terça-feira, 22 de março de 2022

 

INDIVISIBILIDADE DE SERGURANÇA Dos PAÍSES: TODOS TEMOS QUE NOS SENTIR SEGUROS

Penso que muitos quando lerem o título desse texto ficarão um tanto quanto desconfortáveis em saberem que está no termo indivisibilidade a causa do conflito na Ucrânia. É claro que nenhum veículo de comunicação de massa ocidental fez nesses quase trinta dias de conflito  menção responsabilizando de maneira incisiva a OTAN ou os Estado Unidos pela tragédia que se abateu sobre milhões de ucranianos/as. Mais uma vez insisto na tese, se fizermos uma enquete do conflito naquela região, para saber  quem são de fato os vilões e os mocinhos, a resposta certamente será unânime, recaindo ao presidente Russo o homem  mais odiado do planeta.  

Para entender o conflito é importante primeiro compreender o cenário geopolítico da região desde antes do fim da guerra fria. Estado Unidos e URSS sempre estiveram no centro de disputas de hegemonia geopolítica desde o final da segunda guerra mundial. Na tentativa de conter uma possível invasão comunista no ocidente, pós segunda guerra, foram acordadas entre as principais naçõeeuropeias formas de proteção e ajuda mutua. Esse organismo de proteção foi chamado de OTAN (Organização do Tratado do Atlântico Norte). Entretanto com o fim do Pacto de Varsóvia, ou seja, fim da URSS, o ocidente ou o capitalismo se configurou como modelo econômico hegemônico sobre as regiões de influência da ex-União soviética. 

Cabe lembrar que a queda do muro de Berlin ou a supressão da URss se deu a partir de acordo assinado entre Mikhail Gorbatchev e integrantes da OTAN/EUA. Dentre as tratativas estavam a permanência da OTAN como organização de ajuda militar, porém, estando proibida de a expansão em direção leste.  Diante da derrocada comunista, a Rússia passou por um  processo extremo de desestruturação econômica impulsionada pelas políticas neoliberais. Um país economicamente arruinado, somada a uma população moralmente fragilizada permitiu que  o ocidente  ampliasse seu  domínio sobre essa região e o resto do mundo.

Com o início da era Putin, a partir de 2000, o orgulho russo passou a ser reconquistado frente de uma política de recuperação econômica. Paralelamente no lado ocidental os Estados Unidos estavam declarando guerra ao “terrorismo”, cujo inimigo não era os comunistas soviéticos, mas governos ou grupos terroristas que ameaçavam o domínio americano e ocidental sobre importantes reservas de petróleo e rotas comerciais no Oriente Médio. Com o argumento de dissolver ditaduras e restabelecer a democracia no Iraque, com a deposição de saddam Hussein, os EUA tomou decisões infringindo protocolos da ONU.

Milhares de cidadãos iraquianos foram mortos nos ataques, porem, a democracia jamais foi implantada, pois até hoje o pais é governado por presidentefantoches dos EUA. Outro detalhe importante. Foi mentirosa a alegação do governo americano de ter declarado guerra ao Iraque alegando que Saddam Hussain possuía fábricas de armas químicas de destruição em massa. Os ditos depósitos ou fábricas jamais foram encontrados.   Além do Iraque, o Afeganistão também foi ocupado pelo exército norte americano, também com a alegação de prender terroristas e levar paz à região. O primeiro ato que mais tarde reverberaria no conflito na Ucrânia foi a incorporação da República Checa, Hungria e a Polônia à OTAN. Lembram  sobre o documento assinado entre os Estados Unidos e lideres da antiga União soviética, acordando acerca da indivisibilidade de segurança dos países, para que todos se sentissem seguros?

Então, a incorporação dessas nações do leste europeu foi interpretada pela Rússia como ato de traição do ocidente. Entretanto, as incorporações de novos países do leste não cessaram. Em 2004, 2009, 2017 e 2020, mais 12 ou treze países passaram a fazer parte do seleto grupo de integrantes da OTAN e que  poderiam receber bases militares. Outros documentos disponíveis para consulta confirmam que a preocupação dos  EUA deixou de ser no combate do terrorismo, mas com o continuam avanço de potências econômicae militares como a China e a Rússia.  

Frente ao avanço da OTAN sobre suas fronteiras, a Rússia destina fatias expressivas do PIB na reestruturação do exército, tornando-se mais tarde um dos mais equipados do mundo. No entanto o epicentro ou a gota d’água da ocupação Russa à Ucrânia foram mudanças ocorridas na constituição do país que garantia  sua integração a OTAN.

Não correlacionar ou contextualizar esses e outros fatos impede que se teça  ligações desse emaranhado fio condutor dos conflitos. Mais de 90% da população do ocidente vê o conflito na Ucrânia a partir de um viés ocidental. Notícias, imagens são meticulosamente filtradas por organizações que controlam as mídias ocidentais. Afinal o que foi tratado de Varsóvia? Do mesmo que o ocidente criou a OTAN em 1949, uma organização militar de ajuda mutua envolvendo 15 países, em 1955 foi a vez da URSS firmar o pacto de Varsóvia.  Seguindo a mesma linha da OTAN, o pacto de Varsóvia contaria com 7 países participantes, todos do leste da Europa.  

Forjar bandidos e mocinhos sempre foram estratégias bem sucedidas das mídias, em especial da poderosa máquina cinematográfica holywoodiana. Muitos devem lembrar-se de filmes que conduziram milhões de pessoas aos cinemas nas décadas de 80 e 90 como Rambo, Braddock e, outros tantos, protagonizados por figuras emblemáticas enfrentando  espiões comunistas soviéticos, guerrilheiros viatcongs, traficantes sul americanos, terroristas muçulmanos, etc. No final das seções  os expectadoresaiam  aliviados satisfeitos com os  desfechos vitoriosos do "bem", EUA, contra o "mal", todos que atentassem contra as "democracias e as boas condutas". 

O episódio na Ucrânia não é diferente. O erro já tem início quando a imprensa ocidental insiste em construir o conceito equivocado de a "Guerra de Putin". De virtuais bandidos, OTAN – EUA, são forjados como heróis. Mais uma vez insisto em reafirmar minha posição contrária às  guerras, inclusive aos bombardeios do exército Russo contra  civis ucranianos. No entanto, não é conveniente somente Putin responder por tais atrocidades. O ocidente, OTAN em especial, também deve ser responsabilizada por essa tragédia humanitária. A expansão da OTAN às portas da Rússia, tem por objetivo frear o súbito avanço econômico dessa e da China sobre o ocidente e o leste asiático.  

Tanto a instalação de bases militares nos novos territórios integrados a OTAN como a distribuição de armamentos à população ucraniana fazem parte desse jogo sujo que beneficiará a indústria bélica Norte Americana. Fato semelhante ao conflito na Ucrânia aconteceu na primeira e segunda guerra mundial. Além de fornecedor de armamentos aos aos  aliados durante os dois conflitos, os Estados Unidos também financiaram a recuperação das nações destruídas através do plano Marshall.

Quem acompanha os desdobramentos da ocupação do território ucraniano pelo exército russo percebe que a atuação do ocidente, principalmente dos Estados Unidos são bem discretas na busca de soluções imediatas para por fim ao conflito. A impressão é deixar que o conflito siga com o intuito   de cozinhar o presidente Putin em banho maria, forjando uma espécie de  histeria coletiva contra ele e aos seus liderados.

Penso que a Rússia jamais engoliu o ônus de ter protagonizado a derrocada nazista, tendo sido o bônus dessa ação   capitalizada pelo ocidente. O que é verdadeiro é que foi o exército soviético que protagonizou uma das maiores derrotas ao exército nazista em stalingrado, sendo o prenuncio do fim do conflito.  Essa batalha abriu caminho para que os soviéticos chegassem primeiro a capital Berlin, fato que levou ao suicídio de Hitler. Para concluir, penso que a ocupação russa na Ucrânia deve estar sendo conduzida pela população daqueles pais como uma catarse frente às injustiças proporcionadas pela história.

Prof. Jairo Cesa         

segunda-feira, 14 de março de 2022

 

PITAYA/FRUTA DRAGÃO: O DRAMA BATE A PORTA DE CENTENAS DE FAMÍLIAS ENVOLVIDAS NESSA ATIVIDADE NO SUL DE SANTA CATARINA

Em 2016, três anos ante de encerrar a carreira de professor da rede estadual de ensino, decidi com meu irmão ingressar no cultivo da pitayas, fruta ainda desconhecida por expressiva parcela da população.  A decisão foi concretizada quando visitamos uma plantação pioneira no município de Turvo. Na época havia na região poucos produtores que abandonaram o cultivo do tabaco e do maracujá. A expectativa naquele momento era cultivar poucos pés, pois havia dúvida quanto à adaptabilidade ao solo arenoso. Sendo assim pouco mais de 200 pés foram plantados.

Com um manejo não muito eficiente, no ano seguinte foram colhidas as primeiras frutas do pomar, na sua maioria da variedade branca comum, na qual exigia polinização manual.  Já no terceiro ano de cultivo, uma quantidade maior de frutas foi colhida, no entanto, já surgiam no horizonte os primeiros sinais de um futuro pouco promissor com essa cultura, podendo resultar em graves crises de comercialização a exemplo do maracujá e do tabaco.

Na safra 2019/2020, a região sul de Santa Catarina já liderava o cenário catarinense com mais de 90% de toda a produção no estado. Entretanto, mesmo com tanta pitaya disponível muita gente jamais havia experimentado ou ouvido falar. Outro agravante era o fato de o preço pago pelo quilo da fruta não ser muito convidativo às populações menos abastadas. Com uma produção mais expressiva nessa safra, começávamos a sentir na pele o mesmo drama vivido por milhares de agricultores familiares, submetidos à perversidade do mercado, da ganância dos atravessadores e  

O que muitas das dezenas de famílias de produtores/as de pitaya não esperavam era de que no inicio de 2020 o planeta fosse acometido por uma pandemia, matando milhares de pessoas e devastando as economias globais. Os efeitos nefastos do COVID 19 foram sentidos na região sul catarinense, com a redução significativa da demanda pela fruta. Muitos produtores/as como foi e é o meu caso, que não estavam ainda integrados as cooperativas, foram forçados/as a entregar as frutas aos atravessadores/as pagando preços ridículos. Criar novas estratégias para obter melhor produtividade e preços justos passou a uma das principais metas àqueles/as que ainda acreditavam nessa atividade.  

Para aumentar a demanda pela fruta era necessário divulgá-la, fazer com que chegasse a mesa de uma parcela maior da população. Pressionados/as pelos/as atravessadores/as e o mercado, muitos dos produtores tinham que colhê-las ainda na sua fase de maturação incompleta. Por ser uma cactácea, a pitaya quando colhida, seu processo de maturação é cessado. Aqui está o problema. Por estarem os maiores mercados consumidores localizados na região sudeste, São Paulo, Rio de Janeiro, o fruto consumido têm um grau de acidez elevada, pouco adocicada.

Nesse sentindo, quem nunca comeu ou vai experimentar pela primeira vez, irá rejeitá-la para sempre. Diante desse agravante relacionado ao manejo da fruta e a crescente oferta, era urgente criar caminhos alternativos para não abandonar a atividade. Melhorar o processo produtivo visando colher fruta de excelência, bem como investir em publicidade passou a ser quase uma obsessão. Na safra 2020 e 2021, ainda sobre os efeitos nefastos da pandemia, mais de 50% do que produzimos no Sítio Cesa, Canjiquinha/Araranguá, foram comercializadas no próprio município, atendendo pequenos mercados e entrega a domicílio, com preços bem convidativos.

Em 2021 aumentamos um pouco a área de cultivo, inserido espécies diversificadas auto-férteis, variedades que dispensariam a polinização das flores manualmente. A presença permanente de um profissional da EPAGRI foi e continua sendo fundamental na vida dessas famílias que ingressaram no cultivo dessa fruta, conhecida como Fruta Dragão. Por ser uma fruta extremamente sensível, requer muito cuidado no manejo do solo, no controle de doenças e ataques de insetos oportunistas.

Muitos produtores da região adotam o manejo orgânico, ou seja, dispensam o uso de agrotóxicos ou outras práticas que possam reduzir a qualidade nutricional da fruta. Com o ritmo acelerado da vacinação contra o COVID cada vez mais as expectativas eram que o começo safra 2021/2022 a vida das dezenas de famílias que lidavam com fruta na região sul teriam certo alento.  Corrigir a acidez do solo com calcário, inserir adubação verde, etc, fez com que as plantas adquirissem boa capacidade nutricional, aptos a produzirem frutos robustos e saudáveis. 

Além da melhoria no solo, um sistema de captação de água da chuva foi instalado. Junto com uma caixa d’água com capacidade de três mil litros, mangueiras com gotejamento foram distribuídas em todo o pomar. Finalizada a instalação dos equipamentos no início de dezembro de 2021 era só esperar as chuvas para irrigar o pomar. A surpresa foi que desde a instalação dos equipamentos, até o final de fevereiro, foram uma ou duas vezes que choveu o suficiente para encher a caixa d’água.

Embora a pitaya seja uma cactácea que armazena bastante água em suas folhas/cladódios, a falta do líquido comprometeu o desenvolvimento da fruta em quase todos os pomares da região que não adotaram esse ou outro sistema de irrigação. No meu caso, o que ajudou de modo paliativo, foi à água captada de um pequeno açude no sitio, no qual minimizou os impactos da forte estiagem histórica e o calor escaldante que se abateu sobre a região nos meses de janeiro e fevereiro de 2022. Essa anomalia climática afetou profundamente o ciclo natural da planta e dos frutos.

Entretanto, mesmos com as adversidades do tempo, a expectativa era que a oferta de Pitaya seria enorme, que o problema da comercialização se repetiria.   Já na primeira colheita do fruto, visitando alguns mercados da região que comercializavam a fruta já com preços muito baixos, era um mau prenúncio que estaria por vir. Com uma segunda florada excepcional em toda região produtora, a expectativa de que a oferta da fruta dobraria em relação ao ano anterior. Ajudada pela irrigação e o reforço com adubação orgânica, as mais de três mil frutas no pomar iniciavam seu processo de maturação com um grau satisfatório de tamanho e beleza estética. Isso não foi regra para outros pomares afetados pela estiagem, cujos comentários eram de que os frutos tiveram relativa redução de tamanho e qualidade.

Na primeira florada, o técnico da EPAGRI me incentivou a fazer o ensacamento de algumas frutas usando tecido TNT para avaliar os resultados. Tanto para ele quanto para outros produtores que aceitaram o desafio, os resultados apresentados seriam importantes para o futuro da fruta. Tendo sido ensacadas mais ou menos 70 frutas, a conclusão que se chegou foi que essa técnica apresentou resultados bem satisfatórios, principalmente no seu aspecto estético. Querendo repetir o experimento, na segunda florada preparei cerca de 500 saquinhos, confeccionados também com tecido TNT.

As frutas foram cobertas quando houve os descartes dos restos florais, ou seja, seis ou sete dias depois da floração.  Na revelação dos resultados, o técnico da EPAGRI e eu elaboramos um vídeo com explicações detalhadas dá técnica. Na retiradas dos saquinhos ficamos surpresos, pois os resultados foram além das expectativas. No lugar de respostas, o que mais tivemos foram dúvidas sobre os muitos aspectos observados nesse ensacamento. Decidimos que na próxima safra faremos convites aqueles/as que queiram desenvolver alguma pesquisa de TCC o Estrito Senso no pomar para que os dados possam ser avaliados com cientificidade.   

Foi notório perceber que a coloração rosa da casca foi muito mais expressiva que as não ensacadas, bem como a baixa presença de material gelatinoso na polpa. Segundo o técnico Ricardo Martins - EPAGRI, o aspecto extremante rosado da casa se deve a elevada presença de ANTOCIANINA. Acredita-se que os saquinhos devem ter criando um micro clima na fruta, cuja incidência da luz e temperatura assumiu proporções distintas daquelas não ensacadas. Concluída essa etapa de experimento, inicia os preparativos para a colheita.

O fantasma que passou a perturbar meu sono e de tantas outras famílias da região era como seria a comercialização, haveria mercado para tanta oferta de frutas? Antes de dar início colheita era preciso contatar com os compradores/atravessadores e ver a viabilidade de fechar negócio. O pânico começou a tomar corpo quando todos os contados as respostas foram negativas. As frutas não esperavam mais, ou se colhia na expectativa de que se pudesse fechar negócio mais tarde ou deixava tudo no pé evitando um estresse posterior. A decisão foi colhê-las sob um sol escaldante que superou os 40 graus no interior do pomar.

Colhê-las uma por uma, com bastante cuidado, acondicioná-las em caixas, transportá-las em carretinha e depositá-las sob árvores se tornou uma exaustiva rotina por quase uma semana ininterrupta. Infelizmente no galpão construído no sitio não apresentava condição apropriadas para o acondicionamento das frutas no seu interior. Já na metade da colheita recebi ligação de um comprador interessado nas frutas, porém os preços oferecidos eram irrisórios.

Naquele momento não havia alternativa, ou se entregava ao comprador ou a produção estaria completamente perdida.  O fato é que o atravessador enfrentava problemas que passou a ser comum nos últimos tempos, negociar fretes com os caminhões que transportariam os produtos.  Desde o instante que fechei o negocio, até o carregamento definitivo no caminhão se passaram quase cinco dias. Não podendo deixar no interior do galpão do sítio devido às altas temperaturas, um das saídas foi instalar uma lona para proteger as caixas das insistentes chuvas que se abateram sobre a região nos finais de tarde.

Nesses cinco dias de incertezas, cerca de mil quilos de frutas foi descartada, a maioria pesando acima de 800 gramas. Vendo as frutas se degradando e não sabendo o que fazer com as mesmas, decidiu doá-las as entidades assistenciais do município. A pitaya, no momento que um pequeno abscesso aparece na casca, é só retirá-lo com uma faca e estará apta para ser consumida. Foi exatamente o que fiz os quase mil kg descartados foi doada a Casa da fraternidade; Asilo São Vicente da Paulo; Casa Lar Irmã Carmem; Centro de Recuperação Casa do Oleiro; Escola Madre Regina; fazenda São Jorge; Escola Municipal Luiza Scaíni, em Arroio do Silva e Creche municipal Morro dos Conventos.

Finalmente, quarta feira, nove de março, contratei um pequeno caminhão frete onde transportamos todas as caixas até o deposito da empresa compradora, no centro da cidade. No mesmo dia todas foram pesadas e acondicionadas em outras caixas, embarcadas no caminhão e transportadas para São Paulo. Vendo as dificuldades logísticas da empresa, me pré dispus a ajudá-los na organização do produto, separação, pesagem e no embarque.

A expectativa anterior de uma excelente safra, facilidade de vendas e renda razoável capaz de cobrir dos custos na produção caiu por terra. O que me distingue dos demais produtores envolvidos no cultivo de pitaya é o fato de não depender exclusivamente dessa ou de outra atividade agrícola para sobreviver. Embora sendo filho de agricultor e com anos de experiência na roça, por quase 40 anos fui professor na rede publica de ensino do estado de Santa Catarina.

O drama vivenciando por mim nos últimos anos como produtor agrícola é o mesmo vivido pelos meus pais e centenas de outros pequenos agricultores no passado. Na época, lembro que dedicávamos ao cultivo de culturas diversas: milho, amendoim, batata doce, feijão, cebola, mandioca, arroz, trigo, criação de suínos, aves, produção de leite, queijo, ovos, etc. Esse conjunto de atividades dava certo alento ao agricultor e sua família nos momentos de crise. 

O fato era que diante dessa diversidade de culturas sempre havia aquela considerada o suporte econômico das famílias, ou seja, produzido em maior escala com maior renda econômica. Dentre elas estavam o tabaco e a cebola. Tanto o tabaco quanto a cebola, os agricultores ficavam submetidos às cruéis regras do mercado, que auferiam preços ridículos no momento da compra.

O cultivo da cebola, porém, era o segmento mais perverso. Quase todos os agricultores da região cultivavam o produto, porém no momento da venda ficavam reféns a um pequeno cartel de compradores/atravessadores que ditavam as regras do jogo econômico. Geralmente o produto era colhido em quantidade significativa e com boa qualidade, porém ficavam depositado vários dias em paios pouco ventilados.  De 30 ou 40 toneladas colhidas, quando eram carregadas em caminhões 30% ou 40% eram descartadas por apodrecimentos. O mais dolorido era o valor pago pelo produto, 040 a 050 centavos/kg. O prejuízo era minimizado pelo fato de todo o processo produtivo ter sido realizado pela própria família. Gastos com insumos, adubos, implementos agrícolas, empregados eram irrisórios, impactando menos os prejuízos. 

Anos após anos pequenos agricultores vinham sendo sufocados pelas frágeis políticas públicas do setor. Era comum, na época, pequenos agricultores adquirirem financiamentos de bancos públicos para gerenciar seu negócio. Com as permanentes dificuldades de manter os filhos trabalhando no campo, paulatinamente muitos agricultores se desfizeram de suas propriedades, muitas vezes entregando aos bancos para o pagamento das dívidas. Dar-se início, portanto, uma debandada de famílias do campo às cidades, formando um cinturão de despossuídos, transformados em exército de mão de obra barata disponível ao capital. Antes reféns dos atravessadores, agora se tornam reféns do dono da fábrica, do comerciante, que vêem uma grande oportunidade de elevar os seus lucros.

Atualmente quem fizer um tour pelo interior de Araranguá irá se surpreender com as poucas famílias que ainda lá permanecem. Se compararmos o mapa atual da região com imagens captadas há quadro ou cinco décadas o visual é completamente outro.  Locais onde antes havia aglomerados de famílias, florestas e culturas diversas, deram lugar a campos cobertos de arroz irrigado. Quem permaneceu no campo, tenta se adaptar aos novos métodos produtivos impostos pelo mercado, como o uso de sementes modificadas e insumos químicos. Entretanto sofrem na hora de comercializar, tendo que concorrer com redes de supermercados cujos produtos vendidos são oriundos de outras regiões.

O meu retorno ao campo depois de quase cinquenta anos ausente fez despertar um terrível fantasma que atormentou a minha e outras centenas de pequenos agricultores. A sensação era de estar vivendo fatos ocorridos há mais de quarenta anos. Quem ainda resiste e insiste permanecer no campo, luta cultivando alguns produtos aproveitando nichos comerciais locais. A adoção de técnicas alternativas como o cultivo orgânico vem demonstrando ser bem promissor.  Outra estratégia pouco explorada e com baixa demanda são as feiras de produtores familiares. Infelizmente parte da população não desenvolveu o hábito de consumir produtos vindos diretamente do campo, preferindo os supermercados.

A participação do poder público, associações de agricultores e sindicatos deve ser o caminho a ser trilhado, visando criar instrumentos políticos que estimule a população a adquirir produtos produzidos localmente. O uso das novas tecnologias disponíveis como as redes sociais, vem se configurando como uma excelente estratégia de venda a domicilio. Uma população mais consciente e exigente ajuda bastante na dinamização dessas novas práticas de produção e venda.

Em 2021 e 2022 investi pesadamente nas redes sociais para poder vender meu produto e com extraordinário sucesso. Por ser uma área pequena, mais de 50% das frutas foram entregues diretamente ao consumidor, auferindo preços mais convidativos que os oferecidos pelos atravessadores. Criar grupos seletos de consumidores e investindo pesadamente na qualidade do produto oferecido garante uma rentabilidade satisfatória às famílias envolvidas no campo.

Prof. Jairo Cesa