sexta-feira, 30 de abril de 2021

 

O QUE DEVE SER ESCLARECIDO SOBRE OS PROJETOS DE INFRAESTRUTURA NA APA (ÁREA DE PROTEÇÃO AMBIENTAL) NO MORRO DOS CONVENTOS

 

Foto - Jairo


Desde o instante que o tema Código Florestal brasileiro entrou na pauta de discussão do congresso brasileiro procurei acompanhar na medida do possível todas as etapas até a sua homologação em 2012. O acompanhamento das tramitações do código se deve ao fato de naquele momento estar coordenando a OSCIP, entidade ambiental criada no Morro dos Conventos em 2011. Varias textos explicativos sobre o tema, seus desdobramentos e reflexos nos biomas brasileiros, em específico a mata atlântica, foram elaborados e postados num blog do qual administro ha dez anos. 

Paralelo aos debates acerca do código florestal brasileiro, no município de Araranguá estava em curso reuniões que costuravam um plano diretor o mais participativo possível. A participação de integrantes da OSCIP, demais entidades civis e empresariais foram bem superiores a do segmento político. Sendo um plano participativo, era de se prever que a atuação do legislativo e do executivo municipal seria massivo, que não ocorreu de fato.

Era esperando também que quando o plano chegasse à câmara, os legisladores fariam somente alguns pequenos ajustes, respeitando assim as decisões da sociedade. Nada disso, o que houve de fato foram manobras bem articuladas de setores interessados, na tentativa de suprimir ou incluir emendas ao plano conforme conveniências. Na verdade o plano diretor foi discutido e votado aos pedaços. Num regime verdadeiramente democrático o que acontece ou deveria acontecer são reuniões ou audiências públicas com vistas a esclarecer a população acerca do corpo do plano diretor que irá para a votação. Algo que não ocorreu em Araranguá. 

Lembro que quando estávamos elaborando o código ambiental municipal os debates eram mais acirrados, principalmente quando o assunto era o Balneário Morro dos Conventos, Ilhas e Morro Agudo. Quem conhece um pouquinho os mais de duzentos artigos que compõe o código ambiental municipal, sabem que muito do que está ali escrito não é cumprido de fato. Um exemplo é o artigo 60 sobre estratégias no campo ambiental. A proposta contida nesse artigo e explicitada nos incisos I e XIX trata sobre a criação de mecanismos para a redução ou mesmo a proibição do uso de agrotóxicos na área urbana do município.

Quem transita pelas ruas dos bairros da cidade já deve ter notado o uso criminoso de agrotóxicos para a supressão do mato. O órgão encarregado na fiscalização dessa e de outras infrações é a FAMA. E por que não o faz? A FAMA, desde a sua criação em 2007, sua atuação quase que se resume em agilizar licenciamentos, atribuição da administração antes da criação do órgão ambiental. No estatuto da entidade, uma das muitas atribuições da entidade é promover a educação ambiental.

Não tenho conhecimento de ter havido nos quase quinze anos de existência da Fundação Ambiental um plano integrado de educação ambiental envolvendo as várias redes de ensino no município e coordenado pela entidade. Causa estranheza uma fundação ambiental municipal, cuja função também é fiscalizar o poder público, onde o cargo de superintendente é indicação do próprio executivo municipal. É necessário desvincular a FAMA das amarras do controle político. Só assim poderemos acreditar que haverá isonomia de fato nas decisões e ações tomadas.

Sobre o balneário Morro dos Conventos, quando criamos a OSCIP em 2011 nossa meta era promover reuniões mensais para tratarmos das demandas ambientais do Balneário. Foram tantas as demandas que fomos forçados a nos reunirmos quinzenalmente. Das dezenas de deliberações tomadas nesses dez anos, muitas vezes as denúncias tinham como alvo a própria fundação ambiental municipal por suspeita de descumprimento de suas atribuições estatutárias. MPSC, Polícia Ambiental e MPF foram as entidades que mais pronunciamos e cujas respostas eram quase imediatas. Nossa luta como entidade ambiental sempre foi em transformar a faixa costeira de Araranguá em área de conservação.

Motivos não faltavam. Além da frágil geomorfologia local, a presença de sítios arqueológicos datados de quatro a cinco mil anos, dava motivos de sobra para a criação de uma unidade de conservação. Em dezembro de 2016, finalmente três unidades foram criadas na faixa costeira por meio de decreto municipal. Porém, nenhuma das três unidades teve todas as etapas institucionais concluídas, conforme estabelecido os decretos.  O representante da FAMA, no seu texto A Problemática das Novas Construções no Morro dos Conventos, no parágrafo onde aborda as três unidades de conservação, o mesmo se limitou a informar apenas que ambas não estão implementadas e que poderão auxiliar na redução dos conflitos.

Já se passaram quase cinco anos e até o momento nem a administração passada nem a atual se mostraram interessadas em dar prosseguimento às etapas que faltam, algumas delas com os prazos já expirados. O fato é que se todas as etapas estivessem concluídas, alguns impasses observados na parte baixa do Balneário, provavelmente não estariam ocorrendo.  Qualquer obra ou projeto a ser executado nos limites da APA teriam que obedecer a dispositivos presentes no decreto. Um deles é o Art. 4, I, que proíbe a supressão de fragmentos de vegetação nativa primária e secundária, em estágio médio e avançado de regeneração da Mata Atlântica. Muitos devem ter notado de cima do morro ou mesmo lá embaixo a supressão de espécies da mata atlântica. Maquinas removeram espécies em estágio médio e avançado.

Pode ser até que a justificativa apresentada pelo poder público para a supressão fosse por se tratar de obra ou obras de interesse público. O fato é que poderia até com a APA concretizada, a supressão da vegetação ocorresse. Porém, certamente, não nos moldes observados lá embaixo. Se a intenção era alargar a estrada e para tal intento teria que sacrificar a vegetação nativa, o mais sensato nessa tarefa era utilizar um instrumento que não causasse tanto estrago nas demais que foram mantidas em pé. Nada disso, a escolha foi usar uma moto niveladora e patrolar tudo, sem piedade. O órgão ambiental municipal poderia, no mínimo, ter acompanhado e determinado o modo correto para tal ação.

O Art.6 da APA diz que empreendimentos ou atividades sujeitas ao licenciamento ambiental deverão indenizar os impactos gerados por meio de compensação ambiental à APA. Então, mais uma vez está aí o provável motivo na demora da implantação definitiva das três unidades de conservação. Todos os projetos que estão em execução atualmente, tanto na área de RESEX quanto na APA, deveriam compensar ambientalmente as entidades. Os recursos arrecadados seriam aplicados em atividades de educação ambiental e outros serviços conforme descritos no artigo.

Então é isso, não é tão difícil resolver os problemas pertinentes ao Balneário Morro dos Conventos. A conclusão das etapas que ainda faltam da APA e do MONA-UC poderá se transformar em um importante canal de empoderamento da sociedade do Morro dos Conventos nas tomadas de decisões sobre o que pode e o que não pode. Isso certamente minimizaria os impasses e conflitos de interesses tão arraigados nos grupos de debates virtuais.

Prof. Jairo Cesa                  

 

segunda-feira, 26 de abril de 2021

 

A BARRA DO RIO ARARANGUA ESTÁ AGONIZANDO E PEDE SOCORRO DAS AUTORIDADES



Está se tornando hábito todos os finais de semanas na foz do rio Araranguá, mesmo com os decretos do governo do estado para conter a transmissão da COVID 19, centenas de jovens insistirem em descumpri-los. O que é mais estranho é a passividade ou a cegueira das autoridades frente as barbaridade lá praticadas. Em nenhum momento lancei opinião criminalizando a juventude do direito de se divertir. Porém, a crítica que faço se deve ao fato de não ser a foz do rio Araranguá o lugar adequado para tais iniciativas. Lá centenas de pescadores familiares, todos os dias, lançam suas redes para capturar o cada vez mais escasso peixe necessário à sobrevivência. 

Qualquer animal, independente da espécie, tende a sofrer algum tipo de estresse quando seu ambiente é acometido por fortes ruídos. É o que está acontecendo na foz ultimamente com veículos contendo potentes e ensurdecedores sons automotivos.  É possível notar a progressiva redução do número de aves que utilizam o local para pernoitar ou descansar. Lembro no passado a presença de diversos pescadores lançando suas tarrafas na boca da barra. Junto com os pescadores estavam sempre os fieis botos, cada um com o seu nome, exercendo papel de parceiros na captura dos pescados.

Hoje são um ou dois pescadores lançando suas tarrafas, sem mais a companhia dos valorosos botos. A criação da RESEX (Reserva Extrativista de Proteção Ambiental) em 2016 tinha como um dos objetivos a revitalização daquele estuário como forma permitir o retorno dos botos. A pergunta que muitos gostariam de fazer é por que tanto descaso das autoridades com aquele local? Nesse final de semana, 25/04, decidi pegar minha bicicleta e ir até o local ver de perto o que as autoridades insistem em não enxergar.  

O que se nota cerca de quinhentos metros da foz é a distribuição de dezenas de tubos de cimentos sobre área de restinga que fora transformada em estacionamento.  Outros tubos foram instalados para restringir a entrada de veículos até a foz. A idéia, a princípio, seria fazer as pessoas deixarem seus veículos ali estacionados e se deslocarem a pé até o estuário. Quem disse que somente os tubos resolveriam o problema? Como já é costumeiro em outros lugares da orla, um dos tubos foi removido permitindo que os veículos acessem ao local. 

São inúmeras as infrações lá cometidas, principalmente ambientais. Trafegar sobre as restingas e dunas é crime ambiental presente em várias legislações, principalmente no Plano Diretor de Araranguá. O próprio poder público foi um dos infratores no local degradando áreas protegidas. Percebi que parcela significativa dos veículos que lá estavam eram provenientes do Balneário Rincão, onde utilizam a orla para transitar. É outra infração passiva de autuação, pois trafegar sobre a orla de Araranguá está proibido conforme resolução do TRF (Tribunal Regional Federal) de Porto Alegre.

Se a idéia da administração pública de Araranguá era conter o fluxo de pessoas e veículos no local, a fixação de tubos de concreto deveria ter sido realizada também no lado oposto da barra, não é mesmo? Outra reflexão. Tudo indica que o poder público de Ararangua tinha clareza que tais medidas impeditivas não surtiriam os efeitos esperados, pois tanto a Polícia Ambiental, Militar, IMA, IBAMA, não possuem aparatos suficientes para fiscalizarem o local. Ou será que possuem, não o fazem devido às determinações advindas de autoridades superiores? Espero que eu esteja equivocado quanto a essa reflexão.       

Prof. Jairo Cesa



























sexta-feira, 23 de abril de 2021

 

UMA PRÉVIA DE COMO SERÁ A PRÓXIMA CUPULA DO CLIMA EM GLASGOW, ESCÓCIA, EM NOVEMBRO DE 2021

O dia 22 de março de 2021 deverá ser lembrado por muito tempo como uma data especial em que se reuniram as principais lideranças mundiais para tratar sobre o futuro do planeta. A data é especial, primeiro pelo fato de ter comemorado o dia mundial da terra, e segundo, por ter sido coordenado pelos EUA, o segundo maior emissor de gases poluentes do mundo. É obvio que, em se tratando de redução da emissão de gases do efeito estufa na atmosfera, será preciso muito investimento e mudança de comportamento no que tange ao comportamento das pessoas.

No sistema capitalista pensar na mudança de comportamento significaria a ruptura desse sistema produtivo, que se nutre da exploração dos recursos naturais e do próprio sujeito.  Não há dúvida que o sucesso do encontro com tais líderes se deve ao fato de que os efeitos das mudanças climáticas já são perceptíveis nesses países industrializados, com impactos profundos na economia. A reunião do grupo não teve a intenção de definir nenhuma pauta de ações efetivas no momento, no entanto, serviu de base para o encontro das partes da próxima COP, que ocorrerá em novembro de 2021, em Glasgow, Escócia.

A reunião do grupo poderia ter sido um sucesso se não tivesse entre os convidados o representante brasileiro, o presidente Bolsonaro, que destilou mentiras e mais mentiras sobre suas intenções e promessas para combater as emissões de gases do efeito estufa. O fato é que todos os lideres participantes do encontro já possuíam em mão a ficha corrida do presidente brasileiro no que tange as políticas ambientais.

O que foi hilário no seu discurso foi quando prometeu que coordenará ações para por fim ao desmatamento ilegal até 2030. Todos os lideres mundiais sabem que desde que assumiu o governo o desmatamento e outros crimes ambientais no Brasil vem aumentando exponencialmente. Chegou ao extremo do absurdo de pedir dinheiro das nações ricas para investimentos em políticas de proteção da Amazônia.  É claro que nenhum desses líderes é bobo em concordar com essa lorota, quando sabem que mais de três bilhões de reais de Fundo Amazônia estão congelados pelo fato de o presidente Bolsonaro ter descumprindo acordos com os países doadores em proteger a Amazônia.

O ponto nevrálgico de seu discurso foi quando mentiu descaradamente afirmando que seu governo vem investindo em programas contra crimes ambientais. Omitiu no discurso que 600 profissionais do IBAMA redigiram carta denunciando o ministro do meio ambiente de desautorizá-los em multar desmatadores. Poucos dias antes da fala de Bolsonaro na cúpula, foi apreendido na Amazônia o maior carregamento de madeira da história, cuja decisão do ministro foi retirar do cargo o superintendente da Polícia Federal da região por interceder contra essa ação criminosa. Olha bem, um presidente que chancela um ministro que demite um profissional pelo fato de estar exercendo corretamente suas funções legais.

Será que agora vai ser diferente, faltando menos de dois anos para expirar o tempo de Bolsonaro na presidência da república? É obvio que não. Um exemplo disso é o que vem ocorrendo no congresso nacional, de votações de projetos que demonstram total descompasso com o seu discurso de preocupação com o meio ambiente. O trator ruralista no congresso continua fazendo estrago. Aproveitando a pandemia do COVID-19 onde a população está impossibilitada de ir às ruas se manifestarem, o senado aprovou, em toque de caixa, PL 4.348/19 que ameaça direitos de agricultores familiares e garante roubo de terras públicas.

Outros projetos maléficos ao ambiente, chancelados pela poderosa bancada ruralista estão na pauta das maldades futuras. A PL- 191 da grilagem, que permite a legalização de ocupações de terras públicas, entre outras mais como a que fragiliza licenciamentos ambientais estão na pauta de votações das duas casas do legislativo federal. Então, quem acredita que agora o governo Bolsonaro irá agir diferente depois de todo mal que fez para a saúde, educação e meio ambiente?

Prof. Jairo Cesa

HTTPS://www.greenpeace.org/brasil/blog/a-quem-bolsonaro-quer-enganar/

https://www.greenpeace.org/brasil/blog/vexame-no-senado-o-trator-ruralista-esta-passando/

 

 

             

quarta-feira, 21 de abril de 2021

 

A PRESSÃO IMOBILIÁRIA SOBRE OS REMANESCENTES DA MATA ATLÂNTICA NA FAIXA COSTEIRA DE ARARANGUÁ

A fundação SOS Mata Atlântica postou em sua página virtual artigo publicado no Jornal Valor Econômico que merece profunda reflexão ao que está ocorrendo na faixa costeira do município de Araranguá. O título do artigo é "De Olho nos Impactos da Urbanização nos Municípios da Mata Atlântica”, onde a autora do mesmo faz uma breve radiografia da pressão imobiliária na minúscula e frágil faixa costeira brasileira. Relata ela que um quarto da população brasileira está concentrada hoje em 4% de área territorial.

O fato é que legislações foram criadas a exemplo do Estatuto das Cidades para imporem regramento aos municípios brasileiros em seus planos diretores, garantindo o empoderamento da população nas discussões e definições de regras mais protetivas ao meio ambiente. O bioma Mata Atlântica, no entanto, é o bioma mais ameaçado frente as investidas do segmento imobiliário no complexo cordão arenoso litorâneo. Nos últimos anos as notícias ou reportagens mais lidas e ouvidas na imprensa e de entidades ligadas ao meio ambiente foram sobre o aumento do desmatamento e queimadas do que ainda resta dos remanescentes da mata atlântica.

A situação do bioma mata atlântica e dos demais, tende a se agravar ainda mais, pois temos um governo, onde o ministro do meio ambiente insistentemente desrespeita leis para favorecer os infratores. Um exemplo aconteceu no norte do país, onde Ricardo Salles foi contra o superintendente da polícia federal por ter aprendido o maior carregamento de madeira ilegal da história do Brasil. Olha só isso, o ministro se opondo aqueles que combatem os crimes ambientais e a favor dos criminosos ambientais! Isso eu jamais tinha presenciado.  É baseado nesse comportamento pernicioso de quem deveria resguardar as leis ambientais que estamos acompanhando atônitos uma das maiores escaladas escandalosas de crimes ambientais por todo o país.

A certeza da impunidade é o ingrediente que faz movimentar essa terrível engrenagem suicida desses ecossistemas.  O Morro dos Conventos e toda faixa costeira do município de Araranguá também estão sendo palcos de projetos de alto risco de impactos ambientais. O Plano diretor, muito menos legislações federais, estaduais ou decretos, como as que criaram as três unidades de conservação não estão sendo suficientes para frear a fúria obsessiva do segmento imobiliário, que é chancelado pelo poder público. A promessa de construção de uma ponte ligando Hercílio Luz e Morro dos Conventos já está alterando significativamente o cenário geográfico e cultural de toda região.

Se pegarmos o mapa da região dos últimos dez anos será possível observar a brutal ocupação de novas residências sobre remanescentes da mata atlântica. Os impactos sociais e ambientais já são observados, principalmente nos finais de semana, onde centenas de veículos e embarcações invadem trechos ambientalmente sensíveis junto à foz do rio Araranguá. Pescadores familiares com suas pequenas embarcações têm de compartilhar o mesmo espaço do rio com Jet ski e lanchas. O barulho ensurdecedor dos sons automotivos no entorno da foz é outro agravante comprometedor.

   Uma das conquistas obtidas pela população araranguaense e que poderia servir de instrumento mediador aos projetos de infraestrutura na faixa costeira, os gestores públicos insistem em negá-los. Estou me referindo aos decretos municipais que criaram três unidades de conservação em dezembro de 2016.   No caso do Morro dos Conventos, foram dois, o da APA e o da MONA-UC Morro dos Conventos, ambos definem regras de como esses ecossistemas devem ser gestados. Desde 2017 as reuniões com a participação dos delegados de dezenas de delegados que integravam o Grupo Gestor do Projeto Orla não vem acontecendo, o que demonstra nítida participação proposital do poder público para fazer valer os interesses do mercado. 

O que se viu nesse período foram órgãos como o COAMA (Conselho Municipal do Meio Ambiente) e o Poder Legislativo atuando para suprimir artigos dos decretos, bem como dispositivos do próprio plano diretor. Foram manobras bem articuladas, realizadas às pressas. Zoneamentos no Morro dos Conventos, que haviam sido decididos coletivamente, por exemplo, áreas definidas como de preservação permanente, de repente, em uma sessão da câmara, vereadores propuseram mudanças, é claro que atendendo pressão de algum setor interessado.  

Todo o trecho que integra o Paiquerê à Barra Velha foi transformado em APA (Área de Preservação Ambiental). Diferente do decreto que criou o MONA, a APA se define como plano mais flexível ambientalmente. No entanto, qualquer projeto a ser executado nos limites da APA deve ou deveria cumprir com todos os dispositivos descritos do decreto. A conservação, recuperação dos ecossistemas da mata atlântica e a proteção da fauna e da flora nativa são alguns deles.

O interessante é que sobre as proibições impostas pela APA, o inciso primeiro está assim redigido: fica proibida a supressão de fragmentos de vegetação nativa primária e secundária, em estágio médio e avançado de regeneração da Mata Atlântica. Lembro que em uma das reuniões do grupo gestor surgiu a proposta de um seguimento social para a supressão do inciso II do Art 4, da APA, relativo às proibições. A alegação do grupo era de que o respectivo inciso repetia o que o inciso anterior definia. Parecia simples, não era.  O inciso revogado dizia o seguinte: “é proibido a degradação ou intervenção na vegetação de restinga”.

 Nós, integrantes da OSCIP PRESERV’AÇÃO e de outras entidades participantes nos posicionamos contrario a proposta, pois sabíamos que  suprimindo esse inciso poderia  fragilizar ainda mais o decreto. As perguntas que fazemos sobre os reais motivos da desmobilização do grupo gestor do Projeto Orla e da supressão de itens importantes do decreto da APA, podem ser respondidas com o que vem acontecendo atualmente na parte baixa do Balneário Morro dos Conventos. O corte de remanescentes da mata atlântica para a abertura de ruas em um trecho do balneário poderá abrir precedentes para novas investidas do setor imobiliário especulativo à outras áreas consideradas de preservação permanente. Se os próprios decretos da APA e da RESEX não são respeitados, quem garantirá que o decreto do MONA-UC, será?

Lembro das dezenas reuniões do Projeto Orla onde um dos assuntos mais abordados era o desenvolvimento da região sem comprometer o frágil ecossistema da faixa costeira. Uma das demandas mais defendidas principalmente pelos integrantes da OSCIP PRESERV’AÇÃO era que qualquer projeto imobiliário ou turístico para a região fosse condicionado a obras estruturantes como a instalação de um sistema de tratamento de esgoto.

Por que a insistência nesse item? Toda área, do Paiquerê até a parte baixa do Morro dos Conventos, o lençol freático está a menos de um metro de profundidade. Em períodos de chuvas mais volumosas, principalmente no verão quando a população no balneário dobra de tamanho, as fossas sépticas são tomadas pela água, podendo escorrer e contaminar o solo e o mar com clorofórmios fecais.

Na gestão passada, uma ou duas vezes o tema tratamento de esgoto no Morro foi abordado, porém, sem qualquer plano mais efetivo. Na atual gestão, em nenhum momento tanto o prefeito quanto os seus secretários trataram desse assunto. Não mencionaram que para novos licenciamentos de projetos de infraestrutura e edificação imobiliária deveria primeiro ter no local um sistema de tratamento do esgoto.

Se o órgão ambiental municipal, MPSC e MPF não tomarem medidas imediatas contra os abusos/crimes ambientais praticados pelo poder público no Morro dos Conventos, em pouco tempo o “Paraíso do Sul”, como queiram, poderá aparecer com mais frequência na lista do IMA (Instituto do Meio Ambiente de Santa Catarina), durante as temporadas de verão, como uma das praias impróprias para o banho. Aí veremos como ficará o turismo sustentável, declamando em verso e prosa pelas administrações públicas.

Prof. Jairo Cesa      

sexta-feira, 16 de abril de 2021

 

É NECESSÁRIO CONSIDERAR O DECRETO 7830/16 EM OBRAS DE INFRAESTRUTURA COMO A PONTE QUE LIGARÁ MORRO DOS CONVENTOS AO BALNEÁRIO ILHAS

Há anos a região costeira do município de Araranguá vem lutando por demandas que proporcionem o desenvolvimento sustentável. A realização do projeto Orla, entre 2014 a 2017, contribuiu para uma discussão mais participativa dos vários seguimentos sociais na definição de mais de 200 propostas a serem executadas e coordenadas pelo poder público. Mais uma vez reitero que os decretos que criaram três unidades de conservação em 2016 se caracterizaram como o ápice desse processo. Entretanto, tanto na nova gestão pública pós-decreto, como a atual, buscou-se e se busca manter um silêncio sepulcral do projeto orla a exemplo dos decretos das UC.

E por que será? A sensação que fica é que tudo que discutiram e aprovaram os delegados representando dezenas de entidades foi um faz de conta, um teatro? Outra questão que merece resposta. Se há decretos assinados por qualquer que seja o administrador público, o mesmo perde validade e pode ser arquivado? Pelo meu humilde conhecimento em legislação, acredito que enquanto um decreto ou legislação não forem derrubados no legislativo, ambos continuam valendo. Baseado nessa premissa quer aqui levantar algumas discussões relativas ao decreto 7830 de 2016 que criou a Unidade de Conservação da Natureza Municipal Reserva Extrativista do Rio Araranguá.

Esse decreto quando foi assinado gerou forte expectativa nas comunidades costeiras, Ilhas, Morro Agudo, Barra Velha, por exemplo, pelo fato de poder garantir certa ordem no manejo das atividades econômicas e culturais. Ficou assegurado, conforme o inciso V relativo aos objetivos da RESEX, promover o turismo sustentável e o lazer. Quem visita Ilhas e a foz do rio Araranguá nos finais de semana, deve ficar embasbacado com o tipo de turismo que está se criando lá. Nada daquilo é sustentável, muito menos lazer.

Porém, é o Art. 6 que aqui deveremos nos pautar. Assim está escrito o artigo na íntegra: “Empreendimentos ou atividades sujeitos ao licenciamento ambiental, com impactos diretos à RESEX do Rio Araranguá, deverão indenizar os impactos gerados por meio de compensação ambiental à mesma, com custos entre cinco e dez por cento dos totais previstos para a implantação do empreendimento, sendo o percentual fixado pelo órgão gestor de acordo com o grau de impacto ambiental causado pelo empreendimento. Os valores recolhidos a título de compensação ambiental deverão ser obrigatoriamente investidos em recursos humanos, bens e materiais necessários para a implementação, manutenção e gestão da unidade”.  

A ponte, considerada a obra de infraestrutura mais aguardada há décadas, que integrará as tradicionais comunidades próximas a foz do rio Araranguá, tenderá transformar radicalmente aquele cenário e dos demais. Os decretos das unidades quando foram criados em 2016, a exemplo da Resex, tinham como um dos propósitos disciplinar ou estabelecer regras evitassem impactos ambientais aos frágeis ecossistemas inseridos nas UC. Quem acompanha a movimentação nos finais de semana nas proximidades da foz do rio Araranguá, se sente receoso do futuro daquela região quando a ponte estiver concluída.

É possível que uma das justificativas do poder público na não continuidade das etapas referentes a Unidades de Conservação seja a falta de recursos financeiros. Mas o que falta mesmo e vontade política. A criação do plano de manejo nessas unidades, coordenada por equipes de pessoas, dará instruções sobre o que pode e não pode nas mesmas. Contratação de pessoal, fiscalização, atividades educativas, entre outras ações, serão abarcadas por recursos oriundos de compensações ambientais.

Qualquer obra de infraestrutura nos limites das unidades terá de repassar à equipe gestora um percentual financeiro estabelecido pelos decretos. No caso da RESEX, a ponte projetada que integrará os dois lados do rio Araranguá, o Art. 6 do decreto 7830/16, determina que sejam repassados 5% a 10% do montante orçado à respectiva unidade. Nesse caso, a obra da ponte está orçada em 18,5 milhões de reais. Na hipótese da empresa ter de repassar o mínimo de 5% do total da obra à RESEX, seriam 925 mil reais disponíveis no caixa do grupo gestor para a execução das demandas.

Prof. Jairo Cesa     

leismunicipais.com.br/a1/sc/a/ararangua/decreto/2016/783/7830/decreto-n-7830-2016-dispoe-sobre-a-criacao-da-unidade-de-conservacao-da-natureza-municipal-reserva-extrativista-do-rio-ararangua-e-da-outras-providencias   

domingo, 11 de abril de 2021

 

RELATO DE UMA TARDE DE TERROR NA BARRA DO RIO ARARANGUÁ

Como faço frequentemente aos finais de semana, tenho o hábito de pegar a bicicleta ou mesmo a pé e deslocar até a barra do rio Araranguá. O caminhe sempre reserva algumas surpresas agradáveis e às vezes desagradáveis. Hoje, 11 de abril de 2021 foi um daqueles dias que teria sido melhor ter ficado em casa. Quando cheguei à orla do Morro dos Conventos me deparei com centenas de pessoas aglomeradas e uma enormidade de automóveis estacionados irregularmente na orla, entre outros que transitavam perigosamente entre o publico.  Senti naquele instante que o passeio até a barra não seria tão tranquilo, harmonioso como em outras oportunidades.

Seguindo pela orla de bicicleta, em nenhum momento pude desviar o olhar do caminho para apreciar as belezas do trajeto. O motivo foi o fluxo frenético de automóveis, indo e vindo da barra. Cerca de quinhentos à frente, me deparei com uma encantadora imagem, possível de ser vista em dois momentos a cada ano. Eram centenas de pequenos pássaros migratórios que, agitados, beliscavam a areia da praia catando o alimento necessário para a longa jornada até o hemisfério norte.

Nas paragens, como no Morro dos Conventos, as batuíras, como são conhecidas, necessitam de tranquilidade para poder se alimentar e obter energia suficiente para concluir um voo de quase quinze mil quilômetros. Percebi que os pequenos pássaros passavam mais tempo voando do que se alimentado, devido ao grande fluxo de carros passando próximo aos pássaros. As batuíras têm um tempo muito curto para descansar e se alimentar e alçar voo.  É possível que muitas das avezinhas que estavam ali tentando se alimentar jamais chegarão ao destino por não terem se alimentado o suficiente devido aos automóveis.

Já próximo a barra, um forte barulho de som automotivo quebrava a harmonia do local, considerado por muitos como um santuário ecológico. Centenas de aves de espécies distintas têm a foz e o seu entorno como habitat para reprodução e descanso. Chegando mais perto da foz, os ruídos se tornavam mais intensos a ponto de não poder ouvir nem mesmo a minha voz. Em vez de ter ido até o começo da barra pela orla, cortei caminho através das dunas, pois ali percebi que estava o problema que vem se repetindo sem que as autoridades consigam uma solução plausível.

Instalei-me sobre um tronco de arvore seco e comecei a gravar algo que, contando, muitos poderiam não acreditar. Durante os mais de trinta minutos que lá estive pude presenciar cenas estarrecedoras. Desde a prainha de Ilhas até a ponta da barra, margem esquerda do rio, contei mais de cem automóveis, incluindo motocicletas e Jet Ski. Se cada automóvel transportasse duas ou mais pessoas, lá, nessa tarde de domingo, deveria estar cerca de quinhentas pessoas.  

Como explicar um aglomero tão grande de pessoas, num local que fora transformado por decreto em Unidade de Conservação Reserva Extrativista em 2016, com dispositivos que vedam tais práticas tão degradantes ao ecossistema local. O curioso foi que durante o período que lá estive não observei nenhum carro da polícia militar fazendo patrulhamento e repreendendo as pessoas que descumpriam as normas estabelecidas contra o COVID.   Por que será que as pessoas estão agindo de maneira tão displicente como se não tivéssemos vivendo um dos momentos mais críticos da pandemia? Imaginam, os hospitais da região estão com as suas ocupações no limite. Sem contar as UTI que há filas de espera para ter acesso ao tratamento especial.

De acordo com o portal UOL notícias do dia 11 de abril, o Brasil registrou nesse domingo a segunda pior média de mortes da pandemia, 3.109 por dia. O portal G1, bem estar, noticiou no dia 10 de abril, sábado, que a Fiocruz alerta para cenário crítico da pandemia no sul e centro- oeste para as próximas semanas. Então minha previsão não esta equivocada. Acredito que daqui no máximo 15 dias teremos o agravamento dos casos de COVID e mortes na região.

Não é possível que amanhã, segunda feira, 12 de abril, surja comentários de radialistas ou pseudo jornalistas sem qualificação, querendo colocar a culpa nessas pessoas que não estão se cuidando. Se há um decreto estadual o mesmo deve ser cumprido, não é mesmo? E por que não é cumprido? O Estado e os municípios deveriam dar exemplo criando estratégias para coibir, punir categoricamente aqueles que insistem em descumprir o decreto. Quem estava hoje na barra do rio Araranguá, certamente retornará na próxima semana, tendo a certeza de que nada o impedirá de estar lá. Portanto, a única certeza que temos no momento é que estamos vivendo num país, estado e município do faz de conta, onde o que prevalece é o salve-se quem puder.

Prof. Jairo Cesa