quarta-feira, 22 de novembro de 2023

 

ENXURRADAS DEVASTASTADORAS NO SUL DO BRASIL, O QUE ESTÁ ACONTECENDO REALMENTE COM O TEMPO?

https://portallitoralsul.com.br/tornado-foi-registrado-em-balneario-gaivota-e-sombrio-diz-nota-da-defesa-civil/


Desde 2008 quando instalei um pluviômetro no quintal da minha casa venho acompanhando atentamente o comportamento do tempo na região, no estado, no país e no resto do planeta. Nesse período de quinze anos, o estado de Santa Catarina, com destaque o extremo sul, ambos foram afetados por episódios extremos do clima, como estiagens prolongadas, enxurradas, ciclones, tornados, com perdas de vidas humanas e prejuízos milionários à economia. Nesse intervalo de quinze anos todas as COPs (Encontro das partes sobre o Clima), com destaque a de Paris, em 2015, todas, sem exceção, traziam relatos preocupantes de que o clima global estava aquecendo em graus assustadores.

Em todas as conferências inúmeras proposições foram elencadas e assinadas por quase todos os países membros, cujo propósito era fazer com que o planeta não atingisse o nível extremo de aquecimento, nível que já é classificado hoje como fervura global. O que é mais insano nisso tudo é que existem pessoas e até mesmo integrantes de organizações respeitadas em climatologia que ousam justificar as anomalias do tempo como sendo naturais e não antrópicas, ou seja, intervenção humana.

Volto a repetir, o calor escaldante, acompanhado por incêndios generalizados e intermináveis no último verão do hemisfério norte foi o primeiro sinal de alerta que o planeta estava chegando ao limite de saturação climática, que a partir desse momento para a frente o destino da humanidade seria o abismo.  Não deu outra. Tudo o que aconteceu no hemisfério norte, ondas de calor escaldantes, enxurradas, estiagens, tempestades e mortes, têm se repetindo agora na mesma proporção ou até mesmo em escala superior, no hemisfério sul, com destaque o território brasileiro. E olha que estamos ainda na primavera.

Desde o ano passado os especialistas do tempo alertavam que o fenômeno climático El Niño viria com mais força que das vezes passadas. Também, os meteorologistas admitiam que o clima no planeta ficaria ainda mais bagunçado, pelo fato de a terra estar com 1,2° ou 1,3° graus em média mais quentes que o normal. Esses são os ingredientes necessários para turbinar as nuvens na parte sul da America do sul, resultando em chuvas, com volumes assustadores superando marcas históricas de cinco, seis, sete ou mais décadas.

Recentemente o jornal O Globo publicou no seu diário entrevista realizada com a professora Regina Rodrigues, do curso de Oceonografia e Clima, da UFSC. A professora, na sua pesquisa sobre as anomalias climáticas no sul do Brasil concluiu que as águas do atlântico sul, nos trópicos, estão muito mais quentes que o normal, 1,6°, sendo esse um dos indicadores da quantidade de episódios extremos do tempo registrados.  Disse também que a cada segundo o oceano está retendo calor equivalente a cinco bombas atômicas semelhantes a que foi lançada em Hiroshima. Essas ondas de calor extremos, no oceano, afetam toda a biótica marinha, diminuindo a pesca em decorrência da destruição dos recifes de corais, considerados berçários naturais para a reprodução e fornecimento de alimentos.

Relatou também que o número de ciclones ocorridos permanece o mesmo que de tempos atrás, porém, atualmente são mais rápidos e violentos. Sabe que os ciclones extratropicais ocorrem em quilômetros do oceano adentro, que quando chegam à costa estão mais fracos causando poucos problemas. O que vem acontecendo agora é muito estranho, cada vez mais os ciclones estão se formando próximo a costa e com graus de destruição muito maior. Sobre as ondas ou tsunamis meteorológicos que causaram destruição em muitas praias da costa brasileira, a professora procurou desmistificar esse enigma. Disse ela que o que aconteceu de fato foram tempestades a quilômetros de oceano adentro, formando, portanto, “trem de ondas”, traduzidas equivocadamente de Tsunamis meteorológicas.

Foi perguntado à professora se tudo o que está acontecendo no clima do planeta lhe tem causado surpresas. Afirmou que há décadas vinha se prevendo tais mudanças na estrutura climática do planeta, porém, o que lhe assusta é a velocidade como tudo está acontecendo. No final da entrevista foi perguntado sobre o El Niño e a La Niña, se ambos estão realmente influenciando o clima no planeta.   Disse que o que está acontecendo com o clima não é natural, que existem outros fatores além dos dois fenômenos. Quanto ao El Niño, afirmou que é possível a ocorrência de La Niña intercalada com o El Niño, e isso não ocorria antes. Isso quer dizer que pode acontecer, no sul do Brasil, episódios de estiagens prolongadas durante o El Niño.  

Ainda há quem duvida que tudo que está acontecendo com o clima global não tem relação com o modo como o ser humano vem agindo com o planeta, despejando todos os dias toneladas e mais toneladas de gases do efeito estufa. Os desmatamentos, a agricultura predatória que se utiliza de insumos artificiais e agrotóxicos altamente letais à vida no solo, são sem dúvidas os vilões desse desequilíbrio global. Hoje em dia muitos tentam refutar tal afirmação alegando que sem a adoção desse modelo produtivo não haveria como alimentar quase nove bilhões de pessoas no planeta.

Entretanto a realidade é outra. O segmento ligado à agricultura convencional se fundamenta no cultivo de monoculturas, ou seja, de algumas culturas específicas, como soja, algodão, cana de açúcar, milho, das quais ocupam extensos latifúndios. Quase tudo que é produzido, os grãos, por exemplo, são exportados in natura, sendo, portanto, beneficiados posteriormente e transformados em rações para alimentar vacas, porcos, aves, etc. A cana de açúcar, outro produto presente em extensos latifúndios no Brasil, pare dela vai ser esmagada para virar álcool para abastecer veículos automotores. Somando tudo isso, que compõe o poderoso agronegócio, ambas as culturas representam pouco mais de 20% dos alimentos que suprem a demanda da população brasileira.

O fato é que, quem realmente mata a fome dos brasileiros são os agricultores familiares, que conseguem diante de tantas dificuldades colher o feijão, o aipim, a batata doce e outras tantas variedades de hortaliças e leguminosas que diariamente estão nas feiras, pequenos supermercados e mercearias em todos os municípios brasileiros. Devem ser citados também nesse segmento os produtores agroecológicos, orgânicos, que lhes recai mais dificuldade ainda para produzir e comercializar seus alimentos isentos de componentes químicos e agrotóxicos.

Quando se vai ao mercado ou a uma feira e se adquire um produto da agroecologia, um pé de alface, cenouras, repolho, etc, sabe que está levando para casa alimentos ricos em nutrientes e que asseguram o equilíbrio de biomas . Poucos sabem que uns dos maiores vilões do efeito estufa são os insumos químicos, despejados aos turbilhões todos os dias nos solos de todo o planeta, tornando-os pobres em vida.  Repensar o modelo produtivo vigente baseado na química e que suprime florestas é uma das certezas que poderemos estar aqui por mais tempo. Se não for levado a sírio todos os sinais emitidos pelo planeta, como as ondas de calor extremo, enxurradas devastadoras, estiagens históricas, etc, as únicas espécies que tenderão resistir à hecatombe climática serão as baratas e pequenos animais que se alojarão no subsolo.

Prof. Jairo Cesa                   

sexta-feira, 17 de novembro de 2023

 

COPAVI (COOPERATIVA DE PRODUÇÃO AGROPECUÁRIA VITÓRIA) PARANACITY/PR – UMA EXPERIÊNCIA DE ORGANIZAÇÃO PAUTADA NA ÓTICA SOCIALISTA



No sábado, 04 de novembro de 2023, durante o período da tarde um grupo de 35 pessoas que participavam do encontro ampliado da Rede ECOVIDA, em Maringá/PR, foram conhecer a COPAVI, cooperativa de um assentamento do MST, na cidade de Paranácity, distante uma hora de Maringá. A visita a cooperativa proporcionou aos visitantes profundas reflexões acerca da possibilidade de solucionar o problema da fome da humanidade adotando praticas coletivas e sustentáveis de manejo do solo e de outras atividades. Antes de discorrer mais sobre a incrível sensação de passar uma tarde em uma área de pouco mais de 200 há, onde tudo lá produzido, bem como os recursos arrecadados, ambos são investidos e compartilhados coletivamente, farei um breve resumo sobre a trajetória da COPAVI. 

Foto - Jairo


Em 1993 um grupo de famílias se instala em uma área de terra antes cultivada por cana e abandonada em decorrência de falência da empresa.  Entre 1986 e 1988 deu inicio ao processo de desapropriação, cujo argumento foi abandono e improdutividade da área. A ideia do MST era avançar pela reforma agrária na região, sendo o assentamento Santa Rita, a primeira experiência coletiva do estado, com 22 famílias assentadas fixadas em 236 ha de terra, 100% com práticas agroecológicas anos mais tarde ao assentamento. Em 2002 o assentamento Santa Rita avançou junto a ECOVIDA iniciando os trâmites legais para certificação orgânica. Em 2005 foi aprovado como grupo COPAVI, oficialmente passando a integrar a Rede ECOVIDA, que se deu no encontro ampliado em Praia Grande/SC, nesse mesmo ano.

Foto - Jairo


De acordo com o estatuto da mesma, para ingressar na cooperativa é exigido que o candidato comprove aptidões para contribuir no projeto agrário coletivo, onde terá quatro meses de estágio probatório. Após o estágio será avaliado por meio de assembléia com a participação dos associados. Seguindo a filosofia do movimento agrário revolucionário, a COPAVI é território de resistência, pois a luta não se cessou na conquista da terra, mas se renova a cada desistência, permanência ou nova adesão de membros. 

 

Foto - Jairo

Junto a sede administrativa da COPAVI, que também concentram outros equipamentos, como o refeitório coletivo, padaria, área comercial e o espaço memória, o grupo foi agraciado assistindo palestra proferia por uma tecnóloga em agroecologia, que explicou meticulosamente os obstáculos trilhados pela cooperativa nos trinta anos de existência. Disse que a entidade se caracteriza pela diversidade, produzindo cana de açúcar orgânico e derivado, horticultura, padaria e pecuária leiteira.

Foto - Jairo

Foto - Jairo


Dessas atividades o que mais gerou dificuldades no início foi à pecuária leiteira, que exigiu parcerias com universidades e centros de estudos na qualificação de profissionais com olhar agroecológico. Disse que por pouco o setor agropecuário não foi desativado devido às dificuldades de manejo sustentável. Custear o manejo sustentável de vacas para a produção leiteira se tornava impraticável, pois os silos para alimentar os animais tinham de ser de soja e milho orgânicos.    

 

Foto - Jairo

                                                                                                                               
                                                                                            

Outro problema corriqueiro era a elevada mortalidade de bezerros, bem como a grande incidência de carrapatos nos animais adultos. A solução veio através da capacitação profissional, bem como mudanças de estruturas do sistema de manejo dos animais. Em vez de comprar suplementos alimentares, com valores elevados, a solução foi investir no manejo das pastagens, onde o gado permanece maior parte do tempo. O plantio de pastagens e espécies florestais, margaridão, capim copiaçu e leucenas, de porte alto, entre outras variedades vegetais, somado ao manejo eficiente dos bezerros, fez diminuir a mortandade de animais e a incidência de carrapatos, elevando gradativamente a produção de leite.

Foto - Jairo


Após visitar a área destinada ao gado leiteiro, o grupo foi conhecer o espaço destinado à horticultura. Lá foram recepcionados por duas tecnólogas onde explanaram como funciona o sistema de cultivo orgânico de hortaliças e demais legumes. Disseram que muito do que é cultivado, de forma diversificada, é para alimentar as famílias da COPAVI e também para atender o programa do PNAE, PAA, bem como para doações. Durante a pandemia do COVID foram doadas oito toneladas de alimentos, cem litros de álcool 70%.

Foto - Jairo


Todo o processo ou manejo da horta segue a risca critérios pré estabelecidos de tal forma que possa obter bons resultados. O que chamou atenção em relação à cooperativa é que todas as famílias participam de uma forma ou de outra de todas as atividades produtivas, em forma de rodízios. Quem se adaptar melhor em um desses segmentos poderá continuar atuando, porém, o estatuto da COPAVI exige que todos os cooperados experimentem todas as funções, da administração ao trabalho de campo.

Foto - Jairo

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A última etapa de visitação da COPAVI foi o segmento de cana de açúcar onde são beneficiados alguns derivados da cana como melado, açúcar mascavo e cachaça, considerada o produto que agrega maior renda da cooperativa. Todo o cultivo da cana segue regras agroecológicas, sendo cinco variedades cultivadas. O manejo do canavial se dá de modo consorciado, permitindo que entre o carreiro e outro seja cultivado outras plantas. O fato é que a cooperativa tem disponível cana para a moagem durante todo o ano. O processo produtivo da cana e da produção de cachaça, ambos seguem critérios técnicos rígidos, cujo propósito é obter uma aguardente de excelente qualidade.

Foto - Jairo
Foto - Jairo


Foto - Jairo


Minha e talvez a percepção de muitos do grupo que visitaram a COPAVI é de que o sistema lá implantado não é o mais perfeito ou desejado, mas o possível de ser implementado. Lendo alguns trabalhos, pesquisas, sobre a cooperativa, a conclusão que se chegou foi de que a proposta lá adotada segue princípios socialistas, tanto na construção de conceitos novos de organização, decisões horizontalizadas e trabalho solidário, no qual rompe certos paradigmas como poder hierarquizado, espaço individualizado e ideia de lucro.

Ficou explícito também o fato de o grande capital e seus tentáculos de poder, por exemplo, a mídia, atuarem tanto na tentativa de criminalizar determinadas organizações como o MST, que tem a sua gênese fincada na luta pela Reforma Agrária. É notório afirmar que o único caminho para solucionar a fome de milhões de pessoas no planeta é por meio da agricultura familiar e não a agricultura convencional que vem destruindo biomas, matando rios e contaminando solos. A agroecologia, por exemplo, é a que pode reconectar os sujeitos com sua essência geradora, o cosmos, ou força divina, para os metafísicos. Conhecendo a cooperativa COPAVI, lá pode ser visto e sentindo um pouquinho dos princípios que podem salvar a espécie humana no planeta terra, a valorização da diversidade, as decisões horizontalizadas e a solidariedade.

Algo de extraordinária representação simbólica para o fortalecimento e continuidade do projeto revolucionário da  COPAVI, que serve de inspiração para outros movimentos, é o seu centro de memória, uma pequena sala bem na entrada da sede administrativa. No seu interior estão nas paredes as fotos das principais lideranças que passaram pela cooperativa, porem já faleceram. Além das fotos, existe um rico acevo documental contanto um pouco da história do movimento que resultou na COPAVI. A presença de um busto do educador Paulo Freire, deve ser considerado como sendo a educação, o instrumento da transformação, da superação da desigualdade e da humanização dos sujeitos. 

Foto - Jairo

Foto - Jairo

            

Foto - Jairo

                                                                

                                                                                      Prof. Jairo Cesa    

https://revista.fct.unesp.br/index.php/geografiaematos/article/view/1882/FZ1https://revista.fct.unesp.br/index.php/geografiaematos/article/view/1882/FZ1

https://repositorio.ufscar.br/bitstream/handle/ufscar/3580/1893.pdf?sequence=1

https://www.youtube.com/watch?v=iLHkzY_n56s

http://www.cesumar.br/prppge/pesquisa/epcc2015/anais/thalles_santos_simoes_1.pdf