sábado, 31 de março de 2018


AS REDES SOCIAIS E O UNIVERSO PERIGOSO DA COMUNICAÇÃO ILIMITADA



Não é conveniente ao ser humano julgar fatos ou lançar opiniões quando sua mente estiver contaminada por sentimentos de ódio e raiva. Diferente das demais espécies vivas, o ser humano tem na sua constituição bio-psíquica elementos que o capacita às atitudes de livre arbítrio, negando ou escolhendo caminhos que queira seguir. No entanto, embora consiga canalizar parte de sua pulsação instintiva, lhe assegurando o convívio social, os desequilíbrios ambientais, crises econômicas, etc., podem resultar no aumento das pulsações involuntárias do cérebro, ativando latejos odiosos, raivosos. Foram necessário milhares de anos para que espécies hominídeas, caçadores e coletores, aprimorassem suas habilidades cognitivas e afetivas ao ponto de poder conviver em sociedade.
Como não poderia ser diferente, um complexo conjunto de regras escritas foram elaboradas, tornando possíveis o convívio entre indivíduos que apresentam sentimentos, comportamentos e concepções de mundo tão diversos. Entretanto, a vasta gama de ordenações normativas foi insuficiente para suscitar conflitos quase que intermináveis, muito dos quais motivados pelo desejo ofuscante de poder. As guerras, portanto, podem estar nelas as explicações do grau de humanização que a espécie sapiens sapiens ainda não atingiu. São evidentes os indicativos de que a espécie humana não terá tempo suficiente para completar seu ciclo evolutivo, pois, sua casa, o planeta terra, não irá proporcionar meios para completar o ciclo existencial.
Não há dúvida de que nos estágios cada vez mais curto de estabilidade econômica, os índices de conflitos sociais são bem mais discretos. O crescimento vertiginoso do desemprego, do desencadeamento violento de desastres ambientais e dos baixos níveis de escolaridade, associados às inovações tecnológicas, estão sendo hoje os vetores propulsores do ódio que, como um vírus, se espalha rapidamente. A tolerância que por milênios foi apregoada por correntes religiosas tradicionais, (cristianismo, islamismo, budismo, judaísmo, etc), vem, paulatinamente, perdendo forças, pelo fato de lideranças de tais agremiações estarem sendo contaminados pelo intolerante vírus do mercado.
Restabelecer a harmonia, o equilíbrio com os elementos da natureza e com o próprio eu existencial são atitudes que devem ser exercitadas incondicionalmente por todos e todas. Pode até ser um tanto piegas, démodé, aconselhar tais valores num momento de terrível instabilidade social e emocional que atinge o conjunto da humanidade. Não se deve esquecer que a espécie humana passou e passará por ciclos de instabilidade e estabilidade durante sua trajetória. O que preocupa é que nos quase quatro milhões de anos, momento do surgimento do primeiro hominídeo, a espécie hoje vive o seu desafio civilizatório máximo, reprogramar sua conduta existencial ou continuar a caminhada cega no planeta que resultará na sua própria extinção.   
A sociedade brasileira como outras sociedades que carecem de serviços essenciais, principalmente educação, serão as mais impactadas pelos frutos da modernidade. Para uma população onde mais de 80% apresenta baixos níveis de escolaridade, ou seja, não consegue ler interpretar o que escreve, ferramentas modernas como facebook, whatsapp, entre outras, se constituem como armas letais de destruição em massa.  Atualmente quais os conceitos lançados acerca dessas ferramentas tecnológicas? Que estão sendo utilizadas indevidamente, disseminando notícias falsas e apregoando o ódio entre indivíduos e grupos sociais.   
Será que esse comportamento odioso manifestado através das redes sociais são reações isoladas de uma pequena fração da sociedade acometida de algum tipo de patologia emocional, ou são reações espontâneas de um povo realmente violento, que por séculos foi forjado ou acobertado pelo mito do brasileiro cordial? Penso que aqui está a resposta às manifestações de hostilidade, rancor, destiladas contra pessoas que apresentam opiniões divergentes às suas.
Jamais o povo brasileiro pode ser concebido como pacífico, ordeiro, gentil, tolerante, como sempre se apregoou. A lista de justificativas que corroboram a favor dessa afirmação não muitas, com destaques a violência contra mulheres, negros, indígenas, homossexuais, etc. O Brasil é um dos primeiros do ranque em homicídios.  Morrem no Brasil mais pessoas vítimas de armas de fogo por ano que todas as mortes ocorridas na da guerra da Síria, desde o seu início.
O número de mortes não é ainda maior pelo fato de prevalecer à lei do desarmamento. Imaginemos agora centenas de milhares de pessoas saindo de um estádio de futebol ou dirigindo seus automóveis, todas munidas de arma de fogo, onde, de repente, se vêem envolvidas em atos de violência. Portanto, as redes sociais são pequenos lampejos refletidos da complexa conjuntura que tem no seu topo o Estado e todo seu aparato burocrático como desencadeadores da barbárie social.  
Como combater tudo isso? Não há receitas milagrosas para solucionar problemas enraizados na nossa cultura há séculos. Promover campanhas ou programas de auto-ajuda para difundir a tolerância e o amor ao próximo não vem se mostrando tão eficiente como se deseja. É claro que tudo isso se mostra ineficaz quando se tem no bojo da estrutura de poder elementos que incitam a desagregação, fracionando ou individualizando mais e mais os sujeitos ao ponto de terem de viver como reclusos nas suas cavernas existenciais. A internet e sua infinidade de opções interativas vêm transformando sujeitos passivos em anônimos monstros raivosos.  
Teclados de computadores, em mãos erradas, rapidamente podem se transformar em gatilhos de armas poderosas, onde através de simples toques com os dedos, produz estragos como se fossem batalhas em trincheiras. Informações ou notícias falsas, mal intencionadas, em minutos transformam pessoas ou grupos até então amados, idolatrados, em verdadeiros demônios. Qualquer assunto que se escreve principalmente temas relativos à política, futebol ou religião, que são comuns atualmente, dependendo como é escrito e quem a escreve, vira pretexto para o desencadeamento de uma guerra. Tem-se a sensação de que as pessoas permaneceram gerações aprisionadas dentro de casulos, que de repente, rompem-se a fechadura e surge à luz ofuscante, que cega, confunde. Estando libertos das mordaças, todos tendem a se sentir donos da verdade, juízes ao ponto de querer julgar e sentenciar quem quer que seja quando não estiver compatível aos perfiz desejados.
Prof. Jairo Cezar  

terça-feira, 27 de março de 2018


ENSINO A DISTÂNCIA COMO ESTRATEGIA PARA A PRIVATIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO BÁSICA



Quando todos/as acreditavam que nada pior poderia acontecer para a educação pública que a esdrúxula reforma do ensino médio e a homologação da BNCC, no dia 20 de março último, não é que o governo conseguiu piorar ainda mais a situação do ensino, quando anunciou que os/as estudantes do ensino médio poderão fazer a parte diversificada do currículo, ou seja, os 40%, a distância.  Ninguém duvida que a estratégia do governo com essa medida será dar prosseguimento ao programa privatizante da educação pública, que começará com a terceirização.
Entre 2009 a 2013 pesquisas realizadas pela CNTE deram conta que houve redução de 4,8% das matrículas em escolas públicas em todo o Brasil, incluindo nesses números, escolas estaduais, municipais e federais. Entretanto, a pesquisa mostrou também, que em relação ao ensino particular a curva seguiu o caminho inverso, houve um crescimento das matrículas em mais de 17%. É claro que o declínio das matrículas nas escolas públicas deve ter sido motivado pelo estado caótico das quais se encontram milhares de unidades de ensino sem as mínimas condições infraestruturais para a prática docente. Os reflexos desses desleixos com os espaços físicos e professores, desestimulados pelos péssimos salários que recebem, foram e são sentidos nos resultados das avaliações do PISA em ciências, matemática e linguagens, aparecendo o Brasil nas últimas posições entre os países da OCDE.
O reforma do currículo do ensino médio em 2017, bem como a homologação da BNCC, se constituíram como justificativas dos governos na tentativa de retirar o Brasil da condição ridícula que se encontra entre os demais da OCDE no quesito educação. Olha que o Brasil se apresenta como a oitava economia do mundo. Enquanto que nos países com melhores posições no ranque educacional, as reformas em curso são para aprimorar ainda mais os currículos, sem suprimir ou terceirizar disciplinas, no Brasil, ao contrário, as reformas são para fragilizar ainda mais o ensino, retirando a obrigatoriedade de disciplinas como sociologia, filosofia e artes, tornando optativa química, física e biologia. Não há dúvida que o plano das reformas deve ter tido as mãos sutis de setores empresariais, aonde irão bilhões no gigantesco mercado de livros didáticos, cursos de formação continuada e de programas de educação a distância.  
Observe, também, outra sutileza das reformas. O governo tem clareza que mais da metade dos municípios brasileiros possuem apenas uma única escola de ensino médio. Na parte diversificada do currículo, ou seja, os 40% restantes, para completar os 100% das disciplinas, os/as estudantes poderão optar por uma das cinco modalidades oferecidas: ciências da natureza, matemática, ciências humanas ou educação técnica profissional. Portanto, aqui está o segredo do esquema milionário. O não garantia da integralidade da parte diversificada do currículo a mais da metade dos municípios brasileiros, forçará os/as estudantes a buscarem nos municípios vizinhos tais modalidades que lhes interessam.
Porém, nem todos terão oportunidade de escolha, tanto pelo fato de muitas escolas dos demais municípios oferecerem as mesmas modalidades de ensino, quanto pelas distâncias e inexistência de transportes para os deslocamentos.  Frente a tais barreiras geográficas já previsíveis no projeto de reforma, o governo, lançou o plano B, ou seja, o ensino a distância. É claro que essa modalidade a distância resultará em uma economia substancial aos cofres públicos dos estados e municípios. Mas, o que interessa aos governos são as estatísticas, os índices e não se o aluno estudou ou aprendeu.
Muitos economistas, sociólogos e demais intelectuais de vertentes teóricas críticas, tem estampado nos seus livros e artigos, reflexões revelando que no mundo do trabalho capitalista, não há em hipótese alguma interesse de ruptura das relações desiguais de produção. Analisando as últimas investidas golpistas na educação pública, tem-se muito claro a permanência do modelo desigual de produção. O que é fato é que nenhuma escola particular ousará ajustar seus currículos conforme preconizado nas reformas temendo riscos de perda da qualidade no ensino.
Enquanto uma casta de “bem nascidos” terão assegurado o acesso as boas escolas e ao vasto rol de conhecimentos acumulados, lhes garantindo os melhores empregos e salários, no outro lado da extremidade do sistema, estarão os “mal nascidos”, os excluídos do capital, transformados em exército de reserva de mão de obra, cuja escola pública vem absorvendo para, depois, despejá-los/as no mercado, mantendo o ciclo reprodutivo das massas de manobra. É isso mesmo, massas de manobra. Salvo algumas exceções, quantos estudantes de escolas públicas, a partir dos currículos ajustados às reformas terão as mesmas possibilidades de disputar com escolas particulares as vagas de cursos como medicina, engenharias, entre outras? Certamente, terão que se conformar, caso concluam o ensino médio/técnico ou superior a distância, de ter conseguido emprego e recebendo salário que mal lhes assegure a sobrevivência.       
Há pouco tempo quando o projeto de lei da terceirização foi aprovado no congresso nacional, já se fazia o alerta do seu espectro na educação, que poderia começar com os/as professores/as do ensino superior, vindo em seguida os/as profissionais do ensino básico, até alcançar as escolas do ensino básico, com a terceirização das disciplinas. No entanto, tudo está acontecendo muito rápido do que se imaginava, sem que a categoria dos educadores tenha tempo para assimilar e reagir às investidas dos governos entreguistas. É claro, tem muito dinheiro em jogo, somado a pressão dos bancos internacionais (Banco Mundial) que ameaça cortar recursos, se países como o Brasil permanecerem na rabeira entre os piores em educação.    
Quando se lança o alerta de que os atuais governos preconizam a privatização do ensino, isso não é um discurso fatalista de quem aposta sempre no pior. Muito pelo contrário, é a opinião realista e nada otimista de quem acompanha o dia a dia das escolas durante 35 anos, de uma quadro estrutural caótico, que só está funcionando graças ao imensurável esforço de gestores e professores. São escolas cujos professores chegam ao limite de tirar dinheiro do próprio bolso para assegurar o mínimo de conforto aos estudantes.  Jamais tenderão a se render os/as professores/as aos ataques insanos de governos que, sabiamente, tem a educação como instrumento de controle social.  Não há como vislumbrar transformações estruturais significativas no âmbito social e educacional prevalecendo o atual modelo de produção que sobrevive esfolando trabalhadores. É preciso transformar escolas em trincheiras, mobilizar a sociedade para que as defendam bravamente dos poderosos monstros do dinheiro, que insistem em devorar a todo custo corpos e alma de milhões de brasileiros.
Prof. Jairo Cezar

sexta-feira, 23 de março de 2018


DIA MUNDIAL DA ÁGUA TEM DE SER TODOS OS DIAS


Já é habitual o dia 22 de março quase todas as mídias brasileiras se aproveitarem do momento para dedicar atenção especial ao tema água e os problemas envolvendo esse recurso finito. O que se ouve ou lê nas páginas desses veículos noticiosos são reportagens geralmente repetitivas ou cópias dos anos anteriores, com denúncias sobre o aumento da degradação dos mananciais hídricos; das dificuldades dos governos e comitês de bacias em concretizar seus planos de gestão de recursos hídricos, etc, etc. Tornou-se também hábito, jornais trazerem cadernos especiais sobre a água, reportando situações calamitosas de mananciais ou um conjunto de bacias hidrográficas afetadas por diversos agentes poluidores.
Se crianças, por ventura, forem questionadas sobre a situação da água no planeta ou no seu bairro, rapidamente responderá que o cenário é bastante crítico. Dirá também que é preciso preservar, se consciência de que, por ser um recurso finito, vai faltar muito antes do que se imagina.  Nos últimos tempos quais são as noticias que mais ocuparam o tempo nos teles jornais diários, além, é claro, da violência? Aqui estão alguns exemplos: estiagem; racionamento de água; volume morto nas hidrelétricas; desmatamento irregular; esgoto contaminando mananciais; rompimento de barragens contendo produtos tóxicos; etc, etc. Não é mesmo? Portanto, são todos problemas previsíveis e que estão se repetindo a todo instante. Afinal todos esses problemas citados têm alguma relação antrópica, ou seja, influência humana?  
Não bastam apenas atos isolados de sensibilização sobre preservação da água, reunindo professores, estudantes, autoridades municipais, entre outros. Isso já virou quase um condicionamento, ato instintivo, tanto na semana do meio ambiente, dia da árvore, dia da água e outras datas significativas. Por que se faz necessária a critica? Durante os demais dias do ano, tem-se a sensação de que tudo que foi discutido ou desenvolvido nessas datas especiais não alterou em nada as atitudes depredatórias no ambiente escolar e fora dele. São necessários anos para construir hábitos de comportamento saudáveis. A escola tem um papel importante e desafiador, porém, essa tarefa deve ser compartilhada com toda a sociedade.
A razão pela qual os problemas ambientais relacionados aos recursos hídricos estarem se avolumando a cada ano, tais patologias estão associadas ao modelo mercantilista que esse produto assumiu e vem assumindo ultimamente. Pelo ponto de vista de algumas culturas como as indígenas, a água é concebida como um elemento sagrado, cuja proteção garante a harmonização com as forças da natureza. Para as demais culturas secularizadas, a água nada mais é que um produto disponível no mercado, na relação oferta e procura. Aqui pode estar a resposta que explica por que 4,1% (12 rios) possuem qualidade boa, entre os 230 diagnosticados nos 17 estados que integram a mata atlântica.    São 222 rios, ou seja, 75,5%, com qualidade regular, e 60 rios, (20%), cuja água não apresenta qualidade insuficiente todo tipo de uso, sendo rios considerados quase que mortos.  O rio Araranguá ou a bacia do Rio Araranguá pode estar inserido nesse patamar dos 20%.
Diante desse quadro quase catastrófico relativo aos recursos hídricos, a região que congrega as bacias do rio Araranguá, Urussanga e Mampituba/lado catarinense, vem se empenhando para reverter às demandas ambientais que tornam o extremo sul de santa Catarina uma das mais críticas do Estado. Além dos resíduos oriundos do carvão mineral, todo o complexo hídrico da região, superficial e subterrâneo, sofre outros efeitos contaminantes provenientes do esgotamento sanitário, extração de seixos, desmatamento e o uso abusivo de agrotóxico. A agricultura/rizicultura, também, vem se revelando como um dos pivôs de freqüentes conflitos pela disputa dá água com outros seguimentos da economia regional.
Do volume total dos 54% da água utilizada na agricultura em todo o estado, na região do extremo sul de Santa Catarina o índice destinado à atividade agrícola ultrapassa os 41%. Se não houver o equilíbrio da demanda de água na região do extremo sul, bem como o cumprimento de todos os dispositivos descritos no plano de gestão de recursos hídricos do Comitê da Bacia do Araranguá, é quase certo que num futuro bem próximo os integrantes do comitê, terão que se dedicar quase que exclusivamente em apaziguar conflitos envolvendo disputas por esse recurso.
As expectativas relacionadas à água para a região não são nada otimistas para os próximos anos, estando o líquido, a cada dia, se tornando mais limitado e com pouca qualidade para o consumo. Estão sendo cada vez mais freqüentes os ciclos de estiagens prolongadas com efeitos negativos nas recargas dos aqüíferos que alimentam o complexo hídrico da região. O descuido com os mananciais de abastecimento público, bem como dos reservatórios superficiais de água doce, como as lagoas da Serra, Caverá e Sombrio, que continuam sendo antropizadas, poderá levar Araranguá e os municípios que integram todo esse complexo hídrico a seguirem o mesmo caminho de cidades como São Paulo e outras do restante do Brasil que estão sob os efeitos de uma política de racionamento de água.
Prof. Jairo Cezar

terça-feira, 20 de março de 2018



APROVAÇÃO DE PROJETO SOBRE LICENCIAMENTO AMBIENTAL ELEVARÁ RISCOS DE DESASTRES AMBIENTAIS COMO OS DE MARIANA/MG E NO ESTADO DO PARÁ


Varias votações polêmicas no Congresso Nacional em 2017 como a que garantiu o arquivamento do processo da Procuradoria da República que autorizava a continuidade da investigação de um suposto envolvimento de Michel Temer em crime de obstrução de justiça e organização criminosa, tiveram êxito graças aos votos de bancadas ultraconservadores como as dos ruralistas em troca, entre outras benesses, da flexibilização das regras relativas aos agrotóxicos.[1]
Quando tudo parecia que as barganhas entre o governo e seguimentos fisiológicos do agronegócio e imobiliário no congresso ficariam congeladas por algum tempo devido à suspensão do projeto da reforma da previdência, veio a informação preocupante de que o presidente da câmara dos deputados estaria pretendendo votar em caráter de urgência o projeto bomba que flexibilizará os licenciamentos ambientais.
É claro que essa proposta um tanto quanto indecente tem os dedos e as mãos dos parlamentares do agronegócio, que mais uma vez pressionam o governo e seus pares no congresso para a aprovação da lei n. 3.729/04 que tramita há 14 anos. Outras PLs foram elaboradas posteriormente ao projeto de 2004, porém foram resguardados artigos e dispositivos considerados ameaçadores ao meio ambiente.   O que pretendem os signatários da última versão da PL de 2017 é ampliar a todo custo o voraz domínio sobre áreas cujas legislações ambientais negariam por estarem em desacordo com as normas vigentes.
O que querem os defensores da PL é se livrarem de qualquer instrumento restritivo ou impeditivo de organismos lecenciadores e fiscalizadores como o IBAMA, deixando o caminho livre para tomada de posições conforme prerrogativas que lhes convém. Tais mecânicos perniciosos e ameaçadores ao meio ambiente caso sejam aprovados afrontaram diretamente inúmeros dispositivos legais como os da Constituição Federal, dentre eles o Art. 225, Caput. c.c, parágrafo 1°, IV e V, e o Art. 5°, da lei n. 12.846/13, que discorre sobre políticas de anticorrupção, com maior ênfase aos crimes ambientais envolvendo o poder público.[2] 
 Questões como as que foram apontadas acima podem explicar os motivos que estão contribuindo para o desmonte e o sucateamento de entidades ambientais importantes como o IBAMA. Por outro lado serão asseguradas “maior autonomia” e rapidez às instâncias estaduais e municipais através de suas fundações ambientais, nos processos de licenciamentos de obras que até então requerem longo período de análises e acompanhamento técnico, como, por exemplo, projetos de fixação de barras ou estuários.    
O que pretende o projeto, na concepção dos seus defensores, é tornar menos burocrático os procedimentos de licenciamentos ambientais. Pois vejamos alguns itens polêmicos contidos no projeto e que devem ser rechaçados por toda a sociedade. a) A dispensa de prévia necessidade de emissão de certidão de uso e ocupação do solo urbano pelo município, bem como a dispensa de contribuições técnicas para licenças que não exijam EIA. b) Será, também, dispensada a participação dos gestores de Unidades de Conservação integral nos licenciamentos de empreendimentos nesses limites como também nas zonas de amortecimento dessas unidades.[3]
c) Também, será excluída a previsão da elaboração de mapas da área de licença ambiental em terrenos considerados de relevância ambiental, incluindo, nesse item, propriedades indígenas e quilombolas, que não terão mais poder de deliberação em ações de licenciamentos envolvendo suas áreas, apenas ação consultiva. d) A nova legislação deverá afetar também remanescentes de vegetação nativa; e) áreas de recarga de aqüíferos; f) terrenos com a presença de espécies ameaçadas de extinção ou de zonas migratórias; g) áreas antropizadas e tipos específicos de ambientes marinhos como mangues e restinga.
h) Irá excluir, também, das licenças de instalações de equipamentos, a análise do potencial degradador do empreendimento. Hoje em dia é quase habitual o descumprimento de condicionantes ambientais por parte de empreendedores que obtiveram licenciamentos para obras de infraestrutura.  No descumprimento de tais condicionantes os órgãos ambientais têm por dever impor sanções como o cancelamento das licenças.  O Art. 13, I, da PL, isenta o infrator de pena e até mesmo a não suspensão da licença ambiental. 
Em muitos estados e municípios brasileiros são corriqueiros denúncias contra órgãos ambientais suspeitos de crimes de concessão de licenciamentos ambientais para supressão de vegetação. O Art. 67 da lei de crimes ambientais, 9.605/98, impõe ao infrator, detenção de um a três anos e multa. Se o crime for culposo, o Parágrafo Único do artigo estabelece, além da pena de três meses a um ano de detenção, a exclusão da multa. O PL, no seu Art. 46 isenta o servidor público de crime de responsabilidade se comprovado que a ação foi culposa, ou seja, sem intenção aparente.
Outro item, também polêmico, que poderá resultar em graves retrocessos ambientais trata sobre da realização de Audiências Públicas, sendo assegurada apenas uma, antes dos licenciamentos, mesmo assim somente para casos de empreendimentos que requeiram EIA (Estudo de Impacto Ambiental). Diante de tantas incongruências e insensatez administrativas, que faz prevalecer o mandonismo das elites econômicas regionais, tudo leva a crer que mantendo o texto da PL como está, a sua aprovação resultará no desmonte de todo um conjunto de normatizações ambientais, que bom o mau, ainda assegura juridicamente o bom senso nos trâmites de licenciamento.
O aprovação da PL, tenderá, também, promover uma verdadeira Guerra Fiscal entre estados e municípios, cada um querendo flexibilizar ao máximo suas normatizações relativas aos licenciamentos como estratégia para atrair empresas, onde muitas delas, nas regras atuais da legislação, não seriam possíveis de terem suas licenças. A sensação deixada quando nos deparamos com propostas de projetos de lei tão desastrosas para o meio ambiente é de que episódios como as tragédias de Mariana, MG e no Pará, pouco ou nenhum impacto teve no pensamento dos mentores do projeto sobre flexibilização dos licenciamentos ambientais.
 Não há como não prever que outros desastres similares ao de Mariana e no estado do Pará poderão ocorrer diante de um projeto de lei tão permissivo como o PL. 3.729/2004.  Se o histórico no parlamento prevalecer, será outro projeto de lei vitorioso para o governo, pois sua intenção é continuar o estreitamento político com tais bancadas entreguistas no congresso, que vem lhe prestando apoio, livrando-o de acusações que poderiam levá-lo à prisão.
Prof. Jairo Cezar         



[1] http://morrodosconventos-jairo.blogspot.com.br/2018/02/bancadaruralista-tenta-barganhar-votos.html
[2] Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao poder público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.
§ 1º - Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao poder público:
IV - exigir, na forma da lei, para instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente, estudo prévio de impacto ambiental, a que se dará publicidade;
V - controlar a produção, a comercialização e o emprego de técnicas, métodos e substâncias que comportem risco para a vida, a qualidade de vida e o meio ambiente;

[3] https://www.conjur.com.br/2017-mai-02/pl-licenciamento-ambiental-propostas-devastadoras        


sexta-feira, 16 de março de 2018


EXEMPLOS DE RETROCESSOS VISÍVEIS NO TEXTO FINAL DA BNCC (BASE NACIONAL CURRICULAR COMUM)


Com mais de cinco séculos de história, o atual cenário econômico e social dá mostras óbvias que herdamos do colonizar conceitos ou idéias burguesas de dominação. São esses valores que formataram o imaginário da sociedade e das elites políticas parasitárias que vem se revezando no poder alimentado pela ignorância social. Combater essas patologias sociais desumanizadoras é  imprescindível para que cada indivíduo compreenda  a sim mesmo e o funcionamento do mundo a sua volta.
A escola como instituição pública deveria cumprir com tal função, porém, sendo a mesma estatal, seu compromisso é de reproduzir as desigualdades, mantendo intactos os instrumentos de dominação e exploração social. Nas várias LDBs e reformas ocorridas na educação brasileira o que se percebeu foi o avanço progressivo do abismo social, que se projeta especialmente sobre a população jovem que não vislumbra na educação qualquer expectativa de futuro.
As desesperanças enraizadas no imaginário das classes marginalizadas com relação à educação são atribuídas, entre outras causas, ao modelo de produção dependente, cujos planos ou reformas executados foram e são financiados com recursos externos, BANCO MUNDIAL, BID, BIRD, dos quais restringem qualquer possibilidade de ruptura de dependência histórica. As ultimas investidas desses poderosos seguimentos financeiros ocorreu por meio da implantação da nova BNCC, que a princípio, tem no seu bojo introdutório, justificativas um tanto quanto convincentes de que sua aprovação é necessária para supressão de distorções no currículo, bem como a promoção da transformação social, tornando-a mais humana, socialmente justa e voltada à preservação da natureza.
Vendo de fora dá-se a impressão de que a proposta  irá mesmo redimir com o atraso crônico de uma educação pública que mal prepara a força de trabalho, explorada, desprotegida e subalterna aos mandos e desmandos de uma elite míope e governos fantoches.  É tão nítido esse caráter evasivo e impositivo de organismos financeiros à soberania política dos Estados periféricos como o Brasil, que pode ser notado quando comparadas as agendas de competências dos blocos de países onde são oriundos os recursos e disponibilizados via banco aos países dependentes.
Em 2016 o bloco econômico europeu lançou sua agenda para o desenvolvimento e a educação foi o seguimento que mais recebeu atenção. Enquanto no Brasil as reformas praticadas à educação atacam diretamente o currículo, restringindo milhões de brasileiros uma formação digna que o capacite a compreender criticamente o mundo ao seu redor, na Europa, por sua vez, a agenda segue um caminho pavimentado há décadas, ou seja, rejeitar todas as formas de discriminação e exclusão social, reconhecer a importância e os desafios colocados pelas artes e humanidades, ciências e tecnologia; valorizar o respeito pela dignidade humana; estimular a solidariedade com os outros; promover a diversidade cultural e o debate democrático.
Num mundo por hora tensionado por conflitos de todos os tipos e formas, onde exige de forma urgente que escolas redefinam sua função além do campo da instrução, atuando também como agente conciliador, reduzir o currículo ao ponto de excluir temas relevantes sobre o corpo, gênero e sexualidade, é querer se solidarizar com todo o tipo de injustiça, violência, discriminação contra mulheres, negros, homossexuais, etc. A escola, no entanto, tem se caracterizado como epicentro das tensões, convergindo para o seu interior todas feridas presentes na sociedade.
Com a homologação da BNCC, paradoxalmente, a sociedade tenderá, no futuro, responsabilizar a escola pelo retrocesso social e o recrudescimento cultural de toda uma geração. A expectativa é que num futuro próximo possa ser eleito cidadãos verdadeiramente comprometidos com uma educação transformadora, capaz de libertar a população das amarras da ignorância, da dependência e da subserviência de organizações financeiras que traçam os caminhos de como o Brasil deve seguir.     
A supressão da BNCC de tais componentes curriculares, inserindo no lugar princípios e valores éticos, que estabeleça como uma das habilidades o reconhecimento da coexistência como uma atitude ética de respeito à vida e à dignidade humana, esconde no texto a forte influência de congressistas vinculados aos seguimentos religiosas ultraconservadores, que barganharam seus votos atendendo preceitos moralistas que nada contribui para o fortalecimento da embrionária democracia.
No aspecto religioso também não foi diferente, prevaleceu o senso comum doutrinário dos parlamentares integrantes das bancadas religiosas, que conseguiram fazer valer seus interesses criacionistas, nada científicos, com a manutenção do ensino religioso, que aparece agora no texto da Base como abordagem inter-religiosa, norteada por “princípios éticos”.  No CNE, o ensino religioso não recebeu o deferimento conclusivo, uma comissão será criada para deliberar se o ensino terá tratamento como área de conhecimento ou como componente curricular da área de ciências humanas, no ensino fundamental.
Outro detalhe importante, o ensino médio foi excluído da BNCC, se distanciando dos princípios norteadores de construção de um projeto de educação integral, que historicamente vem se concebendo como uma das principais bandeiras dos movimentos organizados ligados à educação. Tanto a BNCC como o documento norteador do ensino médio, esse último sancionado em 2017 pelo Presidente da República, ambos não se diferem quanto aos seus objetivos, ajustar os sistemas de ensino abrindo caminhos para tornar a educação pública um negócio a serviço do mercado, promovendo vultosos lucros para os segmentos de livros didáticos, de apostilas, de formação inicial e continuada de professores e gestores.
Prof. Jairo Cezar                


quinta-feira, 15 de março de 2018


FÓRUM MUNDIAL DA ÁGUA: A ARTICULAÇÃO DE UM PLANO PARA A MERCANTILIZAÇÃO DOS SERVIÇOS DA ÁGUA E A FRAGILIZAÇÃO DAS RELAÇÕES TRABALHISTAS


No ano passado, setembro de 2017, ocorreu na UNIVALI (BALN. CAMBORIU) o IX Fórum Brasileiro de Educação Ambiental. Além das inúmeras mesas redondas, palestras e oficinas que discorreram sobre temas diversos relativos à problemática ambiental e possíveis alternativas. o Fórum Mundial da Água, que ocorrerá em Brasília, entre dias 17 a 23 de março, teve também ampla divulgação. Representantes do governo federal presentes em Baln. Camboriu informaram que todas as escolas brasileiras deveriam promover suas conferências infanto-juvenis durante o último semestre de 2017 em preparação ao evento em Brasília.  
O que não foi dito pelos porta-vozes dos governos, durante a jornada, é que o Fórum terá como objetivo central articular estratégias para a privatização das fontes naturais e dos serviços públicos envolvidos no tratamento e distribuição da água. Convencidos das manobras que afetarão bilhões de pessoas no mundo inteiro, entidades sociais, instituições de pesquisas, representantes de comunidades tradicionais, se reuniram em fevereiro de 2017 e criaram a FAMA (Fórum Alternativo Mundial da Água), que atuará paralelamente ao FMA, para se contrapor as políticas entreguistas dos recursos hídricos.
Na realidade há dados suficientes que confirmam a remunicipalização ou reestatização dos sistemas abastecimento de água e saneamento em muitas cidades no mundo inteiro, pelo fato das concessionárias ou empresas terceirizadas não cumprirem com as metas estabelecias com o poder público. E os motivos são os mais óbvios: tarifas abusivas; descumprimentos de contratos, etc. No entanto, o capital continua sua insistente jornada de apropriação dos recursos hídricos no mundo inteiro. A cada ano meio trilhão de metros cúbicos de água são absorvidos por grandes empresas. O fato é que hoje 90% desse volume são destinados para o abastecimento agrícola, pecuária, bicombustíveis e especulação financeira.    
O Brasil hoje, 316 municípios, ou seja, 5,6% são atendidos por companhias particulares, que administram os serviços de abastecimento de água e saneamento. São seis grandes empresas que controlam 95% dos serviços de saneamento no Brasil. Entretanto, quando o assunto é água e saneamento, na concepção do capital, o Brasil é visto como uma mina de ouro ainda inexplorada. Com o progressivo problema da escassez de água no planeta, a tendência é a elevação vertiginosa dos valores das tarifas do setor, bem como do setor elétrico, que no caso brasileiro, depende quase que exclusivamente da água das hidrelétricas. Para elucidar, nas últimas décadas o consumo de água no Brasil cresceu duas vezes mais que a população. A tendência é que até 2050 a demanda por água no Brasil crescerá 55%.
Há previsões nada otimistas de que em 2030 o planeta irá enfrentar um dos maiores colapsos de abastecimento de água. O que preocupa é que a população não demonstra preocupação desse perigo, sendo necessária intensa campanha de esclarecimento sobre hábitos corretos de consumo e políticas públicas para a expansão do saneamento básico.  Entretanto tais medidas se consideram paliativas, pois não ataca à raiz do problema, que é o atual sistema de produção que se nutre dessas contradições, das crises cíclicas do mercado.
O Fórum Alternativo Mundial da Água, em Brasília, tem exatamente essa prerrogativa, trazer para a população a real situação da água no planeta e denunciar a rapinagem do mercado, principal protagonista da degradação das reservas existentes. O cenário da água e dos demais recursos naturais é tão ameaçador, que o próprio Papa Francisco, em 2016, lançou encíclica “Louvado Seja” – O Cuidado da Casa Comum, uma contribuição das igrejas cristãs voltada à sensibilização das pessoas sobre os perigos que corre o planeta terra. É a água contaminada que mata hoje mais de quinhentas mil pessoas por ano no mundo. O que é espantoso é que no planeta 80% dos países, as metas que vem sendo aplicadas sobre os recursos hídricos são extremamente frágeis.
A própria UNECEF defende que a questão da água se constitui como um problema de gênero, que evolve mulheres e crianças. Ambas consomem cerca de 200 milhões de horas coletando água todos os dias. Ao mesmo tempo a feminização da pobreza vem crescendo progressivamente no mundo inteiro. A ONU lançou relatório afirmando que 70% das pessoas em situação de pobreza no mundo são mulheres, negros, latinos, indígenas e imigrantes. A não realização das conferências preparatórias ao fórum nos estados e municípios se esquivaria ou se esquivou de revelar tamanha brutalidade contra as mulheres devido à escassez de água, bem como de possíveis denúncias contra o governo brasileiro de estar articulando com grandes conglomerados do seguimento hídrico e de saneamento, plano de privatização como ocorreu no seguimento elétrico, aeroportos, portos, pré-sal e tantos outros.
O Brasil, que concentra as maiores reservatórios de água doce do mundo, também concentra os terríveis descasos quanto aos cuidados com esse recurso. Ao mesmo tempo em que 83,3% da população brasileira estavam sendo atendidas por água encanada em 2015, apenas 50,3% dos domicílios possuíam rede de esgotos. O que é mais grave é que apenas 42,7% de todo o esgoto coletado é tratado. As populações mais afetadas pela falta de saneamento são as que ocupam áreas irregulares e as comunidades tradicionais, quilombolas e indígenas. Se a proposta do Fórum é discutir políticas de mercantilização dos serviços da água, que sirvam de exemplo os municípios e estados que terceirizaram tais serviços, cuja população teve baixa qualidade nos serviços e a violenta degradação das relações trabalhistas daqueles/as que atuam na atividade vinculada ao abastecimento hídrico.
Prof. Jairo Cezar


POR QUE SE INVESTE TÃO POUCO EM EDUCAÇÃO INFANTIL NO BRASIL?

Uma das metas do PNE (Plano Nacional de Educação) era universalizar até 2016 a oferta de vagas para educação infantil para crianças de 4 a 5 anos e garantir o atendimento de no mínimo, 50%, das crianças de até 3 anos até 2024, período de vigência do plano. Quase três anos se passaram desde a homologação do PNE em 2015 e o que vê é o parcial cumprimento das metas do plano na sua totalidade, cujos gestores públicos alegam, para justificar tamanha discrepância no cumprimento, a crise econômica. É claro que embora os governos atuais como os antecessores tenham priorizado em suas campanhas eleitorais atenção especial à saúde, à segurança pública e à educação, durante os quatro anos de vigência do mandato, a realidade foi outra. Em Santa Catarina cuja mídia conservadora insiste em ostentar o estado como imune à crise e referência federal no quesito educação e desenvolvimento humano, possui 14,8 mil crianças fora das creches ou CEIs (Centros Educacionais Infantis).
Esse total de crianças a espera de vaga, importante que se diga, é proveniente somente dos cinco municípios mais importantes economicamente do estado: Florianópolis, Lages, Blumenau, Criciúma e Joinville. Agora se incluir os demais 290 municípios, acrescentando também estudantes não matriculados no ensino fundamental e médio, os números certamente triplicariam, que seria motivo até, reservadas a proporções, de uma intervenção federal no estado, como nos demais estados da federação. Isso não vai acontecer pelo fato da SED (Secretaria do Estado e da Educação de SC) estar sendo ultimamente gerida por uma figura que ocupa importante posição no cenário nacional, presidência do CNE (Conselho Nacional de Educação), onde é ovacionado pela cúpula do governo federal e do capital por seguir ipsis litteris a cartilha reformista neoliberal.
Na última segunda feira, 12 de março, o programa Roda Vida, da TV Cultura, entrevistou o ministro da educação Mendonça Filho. Entre os debatedores escolhidos a dedo para sabatinar o então ministro, estava o secretario da educação de Santa Cataria, que é também presidente do CNE. Nos vários assuntos abordados no programa, a Educação Infantil em nenhum momento as intervenções do ministro foram convincentes. Um dos debatedores afirmou que o primeiro plano nacional de educação iniciado em 2000 o Brasil já obrigava o governo ter matriculado 50% das crianças em creche, e que o atual plano prevê esse percentual para 2024.
O ministro respondeu que educação infantil sempre foi colocada em patamar de inferioridade no Brasil, que o problema tem de ser compartilhado, assegurando aos municípios mais autonomia para disponibilizar vagas em creches, e isso envolverá mais recursos. Hoje em dia, bem diferente do que propõe o PNE, creches ainda são concebidas como depósitos para crianças, atendidas por voluntários/as sem o mínimo de preparação à altura do que é recomendado pelas legislações em vigor. São quase 10% de crianças entre 4 a 5 anos que estão fora das salas de aula em todo o Brasil. O PNE determinava que todos os estados e municípios teriam até 2016 prazo final para solucionar esse gargalo educacional.
Outro detalhe importante, se hoje em dia muitos municípios catarinenses garantem o atendimento às crianças de até 3 anos de idade, se deve ao esforço imensurável do ministério público estadual, que vem imprimindo sanções como multas diárias àqueles gestores que se recusam a garantir tal atendimento. O MPE (Ministério Público Estadual) também vem fazendo trabalho idêntico nas unidades de ensino, principalmente as da rede estadual, embargando escolas que não oferecem o mínimo de segurança física ao público docente e discente. Mantendo esse modelo de política educacional coordenada por seguimentos empresariais e organismos financeiros interessados exclusivamente no lucro, por que preparar uma geração de pensadores críticos se ambos poderão protagonizar transformações estruturais que porão em risco a estabilidade desse sistema de privilégios alimentados pela ignorância do povo.  

Prof. Jairo Cezar

sábado, 10 de março de 2018


O JULGAMENTO DAS ADIS NO STF,  SOBRE DISPOSITIVOS DO CÓDIGO FLORESTAL BRASILEIRO QUE ESTIMULARÃO OS DESMATAMENTOS IRREGULARES

Seis anos após a aprovação da lei n. 12.651/12, que versa sobre o novo código florestal brasileiro, as estatísticas comprovam que jamais se desmatou e queimou tanta floresta nesse curto período de tempo. A pergunta que muitos gostariam de fazer é qual ou quais os reais motivos que levaram o Congresso Nacional a elaborar nova legislação ambiental se a que vigorava era comprovadamente avançada. A resposta, portanto, pode estar associada ao dispositivo que estabelece penas médias e severas aos infratores do código, cerca de 70% dos proprietários rurais brasileiros.
O código florestal aprovado em 2012, anistia de multa quem desmatou floresta anterior a 2008, porém, condiciona a anistia à reparação dos danos segundo prazos pré-estabelecidos. A tramitação do projeto de lei no congresso fez com que ONGs, Universidades  e Entidades de Pesquisa fossem excluídas do debate, menos ainda, de ter a oportunidade para encaminhar suas proposições.  Depois de concluído os trâmites da lei, parlamentares que votaram a favor do código, concluíram que o código se caracterizaria em retrocesso ambiental, abrindo brechas para novos desmatamentos.  A única certeza assegurada pela lei era a absolvição dos infratores ambientais. O código também concederia licença para fazer o que quiser na área produtiva. 
Outros equívocos do código florestal ocorreram nos itens APPs e Reserva Legal, que tratam sobre os percentuais que devem ser preservados por cada bioma, pois comprova o real desconhecimento dos congressistas (bancada ruralista) das biodiversidades da cada um deles. No bioma amazônico cada proprietário deve manter 80% da área em reserva legal; no bioma cerrado, tão complexo, diverso e ameaçado, foi estabelecido somente 35% de reserva legal.  Até 2050, caso permaneça o ritmo de devastação do cerrado, 31% dos 34% que restam do bioma, serão, com certeza, dizimados. Desaparecerão por completo do bioma cerca de 480 espécies de plantas. São três vezes mais do total de plantas extintas entre o ano de1500 até os dias atuais.  
Até o momento não se tem um retrato fidedigno de toda área florestada brasileira, os dados disponíveis são muito fragmentados. Os próprios parlamentares, especialmente os da bancada ruralista, não se pautaram a cientificidade do código, pois não era suas reais pretensões,  o que desejavam mesmo era aprovar outro documento ambiental, que fosse menos restritivo e que livrasse milhares de proprietários do pagamento de multas por crimes ambientais cometidos. 
A lei determina que proprietários de terras devessem fazer o levantamento da cobertura vegetal por meio do CAR (Cadastro Ambiental Rural), como instrumento técnico necessário para que o governo conhecesse melhor a realidade do campo brasileiro. Depois de feito o levantamento cadastral, o mesmo deverá ser validado por meio do PRAs (Programa de Regulação Ambiental). Estando essas etapas concluídas, ai sim, teoricamente, é possível saber com exatidão a real dimensão do campo brasileiro, quanto tem de floresta, quanto pode ser suprimida e o quanto deve ser reparada. Esse será também o momento de avaliar as incoerências do código florestal, que certamente serão enormes. Técnicos do governo e ONGs são unânimes em admitir que não há transparência dos dados do CAR (Cadastro Ambiental Rural), misturando atividades legais e ilegais. Essas incertezas se dão porque a normativa n. 03 de 2014, do MMA (Ministério do Meio Ambiente), dá caráter sigiloso às informações pessoais do CAR.
Diante das aberrações constatadas no código florestal aprovado em 2012, três ADIS (Ação Direta de Inconstitucionalidade) foram protocolados no STF, em novembro de 2017, questionando mais de 40 pontos do documento, entre eles, os dispositivos duvidosos constados em APPs; sobre as reservas legais e a polêmica anistia às multas. Depois de alguns meses tramitando no supremo tribunal, finalmente no dia 28 de fevereiro de 2018 os ministros da corte suprema votaram as ações, tendo os resultados provocado indignação e incertezas quanto ao futuro das florestas.
Enquanto muitos admitem que a decisão dos ministros foi assertiva, pois pôs fim as dúvidas ou inseguranças jurídicas relativas ao código florestal, otros, ao contrário, se posicionam um tanto incrédulos, alegando que a corte suprema brasileira assumiu posição contrária aos debates em todo planeta que vem apregoando um posicionamento unilateral em defesa das florestas e do clima global. A sensação que ficou quando foram concluídas as votações das ADIs foi de que integrantes do agronegócio tiveram influência nas decisões dos ministros. As justificativas que corroboram às críticas desferidas aos ministros, diante da decisão, são passíveis de ter o consenso social.  Vejamos então que dispositivos das ADIS foram acatadas pelo STF e outras que foram suprimidas, conservando o texto originário no código sem alteração.
No item ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE (APP), das onze proposições questionadas na ação, somente três tiverem o aceite dos ministros do supremo, ou seja, sofreram alterações conforme postuladas nas ações protocoladas, ou seja, suas posições favoreceram o meio ambiente,  são elas: a) as que tratam sobre preservação de florestas no entorno de nascentes e olhos de água; b) das APPs para interesse social de baixo impacto ambiental; c)  nascentes e olhos de água intermitentes ou perenes.
Agora, os ministros não abriram mão dos seguintes itens: a) as medições das APPs dos leitos dos rios, que deverão partir do leito regular médio e não do leito da época da cheia. Trazendo esse tópico para o município de Araranguá, as áreas inundáveis seriam consideradas APPs, ou seja, toda a extensão de terra às margens do rio Araranguá, contendo trechos mais largos e outros mais estreitos; b) permissão de projetos habitacionais em áreas de mangues e restinga com função ecológica comprometida. Embora o município de Araranguá não possua um bioma específico de mangue, a vegetação de restinga é predominante em toda a sua faixa costeira. Com o projeto Orla concluído e também com a homologação das UCs, essas áreas, teoricamente, estarão livres da ocupação por projeto habitacionais. Entretanto, a descaracterização contínua desse ecossistema, supressão de variedades endêmicas ou inclusão de espécies exóticas, abrirão precedentes para a inserção de projetos de elevado impacto ambiental.     
Outros itens julgados e deferidos pelos ministros também são vistos com retrocessos ambientais, seguindo a lista: c) dispensa de APPs em alguns tipos reservatórios de água para abastecimento e produção de energia, abstendo até de recuperar aquelas desmatadas. Quanto a esse ponto, acredito que o mesmo comprometerá vários reservatórios importantes de abastecimento potável, que poderão ter suas margens ocupadas por projetos de infraestrutura e com enormes impactos devido a redução das recargas em períodos de estiagem. Que sirvam de exemplo as crises de abastecimento de água na cidade de São Paulo em decorrência da redução do volume de água dos reservatórios.
A degradação das APPs é um dos inúmeros fatores; d) plantação em várzea em pequenos imóveis rurais. Essas áreas são geralmente berçários de espécies da fauna e sua interferência pode comprometer a qualidade do solo e dos recursos hídricos. e) as atividades de aqüicultura em APPs, imóveis rurais pequenos e médios também são permitidas. Alegam os ambientalistas e pesquisadores que essa atividade poderá comprometer os ecossistemas pelo fato de serem utilizadas componentes químicos que contaminarão os recursos hídricos e o próprio solo. f) desmatamentos realizados depois de 2008, não pode mais desmatar enquanto não recuperar a área destruída, porém, quem suprimiu anterior a essa data não tem a mesma restrição.
Tanto as entidades científicas, ambientalistas e os produtores rurais que sempre prezaram pelo cumprimento às leis ambientais, alimentam a mesma opinião, o dispositivo favorece quem agiu ilegalmente durante décadas, enquanto aqueles que cumpriram rigorosamente as regras tiveram perdas econômicas, pois deixaram de produzir para preservar, nem mesmo tiveram seus IPTRs (Imposto Predial Territorial Rural) isentados de pagamento.  g) atividades econômicas em encostas com declividade de 45 graus ou topos de morros. Quase todos os dias os noticiários dos telejornais apresentam reportagens divulgando deslizamentos de encostas, quedas de barreiras com vítimas fatais. É visível que todo esse problema é decorrente de atividades agrícolas e ocupações em áreas consideradas de riscos, cujo solo, sem a presença de uma vegetação fixadora, torna-se suscetível às erosões e enxurradas.  h) nas áreas com declividade de 25 a 45 dispensa o reflorestamento.    
Quanto a RESERVA LEGAL questionadas pelas ADIs, todos os oito itens pontuados na ação foram negados pelo supremo. Portanto, mantém-se a redação original do código que versa o seguinte: a) redução de RL de 80 para 50 nos municípios onde há 50 por cento de área ocupada por UCs ou terras indígenas homologáveis; Tendo em vista a fragilidade nas gestões na maioria das UCs (Unidades de Conservações) espalhadas na região da Amazônia Legal, muitas das quais, com sérios problemas de descaracterização por ações atrópicas, a redução do percentual de RL, sem uma fiscalização devida, tende a reduzir ainda mais as áreas de florestas.  b) a decisão do Supremo também dispensa a exigência de RL para hidrelétricas, rodovias e hidrovias, bem como não obriga a recuperação dessas áreas desmatadas.
Seguindo a tendência dos governos neoliberais que insistem em manter um programa desenvolvimentista predatório, a exemplo de projetos como a hidrelétrica de Belo Monte, tudo leva a crer que haverá o agravamento dos passivos ambientais especialmente nas regiões de forte expansão da fronteira agrícola, onde projetos associados estão sendo articulados e de impactos ambientais incalculáveis.  c) a dispensa da compensação ambiental por desmatamento ilegal no mesmo bioma estimulará a prática de infrações generalizadas por todo o território. O cidadão poderá a título de compensação por ato infracionário, adquirir área equivalente à desmatada, independente de ser no mesmo bioma. No caso de Araranguá, o código permite, não havendo área com floresta similar à suprimida ilegalmente, para compensação, poderá adquirir outra, quem sabe no costão da serra geral ou outro bioma distinto, cujo efeito ambiental compensatório ao ecossistema agredido, é nulo.
O código ambiental de 1965 determinava que para efeito de validade, RL só era reconhecida quando fosse comprovada a exclusiva presença de espécies nativas endêmicas ao bioma específico. Com a decisão de que: d) valerá o reflorestamento com espécies exóticas como recompensa de RL (Reserva Legal) suprimidas, não tardará para que eucaliptos e pinos dominem por completo todos os ecossistemas, com impactos irreversíveis ao solo, recursos hídricos, a fauna e a flora nativas.   Quem ousar fazer, usando o aplicativo Google Earth, um rastreamento da extremidade sul de santa Catarina, perceberá que o percentual da cobertura vegetal original é quase inexistente. No entanto, comparando imagens mais antigas com as atuais, irá notar o aumento vertiginoso de áreas ocupadas com agricultura especialmente a rizicultura. É possível também perceber algumas poucas manchas verdes nas imagens, ou são remanescentes de APPs em rios, lagos ou topos de morros, ou áreas de RL protegidas por produtores rurais que seguiram o que determinava o código florestal.
Agora quando se lê a nova redação do código florestal, como o item referendado pelo STF, onde assegura: e) permissão para o cômputo de APP no percentual da RL e continuidade das atividades agropastoris em RL onde ocorreram desmatamentos irregulares anteriores a 2008, aumenta a certeza de que vivemos num país do faz de conta e da impunidade. Se quase 80% dos produtores rurais brasileiros cometeram algum crime ambiental, é claro que deveriam ter sido interceptados pelos órgãos fiscalizadores e punidos sansões estabelecidas pela legislação. Utilizar APPs como computo para atingir o percentual das RL é uma medida um tanto descabida para livrar o produtor infrator do crime ambiental cometido. A lei diz que para o produtor infrator ser beneficiado, a APP deve estar conservada ou em processo de recuperação, bem como o proprietário ter requerido inclusão do imóvel no (CAR). Isso não é obrigação de todos os produtores, segundo o código florestal?
Por fim, foi julgado o quesito mais polêmico de todos, o trata da ANISTIA ÀS MULTAS, que isenta os desmatares de pagamento de multa. Dos quatro pontos presentes nessa ação, um apenas obteve a aprovação da corte, foi o que autoriza a extensão de benefícios legais para pequenos imóveis rurais às áreas de comunidades rurais tituladas e não tituladas. Isso inclui áreas quilombolas e indígenas que terão o mesmo regime de proteção da vegetação.   O que causou estranheza no módulo anistia foi a posição dos ministros em anistiar ou absolver de multas, aqueles que desmataram irregularmente, condicionando-os a se inserirem nos Programas de Regulação Ambiental (PRA). Outra vez, vale ratificar, que essa decisão é um verdadeiro ataque aos princípios básicos da ética e da justiça, uma porta aberta à perpetuação das infrações ambientais no campo e a fragilização de ecossistemas inteiros com o desaparecimento definitivo de espécies da fauna e flora.
Se o item anterior, ratificado pelo STF, que trata sobre a anistia aos desmatadores pós-aprovação do código, condicionando-os a se inserirem no programa de regulação ambiental, já é um absurdo, o que dizer então desse item assim descrito: dispensar a recuperação de RL desmatadas até julho de 2008, bem como recuperar APPs de corpos de água, de acordo com o tamanho do imóvel. Se na decisão anterior o impacto dos crimes cometidos em RL posterior a 2012, poderá ser minimizado através da inclusão no PRA, como explicar para as futuras gerações o motivo pelo qual os ministros do STF levaram a concordar com um dispositivo que dispensa de recuperação milhões de hectares de terras ocupadas por florestas protegidas.  
O Código Florestal, portanto, se configurará em mais um documento com pouco ou nenhum poder de decisão, pois prevalecerão acordos, barganhas políticas, negociatas, etc. Lembram das manobras articuladas pelo atual presidente junto à bancada ruralista para se livrar das acusações de envolvimento em irregularidades na operação lava-jato. Afrouxamento de resoluções sobre agrotóxicos proibidos, anistia de dívidas com a previdência e até mesmo limitar a ação fiscalizadora do estado, fizeram parte do pacote de acordos que deram ou darão mais soberania ao agronegócio para continuar destruindo as florestas.
Prof. Jairo Cezar