quinta-feira, 30 de novembro de 2017

OS DESAFIOS DO COMITÊ DA BACIA DO RIO ARARANGUÁ NA EXECUÇÃO DO PLANO DE RECURSOS HÍDRICOS APROVADO EM 2015

O Comitê da Bacia do Rio Araranguá, entidade criada por decreto estadual em 1997, nos seus vinte anos de existência vem se consolidando no sul de Santa Catarina como organização representativa da sociedade nas discussões de proposições que assegure o equilíbrio entre demanda hídrica e desenvolvimento.  Considerada uma das bacias hidrográficas mais ameaçadas do estado e quiçá do Brasil, o carvão sempre se constituiu e permanece sendo um dos vilões na baixa qualidade hídrica da bacia. Atualmente, além do carvão mineral, outras demandas degradantes como a extração de seixos rolados, desmatamentos, agrotóxicos, esgotamento sanitário, lixo, etc, estão ameaçando o pouco que resta das águas superficiais e subterrâneas não contaminadas.
Por cerca de dois anos, o comitê Araranguá concentrou os esforços na construção do Plano de Recursos Hídricos para a bacia. Considerado avançadíssimo por esmiuçar os problemas e as potencialidades hídricas dá região, o plano foi concluído e apresentado à sociedade em 2015, porém, as doze ações estratégicas de curto prazo oficialmente não saíram ainda do papel. Se houveram atividades executadas durante os dois últimos anos foram por iniciativa de voluntários que integram o comitê. A expectativa é que até 29 de novembro ou 14 dezembro, de 2017, os recursos poderão estar disponibilizados para a execução das seis metas e 33 estratégias.
Como qualquer plano, algumas metas ou estratégias se destacam entre outras por apresentarem gargalos que interferem no satisfatório desempenho das atividades hídricas da região. Das 33 estratégias destacadas, 12 foram enumeradas como emergenciais e que seriam colocadas em execução durante os próximos cinco anos. Além da elaboração de proposta para o enquadramento dos corpos hídricos da bacia, se destaca também como estratégia prioritária a realização de estudos sobre limites de exploração de minerais em calhas dos rios da região.  
 O comitê, desde a sua criação há vinte anos, vem se deparando com problemas quase desconhecidos na região há pouco tempo, como os constantes e contínuos conflitos por água, principalmente envolvendo seguimentos agrícolas e industriais. A supressão de vastas áreas da floresta atlântica transformadas em pró-várzea vem exigindo desde então crescentes demandas por água. O fato é que outros setores também se utilizam das águas da bacia, que somados à agricultura resultam em déficit hídrico. Ano após ano o fluxo de água recebido pelos rios dos aqüíferos e lençóis freáticos está sendo menor. A resposta pode estar na baixa freqüência de chuvas e na supressão das florestas responsáveis pela reposição da água subterrânea.
Para se ter noção do tamanho da pressão do setor agrícola (rizicultura) nos recursos hídricos da região, em 2015, as demandas estimativas dos usos consumitivos da bacia era o seguinte: abastecimento público com 49 milhões de metros cúbicos por ano, e irrigação 527 milhões de metros cúbicos por ano. Não números assustadores. Com o problema dos desmatamentos, parte da água que cai no solo rapidamente escorre para os rios e córregos carregando sedimentos que intensificam o assoreamento. Se o plano de recuperação da mata ciliar e do que resta dos remanescentes da mata atlântica não forem bem sucedidos, em pouco tempo os conflitos pela água se multiplicarão de tal forma que o próprio comitê da bacia não terá estrutura para mediar.
  Dentre os afluentes da bacia mais degradados, o destaque é o rio Mãe Luzia, que certamente requer mais atenção. São inúmeras empresas mineradoras que ainda exploram o carvão mineral para abastecer as termelétricas de Capivari de baixo. Se não bastassem os ativos ambientais, para piorar se somam com os passivos ambientais de décadas de extração. O enxofre e outras dezenas de metais pesados e contaminantes dos resíduos de carvão mineral tornam a água do rio Mãe Luzia, imprópria para consumo humano e animal.  
  O lançamento do livro Era uma vez o Rio Mão Luzia, escrito pelo professor da Unesc, Carlos Renato Carola e Nilson Dassi, e lançado em 2014, foi, entre outras, algumas das atividades voluntárias da sociedade em prol da Bacia. O lançamento da obra despertou a necessidade da criação do fórum permanente em defesa do Rio Mãe Luzia.  A mobilização da sociedade vem se configurando como estratégia positiva para frear ou ganhar tempo ao ímpeto ganancioso e irracional do setor minerador. O empoderamento e o fortalecimento do imaginário social de uma comunidade tendem a serem estratégias excelentes para despertar sentimentos de pertencimento. A produção de livros científicos, de contos, de histórias, artigos, filmes, fotografias, acerca de um rio ou rios, se configuram como ações importantes no processe de sensibilização.
A sensibilização por si só não é suficiente na reversão de práticas degradantes que afetam mananciais. É preciso a atuação incisiva do poder público, disponibilizando recursos cada vez maiores em políticas de saneamento básico. O percentual de tratamento dos esgotos sanitários na região que congrega as bacias do Araranguá, Urussanga e Mampituba (lado catarinense) é ínfimo. Embora as legislações federais estabeleçam prazos para que todos os municípios brasileiros implantem seus sistemas de coleta e tratamento de resíduos orgânicos, falta recursos para sua efetivação. 
No plano de recursos hídricos da bacia, uma das ações emergências, entre outras 12 elencadas, é a redução da poluição originária do esgotamento sanitário. Também sem recursos. Municípios como Siderópolis, Forquilhinha estão com seus projetos de usinas em execução. Que juntos com outros municípios como Criciúma, Araranguá, etc, poderão elevar o percentual de esgoto coletado e tratado na bacia que é vergonhoso. Outro dado preocupante no abastecimento de água no município de Criciúma, o mais populoso do extremo sul catarinense, é que os milhões de litros consumidos diariamente pela população são provenientes da Barragem do rio São Bento, que abastece também centenas de produtores rurais e os seguimentos industriais.
Quanto à poluição por carvão mineral, o incrível é que o município de Nova Veneza, não extrai uma pedra de carvão, porém, o rio que atravessa o município é um dos mais poluídos do país. O Ex-vereador Albarto Ranacosk, de Nova Veneza, que se fez presente no fórum permanente em defesa do rio Mãe Luzia, em Nova Veneza, disse que a barragem do São bento, tem vida útil de 30 anos, e já se passaram 15 anos. O que causa maior apreensão é onde buscar água no futuro para abastecer a região no instante que a barragem sofrer colapso? Criciúma não possui sequer uma fonte natural ou vertente com água disponível.[1]
Enquanto universidades, entidades civis organizadas, escolas, entre outras, se empenham em ações na tentativa de restabelecer à vida nos mananciais que integram a complexa bacia do rio Araranguá, na outra ponta da rede estão empresas e entidades ambientais licenciadoras e fiscalizadoras que seguem caminho oposto. A extração descontrolada e criminosa de seixo rolado está transformando rios importantes como Manoel Alves e Itoupaba, em verdadeiras bombas relógio às populações que habitam o seu entorno. São poderosas máquinas escavadeiras que com uma única pasada conseguem extrair tonelada de pedra.
Na última assembléia geral do Comitê da Bacia do Rio Araranguá, extração de seixo rolado, se configurou em um dos temas principais do encontro, apelidado até de o Conflito da Pedra. Um dos membros do comitê denunciou que empresas estão matando os rios com a extração descontrolada de pedras, com o aval do estado, através da FATMA, que concede os licenciamentos.  Não há fiscalização, nem mesmo contrapartida aos danos causados. É insensato quando entidades como o comitê, cujos membros disponibilizam seu preciso tempo em prol de causas tão nobres como a defesa da água, tem empresas, governos e órgãos licenciadores/fiscalizadores, que põem tudo a perder, descumprido, abertamente, normas ambientais específicas.
No município de Treviso, dois cidadãos que integram o comitê da bacia denunciaram empresas de mineração de carvão que continuam, criminosamente, despejando água contendo metais pesados ao Rio Mãe Luzia. Que tais denúncias foram protolocadas no MPF (Ministério Público Federal) solicitando que se faça averiguação dos fatos delituosos.  Há também antigas minas de carvão desativadas que permanecem contaminando lençóis freáticos e cursos d’água na região, que esse problema somente recebeu atenção das autoridades quando a TV exibiu reportagem destacando a mina, onde possível mobilizar a opinião pública.
Sobre a extração de seixos, o plano de recursos hídricos da bacia, na pagina 51, traz a seguinte recomendação: “realizar estudos sobre limites de exploração e minerais em calhas dos rios da região (estudo)” Na época da apresentação do plano, o custo estimado para a contratação de empresas para estudos dos limites e zoneamento para a exploração da minerais foi orçado em 250.000 mil reais. Enquanto isso, a devassa da vegetação ciliar e dos barrancos dos rios continua sem limites. O engenheiro ambiental e superintendente da fundação ambiental de Nova Veneza declarou na assembléia do comitê que no município uma empresa de extração de seixo foi autuada por ter descumprindo normas legais, sendo caçando os direitos de mineração.
O maior problema no combate a extração de seixos é que as legislações são extremamente permissivas, a exemplo o código florestal brasileiro que abre brechas favoráveis a novos desmatamentos. O que deve ser feito é pressionar os legisladores federais, estaduais e municipais para instituírem legislações mais restritivas e criteriosas para as concessões de licenciamentos ambientais.  A sensação que fica é de que tanto os parlamentares quanto os profissionais que atuam nas fundações e demais órgãos ambientais, odeiam árvores, animais, ou seja, odeiam a sim mesmo. Se for realizado levantamento das leis sancionadas e licenciamentos concedidos ultimamente, quase todos estão em conformidade com os interesses do degradadores ambientais. É fácil comprovar, basta fazer um tour pelo interior e área urbana dos municípios e constatar in loco.
É necessário que a sociedade se sensibilize e empodere de conhecimentos básicos acerca das legislações ambientais, dos trâmites e dos caminhos para se chegar aos órgãos fiscalizadores competentes. Imagens, vídeos, ofícios, são recursos importantes no momento da denúncia. Em âmbito municipal, a população poder recorrer a FAMA e Ministério Público Estadual. Também estão disponíveis para receber denúncias, a Polícia Militar Ambiental (Maracajá), a Justiça Federal e o Ministério Público Federal, ambos em (Criciúma). No entanto, muitos desses órgãos carecem de estrutura apropriada para oferecer serviços de qualidade à população.  Esse déficit de profissionais e equipamentos vem se arrastando há décadas. E por que será? A resposta, portanto, imaginamos que todos saibam.                                
A população não pode se omitir do seu direito e dever de agente fiscalizador dos órgãos ambientais, cujo dever é inspecionar e proteger os ecossistemas, e não transformar em fábrica de dinheiro, facilitando licenciamentos para empreendimentos imobiliários e atividades de extrativismo mineral questionáveis. De acordo com o ex-presidente do Comitê da Bacia do Rio Ararangua, ele relatou que: “as irregularidades estão virando coisa normal, cada um faz o que quer, como quer, extrai-se areia, seixos, sem notas ou notas frias”.
São, portanto, os rios que mais sofrem com tudo isso. Mais cedo ou mais tarde, os rios darão as respostas, sob a forma mais inesperada e trágica, as enxurradas e deslizamentos de morros. Que sirva de advertência o dia 25 de dezembro de 1995, quando uma forte precipitação devastou uma comunidade no município de Timbé do Sul. Entretanto, o que se conclui é que esses episódios extremos do clima pouco refletem nas decisões dos políticos na elaboração de leis, resoluções, decretos, que estão interferindo na dinâmica do clima e na geografia do espaço.
Na expectativa de que se repitam episódios semelhantes ao de 1995 e com efeitos muito mais devastadores, o ambientalista e integrante da ONG Sócio da Natureza, Tadeu dos Santos, elaborou texto discorrendo sobre a extração criminosa de seixo rolado nos rios da bacia hidrográfica do rio Araranguá. O referido documento foi lido na última assembléia geral do comitê da bacia, realizada no dia 23 de novembro de 2017. Alertou Tadeu que a retirada de seixo rolado ou cascalho das calhas de rios, pode até ser “um ato legalizado”, no sul de SC, mas é imoral, inadequado e insustentável.
Alertou as autoridades competentes e a população, que a pratica da mineração de cascalho vem provocando mudanças significativas na geografia da região, bem como na configuração dos rios.  Os seixos ou cascalhos, sempre tiveram uma função importante na regulação e dinâmica do fluxo da água. O que é estarrecedor é que essas práticas têm o consentimento de órgãos que deveriam dificultar ao máximo as licenças, como a FATMA e DNPM. De acordo com Tadeu, não há qualquer fiscalização, tanto prefeituras como iniciativa privada, ambas atuam de forma conivente no processo criminoso da mineração.
Prof. Jairo Cezar            







[1] WWW.engeplus.com.br/noticia/ambiente/2017/o-futuro-do-rio-mae-luzia-em-debate/

sexta-feira, 24 de novembro de 2017

PROJETO ESCOLA SUSTENTÁVEL E AS ETAs (ESTAÇÕES DE TRATAMENTO DE ÁGUA) DE ARARANGUÁ – VISITA A ESTAÇÃO AÇUDE BELINZONI



Está cada vez vais evidenciado que muito mais cedo do esperado os conflitos regionais e planetários serão travados por disputas de mananciais ou poços contendo água potável ao invés de petróleo e jazidas de pedras preciosas. A escassez desse recurso finito já é nítida nos cinco continentes devido a vários fatores como os antrópicos, ação humana. O Brasil, quem diria, um imenso território cantado em verso e prosa por possuir as maiores reservas de água doce do planeta, atualmente, até mesmo a Amazônia vem enfrentando estiagem e o racionamento de água. São freqüentes as campanhas difundidas pelos meios de comunicação, escolas e organizações ambientais, alertando à população e o poder público sobre o risco de faltar água se hábitos de consumo e manuseio do líquido não forem modificados.


Hoje em dia mais de 50% da água tratada somente no Brasil é desperdiçada, ou seja, é perdida devido a problemas na rede ou uso indevido. No caso de Araranguá, o consumo diário é de 6 a 7 milhões de litros. No entanto, desse total consumido, apenas 3 milhões de litros seriam suficientes para suprir as necessidades. Isso significa que é captado das lagoas o dobro de água necessária. Na tentativa de evitar que tal tragédia planetária venha se concretizar, pondo em risco a própria existência da espécie humana, a EEBA vem fazendo a sua parte, realizando o projeto Escola Sustentável, com as temáticas, energia elétrica e água.


Depois de realizada as visitas as ETAI e ETA II, Morro dos Conventos e Lagoa da Serra, a coordenação, grupo gestor do projeto e demais professores/as envolvidos/as, estiveram no dia 22 de novembro de 2017, quarta feira, visitando a ETA III, no bairro Alto Feliz. Mais uma vez o grupo foi recepcionado pelo técnico do SAMAE, Gil, que proferiu palestra educativa sobre os ciclos da água, seus riscos de contaminação e escassez. Relatou que no planeta do total de água existente, 0,26% é doce, estando concentrada nos rios, lagos e no subsolo. Entretanto, apenas 0,002 são consideradas potável, própria para o consumo humano.  Informou que água pode ser consumida naturalmente ou tratada.


Devido aos problemas advindos da contaminação, cada vez mais o volume de água sem tratamento disponível vem se tornando escasso. Nesse sentido, são necessários procedimentos químicos e físicos para torná-la potável à população. O município é atendido por cinco estações, as três citadas acima, e outras duas, nos bairros Hercílio Luz e Espigão da Pedra.   A ETA I, do Morro dos Conventos, trata 33 litros de água por segundo. O líquido é captado no manancial lago do bicho ou lago dourado, que possui 40 hectares de área ocupada pela água. Todo líquido tratado atende exclusivamente à população do próprio bairro e comunidades do entorno.


A ETA II, construída no manancial lago da serra, contendo área de abrangência de 110 hectares, fornece água também para o município de Baln. Arroio do Silva. A cada segundo são tratados, somente para atender a demanda de Araranguá, 95 litros são tratados, que corresponde a 40% da demanda total do município. Já a ETA III, no Açude Belinzoni, embora a área ocupada seja menor que a do Lago da Serra, o volume de água tratada é de 55 litros por segundo, correspondendo 60% do total distribuído à população. Diferente das duas ETAs anteriores, a estação III, o custo pelo beneficiamento da água é relativamente menor que a da lagoa da serra e lago dourado, pelo fato de ser de boa qualidade. A pouca presença de impurezas, evita o adicionamento de substâncias químicas como o alumínio para a separação de partículas pesadas.


A existência de densa vegetação ciliar no entorno do lago despertou a atenção do grupo. O assunto rendeu discussões e reflexões sobre a importância das florestas na regulação dos lençóis freáticos e contenção das partículas que tendem a se deslocar para o leito dos mananciais durante as chuvas. Os/as professores/as que acompanhavam o grupo alertaram sobre os reflexos dos desmatamentos e queimadas para a regulação dos mananciais. Tais atividades depredadoras vêm se replicando no município, fazendo desaparecer os poucos remanescentes de mata atlântica no entorno dos lagos da serra e do caverá. São exatamente nesses pontos frágeis, onde estão as nascentes, que ocorrem as ações criminosas das queimadas.


Já se observa na região, estado e no Brasil como um todo a visível redução do fluxo de chuvas necessárias para a reposição dos aqüíferos e lençóis freáticos. Esse fenômeno climático adverso, que a cada ano seu ciclo se torna mais longo parece não despertar a sensibilidade das autoridades quanto aos cuidados com o planeta e os reservatórios de água doce. O caso da lagoa do caverá é um exemplo ilustrativo. A mesma está secando literalmente. Para ilustrar os reais riscos à humanidade aos reduzidos cuidados com a água, o palestrante exibiu documentário, onde faz menção a uma carta escrita em 2070, descrevendo as debilidades enfrentadas pela humanidade devido à falta de água. O ritmo de degradação hoje enfrentado pelo planeta vem demonstrando que tais debilidades poderão ocorrer muito antes da data destacada no documentário.


Dentre as medidas que os municípios deverão adotar para reverter tais ameaças estão: a preservação das mananciais e aqüíferos é o cumprimento dos planos de saneamento básico. A instalação de sistemas de coleta e tratamento do esgoto é uma das ações do plano. Hoje 97% das residências do município de Araranguá utilizam fossas sépticas. Para reverter o problema da contaminação e riscos à saúde, duas usinas de tratamento foram edificadas, uma nas imediações da Câmara de Vereadores, que atenderá 15,4 mil habitantes e, a segunda, no Parque Alvorada, que tratará esgotos produzidos por 15,2 mil pessoas. 
Segundo o técnico do SAMAE, o mesmo informou que o sistema de tratamento irá retirar 90% da sujeira da água, permitindo sua dispersão na natureza sem riscos ao ambiente. O problema, porém, segundo ele, é quanto aos destinos dos resíduos ou do lodo recolhidos. Informou que o lodo será secado e descartado. A expectativa é que os procedimentos no manuseio do esgotamento não se assemelhem ao do tratamento da água na lagoa da serra e lago dourado, cujo lodo contendo partículas de alumínio é despejado outra vez ao manancial.

Prof. Jairo Cezar














terça-feira, 21 de novembro de 2017

BRASIL: A NAÇÃO QUE OPRIMIDOS RECORREM AOS OPRESSORES PARA  SEREM GUIADOS

Quem acompanha os desdobramentos da política nacional e seus efeitos no campo das organizações e relações sociais, observa que o Brasil vem se cristalizando dias após dia com práticas comportamentais repressores semelhantes aos regimes opressores europeus das décadas de 1930 e 1940. É sabido também que o afloramento maior ou menor desses ciclos de instabilidade comportamentais e suas inserções nas camadas sociais, têm relação com a falta de transparência e corrupção generalizada nas instâncias dos poderes. A violenta guinada à direita nos últimos anos coloca o Brasil em alerta vermelho, sob risco eminente de vir a se repetir o nefasto e trágico regime opressor do militarismo entre os anos 1964 a 1980.
A total descrença da população acerca aos partidos políticos; o crescimento exacerbado da violência; o desrespeito à constituição; à desmoralização da política e políticos, tudo isso faz assombrar a incerteza quanto ao futuro, inclinando ou polarizando as disputas das eleições de 2018 para nomes e partidos que verbalizam discursos populistas ou ultra-reacionários. E a história tem registros documentados de episódios recentes que resultaram em décadas de opressão e violação aos direitos humanos. Isso não significa que o Brasil esteja hoje imune a tais atrocidades protagonizadas pelo “Estado Democrático”. As próprias reformas estruturais, trabalhista, previdenciária, em curso, deixam vácuos perigosos para o aprofundamento das violações e injustiças sociais.
A chacina nas periferias das grandes cidades, o assassinato de índios e trabalhadores sem terra; o feminicídeo; o racismo; a homofobia são consideradas violações aos direitos humanos naturalizadas no Brasil. Ao mesmo tempo em que se descumprem abertamente os princípios contidos na declaração dos direitos humanos, os políticos, na sua maioria, repetem como papagaio o mesmo discurso quando questionado: “é necessário consolidar os preceitos da república e da democracia”.  Que república, que democracia, quando 80% da população brasileira ou acima disso são consideradas analfabetas funcionais, que pouco consegue escrever e interpretar um pequeno parágrafo.
São essas mesmas pessoas e outras tantas que vem declarando voto à Lula e a Bolsonáro, nas eleições do próximo ano. O que esperar do futuro quando ventos ameaçadores seguem em direção contrária, trazendo riscos de vir germinar governos populistas e totalitários. Atacar à criminalidade, à corrupção, com legislações mais severas e edificação de novos presídios não está evitando que o Brasil mantenha-se no topo dos mais violentos. Quando uma sociedade se sente acuada, desprotegida, desperta no imaginário coletivo o desesperado apelo por proteção.
São nesses cenários turbulentos que brotam das profundezas do nosso cérebro a necessidade de uma “messias”, um líder, cujo discurso e promessa, consegue atrair os olhares e as esperanças de parcela significativa da sociedade marginalizada. Propostas como liberação do porte de armas, redução da idade penal, criminalização do aborto, cura guei, escola sem partido, etc, etc, são típicas aberrações que atraem mais e mais atenções do desatento e desassistido eleitorado brasileiro.
Isso mostra que o Brasil não amadureceu nas suas instituições, que tais cenários ameaçadores são reflexos da decadência do sistema educacional público brasileiro. O educador Paulo Freire, atualmente quase esquecido nos espaços acadêmicos e instituições públicas de ensino básico, todas as obras que escreveu trazem extraordinários ensinamentos e inspirações sobre humanidade e o combate a alienação social.  No entanto, os governos que se sucederam ao período pós-ditadura sempre agiram na tentativa de negligenciar suas idéias, teorias, concepções, distorcendo ou inviabilizando o afloramento de qualquer projeto alternativo de educação popular.
O quadro político atual é tão previsível e ameaçador, que forças ultraconservadoras tentam a todo custo criminalizar Paulo Freire e todo o seu legado deixado.  Usam as mídias sociais para replicar conceitos errôneos e até mesmo criminosos acerca da sua rica trajetória política e educacional. A tentativa é enquadrá-lo como personalidade não grata pelos brasileiros, por ter tido no passado ligações com idéias ou teorias revolucionárias que se confrontavam com o conservadorismo retrógrado das elites dominantes. Para uma população semi-analfabeta, que sofre todo o tipo de opressão, expressões descontextualizadas e insistentemente repetidas vão se cristalizando no imaginário social coletivo, ao ponto de se tornar verdades absolutas. Há de concordar que países que menos investem em educação e cultura são mais suscetíveis a golpes de estado e a regimes opressores.    
Mesmo aqueles regidos por governos ditos democráticos, prevalecem o domínio político das castas, dos caudilhos e das oligarquias. No entanto, para assegurar a estabilidade ou status quo institucional desses distintos sistemas, se faz necessário a cooptação do quadro intelectual das classes subalternas, que irão compor os principais postos de decisão do Estado. E por que razão? A resposta, portanto, não é tão simplista como se imagina. As ciências do comportamento, como a psicologia, neurociência, podem contribuir para responder tais questões complexas relativas à psique humana. Por estar inserido em uma cultura historicamente moldada entre dois seguimentos repressores convergentes, Estado e igreja católica, há de se convir que substâncias de um e de outro se amalgamariam no cérebro humano e permaneceriam latentes e atuantes por muitas gerações.  
Por ser uma cultura patriarcal, a mulher se condicionou a condição de subalterna em relação ao sexo oposto, tanto profissionalmente quanto nos espaços de decisão política. Muitas vezes essa condição de desigualdade e de submissão se manifesta de forma inconsciente, quase natural. E as tais hierarquizações não se dão apenas no campo sexual, homem e mulher, são observadas também nas relações professor/aluno, pai/filho, patrão/empregado.   
A escolha de lideranças ou governos mais liberais ou repressores são reflexos do modo como as sociedades foram construídas. Desconstruir conceitos e concepções sobre o modo de ver, pensar, sentir o mundo, dura décadas, até mesmo gerações. Que sirva de alerta às atuais gerações, as duas décadas recentes e outros momentos longos no passado, marcados por regimes políticos totalitários. Os arquivos e livros de história são nossos aliados para que tais episódios sejam relembrados e jamais repetidos.   Embora com todas as falhas e contradições observadas, a democracia ainda é, teoricamente, a que possibilita as vozes de serem ouvidas.
Como fazer valer ouvir as vozes dos oprimidos num regime dominado por meia dúzia mídias tão poderosas que manipulam informações, corações e mentes?  A única esperança é a revolução na educação pública. Fazer germinar os legados de Paulo Freire, Vigotsk, Gramisc, entre outros, que idealizaram uma escola autônoma, transformadora, trazendo para o seu interior os problemas do dia a dia e contextualizá-los com as estruturas dominantes.  Entender que o espaço escolar é repleto de conflitos e contradições é outro quesito importante para a desalienação social. O ato de ensinar, como ensinar e para que ensinar deve ser entendido como ato verdadeiramente político, de construção de possibilidades, de avanços e rupturas das forças opressivas que dominam e os mantém presos na caverna escura do desconhecido.   
Prof. Jairo Cezar                                       


sexta-feira, 17 de novembro de 2017

V COLÓQUIO INTERNACIONAL “A EDUCAÇÃO PELAS IMAGENS E SUAS GEOGRAFIAS” E XVII SIMPÓSIO DE GEOGRAFIA DA UDESC


A geografia como ciência dos espaços e suas diversidades, nos últimos tempos vem redirecionando seu olhar nos movimentos e tensões sociais globais, compreendendo que  imagens e fronteiras são instrumentos de poder, muito além das estéticas e limites territoriais. Foram esses e outros diversos assuntos debatidos durante os quatro dias no V Colóquio Internacional e XVII SIMGEO, realizado nas dependências da UDESC – Florianópolis, entre os dias 06 a 09 de novembro de 2017. Entre os temas geradores discutidos nas mesas redondas tiveram destaques: território de poder nas imagens; cartografias (in)possíveis I e II; invenções entre cinema, educação e geografia. No encontro, professores/as, estudantes e pesquisadores/as, brasileiros/as e estrangeiros/as, tiveram oportunidades para apresentar seus trabalhos investigativos, que totalizaram 113.


A participação da EEBA de Araranguá no V Colóquio Internacional de Geografia mostrou que embora existam infinitas barreiras (fronteiras) que se erguem no entorno e interior das escolas públicas, ela se fez presente provando que na rede estadual de ensino catarinense também se faz pesquisa com qualidade. Por ser o evento de caráter internacional e com vagas limitadas, era previsível que houvesse um elevado número de inscrições de trabalhos. O projeto encaminhado à comissão do colóquio  “Práticas Simples para a Contenção dos Desperdícios de Energia Elétrica e Água na EEBA” foi selecionado entre os 112 escolhidos pela comissão organizadora. Embora a temática norteadora do encontro fosse Educação Pelas Imagens e Suas Geografias, a comissão organizadora se mostrou atraída pelo tema encaminhado por considerá-lo relevante no processo educacional.


 As oficinas se constituíram também em instantes relevantes no encontro, pois oportunizaram aos participantes contatos com assuntos e metodologias pouco difundidas no cotidiano das escolas do ensino básico. Entre as novidades os destaques foram o emprego de imagens para a interpretação do espaço geográfico; imagens e geografias descolonias; realidades do lugar-escola que trazem para os filme? cidade em movimento: poéticas do corpo e mapas sensoriais na composição de geografias menores; uma partida de futebol – globalização e o ensino de geografia.
Não havendo possibilidades de se inscrever em mais de uma oficina, todos/as tiveram que optar à oficina que mais se ajustava ao tema de interesse. As novas tecnologias como Smarts Phones, computadores, notbooks, tablets, etc, por já fazerem parte do cotidiano das escolas, a escolha da oficina “que realidade do lugar-escola traz pro filme”, foi opção para 15 congressistas, cujos trabalhos apresentados foram mediados pelo Prof. Dr. Wenceslau Machado de Oliveira Júnior, da Unicamp, Campinas. 




Todos/as que estavam na sala da UDESC para participarem das oficinas mostravam-se um tanto ansiosos/as  acerca do modo como se desdobraria os trabalhos. O professor Wenceslau, no primeiro momento distribuiu folha de papel A4, pedindo que desenhassem ou escrevesse algo que tivesse marcado suas vidas na UDESC. Concluída essa etapa, foram formados grupos com 4 ou 5 membros, cada qual teria que elaborar um roteiro das impressões obtidas na universidade, que posteriormente resultaria em um pequeno filme. Para quem jamais vivenciou tal experiência, o momento foi ao mesmo tempo angustiante e desafiador. Como montar roteiro diante de pessoas recém conhecidas e com impressões distintas da instituição de ensino (Udesc)? 
Depois de intensas e quase intermináveis discussões, finalmente o grupo chegou ao um consenso descrevendo como seria o roteiro do pequeno filme. Cerca de 30 minutos depois, os grupos estavam novamente reunidos para a exibição dos curtas. Quem pensou que haveria a distribuição de equipamentos aos grupos para a produção dos filmes, se enganou.  Cada um  utilizou seu próprio Smart Phone e nada mais. É claro que houve trabalhos mais bem elaborados que outros pelo fato de haver no grupo indivíduos com habilidades no uso dos equipamentos.


O objetivo da oficina foi mostrar que é possível revolucionar o espaço escolar utilizando equipamentos como o celular utilizados por quase todos/as os/as estudantes. Outro aspecto observado no trabalho foi perceber que o imaginário dos indivíduos está contagiado por percepções hollywoodianas de mundo, ou seja, por produções cinematográficas previsíveis, pouco impactantes intelectualmente, de fácil compreensão e com finais sempre felizes. Os roteiros geralmente não refletem o cotidiano conturbado e contraditório de sociedades marginais, afetadas pela fome, medo e instabilidades emocionais.   Quando os filmes foram exibidos, o professor incitou o publico a distinguir os aspectos objetivos e subjetivos apresentado por cada roteirista. Inserir múltiplas paisagens, efeitos visuais e sonoros são importantes na montagem do roteiro. Não havendo possibilidades de inserções de ambos aspectos no roteiro, somente a imagem pode resultar em excelente trabalho.     
A aplicação dessas ferramentas e metodologias em sala de aula pode proporcionar relevantes resultados no processo educativo, indo muito além do currículo formalizado. Sobre a temática imagem em sala de aula, uma professora da Universitária Federal de Dourados, Mato Grosso do Sul, apresentou trabalho de uma de suas orientandas, com o seguinte tema: o Ensino da Geografia e Cinema: Uma Análise a Partir das Concepções e Práticas dos Professores de Geografia da Rede Pública Estadual de Dourados/MS. A proposta da pesquisa se baseou na observação dos critérios e comportamentos dos/as professores/as de geografia durante a escolha e exibição dos filmes nas aulas.
A pesquisa teve como objeto motivador a lei n. 13.006/2014 na qual estabelece a obrigatoriedade das escolas exibirem duas horas de filmes nacionais mensais como complemento do referencial teórico curricular complementar. Dentre os vários gêneros exibidos pelos/as professores/as, o que ficou em primeiro lugar foram os documentários, com 16%, em segundo ficou gênero drama, com 13%; em terceiro guerra, com 12%. O que despertou a atenção na pesquisa foi quanto ao roteiro de filmes selecionados pelos professores, na sua grande maioria escolhiam produções já exibida pela rede globo de televisão.
Portanto, vê-se nesse processo o papel instigador dos meios de comunicação de massa (TV) na indicação dos títulos.  As produções de maior preferência em sala de aula foram: O Auto da Compadecida; Morte e Vida Severina; Central do Brasil e O Quatrilho, etc. A exibição de filmes nacionais, portanto, não faz parte do cotidiano das escolas brasileiras como recomenda a legislação vigente.  As sessões ainda se transcorrem esporadicamente, seguindo critérios de necessidade, vinculados a trabalhos ou conteúdos curriculares específicos.




Nas duas palestras de abertura do V colóquio, cujo tema foi Territórios e Poder Nas Imagens, o professor Wenceslau Machado trabalhou a ideia das imagens postadas nas redes sociais, jornais, revistas e livros didáticos, definindo-as como instrumento de poder e dominação social. Expôs figuras que ilustram  capas dos livros didáticos de geografia distribuídos nas escolas dos países periféricos, contendo desenhos de índios, negros e aspectos da geografia. Que tais critérios de escolhas das mesmas são políticos, com pretensões de fazer as pessoas aceitarem ou naturalizarem as adversidades econômicas e sociais. Em momento algum ou com raras exceções, o/a professor/a, diante dessas imagens, fará qualquer reflexão mais apurada, interpretando-as como algo em movimento, dinâmico.




Na realidade a fotografia mostrada tenderá reduzir ao máximo a percepção do espaço. Qualquer questionamento será feito à imagem, na tentativa de saber quem a fez, como e por que. A intenção será minimizar a possibilidade do expectador de poder penetrar o mais profundo possível na imagem, compreendê-la a partir das experiências de que as tirou, seu contexto ético e político.  São  comuns nos livros didáticos de geografia que retratam países desenvolvidos, imagens de cidades iluminadas, campos agrícolas informatizados e outras tantas benfeitorias.  Questões como miséria, pobreza, favelas, etc são omitidos. Agora quando o intuito e descrever os países periféricos ou subdesenvolvidos, que imagens geralmente ilustram as capas e páginas? Qual o sentido ético e político de tudo isso?



Imagens, portanto, podem servir para diferentes fins: fortalecer o sentimento de impotência coletiva ou, que é mais comum, forjar imagens para atrair investimentos ou promover à venda de aportes públicos. Na sequência do tema imagens como instrumento de poder, uma acadêmica de geografia explicitou em seu trabalho, vídeo da cidade de São Paulo que foi roteirizado pelo poder público e exibido para empresários do mundo inteiro em Dubai.  O documentário ostentava  uma cidade frenética, dinâmica, atrativa, multicultural, globalizada, empreendedora e que fazia jus ao apelido de a Locomotiva do Brasil. A propositura do vídeo foi oferecer aos detentores do capital o patrimônio público da cidade como parques, estádios de futebol, marcados públicos, terminais de ônibus, entre outros. O documentário ilustra bem o papel político da imagem, vendar a cidade, tornando invisível aos olhos do mundo a cidade real, das contradições, da violência urbana, do trânsito caótico, das favelas, das enchentes, das drogas, do caos na educação, saúde e segurança pública. Nada disso foi mostrado.


Dois outros trabalhos apontaram exemplos de como a imagem pode ser manipulada para construir desejos e possibilidades. Ambos dissertaram temas distintos, porém convergiam nos seus propósitos, que foram imagens como instrumentos de manifestar desejos. O primeiro trabalho tratou sobre o turismo religioso em Santa Catarina como estratégia de vender a imagem do estado para o restante do país. Destacou na pesquisa a cidade de Nova Trento, que adquiriu nova formatação a partir da canonização e criação do santuário Madre Paulina. Nos sites, folders e outros recursos publicitários sobre a cidade, a imagem em primeiro plano sempre destaca o santuário ou a Santa Paulina. A própria imagem da santa, que evidenciava feição sisuda, séria, os marqueteiros tiveram o cuidado de forjá-la, dando ar sereno, suave, meigo.


O segundo trabalho procurou delinear a cidade de Blumenau pensada para 2050, evidenciando o perigo das imagens no planejamento urbano. Segundo o pesquisador, o projeto protagonizado por empresários da região preconizam uma cidade moderna, futurista e com enormes riscos em apagar definitivamente seu passado, transformando espaços históricos em centros comerciais. Outra pesquisa apresentada foi em relação ao  filme Uruguaio O Banheiro do Papa e as Geografias Possíveis. O tema abordado proporcionou ao público reflexões sobre contextos tão diversos entre dois territórios (Brasil e Uruguai).  Embora ambos estivessem separados por uma fronteira física, alfândega, a respectiva barreira não era suficiente para impedir a movimentação de pessoas de uma lado para o outro, repletas de sonhos, de fé, de superação das dificuldades de uma região esquecida pelo Estado e pelo próprio poder divino.



As fronteiras geralmente são espaços repletos de tensões entre os que transitam de um lado para o outro. Na cidade de Ponta Porã, MS, que faz divisa com Pedro Juan Cabaleiro, cidade Paraguaia, uma professora desenvolveu atividade com estudantes de uma escola no lado brasileiro, onde produziram vídeos sobre fronteiras. Dentre os trabalhos elaborados, o que mais a impressionou foi o vídeo construído no interior do próprio cemitério da cidade. Para os/as protagonistas do roteiro, a justificativa apresentada pela escolha do cemitério como objeto de filmagem foi acreditar que fronteira nem sempre é física, podendo ser também abstrata, subjetiva. O portão ou o muro do cemitério ambos servem como fronteiras entre dois momentos distintos, a vida e a morte.                    
Na cidade de Uberlândia/MG, uma professora que integrou uma das mesas redondas do colóquio de geografia, discorreu todos os passos de um projeto que aplicou no município. A proposta foi trabalhar o mapa da hidrografia de Uberlândia, para além das linhas representadas pelas imagens de rios ou outras paisagens prontas. A observação, o contato e o registro fotográfico dos rios proporcionaram novos pensamentos e reflexões do espaço, que somente as imagens captadas no local poderiam assegurar. A sala de aula, portanto,  tende a ser campo de enfrentamento de resistência às imagens que aprisionam o pensamento, nesse caso os livros didáticos.
Além da imagem fotográfica e mapas, que são impregnadas de intenções objetivadas e subjetivadas, o cinema, como instrumento de representação de cenários, linguagens e sentidos diversos, tem um aporte político e ideológico bem definido por quem os dirige. Contudo, a década de 1960 o cinema clássico, da imagem em movimento quase linear, se vê desafiado diante de um novo estilo de fazer arte, que instiga o público a pensar a si mesmo. O Tema Cinema como linguagem educativa foi mais uma pesquisa apresentada por uma palestrante em mesa redonda no colóquio de geografia. Abordou na sua investigação o cinema do diretor francês Jean-Luc Godard, das rupturas, dos conflitos, da provocação, da perplexidade, dos dramas existenciais que acompanham a humanidade.  Nos filmes Godard se utilizou de recursos simples até mesmo celulares para manipular imagens aqui e agora. Digamos que Godard se tornou o divisor de águas do cinema tradicional, do consensual, para o gênero provocativo.   

          
Enquanto a sétima arte no Brasil vem consagrando diretores internacionalmente, a maioria do público desconhece ou jamais ouviu falar de Patrícia Ferreira Keretxu, cineasta da aldeia Koenju, no Rio Grande do Sul, considerada uma das pessoas mais atuantes nos quadros do vídeo nas aldeias. Sua trajetória de vida e trabalho foi tema de pesquisa debatida em mesa redonda no V Colóquio de Geografia. Seus filmes retratam cenários distintos daqueles mostrados corriqueiramente pelo cinema e mídias tradicionais. Além dos saberes tradicionais e da forte espiritualidade, seus trabalhos são eminentemente políticos, pois cada imagem, movimento e expressão corporal estão embebidos de simbologia e atemporalidade. No caso das aldeias, o trabalho com cinema requer outra dinâmica, pois a relação tempo espaço e linguagem comunicativa são outras.
Algumas reflexões e questionamentos foram manifestados às conferencistas que abordaram a temática cinema como ferramenta educativa. Suas respostas comprovam o distanciamento descomunal envolvendo cinema e ambiente escolar. É necessário revitalizar a educação e o cinema, considerados campos férteis que germinam possibilidades. Cinema, porém, é fazer escolhas, enquanto que a escola, ao contrário, tudo é dado como definitivo, imutável.


 Assistir ou produzir curtas pode ajudar estudantes a compreenderem que nada é estático, que cenários, imagens, falas, etc, são decisões individuais ou coletivas. Quando se assiste filme ou documentário, o roteiro, cenas, falas, etc, são escolhas, são decisões políticas, saturadas de intenções. Congelar cena de um filme e fazer os/as estudantes pensarem, opinando sobre como as fariam, qual o enquadramento, ângulo, etc, é um excelente recurso para levá-los/as a entender que a vida é repleta de possibilidades, que o que é dado, não é imutável, que pode sofrer alterações.    
              Seria preferível, porém impossível, descrever com detalhes os projetos, mesas redondas e oficinas apresentadas nos quatro dias do encontro de geografia da UDESC. Entretanto, a mim me coube escolher o que seria mais significativo e que poderia contribuir decisivamente para mudanças de paradigma no processo de ensino da geografia. Como fora descrito acima, essa decisão também se caracteriza como ato político e ético, forçando-me excluir certas falas e imagens. Não significa que tal decisão tenha proporcionado o empobrecimento dos argumentos e da crítica. Acredito que tal leviandade não tenha ocorrido e o público leitor será testemunha no instante que concluir a leitura do respectivo relatório.
Prof. Jairo Cezar  














          


           

sexta-feira, 3 de novembro de 2017

 A REALIDADE PREOCUPANTE DO ESGOTAMENTO SANITÁRIO NAS MAIORES CIDADES DE SANTA CATARINA E NO RESTANTE DO ESTADO



Córrego que corta a Av. XV de novembro - Araranguá

O DC: Diário Catarinense no dia 18 de outubro de 2017 publicou reportagem mostrando os sérios problemas de esgotamento sanitário nas três maiores cidades de Santa Catarina. Mas tudo o que foi divulgado os catarinenses já estavam “careca de saber”, dentre tantas, que o estado apresenta um dos piores indicadores de saneamento básico nacional. Porém, o que poucos sabiam e que a reportagem procurou explicitar são os percentuais divulgados relativos ao número de residências e indústrias conectadas a rede de esgoto que não condiz com a realidade. De cada 10 residências em Florianópolis, Joinville e Blumenau, 3 apresentam ligações incorretas, ou seja, os esgotos são lançados diretamente nas tubulações pluviais, nos córregos e rios.[1]
Somente Joinville foi detectado 62% de ligações irregulares; Florianópolis, 48,9% e Blumenau, 28%. O que preocupa é quando tais números são acrescidos com os demais percentuais oficiais provenientes dos 40 municípios catarinenses que também tratam seus esgotos, somando 24,77% de tratamento. Imagine dos 295 municípios que compõem todo território, somente 40 tratam seus esgotos. É muito pouco. Menor que a média de cobertura brasileira, que é de 30%. Portanto, no caso catarinense, em especial, é possível que esse percentual seja muito menor que o dado oficial, consideração outras milhares de residências e indústrias que também apresentam alguma irregularidade nas ligações.
Não é temeroso um estado que seguidamente insiste projetar por meio da mídia imagem ostentando uma população feliz, com excelentes indicadores de qualidade vida, onde apenas 40 municípios tratam seus esgotos. Outra contradição é quanto ao número de cidades brasileiras que já desenvolveram seus planos de saneamento básico. Santa Catarina aparece na primeira posição. Das 295 cidades, 235 já estão com seus planos aprovados. Mesmo assim, o estado aparece em 18 no ranking nacional em número de residências cobertas com redes de tratamento de esgoto. Ficando atrás até do Maranhão, como se sabe, é um dos mais problemáticos socialmente em comparação aos demais.
A lei n. 11.445/07 que disserta sobre políticas de saneamento básico nos municípios, estipulou para o dia 31 de dezembro de 2017 o prazo final para que os mais de 5 mil municípios brasileiros finalizem seus planos. O fato é que a elaboração do plano pode até ser possível de ser finalizado dentro dos prazos, o problema é o cumprimento de todas as metas estabelecidas, que segundo muitos gestores públicos, estão sendo inviabilizado por limitações financeiras. O plano de saneamento básico não trata exclusivamente da coleta e tratamento de esgotos, inclui também outras demandas como garantia do acesso de água potável à população, sistema de coleta e reciclagem de lixo, etc.
É claro que muitas das justificativas apresentadas são desculpas inconsistentes, pois inúmeras metas poderiam ser executadas com o mínimo de recursos, basta apenas vontade política. A coleta seletiva e o destino adequado dos resíduos sólidos são ações contidas no plano, onde todos os municípios brasileiros poderiam estar executando. É possível contar nos dedos aqueles que vêm desenvolvendo o programa há algum tempo. Seria função do gestor público, do órgão ambiental municipal, demais secretarias e outros seguimentos sociais, mobilizar a população e instruí-la acerca dos procedimentos que devem ser adotados nesse programa.
O município de Araranguá em 2014 teve seu plano de saneamento básico homologado pelo poder executivo. Nos três anos que se seguiram a aprovação do plano foi concluída as obras dos dois sistemas de tratamento de esgotos, que estão agora em testes para fazer funcionar definitivamente. É bom que se diga que já foram desperdiçados milhares de reais dos contribuintes no projeto inicial por falhas no projeto de engenharia. Lembram das tubulações e demais equipamentos que estavam afundando no bairro Vila São José?
O que deve merecer atenção de todos/as são as legislações em vigor que impede aos proprietários de residências e empresas lançarem seus esgotos nas tubulações pluviais, córregos e rios. Se a rede de canais onde escorrerá o esgoto até as duas usinas de tratamento estão concluídas, é sabido, teoricamente, que cada residência ou empresa já tenham seus sistemas conectados à rede, bastando apenas autorização do órgão gestor, nesse caso o SAMAE. Na fala do diretor do SAMAE à uma emissora de rádio do município, informou que caberá ao proprietário contratar um pedreiro para providenciar a instalação dos tubos que se conecte à rede externa.
O que intriga é quanto ao imenso odor de esgoto exalado pelas bocas de lobos em alguns pontos no centro da cidade. É de se prevê quem o intenso mau cheiro se deve ao lançamento de esgotos irregularmente nas tubulações pluviais, que por sua vez escorrem até os córregos que cortam toda a cidade. O procedimento seria simples para coibir tais infrações, bastaria fiscalizar quem está agindo ilegalmente, propondo-a, para não incorrer em penalidades legais, que conecte imediatamente à rede de tratamento de esgoto, não é mesmo? E por que tal fiscalização não é realizada?  
De acordo com informações repassadas pelo Instituto Trata Brasil, no Brasil atualmente somente 1.692 dos 5.570 municípios elaboraram seus planos de saneamento básico. Isso representa 30,4 % apenas. O problema é que o prazo estabelecido espira em dezembro de 2017. Os municípios que não tiverem seus projetos concluídos serão advertidos e penalizados com o não recebimento de recursos federais. É um problema extremamente sério porque mais de 80% dos pequenos municípios não possuem sequer um profissional da engenharia para orientar na elaboração do plano. 


Esgoto que escorre para o rio Araranguá - Próximo a rodoviária

O protocolo assinado pelo Brasil estabelece que até 2033 os serviços abastecimento de água e saneamento básico sejam universalizados, ou seja, nenhum município poderá estar excluído. Tudo indica que o prazo agendado dificilmente será cumprido. E os motivos são diversos, dentre eles, a inoperância administrativa dos governos municipais, estaduais e federal.  É importante reafirmar que a cada 1 real investido em saneamento básico, são economizados outros quatro reais em doenças. Porém, esses números estão longe de sensibilizar governantes das três instâncias de poder, que não enxergam o saneamento básico como prioridade de gestão, contrariando, no entanto, as promessas de campanha, que insistem em afirmar como sendo prioridade das prioridades.
Geralmente, com raras exceções, o modo de governar dos gestores públicos é eminentemente política, ou seja, administra visando unicamente reeleger-se ou assegurar a permanência do partido ou candidato situacionista à frente do comando na eleição seguinte. Volta e meia é possível ouvir frases do tipo “enterrar cano não dá votos”. Embora muitos desprezem tal discurso, declarando-o como ultrapassado, na prática é o que milhares de políticos de pequenos e médios municípios brasileiros pensam. É só verificar o vergonhoso número de municípios que possuem planos de saneamento básico. São somente 30,4% ao todo. Esse percentual, é bom que se diga, não inclui sistemas de tratamento, que possivelmente reduziria pela metade.
O que é imperdoável é um município do tamanho de Araranguá, com quase trezentos anos e aproximando os 70 mil habitantes, não ter sequer uma cooperativa de reciclagem de lixo sólido. E olha que o plano estabelece obrigatoriedade do município oferecer tal serviço aos cidadãos. Outras leis e resoluções elaboradas em gestões passadas ratificam ainda mais a obrigatoriedade do município de desenvolver políticas de coleta, reciclagem e educação ambiental.[2] Nada foi efetivado ainda. Todo o lixo produzido pela população, parte é recolhido pelo município, outra parte por empresa terceirizada, que tem como destino aterro sanitário localizado no município de Içara, cerca de 40 km de Araranguá. 
 Se o plano de coleta e separação estivesse funcionando, o custo dos serviços hoje oferecidos seria reduzido quase pela metade, além, é claro, de assegurar trabalho e renda para centenas pessoas. Atualmente, cerca de uma dezena de pessoas sobrevivem coletando e separando resíduos no município, que depois são transportados para cooperativas em Criciúma. Portanto, o município de Araranguá continua engatinhando quando o assunto é saneamento básico, atrás até de municípios de menor população e arrecadação no vale como Sombrio, Praia Grande, Maracajá, que são bem atuantes nesse seguimento.
Tanto o órgão ambiental municipal (FAMA) como a própria secretaria municipal de educação, de acordo com seus estatutos e planos municipais, tem o compromisso de promover educação ambiental aos estudantes e a comunidade em geral. A única ação efetiva no município nesse setor é a semana municipal do meio ambiente, na primeira semana de junho. Isso porque foi sancionada legislação pelo legislativo municipal em 2013. Fora isso, algumas atividades isoladas são desenvolvidas por escolas ou organizações ambientais, porém, muito específicos, não contemplando todas as redes de ensino e a comunidade.
É sabido de todos que a coleta de lixo da orla do município, bem como das margens do leito do rio são ações paliativas, porque não interfere nos principais vetores da degradação. Por outro lado, recolher garrafas pet, latas e dezenas de produtos descartáveis são necessárias porque ambos trazem danos ambientais.  Porém, nada se compara as toneladas de esgotos domésticos e industriais que escorrem diariamente para o rio Araranguá. São poucas as pessoas que disponibilizariam do seu sagrado final de semana para rastrear as demandas ambientais do município, que são muitas. Fazendo um tour pelo principal córrego que corta a cidade é de assustar a quantidade de esgoto escorrendo pelo seu leito. É de se prever que existam centenas, milhares de domicílios cujas fossas estejam conectadas as tubulações pluviais. 
Em entrevista a uma rádio do município de Araranguá, o diretor do SAMAE fez alguns esclarecimentos à população acerca das duas subestações de tratamento de esgoto que já estão concluídas e que ambas serão inauguradas dia primeiro de novembro de 2017. Informou que todo o processo desde a elaboração do projeto à construção das estruturas teve início em 2008, que houve falhas de engenharia no projeto inicial, porém, que os erros foram reparados. Contudo, outro terreno foi adquirido no Parque Alvorada, cuja estação foi refeita e já está concluída. O custo total das duas estações foram orçados em 17 milhões de reais e que o SAMAE vem  pagando parcelas mensais de 80 mil reais.
Foi claro em afirmar que atualmente muitas casas despejam seus esgotos na fossa pluvial, que vai para o rio contaminando as lagoas que abastecem a população. Informou também que as pessoas que possuem rede de esgoto passando na frente de suas casas providenciem a contratação de um pedreiro para providenciar a instalação de tubulação que levará o esgoto direto rede de coleta. Deixou claro que o sistema recolherá apenas esgoto do banheiro, excetuando os demais resíduos como industrial, postos de gasolina, etc. Quanto à cobrança pelos serviços, disse que até o final do ano os cidadãos estarão isentos de taxas adicionais. Com a rede de tratamento pronta, os impactos à população serão extremamente positivos, disse o diretor do SAMAE. De cada 1 real gasto com esgoto, se economizará 3 a 4 reais com saúde.
A proposta da autarquia agora é estender a rede para o restante do município, é só ter recurso em caixa, disse. Os dois sistemas cobrirão cerca de 30% do município, restando outros 70% que terão um custo aproximado de 50 milhões de reais. Que já existe o projeto pronto para o restante da cidade, que agora o desafio é buscar recursos. Citou na sua fala os Balneários Morro dos Conventos, Paiquerê e Ilhas que deverão também ter suas estações de tratamento. Que o motivo pelo qual o Paiquerê foi embargado foi pelo fato da inexistência de tratamento do esgoto. Concorda que o lençol freático do Morro dos Conventos é extremamente superficial, que o risco de contaminação é muito grande. Que sua intenção é construir a usina com urgência, porque “daqui a pouco o mar estará impróprio para banho”.[3]
Sugeriu como proposta de usinas para os balneários, às compactas, com custo de engenharia mais acessível, equivalente a um ou dois milhões de reais. Foi categórico em reafirmar que o SAMAE atualmente não ter recursos em caixa. No entanto, assegurou que nos próximos 1, 2 ou três anos, quem sabe, se poderá concluir o restante do município. A revista W3, em sua publicação semanal, trouxe no dia 11 de julho de 2017, reportagem com a seguinte manchete “SAMAE já testa estações de tratamento de esgoto em Araranguá. No final da reportagem, o diretor do órgão fez o seguinte comentário relativo ao sistema de esgotamento sanitário no município: “em muitos locais ainda há esgoto a céu aberto, o que ocasiona problemas de saúde, principalmente em crianças e idosos, por estarem mais suscetíveis a doenças. Além disso: "causa grande dano ao Meio Ambiente, onde os dejetos do esgoto vão parar no lençol freático contaminando o solo e a água”.  Para finalizar, confessou o diretor que: “quando a população tem acesso a água tratada, coleta e tratamento dos esgotos, elas têm uma melhoria da qualidade de vida e é para isso que estamos trabalhando”.      

Prof. Jairo Cezar  
     






[1] clicrbs.com.br/sc/estilo-de-vida/noticia/2017/09/apesar-de-ter-o-maior-percentual-de-cidades-com-planos-de-saneamento-sc-falha-na-coleta-de-esgoto-9887025.html

[2] http://morrodosconventos-jairo.blogspot.com.br/2017/03/as-precarias-politicas-de.html
[3] https://www.revistaw3.com.br/geral/2017/09/11/samae-ja-testa-estacoes-de-tratamento-de-esgoto-em-ararangua.html