sexta-feira, 30 de abril de 2021

 

O QUE DEVE SER ESCLARECIDO SOBRE OS PROJETOS DE INFRAESTRUTURA NA APA (ÁREA DE PROTEÇÃO AMBIENTAL) NO MORRO DOS CONVENTOS

 

Foto - Jairo


Desde o instante que o tema Código Florestal brasileiro entrou na pauta de discussão do congresso brasileiro procurei acompanhar na medida do possível todas as etapas até a sua homologação em 2012. O acompanhamento das tramitações do código se deve ao fato de naquele momento estar coordenando a OSCIP, entidade ambiental criada no Morro dos Conventos em 2011. Varias textos explicativos sobre o tema, seus desdobramentos e reflexos nos biomas brasileiros, em específico a mata atlântica, foram elaborados e postados num blog do qual administro ha dez anos. 

Paralelo aos debates acerca do código florestal brasileiro, no município de Araranguá estava em curso reuniões que costuravam um plano diretor o mais participativo possível. A participação de integrantes da OSCIP, demais entidades civis e empresariais foram bem superiores a do segmento político. Sendo um plano participativo, era de se prever que a atuação do legislativo e do executivo municipal seria massivo, que não ocorreu de fato.

Era esperando também que quando o plano chegasse à câmara, os legisladores fariam somente alguns pequenos ajustes, respeitando assim as decisões da sociedade. Nada disso, o que houve de fato foram manobras bem articuladas de setores interessados, na tentativa de suprimir ou incluir emendas ao plano conforme conveniências. Na verdade o plano diretor foi discutido e votado aos pedaços. Num regime verdadeiramente democrático o que acontece ou deveria acontecer são reuniões ou audiências públicas com vistas a esclarecer a população acerca do corpo do plano diretor que irá para a votação. Algo que não ocorreu em Araranguá. 

Lembro que quando estávamos elaborando o código ambiental municipal os debates eram mais acirrados, principalmente quando o assunto era o Balneário Morro dos Conventos, Ilhas e Morro Agudo. Quem conhece um pouquinho os mais de duzentos artigos que compõe o código ambiental municipal, sabem que muito do que está ali escrito não é cumprido de fato. Um exemplo é o artigo 60 sobre estratégias no campo ambiental. A proposta contida nesse artigo e explicitada nos incisos I e XIX trata sobre a criação de mecanismos para a redução ou mesmo a proibição do uso de agrotóxicos na área urbana do município.

Quem transita pelas ruas dos bairros da cidade já deve ter notado o uso criminoso de agrotóxicos para a supressão do mato. O órgão encarregado na fiscalização dessa e de outras infrações é a FAMA. E por que não o faz? A FAMA, desde a sua criação em 2007, sua atuação quase que se resume em agilizar licenciamentos, atribuição da administração antes da criação do órgão ambiental. No estatuto da entidade, uma das muitas atribuições da entidade é promover a educação ambiental.

Não tenho conhecimento de ter havido nos quase quinze anos de existência da Fundação Ambiental um plano integrado de educação ambiental envolvendo as várias redes de ensino no município e coordenado pela entidade. Causa estranheza uma fundação ambiental municipal, cuja função também é fiscalizar o poder público, onde o cargo de superintendente é indicação do próprio executivo municipal. É necessário desvincular a FAMA das amarras do controle político. Só assim poderemos acreditar que haverá isonomia de fato nas decisões e ações tomadas.

Sobre o balneário Morro dos Conventos, quando criamos a OSCIP em 2011 nossa meta era promover reuniões mensais para tratarmos das demandas ambientais do Balneário. Foram tantas as demandas que fomos forçados a nos reunirmos quinzenalmente. Das dezenas de deliberações tomadas nesses dez anos, muitas vezes as denúncias tinham como alvo a própria fundação ambiental municipal por suspeita de descumprimento de suas atribuições estatutárias. MPSC, Polícia Ambiental e MPF foram as entidades que mais pronunciamos e cujas respostas eram quase imediatas. Nossa luta como entidade ambiental sempre foi em transformar a faixa costeira de Araranguá em área de conservação.

Motivos não faltavam. Além da frágil geomorfologia local, a presença de sítios arqueológicos datados de quatro a cinco mil anos, dava motivos de sobra para a criação de uma unidade de conservação. Em dezembro de 2016, finalmente três unidades foram criadas na faixa costeira por meio de decreto municipal. Porém, nenhuma das três unidades teve todas as etapas institucionais concluídas, conforme estabelecido os decretos.  O representante da FAMA, no seu texto A Problemática das Novas Construções no Morro dos Conventos, no parágrafo onde aborda as três unidades de conservação, o mesmo se limitou a informar apenas que ambas não estão implementadas e que poderão auxiliar na redução dos conflitos.

Já se passaram quase cinco anos e até o momento nem a administração passada nem a atual se mostraram interessadas em dar prosseguimento às etapas que faltam, algumas delas com os prazos já expirados. O fato é que se todas as etapas estivessem concluídas, alguns impasses observados na parte baixa do Balneário, provavelmente não estariam ocorrendo.  Qualquer obra ou projeto a ser executado nos limites da APA teriam que obedecer a dispositivos presentes no decreto. Um deles é o Art. 4, I, que proíbe a supressão de fragmentos de vegetação nativa primária e secundária, em estágio médio e avançado de regeneração da Mata Atlântica. Muitos devem ter notado de cima do morro ou mesmo lá embaixo a supressão de espécies da mata atlântica. Maquinas removeram espécies em estágio médio e avançado.

Pode ser até que a justificativa apresentada pelo poder público para a supressão fosse por se tratar de obra ou obras de interesse público. O fato é que poderia até com a APA concretizada, a supressão da vegetação ocorresse. Porém, certamente, não nos moldes observados lá embaixo. Se a intenção era alargar a estrada e para tal intento teria que sacrificar a vegetação nativa, o mais sensato nessa tarefa era utilizar um instrumento que não causasse tanto estrago nas demais que foram mantidas em pé. Nada disso, a escolha foi usar uma moto niveladora e patrolar tudo, sem piedade. O órgão ambiental municipal poderia, no mínimo, ter acompanhado e determinado o modo correto para tal ação.

O Art.6 da APA diz que empreendimentos ou atividades sujeitas ao licenciamento ambiental deverão indenizar os impactos gerados por meio de compensação ambiental à APA. Então, mais uma vez está aí o provável motivo na demora da implantação definitiva das três unidades de conservação. Todos os projetos que estão em execução atualmente, tanto na área de RESEX quanto na APA, deveriam compensar ambientalmente as entidades. Os recursos arrecadados seriam aplicados em atividades de educação ambiental e outros serviços conforme descritos no artigo.

Então é isso, não é tão difícil resolver os problemas pertinentes ao Balneário Morro dos Conventos. A conclusão das etapas que ainda faltam da APA e do MONA-UC poderá se transformar em um importante canal de empoderamento da sociedade do Morro dos Conventos nas tomadas de decisões sobre o que pode e o que não pode. Isso certamente minimizaria os impasses e conflitos de interesses tão arraigados nos grupos de debates virtuais.

Prof. Jairo Cesa                  

 

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