sábado, 24 de fevereiro de 2018


ADMINISTRADORES PÚBLICOS MUNICIPAIS DESCUMPREM METAS E ESTRATÉGIAS  DO PNE (PLANO NACIONAL DE EDUCAÇÃO) TERCEIRIZANDO A EDUCAÇÃO INFANTIL

Enquanto muitos países vinculados a OCDE estão a cada pesquisa lançada pelo PISA apresentando ou mantendo melhorias significativas na educação e alcançando as primeiras posições no ranque internacional em qualidade educacional, o Brasil segue o caminho inverso, declinando e perdendo posições a cada avaliação realizada. O motivo desse retrocesso não deve ter como justificativa as legislações em curso que demonstram ser inovadoras e que certamente colorariam o Brasil entre os primeiros da lista dos mais desenvolvidos. Onde está, portanto, o problema? Sem dúvida o imbróglio está na base da estrutura, ou seja, nos pilares da formação da sociedade brasileira. Enquanto que em muitas sociedades a educação sempre foi compreendida como algo intrínseco a existência humana, ou seja, prioridade das prioridades, no Brasil, ao contrário, a educação é concebida como elemento secundário à existência humana.
Para provar que a educação no Brasil está a anos luz do ideal basta comparar os salários pagos aos professores que atuam no ensino básico aqui com os dos países melhores classificados no ranque internacional. São estratosféricas as diferenças salariais.  Agora, outro quesito determinante para o bom desempenho nos processos avaliativos desses países são os investimentos públicos em educação básica, especialmente no ensino infantil e fundamental, cujos profissionais envolvidos são todos mestres ou doutores. São centenas, milhares de pesquisas desenvolvidas no mundo que comprovam que partes importantes do cérebro responsáveis pela inteligência são estimuladas até os sete anos de idade.
Se até essa fase a criança obtiver o acompanhamento de profissionais altamente competentes, nas etapas subseqüentes da sua vida estudantil basta apenas aprimorar suas competências. Esse seria um dos motivos do empenho dos governos em construir legislações para convergir maior fatia de recursos à educação infantil. O modelo Finlandês de educação é um bom exemplo para o Brasil onde mostra que quanto mais preparado e remunerado for os/as profissionais, em todos os níveis, os resultados aparecem imediatamente no conjunto da sociedade. Enquanto aqui o que vê é administradores públicos terceirizando creches e contratando estagiários com remunerações ridículas para trabalhar com crianças, na Finlândia, as escolas de ensino infantil, a legislação exige que todo profissional contratado tenha o nível mestrado para exercer a função docente.
 Quando pensávamos que a LDB poderia ter realmente avançado no quesito universalização do ensino básico brasileiro, nos deparamos com dispositivos da legislação como o art. 62, sobre a formação de docentes, com a seguinte redação: para atuar na educação básica far – se á em nível superior em curso de licenciatura, de graduação plena, em universidades e institutos superiores de educação, admita para formação mínima para o exercício do magistério na educação infantil e nas quatro primeiras séries do ensino fundamental, a oferecida em nível médio, na modalidade normal. Observaram o equívoco cometido pelos protagonistas da legislação? É claro que não podemos desmerecer a competência de muitos desses profissionais de nível médio que atuam nas séries iniciais.
 Mas, diante do desafio de lecionar em uma das fases mais complexas das etapas do desenvolvimento humano, ter o nível médio (magistério), como única formação, é muito pouco. Imagine agora estagiários/as atuando com crianças, talvez sem qualificação mínima para a função. O que esperar dessas crianças no futuro, quando se tem administradores com os olhares tão limitados acerca da educação. Na realidade a concepção de educação infantil para tais administradores é a mesma de milhares de brasileiros que têm as creches ou centros de educação infantil como espaço de “recolhimento” de crianças durante as horas que estão trabalhando. Não conseguem vislumbrar que nesses ambientes as crianças são ou deveriam ter suas capacidades e habilidades cognitivas, afetivas e psicomotoras estimuladas, como pré-requisitos necessários às etapas subseqüentes de suas vidas.
Outro olhar equivocado dos administradores públicos sobre a educação é querer admitir que educação é despesa e não investimento. Quanto se discute investimento o foco não está no resultado imediato como se fosse à pavimentação de uma rua, limpeza pública, etc. Geralmente são anos de muito trabalho, dedicação, cujos reflexos somente serão observados depois de uma ou duas gerações. Na Finlândia, a revolução na educação teve início no começo da década de 1970, depois de longa estagnação econômica.  No Brasil, os administradores públicos resistem em contratar profissionais concursados e habilitados para as escolas para não gastar.
O município de Araranguá serve de exemplo de como caminhar para traz na educação. Segundo a vice-presidente do Sindicato dos Municipários de Araranguá, em relação ao imbróglio envolvendo a terceirização das creches no município, sua resposta foi à seguinte: “O Município possui profissionais concursados e plenamente capacitados para trabalhar na rede pública municipal de ensino. Não é necessário fazer a terceirização deste setor (ensino infantil). Educação é investimento, não despesa”, adverte a vice-presidente do SINDMA, Simone Zilli.         
Sobre os salários, na Finlândia a remuneração média de um/a professor/a que leciona em escola infantil ou fundamental é o equivalente a 11 mil reais mensais. No Brasil, em meados de 2014, o provento médio de um/a professor/a de nível básico pouco superava os 2. 700 reais mensais. É claro que nesses países as taxas tributárias cobradas pelo Estado são as mais elevadas do mundo. Somente a Finlândia, o percentual de impostos cobrados pelo Estado alcança os 51% do PIB. O fato é que a população pouco reclama, pois sabe que tais tributos arrecadados são aplicados rigorosamente em prol da sociedade. No Brasil, além do pífio percentual do PIB investido em educação, menos de 5%, parcela significativa desse montante não chega ao chão da escola, perdendo-se no ralo da burocracia e da corrupção generalizada.
De acordo com as novas legislações em vigor no Brasil, o PNE (Plano Nacional de Educação) estabelece, entre outras obrigações, que até 2024 o percentual do PIB para a educação alcance os 10% do PIB. De acordo com a atual conjuntura política, dificilmente os governos das instâncias federal, estaduais e municipais, cumprirão definitivamente com as 20 metas e mais de 250 estratégias contidas nos planos nacional, estaduais e municipais de educação. Muitas dessas metas e estratégias já tiveram seus prazos expirados há algum tempo. A expectativa do plano era tentar reverter um problema quase crônico da educação brasileira, a inexistência de um programa político estratégico para alavancar sua qualidade.
Em âmbito de Araranguá, em Junho de 2015, o plano foi aprovado por unanimidade na câmara de vereadores. Nesses quase três anos de vigência do Plano, o poder público municipal não cumpriu com metas e estratégias prioritárias como a universalização da educação infantil, bem como ampliar a oferta de espaços adequados de forma a atender, no mínimo, 70% das crianças de até três anos até o final da vigência deste plano.
O que é pior, a atual administração vem tomando medidas que se contrapõe ao próprio plano municipal de educação. Dente elas o que estabelece entre as vinte metas o atendimento da demanda de estudantes do nível infantil e a contratação de profissionais qualificados para o exercício da função docente. Nos dois anos a frente do executivo, o que se vê são denúncias de total desleixo com o ensino infantil. Como forma de viabilizar e proporcionar educação para esse público, a própria comunidade se vê forcada a oferecê-la à população por meio de convênios. Lembram o que foi escrito acima de como os governos dos países mais desenvolvidos pensam a educação infantil?
No Brasil, educação infantil é entendida como creches, ou seja, espaços onde crianças são entregues à responsabilidade de cuidadoras/es enquanto os pais ou responsáveis trabalham.  É exatamente isso, depósito de crianças. No instante que gestores públicos afirmam que para trabalhar em centros infantis, a contratação de estagiários é suficiente para o atendimento das crianças, certamente continuaremos por longas décadas caminhando na rabeira dos países cujos governos tratam suas crianças como tesouros raros e que são lapidados por pessoas de extraordinária excelência profissional.   
Prof. Jairo Cezar

quinta-feira, 22 de fevereiro de 2018


BANCADA RURALISTA TENTA BARGANHAR VOTOS EM TROCA DA APROVAÇÃO DE PROJETOS DE INTERESSE COMO O PL 6.299/02 (PACOTE DO VENENO)

A mesma estratégia adotada pelo governo Temer no final de 2017 onde tornou legal a escravidão no campo por meio da reforma trabalhista, pretende repetir a dose dessa vez com a reforma da previdência, barganhando com parlamentares da bancada ruralista o apoio e os votos em troca do projeto de lei n. 6.299/02 batizado de Pacote do Veneno.  Esse projeto foi apresentado pelo ex-senador e agora ministro da agricultura Blário Maggio, que trata entre outras coisas de mudanças segnificativas nas regras pesquisa, classificação, registro e fiscalização de agrotóxicos. Um dos itens que o projeto pretende suprimir são os rótulos com caveiras presentes nas embalagens de venenos. Outra PL envolvida na negociata do veneno é a de n. 3.200/2015 que trata da revogação definitiva da lei n. 7.802 de 1989. Se essa manobra for bem sucedida desaparecerá dos receituários o termo agrotóxico, no lugar aparecerá a nomenclatura “defensivo fitossanitário”.[1]     
Somente um cenário muito adverso conjunturalmente poderá inviabilizar essa malfadada violência contra os brasileiros que estão se envenenando cada dia mais. A intervenção do exército na cidade do Rio de Janeiro gerando grande inquietação nacional e internacional pode ser uma dessas adversidades que inibirá ou não o sinistro acordão que colocará mais veneno na mesa dos brasileiros.  
No instante em que milhões de brasileiros estavam com suas atenções direcionadas à ação militar naquele estado, o congresso nacional poderia aproveitar-se do ensejo e votar o projeto da reforma da previdência. Entretanto, dispositivos da constituição federal veda tal prerrogativa em casos excepcionais como de uma ação militar. Ninguém duvida que a intervenção no Rio de Janeiro foi premeditada com o propósito de melhorar os níveis de popularidade do governo federal frente à opinião pública. 
O fato é que o pacote do veneno que interessa ao agronegócio e poderosos segmentos transnacionais fabricantes de agrotóxico é muito preocupante. Diversos especialistas ouvidos afirmam categoricamente que não é função do congresso nacional nem tão pouco do executivo a responsabilidade de mexer nas regras decidindo os tipos de agrotóxicos para as lavouras, e sim de técnicos e entidades como a ANVISA, IBAMA, entre outras, que atuam pelo bem estar da população.
Não é de hoje que governos, pressionados pela ganância do agronegócio, vem atuando abertamente no desmantelamento desses órgãos, que são reconhecidos pela sua credibilidade e independência. O que querem é submetê-los as ordens de quadrilheiros mal intencionados instalados nas esferas dos poderes, dentre eles o Ministério da Agricultura. Lembram dos nomes e currículos de duas personalidades, Katia Abreu, no governo Dilma, e Blario Maggi, atual governo Temer, ambos no Ministério da Agricultura? Isso mesmo, Katia Abreu e o atual Blario Mággio, principais comandantes da poderosa linha de frente da bancada ruralista, defensores do desmatamento e envenenamento do campo. Tanto um quanto ou outro são ferrenhos opositores da demarcação de terras indígenas, autores da PEC 45/2013 que propunha a venda da demarcação de terras indígenas em áreas retomadas.[2]    
Dentre as várias proposições contidas no texto do projeto, sendo que já recebeu uma infinidade de emendas está à troca do termo agrotóxico por DEFENSIVO FITOSSANITÁRIO; a não necessidade de estudos aprofundados sobre a toxidade dos venenos; a não exigência do registro de herbicidas como o 2,4D, Paraquat e Glifosato, os mais consumidos no Brasil. Afinal, o que muda em termos de composições químicas adicionadas na produção dessas substâncias com a troca do nome? Nada, apenas retira o estigma letal criado sobre os pesticidas, substituindo por outro nome, cuja sonoridade faz pensar sobre algo produzido com plantas (FITO). Pura enganação.  O pacote é mais mortífero do que se imagina.  A insistência do agronegócio na aprovação do projeto de lei é para tornar legal a comercialização no Brasil de princípios ativos banidos há décadas em várias partes do mundo.
O mais grave nisso é que tais pesticidas e outros similares são altamente tóxicos e estão fazendo parte do dia a dia dos produtores rurais. A pressão pela liberação de variedades proibidas à agricultura è porque os atuais venenos comercializados não exercem a mesma eficiência necessária no combate às ditas “pragas” invasoras. No desespero, os agricultores se lançam a borrifar o dobro das dosagens recomendadas na mesma cultura, porém, sem sucesso. Como saída se lançam aos indesejáveis venenos proibidos, geralmente contrabandeados ou comercializados livremente em casas comerciais, até mesmo com a prescrição de profissionais capacitados.
 É claro que o ideal seria o banimento definitivo de todos os agrotóxicos da face da terra e a adoção de uma agricultura que fosse a mais natural possível. Entretanto, diante do gigantesco poder das corporações que controlam o setor dos agrotóxicos, de sementes e insumos, continuaremos por longa data convivendo com esse terrível mal que a cada dia está contribuindo para o aumento de doenças relacionadas aos agrotóxicos. Para comprovar tal afirmação é só visitar as unidades de saúde ou hospitais nos municípios interioranos e pesquisar os laudos laboratoriais das enfermidades mais comuns na população. Não há dúvida que metade ou mais da metade das doenças diagnosticas têm alguma relação com a longa exposição com herbicidas, fungicidas, etc., e a ingestão de alimentos, frutas, verduras e cereais contendo elevado grau de toxidade.  
Os menos céticos aos venenos admitem que se fosse cumprido rigorosamente os protocolos relacionados à manipulação dos agrotóxicos os índices de intoxicação por ingestão de alimentos contaminados poderiam ser muito menores. Não é exatamente o que acontece no dia a dia do campo. O desconhecimento, despreparo até mesmo desleixo dos produtores rurais no manuseio dos equipamentos para a aplicação dos venenos é preocupante. O pior de tudo é que não há qualquer fiscalização por parte dos órgãos competentes municipais e estaduais, no cumprimento dos protocolos pelos agricultores tanto na aplicação correta das dosagens prescrições, bem como ao período correto para a colheita das culturas, que deverá estar isenta de resquícios de veneno. 
As legislações desse seguimento atualmente em vigor no Brasil restringem sua aplicação em vias públicas.[3] Entretanto, o que mais se vê são irregularidades cujos infratores nem mesmo são advertidos pelo erro cometido. O próprio poder público que deveria ser o exemplo para a sociedade, vem corriqueiramente infringindo as legislações. Hoje em dia causa mais indignação e revolta à publicação nas redes sociais de imagens ou vídeos exibindo maus tratos em animais que quilos e quilos de venenos aplicados estradas, terrenos baldios e vias públicas para suprimir plantas. Nem mesmo a aplicação de veneno próximo a mananciais que abastecem com água à população choca a população.
Enquanto a sociedade não se indignar, superar o conformismo quase insano que o impede de reagir diante das brutalidades contra os ecossistemas, onde se tenta naturalizar tudo até mesmo o convívio com venenos, continuaremos por muito tempo reféns de políticos parasitas que se alojam no poder, criando e executando leis para o contínuo ciclo de dominação social. Como tudo é tão efêmero na política, claro, isso quando ameaça o futuro eleitoral dos que pretendem se eleger no pleito seguinte, de repente veio à notícia que o governo federal teria suspendido a tramitação e possível votação ainda nesse semestre da reforma da previdência. Paradoxalmente, os próprios parlamentares da base de apoio do governo se sentiram aliviados com a notícia. Na realidade o governo Temer buscava um pretexto plausível para a suspensão do processo, pois admitia não obter os votos necessários para a aprovação da reforma, que lhe incorreria em derrota política, como de dezenas de deputados que lhe dá guarida.
Como fica então a barganha política que estava sendo articulada entre a bancada ruralista e o governo federal acerca das PLs que alteravam dispositivos relativos ao comércio de agrotóxicos, muitos dos quais proibidos por serem causadores de doenças degenerativas? Não tardará muito e teremos notícias de novas manobras ou pressão do agronegócio para obter êxito na aprovação das PLs do veneno. 
Prof. Jairo Cezar

domingo, 18 de fevereiro de 2018


ARTES PLÁSTICAS COMO INSTRUMENTO DE COMUNICAÇÃO PARA EXTERNIZAR SENTIMENTOS E IMPRESSÕES DO COTIDIANO SOCIAL

Desde os tempos mais remotos, os primeiros seres humanos utilizavam os desenhos ou pinturas rupestres para se comunicarem. Graças aos signos pictóricos preservados em vários lugares do planeta, ainda hoje historiadores e outros pesquisadores de áreas distintas se debruçam nessas fontes para tentar compreender o modo como esses povos se organizavam e compreendiam o mundo. Embora a escrita tenha se sobrepujado a arte pictórica mais tarde, o desenho com grafite, a escultura, o mosaico, a pintura a óleo, entre outros gêneros artísticos, permanecem vivas em quase todas as culturas.
Algumas culturas como as mesoamericanas não desenvolveram a escrita como ferramenta convencional de comunicação. O emprego da oralidade e de símbolos pictóricos como desenhos, esculturas, se constituíram em recursos necessários para comunicar-se, transmitindo saberes de geração para geração. A pintura em tela, com o emprego de tinta a óleo, permitiu que muito do que se sabe hoje de algumas culturas, cenários, estéticas, costumes, etc, fosse possível graças aos trabalhos deixados por artistas de extraordinária sensibilidade e habilidade técnica.
Qualquer pintura ou desenho, representado em tela ou não, quem o fez, procura ou procurou expressar seu sentimento ou visão de mundo naquele momento. Portanto, qualquer indivíduo, artista plástico ou não, não estará imune a influência dos arcabouços culturais da sua época. Tanto antes como nas fases subsequentes a renascença, todas as pinturas estão repletas de traços subjetivos do período representado. No Brasil a pintura teve forte influência na formatação da identidade nacional. Desde a época do império, o Estado contratava pintores profissionais para representar cenários e fatos históricos importantes do cotidiano social.
Geralmente os episódios exteriorizados nas pinturas que decoram salões e espaços públicos atualmente, como o quadro retratando o enforcamento de Tiradentes, não correspondem exatamente aos fatos ocorridos. Cenários e personagens eram forjados com o intuito de   fabricar heróis imaginários para despertar sentimentos nacionalistas. Portanto, a arte tende muitas vezes a ser dissimuladora, opressora, aprisionadora, submetendo gerações e gerações ao domínio cego de grupos dominantes. A arte não pode ter regras, leis, deve trilhar seu próprio caminho, pois arte é  sinônimo de liberdade.
Todo artista, quando faz uma obra de arte, é impulsionado por algum desejo, sentimento. Durante o processo de construção de um projeto, pintura, escultura, mosaico, etc, cada centímetro concluído desencadeia turbilhões de emoções. Cada obra pintada é única,  inrepetível. Iniciar qualquer atividade artística não tem idade e nem tempo específico. Pode ter como força motivadora as aulas de educação artística no colegial, um curso acadêmico, ou até mesmo episódios extremos na vida, ou seja, um estresse emocional, cuja arte assume uma função terapêutica de ressignificação da vida.
Foi exatamente o que aconteceu comigo em 2006, depois de ter sofrido um violento estresse emocional que me levou ao recolhimento absoluto. Os primeiros rabiscos e pinceladas com tinta guache davam mostras de que tal atividade contribuía para minimizar a ansiedade extrema.  Em 2007, mesmo diante da fragilidade dos movimentos psicomotricial, decidi me matricular em uma escola de artes plásticas. O primeiro contato formal com os pincéis e um punhado de bisnagas multicoloridas de tinta a óleo foi o sinal de que algo importante estava acontecendo.
 Um singelo desenho de uma  paisagem a beira mar estava na frente dos meus olhos para colorir. Agora não havia mais retorno, mesmo com as mãos trêmulas resultante da ansiedade veio à revelação. O pequeno quadro com coqueiros, raios de sol iluminando a  manhã e pássaros deslizando num céu alaranjado, ambos  revelaram que a arte é sim transformadora, curativa. Não é por acaso que escolas que atendem crianças e adolescentes especiais e até mesmo clínicas para tratamento de pessoas com distúrbios psicológicos, a arte, como terapia ocupacional, é um excelente recurso para minimizar os sintomas.
Com a conclusão do primeiro trabalho, outros e mais outros vieram em seguida. A cada quadro pintado era perceptível que meu estado de ansiedade a cada dia vinha diminuindo. Isso abriu caminho para alçar vôos mais altos, a ponto de querer até  abandonar as cópias prontas e arriscar assumir um estilo próprio. O academicismo, talvez influenciado pelo estilo de arte aprendida no período escolar, tornou-se parâmetro para as minhas produções dali para frente.  A reprodução de cenários paisagísticos singulares, casarios, igrejinhas e monumentos de relativo valor histórico, cada vez mais guiaria meu olhar ao mundo sensível da arte reveladora.
Por que não utilizar a artes plásticas para entender a luz das cores e formas os distintos cenários paisagísticos e arquitetônicos do município de Araranguá, cujas imagens e ângulos revelam ambientes que estão descritos em preto e branco. Transpor imagens para a tela e colori-las, a exemple das pinturas abaixo, não foi tarefa simples como se presumia. Uma intensa pesquisa em obras de artes visuais e no livro “Florianópolis: paredes do passado, de Ney Claudio Franzoni Viegas, contendo imagens e descrições dos casarios da capital do estado do século XIX e XX, contribuíram para definir as cores  usadas nas pinturas  inspiradas em fotografias em preto e branco que retratam certos aspectos da cidade de Araranguá no começo do século XX.
Em quase dez anos conciliando trabalho docente e aprendiz arte um pequeno acervo de singelas pinturas foi materializado, onde cada obra concluída, cada detalhe mostrado, trazia a revelação de que a arte pode sim trazer a cura libertando-nos das grades  dos nossos demônios/domínios  inconscientes. A libertação se revela quando nos desafiamos aos erros ou quando rompemos com padrões cartesianos que mostra um mundo perfeito, estável. Arte é manter-se em permanente instabilidade, desafiando a imaginação construindo ou desconstruindo cenários possíveis e previsíveis. A arte, portanto, tanto pode servir para  insubordinação, transgressão de conceitos e valores morais dominadores, como também instrumento de fortalecimento da estratificação social, ou seja, divisão de classes.
Em 2017 a convite da secretária da cultura do município de Araranguá algumas telas foram expostas junto com outros trabalhos no Hal de entrada da câmara de vereadores de Araranguá. Muitas pessoas se sensibilizaram quando se depararam com pinturas contendo paisagens, ambientes de reunião popular, etc,  que relembravam cenas vividas da infância. O fato é que a pintura fez aflorar outro desejo, a arte do mosaico com peças de cerâmica. Sem muita técnica e destreza, menos ainda de ferramentas apropriadas, apenas um alicate para o corte das peças, me arrisquei a confeccionar os primeiros trabalhos utilizando janelas refugadas de casarios.
Folheando algumas revistas especializadas em arte de mosaico ou conhecendo in loco os desenhos que narram a história da America Latina retratada nas paredes do prédio da reitoria da UFSC; os inúmeros mosaicos decorando entradas de prédios em Florianópolis e locais estratégicos em Itajaí,  me instigou o desejo de fazer algo semelhante. E por que não? Foi só escolher o desenho, o local, reunir as peças com as cores desejadas, e mão na massa, literalmente. Quatro ou cinco meses depois estava concluído o que se imaginava ser trabalho exclusivo de artistas renomados. Em culturas clássicas como os bizantinos, a arte em mosaico sempre assumiu uma representação simbólica determinante no imaginário das pessoas.                    
   Escolher e representar em fragmentos de cerâmica um pequeno recorte do inigualável cenário paisagístico do Morro dos Conventos não foi tarefa tão fácil. Delimitar uma escala que não extrapolasse para mais ou menos as dimensões originais do desenho também foi outro trabalho de  parto. Embora não tenha atingido os objetivos desejados em termos de proporcionalidade em relação às figuras, a obra artística, além de inspiradora, emociona os mais sensíveis, que buscam na arte respostas às várias perguntas que fazemos, dentre elas nosso papel nessa vida e o que é necessário para ser feliz?
Por cerca de dois anos vivi certo recrudescimento não produzindo novos trabalhos em pintura, apenas fazendo alguns reparos naquelas telas que sofreram alguma avaria em decorrência do tempo. Quase todas as pinturas produzidas estão expostas na residência dos meus pais ou no restaurante Cesa no Morro dos Conventos. No começo de 2018, a surpresa. Um proprietário de uma galeria comercial localizada no centro da cidade me fez o convite para expor os trabalhos na mesma. No início relutei, porém fui convencido de que as obras expostas seriam como um corpo nu aberto ao julgamento e críticas.  
Dito e feito, por três semanas cerca de quinze telas ficaram distribuídas no interior do prédio, onde circulavam centenas de pessoas diariamente. Era preciso saber a opinião do público que transitava pelo local e parava diante das imagens. O que motivavam suas paradas em frente das telas, o que procuravam saber, etc? Talvez muitas dessas perguntas jamais se terão respostas, pois nem todos que contemplaram os trabalhos quiseram externizar o que sentiam no caderno ali disponibilizado para tal fim. Mais de cem pessoas ousaram em assinar seus nomes e até mesmo expor suas opiniões ou críticas às obras distribuídas nos cavaletes.
Embora eu sendo um tanto crítico acerca do meu trabalho sempre acreditando que poderia ser melhor, as opiniões quase unânimes dos que registraram no livro me fez acreditar que devo continuar insistindo nesse estilo de pintura, que segundo uma colega, professora de artes, alguns quadros tem similaridade com as pinturas do artista Frances, Renoir. Uma opinião desse nível, é claro, deixaria qualquer um lisonjeado. No mesmo dia que fazia o recolhimento das telas, consultando as mensagens no E.mail, lá encontro o recado enviado por uma cidadã funcionária de uma grande rede de super mercados do estado, me convidando se eu tinha interesse de expor as telas em uma das lojas no município de Criciúma. Sem titubear, minha resposta foi positiva. Agora é prepará-las e enfrentar um novo desafio que somente a arte proporciona.  
Prof. Jairo Cezar                 




sábado, 10 de fevereiro de 2018

OS DESAFIOS E AS POSSIBILIDADES DO PROJETO GEOPARQUE CAMINHO DOS CÂNIONS PARA O DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL DA REGIÃO DO EXTREMO SUL DE SANTA CATARINA

Cachoeira da Cortina - Timbé do Sul


Há muitos anos vem se tentando na região do extremo sul de Santa Catarina desenvolver políticas públicas para redimensionar o conceito de turismo, que tradicionalmente é concebido como sazonal, ou seja, apenas no verão, onde prioriza quase que exclusivamente os municípios banhados pelo oceano atlântico. É inacreditável que parcela significativa da população dos municípios que integram a AMESC não tem a mínima noção do extraordinário potencial turístico oferecido por essa região. Além de belíssimas praias e lagoas, que atraem centenas de turistas e veranistas todos os anos, há poucos quilômetros da faixa costeira é possível se encantar e se deliciar banhando em cachoeiras com quedas d’água que ultrapassam os cem metros de altura; caminhar por trilhas dentro de florestas e cânions; visitar comunidades tradicionais e furnas que guardam registros arqueológicos de grupos pré-históricos.



Entretanto, todo esse potencial que já poderia há anos estar contribuindo para alavancar a economia da região, continua em fase embrionária desde 2007 quando foi homologado o projeto Geoparque Caminho dos Cânions.  No Brasil, só existe um geoparque reconhecido pela UNESCO, o de Araripe, no estado do Ceará. Somente a china possui 32. O Caminho dos Cânions, onde haverá a inserção de quatro municípios catarinenses e três do rio grande do sul, será o 128° geoparque existente no planeta. Embora exista boa vontade de dezenas de pessoas envolvidas diretamente no projeto, o que deixa dúvidas é o incipiente esforço do governo estadual e de seus representantes na região, na convergência das energias para a execução rápida das etapas subseqüentes que assegurem a homologação pela UNESCO.[1]  
O pouco número de geoparques criados no Brasil, embora sendo o país que possua um dos melhores potenciais geológicos no planeta, tem relação com múltiplos fatores, desde a falta de legislações específicas; à falta de planejamento estratégico; degradação e falta de educação patrimonial. Parece que dessa vez, o processo que resultará no aceite da UNESCO acerca do geoparque caminho dos cânions tem tudo para deslanchar. A audiência pública promovida pela ALESC no município da Praia Grande em outubro de 2017, sob a coordenação do deputado Dirceu Dresch, serviu como termômetro para avaliar o interesse e o sentimento da população e das autoridades da região e do estado acerca desse projeto.[2]
Durante quase três horas de debate, o que se sucedeu foi certo mal estar sentido pelas autoridades municipais e estaduais presentes, quando ouviram os desabafos desferidos por integrantes da sociedade civil e cidadãos/ãs, afirmando categoricamente que o projeto é discriminatório, pois exclui grupos sociais históricos, como os quilombolas, que há séculos habitam a região. Se tal comunidade não for integrada e suas necessidades básicas atendidas, como luz elétrica e saneamento básico, o projeto tenderá a fracassar. A comunidade ainda é carente de serviços básicos ao ponto de muitas residências ainda utilizarem patentes de madeira. A própria representante da empresa contratada para realizar o diagnóstico das potencialidades da região, deixou bem claro afirmando que: “O geoparque vem para desenvolver as comunidades, com o compromisso dos gestores públicos e a parceria dos empresários locais para trazer oportunidades de renda, é um projeto de longo prazo que não traz restrições às atividades econômicas”.
Parece que, segundo o deputado coordenador da audiência, não é exatamente o que pensam alguns gestores públicos e empresários ligados ao turismo da região, que estão mais preocupados com o sucesso do seu negócio, que a melhoria dos demais setores da sociedade que também poderiam se beneficiar com o turismo. O projeto Geoparque Caminho dos Cânions é inquestionavelmente a oportunidade que terá a população do extremo sul do estado para superar o histórico atraso sócio econômico que estão submetidas. Se depender dos seguimentos políticos que nos representam em vários patamares de poder, a tendência é continuarmos amargando por longos anos o título de a região mais atrasada do estado.
É possível que 2018, ano eleitoral, algumas iniciativas mais pontuais sobre o projeto venham a se concretizar por parte do governo do estado, quem sabe até a disponibilização de recursos mais vultosos para fomentar tais iniciativas. Como já é de praxe no Brasil e no estado de Santa Catarina, onde muitos projetos têm um tempo limitado de validade, ou seja, dura o mesmo tempo de algumas gestões públicas, não há qualquer certeza que após os trâmites eleitorais de 2018, a nova composição política do executivo catarinense irá tratar o projeto geopareque como prioridade. Como alternativa aos desleixos do poder público, é necessário fazer com que a população incorpore o projeto, compreendendo como instrumento importante para promover o seu desenvolvimento.
O trabalho de Educação Patrimonial e Ambiental deverá se caracterizar como prioridade das prioridades, atendendo não somente estudantes das distintas redes de ensino, como também toda a população dos municípios integrados e não integrados ao projeto. Se tais ações não forem estrategicamente difundidas, corre-se o risco de a UNESCO excluir da lista a proposta de geoparque para Santa Catarina. Essa é uma probabilidade concreta baseada em visitas e observações realizadas em municípios inseridos ao projeto quando se constatou o elevado processo de degradação ambiental e patrimonial.


É fato é que atualmente expressiva parcela das pessoas que visitam os municípios indicados para o projeto é de turistas de outros estados e até mesmo países que buscam ambientes singulares semelhantes ao da região. Não há registros ou fontes que comprovam haver lugar no mundo onde a distância entre a faixa costeira banhada pelo oceano atlântico e o planalto seja tão curta. Em pouco mais de uma hora é possível, de automóvel, sair da praia e contemplar as deslumbrantes paisagens cênicas; caminhar por trilhas no meio da floresta e dos cânions; banhar-se em cachoeiras com quedas d’água que ultrapassam os cem metros e transitar por comunidades tradicionais e furnas que guardam vestígios de civilizações passadas.[3]
No entanto, todo esse rico potencial turístico vem paulatinamente sendo impactado por atividades econômicas ainda nada sustentáveis. A visita realizada em três quedas d’águas nos municípios de Morro Grande, Jacinto Machado e Timbé do Sul, mostrou que tais cenários estão ameaçados pelos desmatamentos e queimadas.[4]  A inserção de espécies exóticas como eucaliptos e pinos vem alterando abruptamente todo o ecossistema, impactando a dinâmica das nascentes, da flora e da fauna. 


Alguns desses lugares por ser ainda pouco conhecido e de difícil acesso, como a cachoeira do Bizungo, no Morro Grande, não se vê forte impacto ambiental aparente no entorno, exceto a progressiva proliferação de pinos e eucaliptos.  No município de Timbé do Sul, que possui balneários paradisíacos e cachoeiras inigualáveis, também não mostra isenta das ações antrópicas.[5] Tudo converge para que com a pavimentação asfáltica da rodovia Br. 285, Serra da Rocinha (Timbé do Sul) e da Serra do Faxinal (Praia Grande), o fluxo de pessoas que transitarão por esses cenários tenderá a aumentar substancialmente.


O futuro melhoramento das vias de acesso aos municípios que integram ao geoparque deve ser considerado e visto como elemento motivador dos debates para acelerar a homologação do projeto Geoparque Caminho dos Cânions. Pode estar aí a oportunidade da região do extremo sul do estado se deslanchar não só economicamente como também no aspecto cultural. Entretanto, é necessário frisar que esse tipo de “indústria” requer a concretização de algumas demandas importantes.

Cachoeira do Bizungo  - Morro Grande

Uma delas é desconstruir o paradigma da população em relação a sua concepção sobre a sustentabilidade. É claro que o público que será atraído para esses ambientes de lazer e contemplação tende a apresentar níveis de sensibilização mais aguçados. Formar novas gerações de cidadãos/ãs que se adéqüem a esse novo paradigma social deverá ser compromisso das escolas. A reformulação do currículo escolar com a inserção de temas que promovam a sensibilização e a valorização dos aspectos paisagísticos e culturais deverá ser o primeiro desafio.
Prof. Jairo Cezar
  
           
                        





[1] file:///C:/Users/Jairo/Downloads/16220-58259-1-PB.pdf    

[2] http://www.jornaldoscanyons.com.br/2017/10/alesc-promove-audiencia-publica-sobe-o-geoparque-JornaldosCanyons.html        

[3] https://www.youtube.com/watch?v=ZHGqA6pfhhc
[4] https://www.youtube.com/watch?v=4tKqDZ6O6uA
[5] https://www.youtube.com/watch?v=uBbbO4Ivc2k


















sexta-feira, 2 de fevereiro de 2018

BRASIL, PAÍS ONDE SE GASTA MAIS RECURSOS PÚBLICOS COM PENITENCIÁRIAS QUE ESCOLAS  

Visitando a Penitenciária Sul, Bairro Vila Maria, Criciúma, no dia da sua inauguração onde foi aberta ao publico para conhecer in loco aquela que é denominada como modelo de inovação do setor no estado e no Brasil, me chamou a atenção a sofisticação do empreendimento de quase cerca de 25 milhões de reais que causaria inveja e ao mesmo tempo indignação aos inúmeros gestores das escolas públicas estaduais, cujas escolas que atuam não recebem um único reparo há anos. É inegável que a inauguração de qualquer empreendimento público, até mesmo penitenciárias, a participação de autoridades competentes deve ser considerada. Entretanto, não do nível midiático extremado como se sucedeu com a penitenciária sul que recebeu até mesmo a visita do Ministro da Justiça.
Não tenho lembrança nos meus 35 anos de atividade docente, nas poucas escolas que foram construídas e inauguradas nesse período, a presença de alguma autoridade de expressão nacional como o ministro da educação. Até porque se nesses trinta e cinco anos de atuação docente, se cada ano uma ou duas escolas fossem construída ou restaurada, não estaríamos hoje vivendo o caos no sistema prisional brasileiro, bem como disponibilizando quase 30 milhões de reais dos contribuintes para a construção de uma penitenciária. É claro que quanto menos investimento em educação mais suscetível estará o país à formação de levas de marginalizados potenciais.
Entretanto também não podemos transferir toda responsabilidade de um problema que se parece crônico exclusivamente ao precário sistema educacional. A questão da violência, no entanto, é mais complexa do que se imagina e deve ser compreendida como um problema sistêmico, ou seja, reflexo de um modelo econômico e política decadente, refém dos mandos e desmandos de governos e de uma elite parasitária que se nutrem da miséria social.  Alguém se lembra de quantas escolas, ginásios de esportes, hospitais, entre outros/as, foram inaugurados/as nos últimos anos em seu município ou estado nos últimos anos? Em sua cidade, quantos parques ou espaços públicos com equipamentos desportivos ou playgrounds estão disponibilizados à população?
Se transitarmos, por exemplo, pelos bairros do município de Araranguá especialmente aos finais de semana, acredito que muitos ficariam surpresos caso avistassem crianças brincando ou praticando alguma atividade esportiva. Certamente essas crianças ou adolescentes estariam praticando tais atividades na rua, se desviando dos pedestres e veículos. Como não há espaços públicos e seguros para o lazer, aquelas crianças que não se arriscam sair à rua, permanecem enclausuradas em suas residências, transformando-se em prisioneiros passivos das novas tecnologias home tech. Paradoxalmente, no Brasil, o gasto público com cada detento é muito superior do que de um estudante.
Enquanto tal absurdo permanecer, o Brasil seguirá nos noticiários nacionais e internacionais como um dos mais violentos do mundo. Para reverter o atual cenário catastrófico que afeta a segurança pública, bem como a educação, é necessário eleger governos comprometidos que priorizam políticas de interesse coletivo em detrimento dos individuais. Acredito que muitos, quando lerem tal expressão acima, certamente se sentirão indignados ou traídos porque, vira e volta, a mesma frase é citada em textos ou discursos de (políticos) com históricos terríveis a frente de governos progressistas. Todos/as sabem que a transformação de uma sociedade requer anos, décadas de investimentos e princípios éticos. Muitas nações que hoje apresentam satisfatório nível de IDH tiveram que superar décadas de guerras e crises econômicas. A superação se deu investindo maciçamente em educação. É possível perceber que aqueles países que apresentam excelentes IDHs e do PISA (nível da educação básica), são os que possuem as menores taxas de criminalidade.  
O Brasil, para melhorar o IDH e o PISA, não necessita trilhar os mesmos caminhos catastróficos que tais nações trilharam para a superação das adversidades. Coisas simples, porém permanentes devem ter prioridade. Entre tantas que certamente poderiam estar no topo da lista das emergenciais, se destacam: honestidade e responsabilidade na aplicação dos recursos oriundos dos impostos; fim dos privilégios e altos salários a todos que exercem cargos nas três esferas dos poderes públicos; combate a corrupção, as fraudes e aos sonegadores de impostos. Porém, parece que tudo que foi dito ou que é dito são expressões desgastadas e desacreditada pela população, pois são discursos ou programas de quase todos os partidos ou blocos de partidos que ocuparam ou ocupam os postos de poder.
À frente do legislativo ou do executivo esquecem que estão a serviço do povo, assumindo o papel de mediadores ou facilitadores da elite dominante, legislando ou homologando leis que depreciam direitos, dos quais comprometem o futuro de milhões de brasileiros.  Um país sem perspectiva de futuro para seus jovens resulta exatamente no que estamos acompanhando nos últimos anos, o crescimento vertiginoso da violência, não escapando nem mesmo as pacatas cidades do interior do Brasil. Quem ouve ou ouviu os discursos de algumas autoridades que estiveram na inauguração da Penitenciária Sul, em Criciúma, deve ter notado que todos/as quando falaram demonstraram ter clareza que a função da cadeia é proporcionar a ressocialização do apenado/a.
O próprio Ministro da Justiça, presente na inauguração, representa um governo que protagoniza um dos maiores ataques ao Estado brasileiro. Quem acompanha os noticiários ou até mesmo quem caminha pelas ruas ou bairros do seu município, constata a elevação das taxas de miseráveis. O próprio ministro no seu discurso teve a coragem de afirmar: “mais do que aplicar a sanção, é a esperança, é a certeza da revida, da nova vida. Aqui não é o fim, é uma transição, é recuperação, é ressocialização. Aqui é compromisso social de que presídio é transição, é retorno à vida útil para cuidar de si e a sua família. Isso é o traço fundamental de uma sociedade desenvolvida”.  Que esperança, que nova vida, diante de um cenário tão desesperançoso.
A penitenciária inaugurada em Criciúma, sem dúvida alguma, é uma exceção diante das centenas espalhadas pelo Brasil, onde quase todos os dias muitas aparecem nos noticiadas nos telejornais por se tornarem palco de rebeliões devido à super lotação e péssimas condições de higiene. Esperamos que daqui a um ano, tal iniciativa de abrir as portas da penitenciária ao público se repita para conferir se a excelente estrutura inaugurada permanece inalterada. Outro item a ser conferido é se capacidade máxima de detentas aceito, 286, será mesmo respeitada.
Somente os apadrinhados políticos presentes na inauguração devem ter se esforçado ao máximo para acreditar nos discursos hipócritas das autoridades admitindo que sistema penitenciário brasileiro proporciona a ressocialização para que voltem a ser inseridas na sociedade. Os demais e a população residente no entorno das duas penitenciárias ficarão apenas na torcida para que tudo dê certo, que não transformem em verdadeiros barris de pólvora, ameaçando a segurança dos/as trabalhadores/as (agentes penitenciárias/os), e da população do extremo sul do estado.

Prof. Jairo Cezar