sexta-feira, 25 de maio de 2012


A crise econômica européia e o fortalecimento da xenofobia

A atual crise européia vem colocando em xeque os alicerces de um padrão de prosperidade que para muitos cidadãos e cidadãs daquele continente era concebido como orgulho e exemplo a serem imitados pelas demais nações. No entanto, a precarização das relações produtivas e sociais que assola o velho continente nada mais é do que a própria crise do sistema de produção capitalista que tenta se ajustar a um novo padrão de produção e consumo que procura limitar a participação do Estado no financiamento de serviços essenciais à sociedade como saúde, educação e seguridade social.
O Estado de Bem Estar Social, uma das principais conquistas da sociedade européia no período pós-guerras, vem sofrendo atualmente um forte revés histórico. Para os gerenciadores dos mercados financeiros, são os excessos de benefícios subsidiados pelo Estado que contribuem para que países como Espanha, Portugal, Itália, França e especialmente a Grécia, recorram às instituições financeiras internacionais como o FMI, implorando ajuda para cobrir seus déficits orçamentários. A contrapartida imposta por essas organizações de créditos às nações em crise é um tanto quanto amarga e que afeta expressiva parcela da população como a perda progressiva de benefícios sociais.   
 Como em qualquer sociedade, tanto as mais antigas como as modernas, a economia foi e sempre será a base de sustentação de toda sua estrutura. Sua condição de estabilidade ou instabilidade reflete diretamente nas relações de convívio entre os diferentes grupos sociais que ocupam o mesmo espaço ou territórios distintos. As duas guerras mundiais que devastaram quase a totalidade da infra-estrutura européia servem de exemplo para elucidar como amor e ódio, caminham juntos, sendo que a maior ou menor manifestação de ambos está condicionada as condições de subsistência dos indivíduos ou grupos de indivíduos que dividem o mesmo espaço de trabalho, bairro, município ou país. É o caso, por exemplo, da atual crise que assola o velho continente que é hoje constituído por um intricado e complexo mosaico étnico que transformam Paris, Lisboa, Londres, Berlin, entre outras metrópoles, em cidades cosmopolitas.
A absorção desse contingente populacional atraídos pela expectativa de sucesso profissional e econômico obrigou os governos a disporem de mais recursos para suprirem o crescimento da demanda social, sendo sua maioria composta por imigrantes originários de suas ex-colônias.  Com o agravamento do processo recessivo que reflete na redução vertiginosa de postos de trabalhos, os governos europeus, cumprindo as recomendações das instituições financeiras internacionais, põem em prática suas políticas de ajustes estruturais, dentre elas a redução do contingente de trabalhadores dos serviços públicos, cortes de gastos em setores essenciais como saúde e educação, reforma previdenciária, entre outras.
Vendo suas condições de subsistência  se precarizarem dia após dia, a população européia não imigrante transfere ao outro, ou seja, ao imigrante africano, asiático e latino americano a culpa pela situação de depreciação social. Esse quadro depredatório vem gerando sentimentos de xenofobia (medo do outro, do estrangeiro) cuja resposta manifestada pela população ocorre sob a forma de atos de vandalismo e violência ruas ou mediante o voto, elegendo candidatos vinculados a partidos de tendências ultradireitistas, com programas de governos cujo eixo principal são as deportações e o controle rígido do fluxo migratório.
Ao mesmo tempo em que a Europa se torna mais e mais aculturada, a ameaça aos princípios republicanismos, principal legado do modernismo do século XIX, torna-se mais evidente. Os princípios iluministas baseados na liberdade, igualdade e fraternidade, tem sua razão de ser quando da existência de uma estabilidade econômica. Se fosse o inverso, não teriam ocorrido guerras fratricidas como os dois conflitos mundiais. Como manter um Estado laico, livre, quando se sabe que o próprio Estado passa a sancionar leis restringindo o acesso de indivíduos em locais públicos com trajes típicos de sua cultura de origem.
É possível estabelecer sentimentos concretos de patriotismo mesmo sabendo que o território no qual habitam os sujeitos apresenta profundas diversidades culturais? A resposta poderia ser sim, se não fosse instituído um modelo de organização abstrato, conhecido por nação e entregue a um estadista que procura impor verticalmente uma idéia ou conceito interpretados como verdadeiros. O nazifascismo e o stalinismo são alguns exemplos de organizações abstratas, que se cristalizaram pautadas nas concepções de mundo e de sociedade idealizadas de cima para baixo por seus líderes, ou seja, o mundo que se vive na cabeça é melhor que o mundo real.   O risco do surgimento de grupos extremistas ou líderes fundamentalistas de caráter nacionalista e com receituário pronto para solucionar os problemas da crise, são possíveis de ocorrer em momentos de incertezas como as que estão sendo vivenciadas agora pela sociedade européia. Não podemos jamais esquecer o holocausto alemão, das guerras separatistas da ex-Iuguslávia, da Rússia, entre outras tantas.
O fato mais emblemático e que serve de ilustração para comprovar que muitas vezes o ódio que se espalha pela Europa não tem como alvo o próprio estrangeiro imigrante. Muito pelo contrário, o alvo são os próprios cidadãos (ãs) europeus como o atentado na Noruega, na Ilha de Utóia, quando dezenas de jovens que participavam de um acampamento foram surpreendidos e mortos a tiros por um ultradireitista norueguês. O ato pode ser interpretado de duas maneiras, uma resposta às políticas públicas equivocadas dos governos atuais e ação contra as gerações futuras, representada pelos jovens mortos, que possivelmente comandariam o país.   
A crise européia pode também se configurar como o esvaziamento de sentido a uma cultura milenar, representada na arquitetura, nos monumentos, nas catedrais transformadas em museus, visitadas e contempladas anualmente por milhares de pessoas de diferentes países e cultos. Como conciliar o aspecto ético e o estético num continente habitado por um complexo contingente de povos e línguas tão distintas, que tentam se adequar a valores e comportamentos baseados na razão ocidental?    
Prof. Jairo Cezar  

segunda-feira, 14 de maio de 2012


O Drama do Ensino Público Brasileiro

A crença de que com a virada do terceiro milênio o Brasil romperia com sua histórica desigualdade social, continua sendo um sonho ainda distante. Com base em experiências vividas pelos países mais desenvolvidos, a supressão das desigualdades tornou-se real quando seus governantes passaram a investir enormes parcelas do PIB (Produto Interno Bruto) na educação básica e no ensino superior. Não os míseros 5,8% investidos pelo Governo brasileiro em 2010. O pior de tudo é que esse percentual, mesmo minguado, tem a sua aplicabilidade questionada pelas entidades que representam os trabalhadores em educação, denunciando a não há transparência quanto a real destinação dos recursos aplicados.
Com a implantação da LDB em 1996, foi estabelecido o PNE (Plano Nacional de Educação), cuja meta seria pressionar o governo federal, para que num prazo de 10 anos, destinasse 10% do PIB à educação básica. É estarrecedor quando se sabe que nem 6% foram garantidos nos dez anos da implantação da leio. Se as metas do PNE fossem asseguradas, certamente a realidade da educação pública seria bem diferente. A escassez de recursos para a concretização das metas, segundo o governo, não justifica. Pois vejamos, se o governo adotasse medidas de combate a renúncia fiscal e dos subsídios, entraria no seu caixa, seguramente, 3,7% taxa básica de juros geraria 0,6% do PIB em recursos públicos para a união, estados e municípios. Em relação aos recursos do Fundef, (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério), implantado em 1997, entre 2000 e 2003, as despesas com o programa bolsa escola foram computadas como sendo educacionais. A substituição do Fundef pelo Funde, (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de
Valorização dos Profissionais da Educação) ocorrida em 2007, foi corrigir a legislação anterior, garantindo um pouco mais de recursos para os estudantes do ensino infantil, médio, jovens e adultos e especiais.  
Mas o que é realmente gritante é quando as secretarias de educação tanto estaduais como municipais, creditam despesas que não tem nada a ver com a real função do Funde como o asfaltamento de uma rua próxima a escola; repasse de recursos para ONGs; assinatura de revistas e periódicos; inclusão de despesas educacionais com os professores cedidos a órgãos não educacionais, entre outros absurdos
As políticas públicas aplicadas à educação básica estão sendo inseridas num projeto político e social amplo, tendo por princípio a massificação da sociedade, despolitizando-a e tornando-a acessível ao mercado produtivo como mão-de-obra barata. É oportuno ressaltar que a renda das pessoas depende da educação formal que receberam, enquanto a boa ou má educação de jovens e adultos está condicionada a renda de seus familiares. A combinação desses fatores faz com que nossa política educacional seja responsável pela concentração de renda e da reprodução das desigualdades. A permanência dos seguimentos mais pobres da sociedade na escola diminui significativamente ao longo das séries escolares. Os índices de abandono chegam a um patamar aproximado de 30% das crianças antes do final do ensino fundamental.
Do lado oposto estão os mais ricos, cujo acesso à educação começa bem cedo e perdurando por aproximadamente duas décadas, com investimentos que ultrapassam a dois mil reais anos, sem contar, é claro, com outros gastos adicionais como cursos de idiomas, música, esportes, etc., que ultrapassariam a centenas de milhares de reais. Para termos uma pequena noção da nossa precariedade educacional, basta prestar atenção na avaliação da PISA (Programa Internacional para Avaliação de Alunos), vinculado a OCDE (Organização para Cooperação e Desenvolvimento da Educação), com dados de 2009, que examinou a proficiência de estudantes de 15 anos de 65 países nas disciplinas de matemática, leitura e ciências.   Seguindo uma escala que vai de um a seis, chegou-se a conclusão que menos de 1% dos estudantes brasileiros avaliados alcançou média cinco ou seis, índice este atingido por 10% dos estudantes dos países mais desenvolvidos.  Com base nesses dados, tem-se a idéia do nível instrucional dos nossos estudantes quando concluem o ensino básico. Os que alcançaram melhores notas, certamente pertenciam às famílias mais abastadas economicamente e estudaram em escolas particulares. Quanto ao ensino superior é muito provável que os estudantes com melhores notas do (PISA) ocuparam a maioria das vagas disponíveis dos cursos de excelência das universidades públicas com boa conceituação do MEC (Ministério da Educação e Cultura). Os demais sobraram às universidades e faculdades particulares, muitas das quais com qualificação abaixo da média, que oferecem cursos com forte apelo mercadológico, ou seja, um currículo reduzido que não oportuniza o estudante o mínimo de experimento e a pesquisa.
Os países da América do Sul com exceção o Brasil, as duas Guianas, Suriname e o Peru, vêm adotando políticas com forte investimento nos diversos níveis de ensino, e o resultando são os dados de 2009, quanto ao percentual de jovens entre 15 a 24 anos alfabetizados e o percentual matriculado no ensino superior em 2010. A Venezuela apresentou o melhor resultando. Dos 98,4% de jovens alfabetizados em 2009, 78% acessaram o ensino superior em 2010. A Argentina vem em seguida, dos 99,2% alfabetizados, 71% matricularam-se no ensino superior; o Uruguai ficou em terceiro, 99% para 63%; Chile, 98,9% para 59%; Equador, 96,8% para 40%; Paraguai, 98,8% para 37%; Colômbia, 97,8 para 37%. O Brasil foi classificado em oitavo lugar, ou seja, dos 97,8% que concluíram o ensino médio, apenas 36% tiveram acesso ao ensino superior. Por que poucos têm acesso ao ensino superior no Brasil, especialmente a um ensino de qualidade? Uma das respostas parte do princípio de que a cada ano adicional de escolaridade de um trabalhador implica em um aumento da renda da ordem de 15% em média. É com base nessa resposta que se conclui o motivo pelo qual o governo brasileiro vem investindo mais recursos na implantação de escolas técnicas federais em vários estados.
Dos 37% de estudantes que acessaram o ensino superior em 2010, muitos estão matriculados em instituições particulares, verdadeiros depósitos de estudantes, com salas cheias e um corpo docente despreparado. Senão vejamos, ainda que se possa parecer absurdo, a Lei de Diretrizes e Base da educação, lei 9394/96, não exige que o corpo docente das universidades seja composto por doutores. A sutil redação da lei exige que pelo menos um terço dos seus profissionais tenha titulação acadêmica de mestrado e doutorado, ou seja, se a titulação exigida é mestrado e doutorado, por que então contratar doutores que terão suas remunerações maiores? Portanto, a lei deixa subtendido sua real finalidade.  É Esse o Brasil que orgulha a elite econômica brasileira que se vangloria com o titulo de sexta economia mundial? Uma das justificativas do governo brasileiro para a abertura do mercado às instituições superiores particulares é possibilitar o desenvolvimento dos estados mais carentes. Esse argumento não condiz com a realidade, pois expressiva fração dessas instituições está instalada nos estados com melhores condições econômicas. Somente o estado de São Paulo, do total de estudantes matriculados, 87% estão nas faculdades e universidades particulares. É preciso romper com esse paradigma desigual que vem se perpetuando durante gerações. Para construirmos um país realmente republicano, precisamos romper com essa situação perversa e criar um sistema educacional onde todos sejam tratados de forma igualitária.    
Prof. Jairo Cezar