas procurei assistir as gravações disponibilizadas na pagina da TV ALESC, exceto o encontro em Içara, pois lá estive presente. O fato que chamou a atenção nas audiências foi a expressiva presença de representantes de setores ligados direta e indiretamente no campo e empresarial. Quanto as demandas discutidas havia consenso na defesa de temas como a descentralização dos licenciamentos ambientais, tornando-os autodeclaratório; a autonomia aos municípios para decidir regras em APPs urbanas e a flexibilização acerca do manejo das araucárias, etc.

Os itens acima destacados, entre outros, suas inserções no novo código ambiental poderá trazer muito mais desastres ambientais. Por exemplo, a transferência da gestão das APPs urbanas aos municípios. Em Santa Catarina parcela significativa das cidades é cortada por rios, riachos e córregos. Em quase todas, as margens sofreram ações antrópicas com obras de infraestrutura suscetíveis as inundações e deslizamentos. Conforme o código florestal brasileiro e a lei n. 16.432/14, código ambiental catarinense, os mesmos vedam licenciamentos para novas ocupações num limite mínimo de 15 a 30 metros dependendo da extensão dos cursos d’água.

A intenção de transferir aos municípios a responsabilidade de definir suas APP poderá resultar em regras distintas de limites de APP numa mesma bacia hidrográfica e uma profunda confusão jurídica. Outro aspecto importante a ser considerado sobre a municipalização é que nas discussões sobre o tema prevalecerá a pressão do lobby empresarial/imobiliário sobre os legisladores e gestores municipais, propondo minimizar as regras ao máximo.

O setor empresarial capitaneado pela FIESC e demais entidades congêneres insistem na tese de que as regras ambientais em curso a exemplo do licenciamento impedem investimentos no estado na ordem de trinta bilhões de reais. Como assim? Afirmam que as atuais resoluções sobre licenciamentos estão pautadas em critérios burocráticos que engessam o desenvolvimento. A proposta defendida é instituir o licenciamento autodeclaratório, ou seja, permitir ao empreendedor ou qualquer cidadão a contratação de profissionais para elaborar o documento.

Falando sobre descentralização ou municipalização dos licenciamentos, atualmente o órgão responsável nas tratativas desse tema é o IMA (Instituto do Meio Ambiente) de Santa Catarina, além de outros municípios maiores com boa infraestrutura técnica. Se há demora ou muita burocracia nos licenciamento como alegam o setor produtivo, a culpa não é do órgão licenciador estadual, mas da sua fragilidade estrutural. Para tornar mais o órgão mais célere, caberia ao governo muni-lo com grande plantel de técnicos capacitados como de analistas ambientais. Não o faz pelo fato de ter no seu portfólio a intenção de municipalizar serviços hoje de sua alçada.

O atual presidente do IMA, que também participa das audiências, declarou em um dos encontros ser favorável à descentralização, porém, com compromisso, ressaltou. Como esperar compromisso quando se sabe muitos municípios além de poucos terem órgãos ambientais, aqueles que possuem carecem de infraestrutura mínima. Outro detalhe. Muitas fundações ambientais são vinculadas ao poder executivo, cujos superintendentes e demais profissionais exercem cargos comissionados, ou seja, indicados pelo prefeito. Como imaginar que haverá isonomia e imparcialidade nas decisões dos laudos ambientais com essa configuração?

A participação da FIESC em todas as audiências responde os reais interesses na agilização da revisão do código ambiental e sua imediata aprovação até o final do ano. Na página da entidade, na internet, estão relatadas as quatro premissas defendidas pela federação: 1- a aplicação do código ambiental catarinense sobre todos os biomas no estado; 2- a prevalência do código ambiental catarinense, ao código florestal brasileiro e a lei da mata atlântica e regulamentar o licenciamento auto declaratório.

Por que defender a prevalência do futuro código ambiental em detrimento código florestal e a lei da mata atlântica. A resposta está na permissibilidade do documento catarinense, principalmente no quesito empreendimentos sobre áreas de remanescentes da mata atlântica. Se ainda hoje áreas remanescentes de mangues e restingas são preservadas, temos que louvar a lei 11.426/2006, lei da mata atlântica.  

Essa revisão atropelada do código ambiental também explica a ausência de entidades importantes no debate como universidades, setores ligados à educação e ONG. Nas centenas de falas ouvidas nas audiências, a única vez o tema educação foi citada aconteceu  no encontro de Rio das Antas, oeste do estado. O incrível é que a fala não veio de um professor/a ou representante da Secretaria da Educação do Estado, mas por uma engenheira sanitarista.

Relatou a proponente que todos são responsáveis pelos resíduos produzidos, por isso a necessidade de dar ênfase a “logística reversa”. Além disso, alertou a necessidade de trabalhar a educação ambiental nas escolas, que está sendo esquecida. Que é preciso sensibilizar as crianças sobre a necessidade de defender o meio ambiente. O mais incrível foi à resposta dada pelo presidente da comissão mista, o deputado Cobalchini. Disse que a sugestão da proponente foi muito interessante, que até aquele momento não havia recebido nenhuma proposta relativa ao tema educação.

É importante aqui ressaltar que educação ambiental nas escolas faz parte dos PCNs estando inserido no currículo como tema transversal, devendo ser trabalhada em todas as áreas do conhecimento. Imagine o absurdo, foi excluído do debate da revisão do código, departamentos da secretaria de educação estadual voltada à educação ambiental. Em 2010 o governo do estado assinou decreto n. 3.726/2010 criando o ProEEA (Programa Estadual de Educação Ambiental). Como acreditar que um código ambiental que mudará significativamente o cenário ecológico do estado não teve a participação de professores, diretores, supervisores e outros tantos profissionais que integram as redes de ensino municipal e estadual.

É inacreditável que ONGs e demais organizações em defesa do meio ambiente está foram dessa discussão. A resposta acerca da ausência dessas instituições nas audiências está no site da ONG APREMAVI, de Rio do Sul, com o seguinte título: Revisão do Código Ambiental de Santa Catarina segue na Trilha dos Retrocessos.

O documento assinado por quase cinquentas organizações em defesa do meio ambiente traz informações que mostram o motivo da ausência no processo de revisão do código ambiental catarinense. Ambas as organizações denunciam haver manobras articuladas entre parlamentares da ALESC e o setor produtivo a revisão do código sem uma discussão mais profunda com a sociedade. O erro, segundo as organizações, são os prazos exímios estabelecidos para revisar mais de 300 artigos.

A relativização de medidas de proteção ambiental será e está sendo a tônica nas audiências. Pior é que tudo isso está acontecendo num momento em que o congresso nacional e o atual governo procuram fragilizar ainda mais as legislações ambientais e organismo protetores. As audiências públicas estão servindo de pano de fundo para dar um falso sentido de legitimidade ao processo. Todos os trâmites estabelecidos na revisão do código comprovam existir uma escancarada violação dos princípios democráticos de participação social, como define o artigo 225, caput, da constituição federal.

Prof. Jairo Cesa

 

https://apremavi.org.br/revisao-do-codigo-ambiental-de-santa-catarina-segue-na-trilha-dos-retrocessos/

https://www.blogger.com/blog/post/edit/8334622275182680372/740421506726665708

eisestaduais.com.br/sc/lei-ordinaria-n-16342-2014-santa-catarina-altera-a-lei-n-14675-de-2009-que-institui-o-codigo-estadual-do-meio-ambiente-e-estabelece-outras-providencias

https://www.canalrural.com.br/noticias/justica-mata-atlantica-codigo-florestal-sc/

https://www1.folha.uol.com.br/fsp/brasil/fc2006200915.htm

http://mdb-sc.org.br/cobalchini-defende-agilidade-na-revisao-do-codigo-do-meio-ambiente-de-sc/

https://www.sed.sc.gov.br/programas-e-projetos/30939-educacao-ambiental

https://www.educacaoambiental.sde.sc.gov.br/Documentos/PROEEA.pdf

 

 

 

 

 

sexta-feira, 12 de novembro de 2021

 

COP-26, GLASGOW/ESCÓCIA: OS DISCURSOS HIPÓCRITAS DOS GOVERNADORES BRASILEIROS LÁ PRESENTES EM DEFESA DO CLIMA GLOBAL

Depois do forjado cenário apoteótico criado no estado para garantir sobrevida ao carvão mineral por mais tempo, sendo o “sucesso” protagonizado pelo governador do estado, noticias dão conta que o chefe do executivo catarinense embarcou para Escócia para participar da COP 26 em Glasgow. Parece piada, mas é real. O governador foi para Glasgow apresentar às autoridades internacionais metas de transição sustentável que o estado vem desenvolvendo como o programa de descarbonização e a ampliação da cobertura verde.

É importante destacar que além do governador catarinense, outros 23 chefes dos executivos estaduais também estarão presentes na conferência do clima em Glasgow. Estarem lá não significa que de repente ambas as autoridades brasileiras foram contagiados for um profundo sentimento ecológico pela defesa do planeta. Nada disso. Estar em Glasgow, tem por finalidade a assinatura de protocolos de compromisso sobre transições para uma economia verde, ou seja, atividades produtivas que não provocam impactos ambientais. Ficar de fora desse compromisso poderá trazer no futuro riscos econômicos sérios principalmente no segmento da agropecuária.  

A descarbonização, por sua vez, que são estudos ainda embrionários para a captura de CO2 liberado pelo carvão, entre outros, foi sem dúvida um das justificativas apresentadas pelo segmento carbonífero para manter o carvão mineral como matriz energética no estado. Acredita-se que os mais interessados da ida do governador ao encontro do clima foram exatamente os grandes empresários do carvão mineral. Isso porque em Glasgow um dos temas que convergirá às atenções do planeta será o fim dos combustíveis fósseis.

Apresentar propostas de descarbonização, especialmente em usinas termelétricas poderá quem sabe sensibilizar autoridades no evento, desconstruindo conceitos que mostram o carvão e o petróleo como vilões do clima.  É claro que em nenhum momento, ninguém da comitiva do governador ousará exibir o drama vivido por milhares de pessoas no sul do estado impactadas pela mineração. Também não haverá qualquer menção aos inúmeros processos já julgados pela justiça que condenaram proprietários de minas por crimes ambientais resultantes da extração de carvão.

E o que dizer dos desmatamentos e o uso indiscriminado de agrotóxico, agora incentivado por políticas que dão subsídios às empresas na comercialização de pesticidas, fungicidas, herbicidas, etc. São milhões de reais que o Estado deixa de arrecadar com tais subsídios, sendo o agronegócio o segmento mais beneficiado. Quanto aos desmatamentos, Santa Catarina sempre aparece na lista entre os que mais desmatam, sendo a Mata Atlântica o bioma mais afetado.

É fato, os responsáveis pela destruição dos biomas no estado, a mata atlântica, por exemplo, na sua maioria tem ligação com o segmento imobiliário. Suprimir florestas principalmente áreas de restinga e mangues para dar lugar a loteamentos ambientalmente impactantes. Também em Glasgow, deveria o governo catarinense informar que as audiências que estão sendo realizadas no estado para debater as mudanças no código ambiental catarinense visam beneficiar quase que exclusivamente aqueles que mais destroem o ambiente, o agronegócio.

Ouvindo a fala do representante da FIESC na audiência em Chapecó, as proposições apresentadas para inclusão no código confirmam essa certeza, que o documento tem finalidades bem explícitas, deixar “passar a boiada” em benefício de alguns segmentos econômicos. Uma das demandas propostas pela FIESC foi a prevalência do futuro código ambiental catarinense ao código florestal federal e a lei da mata atlântica.

O que isso significa? Significa que o documento modificativo ao atual código ambiental será extremamente permissivo. Atualmente a não devastação definitiva do bioma da mata atlântica especialmente na faixa costeira onde estão alguns remanescentes importantes como a restinga se deve a lei da mata atlântica, homologada em 2006. Essa lei é considerada mais restritiva à concessão de licenciamentos para loteamentos e grandes obras estruturantes no bioma da mata atlântica. Prevalecer o código ambiental em detrimento da mata atlântica, como é reivindicado pela FISEC (Federação da Indústria de Santa Catarina) representa a destruição definitiva do pouco que ainda resta desse remanescente no estado.

Um dos principais pontos discutidos e que mostram interesse de ambos os seguimentos na sua inclusão no documento final do código é quanto aos licenciamentos, que tenderá ser autodeclaratório. Esse mecanismo dispensará os trâmites burocráticos necessários, bastando o interessado ele próprio contratar profissionais, fazer o licenciamento e apresentar aos órgãos competentes. Quando afirmamos que o item relativo ao licenciamento autodeclaratório passará, essa certeza se deve ao fato da existência de um projeto de lei no senado federal, a PL n. 2.159/21, apelidada de PL DA BOIADA.

A chance de que essa PL não seja aprovada no senado é quase nula. A certeza se deve ao fato de que a relatora do projeto é a senadora Kátia Abreu, ligada ao agronegócio. Em Glasgow, onde participa da COP 26, a senadora foi interpelada por um grupo de jovens que entregaram o movimento Engajamento. Disseram à senadora que a aprovação da PL como está provocará impactos negativos aos ecossistemas.

Reflitam, das dezenas de pessoas que estão em Glasgow, parte significativa integram a comitiva oficial do governo Brasileiro. Como acreditar que esse grupo atuará na COP pensando em ações que realmente venham minimizar o aquecimento global. É muita hipocrisia. O fato é que a COP 26 deverá ser um grande balcão de negócios em benefício do capital. Isso já pode ser comprovado no primeiro texto rascunho apresentado em Glasgow.

Acreditem se quiser, não foi mencionada no documento nenhuma linha referente ao fim dos combustíveis fósseis: carvão, petróleo, gás. É claro que por trás dessa decisão está o lobby das nações industrializadas e produtoras de carvão e petróleo. A não inclusão dos combustíveis fósseis no texto, a justificativa apresentada é de que não reconhecem tais matrizes energéticas como impulsionadoras da crise climática.

Era tudo o que queriam ouvir os empresários do carvão do sul de Santa Catarina e estado do rio grande do sul. Com essa postura favorável aos combustíveis fósseis, especialmente carvão, continuaremos remando contra a maré climática. O que há de verdade nisso tudo são os discursos hipócritas de autoridades e empresários, jurando de mão posta defender o meio ambiente. São discursos vazios, repletos de artimanhas favorecendo os seus pares.

Querem outro exemplo de discurso hipócrita? Um mês antes do início da COP 26 o INPE apresentou relatório confirmando aumento expressivo de desmatamento na floresta amazônica, a área chegou a 1224 km2, equivalente ao estado do Rio de Janeiro. O estado líder do desmatamento foi o Pará, com 474 km2. O que é mais insano nisso tudo é que quase todos os governadores dos estados que integram a Amazônia legal estão ou estavam em Glasgow participando da conferência em defesa do clima!!!! Acreditem????

O governador do estado do Pará também estava lá, se juntando aos demais que integram o movimento Governadores Pelo Clima. Em uma reportagem exibida pela Agencia Pará, o governador paraense narrou o seguinte sobre a importância da COP 26: “conter o desmatamento não é suficiente, temos que trabalhar para regenerar as áreas já antropizadas, e é com esse desafio que o Pará e os estados da Amazônia se somam aos demais estados do Brasil para dizer que estamos trabalhando unidos por essa causa”.

Além do Pará, os dois estados que também tiveram elevados índices de desmatamento em setembro, Amazônia e Rondônia, seus governos estavam na COP 26, prometendo que farão de tudo para alcançar o desmatamento zero até 2050. Claro que até lá o desmatamento será zerado, pois não terá mais uma árvore para ser derrubada.  

Prof. Jairo Cesa

            

https://www.youtube.com/watch?v=fdc84NcCEws 

https://www.wwf.org.br/informacoes/noticias_meio_ambiente_e_natureza/?80548/Katia-Abreu-ganha-caixa-preta-na-COP26-de-jovens-do-Engajamundo

https://unfccc.int/sites/default/files/resource/Non-paper%20on%20possible%20elements.pdf

https://agenciapara.com.br/noticia/32722/

https://www.cnnbrasil.com.br/nacional/amazonia-desmatamento-em-setembro-de-2021-supera-mes-em-2020/

https://g1.globo.com/meio-ambiente/noticia/2021/10/08/setembro-tem-segundo-pior-indice-de-alertas-de-desmatamento-aponta-inpe.ghtml

https://news.mongabay.com/2021/10/brazil-reports-increase-in-amazon-logging/

https://www.greenpeace.org/brasil/blog/deter-registra-segundo-pior-indice-nos-alertas-para-setembro/

 

 

 

domingo, 7 de novembro de 2021

 

NOVO ENSINO MÉDIO E O REBAIXAMENTO DO TÉCNICO PROFISSIONALIZANTE

O Novo Ensino Médio com previsão para começar em 2022 na realidade não tem nada de novo. É considerado por educadores e especialistas como um grande retrocesso, um modelo piorado ao implantado na década de 1970 quando vigorava a famigerada lei 5692/71. É importante destacar que não é somente o ensino médio que irá retroceder, o ensino fundamental também conforme está exposto na BNCC. Nessas mudanças como já é de praxe entrou em ação o poderoso lobby das corporações econômicas e grandes instituições financeiras, subsidiando governos entreguistas, Temer e Bolsonaro, interessados em transformar a massa de jovens brasileiros em força de trabalho barata.

Quando afirmamos que tais reformas não têm a mínima intenção de construir sujeitos críticos, conscientes e aptos a decidir seus destinos, a resposta está no novo currículo do ensino médio com a obrigatoriedade apenas das disciplinas língua portuguesa, língua estrangeira e matemática. As demais áreas do conhecimento, sociologia, filosofia, biologia, física, química, história, geografia, etc, foram fundidas em itinerários específicos: ciências humanas sociais aplicadas; ciências da natureza e formação técnica profissional. Para entender a jogada sórdida do capital sobre os currículos, no final da etapa do ensino médio o estudante poderá escolher um desses itinerários que mais se identifica.

O agravante aqui é que poucos serão os municípios brasileiros que irão ofertar todos esses itinerários, exceto, é claro, as escolas particulares. De fato pouquíssimos serão os municípios que irão garantir todos os itinerários, na sua esmagadora maioria oferecerão apenas cursos de formação profissionalizante de baixa qualidade. E por que tanta certeza nisso? Não precisamos de bola de cristal para saber. Quem vive o dia a dia de uma escola pública sabe o quão difícil é lecionar onde tudo falta de computadores a materiais de limpeza.  

Será que agora a partir da concretização dessas reformas vai ser diferente, como um passe de mágica? É óbvio que não. Não há dúvida que parcela significativa dos estudantes que concluem do ensino médio das escolas públicas não tem intenção de cursar universidade. Isso não justifica ter que mudar uma estrutura curricular eliminando qualquer possibilidade aqueles que almejam seguir os estudos. Pois é isso acontecerá. Haverá somente escolas “profissionalizantes” nos municípios menores, cujos cursos oferecidos não darão direito ao estudante de aprender química, física, biologia, história, etc. Caso não queira seguir o itinerário profissionalizante, o caminho é procurar uma escola que ofereça outros itinerários em municípios próximos ou matricular-se em unidades particulares de ensino.

Grande parte dos cursos profissionalizantes que serão ofertados nas escolas públicas de nível público não terá professores habilitados para o exercício da função. A falta de profissional bem como de infraestrutura capaz de assegurar uma formação satisfatória, não impedirá a escola de formar parcerias com instituições como SENAI, SENAC, etc, que já estão no mercado do ensino técnico há muito tempo.  A alternativa assegurada pela reforma do ensino médio é a contratação de pessoas com “notório saber”, ou seja, aqueles que apresentam algum conhecimento do assunto, sem a obrigatoriedade de ter habilitação pedagógica.  

Um exemplo que poderia ser seguido por todas as escolas públicas de ensino médio são os Institutos Federais. Os estudantes que concluem o nível secundário nessas instituições apresentam uma satisfatória formação técnica e um cabedal de conhecimentos que o capacita a disputar vagas em universidades públicas.  Basta observar a lista de estudantes de escolas públicas que ingressaram no ensino superior nos últimos anos, muitos são oriundos dessas instituições.

Embora público, os ingressantes aos institutos federais passam por exames de seleção, tamanha a procura por uma vaga. Os cursos técnicos ou tecnicismo proposto pelo Novo Ensino Médio em nada se comparará aos que são oferecidos pelas escolas técnicas federais. Além de não dar qualificação alguma ao cursando, para ter direito ao certificado de que o qualifica como um profissional técnico terá que estudar mais um ou um ano meio.

Lembro que na década de 1990 nas várias paralisações e assembleias de professores da rede publica estadual de ensino, Nilson Matos Pereira, uma das principais lideranças do SINTE já profetizava que num futuro próximo as escolas estaduais seriam tomadas por empresas ou instituições de ensino técnico como o SENAI formando parcerias com o Estado. Portanto o futuro chegou. Mais uma vez o lobby das corporações empresariais, como a FIESC, por exemplo, se mostrou muito competente nas reformas, adequando às escolas e os currículos segundo seus interesses e ideologias.

Prof. Jairo Cesa      

 

https://www.redebrasilatual.com.br/educacao/2021/08/novo-ensino-medio-doria-bolsonaro-escola/

sexta-feira, 5 de novembro de 2021

 

PEC DOS PRECATÓRIOS OU DAS PEDALADAS PATROCINADAS PELO GOVERNO BOLSONARO

Há cinco anos o parlamento brasileiro cassava o mandato da ex-presidente Dilma Rousseff acusada de ter praticado pedaladas fiscais e concedido créditos suplementares sem autorização legislativa. No dia três de novembro último, 312 deputados aprovaram em primeiro turno a PEC 23/2021 dos precatórios, que nada mais é que pedaladas fiscais, crime previsto pela constituição e passivo de impeachment. Para clarear, precatórios são dívidas contraídas pelo Estado brasileiro contra instituições, já transitada e julgada. Um exemplo é a divida junto ao Fundef praticada na época do presidente FHC.

Naquele momento, década de 1990, o Estado brasileiro deixou de repassar aos estados parcelas relativas ao reajuste do Fundef, cifras que podem chegar hoje a 90 bilhões de reais. A urgente votação da PEC se deve ao fato de que esses recursos provenientes dos precatórios serão utilizados no novo programa social que substituirá o bolsa família. Esse calote fiscal praticado pelo congresso tem objetivos muito claros, pavimentar o caminho para a reeleição de Bolsonaro.

Para a aprovação da PEC, o presidente da câmara dos deputados Artur Lira usou toda a sua influência passando por cima de regras regimentais. Para obter os 308 votos necessários à aprovação, autorizou deputados licenciados, muitos desses fora do país participando da COP 26 em Glasgow, que votassem de forma remota. Incrível o sucesso dessa manobra articulada pelo presidente, conseguindo até atrair votos de deputados do PDT e PSB, considerados partidos da oposição.

Não há dúvida que todos esses parlamentares favoráveis as pedaladas fiscais foram convencidos diante da certeza de terem recompensas polpudas por meio de emendas parlamentares, recursos que azeitarão seus redutos eleitorais. Por que trocar um programa social que estava dando certo, por outro com prazo de validade até dezembro de 2022, um mês depois do segundo turno? A intenção é, primeiro, suprimir o carimbo petista do programa original, o bolsa família, e o segundo, dar uma conotação mais humanística, fraternal do governo Bolsonaro a favor das populações necessitadas. 

É fato, não há sensibilidade alguma por qualquer um dos integrantes desse governo genocida, muito menos do ministro da economia, Paulo Guedes, que sempre defendeu o fim do programa bolsa família. De repente, quando perceberam que a gestão e Bolsonaro estava ruindo frente às denúncias de irregularidades reveladas na CPI da COVID, a saída foi, esqueça tudo o que eu falei sobre contrariedade sobre programas sociais. Os quatrocentos reais prometidos para o programa social Auxílio Brasil poderiam seguramente ter sido inseridos ao bolsa família, sem o cometimento de delitos como o calote dos precatórios.

Em qualquer sociedade os programas assistenciais criados pelos governos têm atribuições específicas recuperar a dignidade das populações em situação de vulnerabilidade social. Parece que no caso brasileiro os programas não são capazes de superar o terrível ciclo vicioso de um sistema político podre que se perpetua desse toma lá da cá assistencial. Um governo e um congresso como está hoje representado é a triste realidade de um Brasil cuja maioria da população ainda barganha voto por comida.

Prof. Jairo Cesa