segunda-feira, 29 de junho de 2015

Até quando pais, mães e responsáveis permanecerão indiferentes às políticas de desmonte da escola pública patrocinadas pelo governo do estado de Santa Catarina

Depois da maior greve ocorrida na Rede Pública Estadual de Ensino de Santa Catarina com duração de 73 dias, o que chamou atenção foi que durante todo o tempo de paralisação, parcela expressiva de pais, mães, entre outros, se mantiveram apáticos, indiferentes, à situação, não exteriorizando qualquer manifestação a tal ponto que deixasse o governo em uma condição de desconforto perante a opinião pública. Nade disso. O modo como os pais, a sociedade como um todo estão se posicionando diante do explícito descaso das autoridades com a educação pública, saúde, segurança, saneamento básico, cultura, etc., é preocupante.  Não é possível que depois de tantas e tantas denúncias de escolas aos pedaços, muitas já interditadas, outras em vias de execução, não se verificaram nos mais de 290 municípios do estado, mobilizações ou formação de grupos, ocupando os espaços das rádios, das SDRs ou mesmo se dirigindo à capital do estado invadindo os andares da secretaria da educação, o Hal da assembléia legislativa, até mesmo a sede administrativa do governo do estado.
O estranho é o fato que próximo de 80% da população jovem em idade escolar no estado estudam em escolas públicas estaduais. Contudo são os mesmos pais desses estudantes, os protagonistas dos resultados das eleições que são eleitos os ocupantes dos postos importantes dos poderes legislativos e executivos em âmbito municipal, estadual e federal, cuja realidade dos sérvios públicos oferecidos é reflexo do modo como esses representantes atuam. O problema da precarização, especialmente nos sérvios oferecidos pelo Estado, não está exatamente na falta de recursos, isso porque o estado de Santa Catarina é um dos maiores arrecadadores proporcionais de impostos da federação.
O centro da crise está no modo como os impostos são utilizados, sendo que parcela expressiva destina ao pagamento de salários e de outras despesas das SDRs, muitas das quais consideradas cabides de empregos que acomodam milhares de apadrinhados políticos. Para não resultar em risco de processo por injúria e leviandade acerca das afirmações relativas ao funcionamento das secretarias regionais, tal posicionamento está fundamentado no relatório apresentado pelos auditores do TCE (Tribunal de Contas do Estado) que expõe em detalhes pouca transparência administrativa de inúmeras secretarias regionais[1].
Como integrante da executiva regional do Sinte, nas várias visitas aos municípios da regional de Araranguá é visível, nas obras construídas, escolas, ginásios, etc., evidências de que há irregularidades na execução dos projetos. O que dizer de uma escola orçada em mais de quatro milhões de reais, que embora não tenha sido inaugurada, já apresenta fissuras nas paredes, sendo a tinta e o reboco em elevado estágio de deterioração.  Em qualquer sociedade um pouco mais avançada culturalmente que a nossa, havendo suspeitas de irregularidades em obras financiadas com dinheiro dos contribuintes, a resposta da sociedade é imediata, execrando através do voto o candidato ou o partido acusados de improbidade administrativa, ou seja, agir de forma desonesta.
 No caso brasileiro ou catarinense estamos ainda longe da maturidade política. Há décadas o estado tem sido governando pelos mesmos partidos que integram arcos de alianças históricas, que jamais dedicaram atenção exclusiva à educação. Pois se assim o fizessem não teria o magistério nos últimos trinta nos enfrentado quase vinte greves, aproximadamente uma paralisação por ano. Durante os dias sem aulas não houve visitas de pais à sede do sindicato dos professores, muito menos qualquer publicação nos jornais impressos da região notas de protestos ou solidariedade a favor ou contra o governo, pelo fato do seu filho estar fora da sala de aula. Não, nada disso.  Escolas públicas, denúncias, passeatas, protestos, são ações ainda de exclusividade dos/as professores/as.
Por que razão que quando se trata de passeata de interesse religioso, as dificuldades para sua organização são bem dizer nulas. Refiro-me a Caminhada para Jesus realizada no último sábado, 27 de junho, reunindo centenas de pessoas que não hesitaram em sair de suas residências para expressar palavras de louvor.  Até mesmo integrantes do poder legislativo e executivo municipal participaram apoiando o momento. Não estamos aqui criminalizando o ato, muito pelo contrário, pois todos têm direito de cultuar suas crenças. Refiro-me ao fato, de não ter ocorrido ato semelhante pelas ruas da cidade reivindicando educação, saúde, com qualidade. Convém destacar que o próprio legislativo de Araranguá não moveu uma palha se quer em apoio aos professores da rede estadual. Diferentes de outras câmaras municipais como do Sombrio que dedicaram quase uma sessão para falar de educação e elaboração de uma moção de apoio à classe.     
Acreditem pais/mães, enquanto vocês não assumirem as escolas que seus filhos passam parte do tempo, interagindo na construção do projeto político pedagógico, as expectativas de uma nova hegemonia política de base popular, de uma escola libertadora, transformadora e não estatal/partidária/manipuladora, é uma utopia distante. No distante horizonte do oceano social alguns sinais dessa utopia estão se evidenciando. As três reuniões ocorridas nas dependências do colégio castro Alves, com a presença de integrantes das APPs (Associação de Pais e Professores) das escolas estaduais da região da 22ª GERED, para discutir educação, pode ser interpretado como o início de um processo verdadeiramente transformador da educação no futuro.
 A esperança é despertar o sentimento de comprometimento da sociedade com a educação pública, tomando consciência acerca dos impostos pagos, que devem retornar em forma de serviços públicos de qualidade. É imprescindível que se recupere a credibilidade da escola pública catarinense, hoje concebida como aparelho ideológico e eleitoreiro controlado pelo Estado, para além da formação de mão de obra barata. Não é esse o modelo de escola pública desejado pelos filhos dos trabalhadores catarinenses. Uma escola pública deve ser acolhedora, atraente, que estimule a solidariedade, a colaboração mútua para o sucesso de todos. Lutar por uma escola com tais características ainda hoje é uma utopia, mas deve ser insistentemente almejada por todos.    
Prof. Jairo Cezar                        




[1] morrodosconventos-jairo.blospot.com.br

quinta-feira, 25 de junho de 2015

Municípios que integram o Comitê da Bacia do Rio Araranguá sofrem descasos quanto as políticas de monitoramento e prevenção de eventos climáticos extremos.

Na visita do secretário estadual da defesa civil na região de Araraguá ouvindo atentamente o que falou em entrevista concedida a uma rádio do município, o que chamou atenção foi o modo otimista como abordou as demandas para o vale do Araranguá, região que nos últimos anos tornou-se palco de fenômenos climáticos extremas, cujas ações preventivas e mitigatórias prometidas comprovam o descaso das autoridades políticas locais e do próprio governo estadual à região. Tal afirmação está fundamentada em relatos divulgados pela própria equipe executora do comitê da bacia do rio Araranguá, onde participo como representantes do Sindicato dos Trabalhadores da Educação da Rede Estadual e membro do conselho consultivo.
Nos últimos dez anos, depois da região sofrer os efeitos do Furacão Catarina e de outras anomalias climáticas extremas como enchentes e estiagens prolongadas, diversas foram as promessas de planos para a região como a aquisição e fixação de equipamentos para o monitoramento climático, bem como a capacitação de gestores municipais, treinamento e educação ambiental à população para atuarem na hipótese de eventos extremos do tempo. O que se vê no vale do Araranguá são políticas ainda paliativas, de pouco impacto social e sem qualquer garantia de sustentação. Para justificar a pouca eficácia dos planos previstos para a área da defesa civil da região, em 2008 foram obtidos recursos para a compra de 33 estações meteorológicas com tecnologias de ponta sendo que desse total apenas três estão em funcionamento.
É importante ressaltar que os respectivos fundos adquiridos não vieram do orçamento do Estado como fora prometido, mas graças ao empenho da equipe do Professor Daniel da Silva, do curso de engenharia ambiental da UFSC, com o projeto tecnologias sociais da água vinculada ao programa TSGA I (Tecnologias Sociais de Gestão da Água). O projeto atendeu algumas bacias do estado dentre elas a do Araranguá fomentado com recursos provenientes da Petrobras e executado pela EPAGRI e EMBRAPA. Na oportunidade quando o projeto foi apresentado na sede da CENTRAR/EPAGRI – Araranguá, representantes de organizações vinculadas ao governo do estado discursaram admitindo que com a instalação dos equipamentos a região de Araranguá seria referência estadual no preciso monitoramento do clima local assegurando informações que garantiriam à defesa civil e aos gestores públicos tomadas de decisões rápidas para amenizar os impactos provenientes dos eventos climáticos extremos.
Na última reunião do Conselho Consultivo do Comitê da Bacia membros da executiva fizeram desabafo relatando o descaso do governo com as estações meteorológicas, cujo funcionamento é deficitário pelo fato das baterias que alimentam o sistema estarem queimadas. São dados importantes que não são coletados e que compromete desse modo o acompanhamento diário dos índices de chuva, temperatura, vento, pressão atmosférica, entre outros indicadores. Para se ter uma idéia do tamanho da aberração, o custo orçado para a instalação de cada estação foi de 30 a 40 mil reais. Acontece que essas mesmas estações de alta precisão estão com o seu funcionamento comprometido devido a falta de baterias orçadas entre 70 a 100 reais. É isso mesmo, um valor que comparado com o custo da estação, é irrisório. Como conseguir tal recurso, o jeito é mendigar, solicitar apoio financeiro de entidades como vem fazendo os integrantes do comitê. 
Outro problema que combinado com escassez de recursos para reparo das estações é a falta de profissionais para a manutenção dos equipamentos. O governo em inúmeras oportunidades se manifestou prometendo, no entanto, ficou só na promessa e os problemas persistem. Talvez esse seja um dos motivos que levaram os governos a criação dos comitês das bacias, para se ver livres dos compromissos e transferir as responsabilidades financeiras e de gestão aos próprios comitês. Postura um tanto quanto irresponsável do Estado com os membros do comitê que se reúnem periodicamente e de modo voluntário, para deliberar ações que muitas vezes deixam de ser executadas por falta de recursos.
O governo recentemente divulgou através dos meios de comunicações que estão previstos instalações de novas estações meteorológicas pelo estado totalizando 67. Quanto as estações já fixadas em Araranguá os equipamentos comprovadamente danificados, quase todos, vão ser recolhidos e cujas peças em bom estado de conservação servirão para repor outras que estão funcionando. Há casos bizarros de estações como do bairro barranca, que foi danificada pelo fato de ter servido de alvo para armas de fogo. No próprio Iate Clube, morro dos conventos, o equipamento que tinha sido instalado também deixou de receber manutenção e desapareceu, possivelmente caiu no rio.
O que é estarrecedor é o fato que entre os anos de 2011 e 2012, datas historicamente comprovada as mais secas já registradas no estado de Santa Catarina, não houve o monitoramento eficiente dos índices pluviométricos na região que congrega a Bacia do Rio Araranguá. Na época, das 35 estações instaladas, apenas 10 ou 12 estavam funcionando. Em 2013 o problema persistiu. Somente em 2014 depois de tantas insistências foi possível a contratação de uma técnica para fazer o reparo dos equipamentos. No entanto os resultados das inspeções não foram satisfatórios pelo fato da técnica contrata ter de atender as estações distribuídas nas bacias do rio Tubarão a Araranguá.  Uma pessoa apenas não conseguiria atender tanta demanda e com o agravante da profissional estar residindo em Porto Alegre dificultando sua presença na região de forma mais efetiva. Para tornar mais eficiente as ações seria necessária a contratação de profissionais com atuação permanente.
Atualmente os serviços de previsões meteorológicas do estado e da região prestados pela EPAGRI/SIRAN e profissionais particulares, se utilizam, dentre outras meios como satélites, das informações colhidas diariamente dessas estações. Deve ser ressaltado que das 26 que foram restauradas, três repassam informações um tanto quanto confiáveis, como as estações do CENTRAR/EPAGRI, em Araranguá, do IPAT/UNESC e da barragem do rio São Bento, monitorada pela CASAN. Com toda precariedade infraestrutural comprovada, é digno de reconhecimento a competência profissional dos meteorologistas que ainda conseguem oferecer à comunidade, à defesa civil e aos gestores públicos, informações com mínima margem de erro sobre as manifestações do tempo.
Imaginamos agora se toda essa estrutura hoje deficitária estivesse funcionando com eficácia. Para suprir essa demanda, no vale do Araranguá as estações meteorológicas deficitárias foram substituídas por equipamentos alternativos, como pluviômetros, que embora não ofereçam resultados completos, proporcionam aos agricultores e demais profissionais ligados ao setor agrícola, dados importantes para se planejar acerca do momento do plantio e a quantidade de chuvas previstas para aquela estação. Os resultados embora não suficientes pela pouca precisão garante, por outro lado, dados que ajudarão no monitoramento das manifestações do tempo da região do extremo sul do estado.
               No discurso do secretário convém destacar alguns pontos que estão concisos com a política adotada pelo governador do estado em relação às defesas civis dos municípios catarinenses.  Disse que a preocupação é ajudar as prefeituras, garantindo a elaboração de plano de contingência municipal e o melhoramento das estruturas que permitem o monitoramento do clima através da instalação de equipamentos tecnológicos, e de modelagem hidrológica com informações mais confiáveis à população.
Sobre esse assunto o secretaria deveria saber que em 2011 esse assunto foi discutido em uma das assembléias ordinárias do comitê da bacia, quando da apresentação do projeto “sistemas de previsão hidrológica para a bacia hidrográfica do rio Araranguá”, cujo objetivo seria: “disponibilizar um sistema de monitoramento da rede hídrica e previsão de eventos extremos a partir do ajuste de modelos matemáticos hidrológicos e do acompanhamento quali-quantitativo da bacia do rio Araranguá” [1]. O que se sabe é que embora tenha havido posicionamentos favoráveis à proposta na época, a mesma não vigorou, o motivo talvez, como de outras tantas propostas abortadas, seria pela indisponibilidade de recursos, bem como o frágil empenho do Estado como agente motivador.  
Também prometeu que será disponibilizada uma plataforma web em que a população poderá baixar no computador ou smart-fone para receber informações e alertas de possíveis eventos climáticos extremos. Sobre esse sistema digital que munirá as pessoas com informações e alertas sobre possíveis eventos extremos, no mesmo projeto citado acima o autor destaca que a proposta apresentada visa monitorar a distribuição de precipitação e nível de rio na bacia do rio Araranguá; determinar níveis de referência (normal, alerta, atenção e emergência) e correlacionar com o monitoramento contínuo; diagnosticar e monitorar a qualidade da água do rio Araranguá; calibrar e validar um modelo hidrológico para estudos na bacia hidrográfica e ampliar a rede de monitoramento hidrológico e disponibilizar as informações via web[2]   
Destacou que o estado de santa Catarina em relação às políticas de prevenção de eventos climáticos extremos é referência no Brasil. O deputado que o acompanhou na entrevista, do mesmo partido do governador, disse que não são necessários investimentos caros para soluções complexas, que é só dotar a comunidade com informações necessárias. O secretário afirmou que as bacias deverão elaborar seus planos diretores com capacidade de promover estudos hidrológicos dos rios verificando a disponibilidade de água. Disse também que em 2013 todos os municípios que tiveram problemas decorrentes de enchentes e outras manifestações do clima foram atendidos com recursos do estado. Quanto ao questionamento acerca dos motivos de não ter sido realizado, entre 2004 a 2015, nenhum programa de treinamento à população para o enfrentamento de eventos extremos, a resposta do secretário foi de que o estado irá fazer. Para isso estão disponibilizados recursos orçados em três milhões de reais para eventualidades climáticas, capacitação, treinamento. Para a compra de novos equipamentos de alta tecnologia, os valores chegam a 25 milhões de reais. É preciso criar uma nova cultura, afirmou, de proteção do cidadão catarinense.
Outro aspecto que chamou atenção na entrevista foi de não ter em nenhum momento mencionado o problema da lagoa do caverá. Oportunidade importante para interrogar o secretário acerca dos últimos encaminhamentos da secretaria da defesa civil e do próprio governo estadual para o salvamento desse importante manancial. Estranho não estar essa demanda na agenda do secretário em visita à região, por não ser prioridade.  
Prof. Jairo Cezar      




[1] http://www.sirhesc.sds.sc.gov.br/sirhsc/conteudo_visualizar_dinamico.jsp?idEmpresa=18&idMenu=1445&idMenuPai=521
[2] Idem.

sábado, 20 de junho de 2015

Supremo Tribunal Federal discute ADI 4439 que trata sobre a polêmica do Ensino Religioso nas Escolas Públicas

Ainda hoje poucas são as escolas públicas de ensino fundamental em que o professor no início e final das atividades solicita as/aos estudantes para se posicionarem em pé e proferirem oração com ênfase no culto católico. Iniciar o texto com essa reflexão tem por objetivo refletir o resultado da audiência ocorrida no último dia 15 (quinze) de junho no STF (Supremo Tribunal Federal) que tratou sobre ADI 4.439 impetrada pela Procuradoria Geral da União para discutir o mérito relativo ao ensino religioso se deve ou não ser ofertado nas escolas públicas, que conforme o Art. 210 parágrafo único da Constituição Federal  "O ensino religioso, de matrícula facultativa, constituirá disciplina dos horários normais das escolas públicas de ensino fundamental".
Quando a lei estabelece que a matricula se constitui como facultativa traduz que os estudantes terão direito de decidir se querem ou não assistir as aulas.  Além desse item, a ação também questiona trechos da própria Lei de Diretrizes e Base, 9394/96 e do acordo firmado entre o Brasil e a Santa Sé, em 2010, que prevê, entre outras coisas, o ensino religioso nas escolas públicas.  No Brasil quando o assunto é religião e sua disseminação nas escolas deve ser ressaltado o aspecto cultural extremamente influenciado pelo culto católico, cuja presença data do início do século XVI  quando os jesuítas atravessaram o atlântico para assegurar o domínio cristão/católico ao novo mundo, impondo regras morais depreciativas aos ritos tradicionais dos indígenas, com forte apreço aos elementos da natureza, à água, às florestas, os animais, bem como das divindades, dos cultos, interpretados como práticas heréticas.
As primeiras escolas públicas aqui instaladas seguindo a linha da moralização cristã, tinham os jesuítas como meta oferecer escolaridade gratuita exclusivamente à população indígena. No entanto, dada a inexistência de escolas estatais nas vilas e cidades, os proprietários e demais integrantes da elite reivindicaram o direito à educação para seus filhos admitindo serem usuários exclusivos de direito. Nessas unidades de ensino, os currículos como a própria arquitetura escolar foram meticulosamente pensados evidenciando a disciplina do corpo e o desprezo a tudo que pudesse subverter a fé.   
Porém, a predominância do culto católico nas escolas persistiu séculos mais tarde sendo ratificada como religião oficial do império através da constituição de 1824. Com a Proclamação da República onde houve a separação entre a igreja e o Estado assumindo um caráter de laicidade, a Constituição de 1891 reiterou que o ensino religioso nas escolas públicas deveria ser leigo, ou seja, ministrado por pessoas sem qualquer vínculo religioso.  Mesmo com tais dispositivos constitucionais tornando o Estado um seguimento imparcial no qual assegurava livre expressão de culto à sociedade, o ensino confessional católico, manteve-se presente no cotidiano das escolas publicas e providas por professores indicados pela própria instituição religiosa do município.  
Dada ao caráter multicultural e da forte diversidade de religiões predominantes no território brasileiro nas últimas décadas do século XX, as novas regras contidas nas diretrizes educacionais como a lei 4024/61 mantinham o ensino religioso facultativo e não confessional. Em 1971, com a promulgação da Lei de Diretrizes e Base 5692/71, já sob o regime militar, foram estabelecidas a obrigatoriedade nas escolas públicas as disciplinas de Educação Moral e Cívica, OSPB, entre outras, enquanto o ensino religioso a matricula manteve-se facultativa, porém, sendo agora assegurada para os estudantes do primeiro e segundo graus. 
Portanto, a pseudo regularização do ensino religioso nas escolas públicas brasileiras somente ocorreu com a constituição de 1988 definindo-a como sendo facultativa e garantida nos horários normais do ensino fundamental.  Ao mesmo tempo que a constituição estabelece parâmetros acerca do ensino religioso, regulando como disciplina não obrigatória, a LDB 9.394/96 lança normatizações na qual assegura sua inserção na grade curricular como parte integrante da educação básica. A propria legislação garante que o ensino religioso nas escolas os currículos não poderão estar pautados em conceitos e valores preconceituosas que incitem os estudantes a creditarem opiniões discriminatórias de certos cultos religiosos em defesa de outros tidos como "superiores". 
Quando se acreditou que o Estado brasileiro depois de tentativas fracassadas estava finalmente alcançando o grau de maturidade política mantendo-se independente segundo os preceitos constitucionais, não privilegiando qualquer credo que fosse, em 2010 gerou estranheza a atitude do governo brasileiro em referendar acordo com a Santa Sé, Estado do Vaticano, permitindo inserir o ensino confessional católico nas escolas públicas. Uma atitude que revela total desacordo aos princípios republicanos e democráticos do Estado brasileiro, bem como uma afronta à constituição brasileira e a própria LDB que estabelecem parâmetros acerca dessa matéria. Com base nesse acordo bilateral deixa transparecer o contínuo poder e influência de uma instituição religiosa no dia a dia  de uma sociedade e nas decisões políticas de um país que que se constitui como laico.
O que chama atenção na matéria que está em discussão no Supremo é o fato de estar ocorrendo atualmente disputas acirradas envolvendo religiões tradicionais e neopetencostais por espaços televisivos, radiofônicos, de igrejas e de escolas. Diariamente inúmeros canais abertos de televisão dedicam horas e horas de sua programação para a transmissão de ritos, de testemunhos de milagres de curas, de catarse coletiva, cujos problemas como a falta de dinheiro, as enfermidades, os conflitos conjugais, entre outros, levam a acreditar que estão condicionadas a existência de forças sobrenaturais malignas, realçadas na figura imaginativa do “demônio”.
Não é admissível que escolas públicas brasileiras tenham o mesmo destino das do Rio de Janeiro, loteadas entre as principais religiões que mesmo com a justificativa que respeitam as diversidades, subjetivamente nada mais são que instrumentos de doutrinação, que começam na tenra idade, quando as crianças ainda imaturas, transformam-se em presas fáceis de entidades religiosas oportunistas. Além do mais os professores são custeados pelo próprio estado, infringindo  a  Art. 19, I da Constituição Federal que proíbe a subvenção estatal ou aliança com fins religiosos.  
Saindo da seara jurídica e trazendo o assunto religião para o ambiente pedagógico da sala de aula, caso o Supremo decida pela permanência do ensino não confessional e facultativo como está na constituição, o problema não estará solucionado pelo fato do ensino religioso atender exclusivamente estudantes do ensino fundamental, a partir dos seis anos de idade. Com a idade dos seis, sete anos ou mais, as crianças não estão neurologicamente maduras o suficiente para compreender conceitos complexos como diversidade cultural, conflitos religiosos, fundamentalismo, entre outros tantos temas que requer do estudante certa capacidade de abstração.
São assuntos tratados no ensino médio nas áreas de sociologia, filosofia, história, etc. Outro item que é questionável é quanto ao conceito de facultativo.  No ensino médio, esse dispositivo seria fácil de resolver, pois o estudante teria liberdade de optar em participar ou não da aula. No ensino fundamental, com alunos de seis anos, por exemplo, cuja turma é atendida por um único professor, é muito difícil acreditar que um estudante tenha condições de escolha em querer ou não participar das aulas. Quanto ao ateísmo, qual seria o tratamento adotado, já que a disciplina se constitui como religiosa?         
Também deve ser destacando que no momento que for trabalhar religião o profissional deve estar munido de todo um cabedal de conhecimento capaz de transitar por todas vertentes religiosas, agrupando-as segundo suas linhas filosóficas e ideológicas, e colhendo de ambas apenas elementos que contribuíam para o convívio tolerante e democrático dos diferentes grupos sociais. Numa sociedade como a brasileira onde a educação é tratada com desprezo pelas autoridades, cujos profissionais que atuam nas áreas básicas carecem de uma boa formação, imaginem o professor que exerce a disciplina de religião não confecional. Tudo leva a crer que se não houver uma abordagem mais profunda desse assunto, que ultrapasse o simples debate do supremo em decidir pelo confessional ou não confessional, o caminho deverá ser pela reforma constitucional, propondo ao congresso a supressão de todos os artigos da constituição que tratam sobre ensino religioso nas escolas públicas.     

Prof. Jairo Cezar  

terça-feira, 16 de junho de 2015

As verdades omitidas  sobre a redução da maioridade penal

É um tanto quanto questionável quando seguimentos ultraconservadores do congresso nacional aproveitando-se do momento de instabilidade no qual passa a sociedade e o oportunismo flagrante da grande mídia nacional colocam no centro do debate a redução da maioridade penal como um dos assuntos relevantes da pauta política. Não é a toa que por trás dessa proposta reformista neoliberal há interesses óbvios de setores políticos (deputados) e da própria iniciativa privada em obter concessões de outorgas para construção de novos presídios. Paradoxalmente, o seguimento penitenciário é visto como um negócio lucrativo, sendo que a redução da idade penal irá seguramente expandir as demandas por novos presídios, que por sua vez multiplicarão os lucros de outros setores ligados a segurança pública e privada.
É importante esclarecer que no Brasil, enquanto o gasto público por estudante/ano, em tempo integral, pouco ultrapassa os quinhentos reais, no setor carcerário o valor aproxima os três mil reais/ano. Mesmo assim, essas instituições que deveriam cumprir com sua função de reabilitar o infrator, se constituem em depósitos de pessoas, verdadeiras panelas de pressão prestes a explodir como da rebelião ocorrida em presídio no Maranhão em 2013 resultando em nove mortes.  Se observarmos com atenção o conteúdo dos noticiários divulgados pelos telejornais diários chama atenção a enormidade de reportagens que dão ênfase à violência, à criminalidade, o tráfico de drogas, entre outros delitos. Raros, portanto, são os episódios reportados cuja ocorrência tenha sido em bairros cuja população é mais abastada economicamente. Nada disso, geralmente os incidentes, com mortes, são em áreas desassistidas pelo Estado, tendo geralmente o tráfico de drogas como elemento motivador.
Dentre os envolvidos nesse simulacro de violência está, comumente, a população negra, na sua maioria crianças e adolescentes advindas de famílias esfaceladas, sem qualquer perspectiva de futuro. O problema, portanto, deve ser interpretado como uma patologia social de caráter política, ou seja, condicionada a escassez de investimentos pesados em políticas públicas em educação, saúde, lazer, saneamento básico etc. O Estado, portanto, não pode ser eximido dessa culpa histórica quando deixa de cumprir leis importantes como os Art. 5° e 6° da Constituição Federal que trata sobre princípios básicos à dignidade humana. Sendo assim, o não cumprimento aos preceitos constitucionais torna-se mais fácil prender que assisti com educação a sociedade. Qualquer indivíduo com o mínimo de esclarecimento consegue compreender que enquanto no Brasil bilhões de reais são sonegados ou desviados em operações fraudulentas, sem que os culpados sejam realmente punidos, em nada adianta aprovar leis e mais leis como da redução da maioridade idade penal. Isso porque expressiva parcela das vítimas de violência são menores cujos ambientes em que vivem sofrem todo tipo de descaso público.
São bairros que não apresentam as mínimas condições de infraestrutura básica, que adicionado a outros fatores negativos como escolas precárias, desemprego e escassez de espaços de lazer, transformam crianças e adolescentes em prezas fáceis do crime, engordando as estatísticas da violência e do número de condenados depositados em presídios e centos de recuperação de menores infratores, sem que tenham o mínimo de infraestrura para a reeducação, a ressocialização. Entretanto crianças e adolescentes são mais vítimas que protagonistas de homicídios no Brasil e as estatísticas comprovam essa afirmação. Para se ter idéia o número de homicídios de crianças e adolescentes entre 1980 a 2010 cresceu 346%, ou seja, mais de 176 mil indivíduos foram mortos nesse período. Somente em 2010, foram 8.686, isto é, 24 homicídios por dia.  Para se ter noção da carnificina contra adolescentes e crianças brasileiras, o Brasil, segundo a OMS (Organização Mundial da Saúde), está na quarta posição, entre 92 países pesquisados, em número de assassinatos. São 13 homicídios para cada cem mil pessoas. É 50 a 150 vezes maior que em países como Inglaterra, Portugal, Espanha, Irlanda, Itália, Egito, etc., cujas taxas mal chegam a 0,2% de homicídio[1].
Vem se tornando rotina reportagens mostrando rebeliões em presídios brasileiros sendo que os motivos resultam da superlotação. Se os centros de detenções, hoje existentes, não conseguem atender a demanda, como ficarão a partir do momento que lei estabelecer a maioridade penal? Acreditar que com a redução  será possível assegurar à paz, à segurança nas praças e cidades brasileiras como imaginam parcela expressiva dos congressistas e da população, é com certeza um pensamento pouco inteligente com escassa compreensão das legislações em vigor e da realidade social brasileira. Não é com reformas ou novas leis que se resolverão problemas estruturais como a violência cuja causa está no próprio modelo econômico que se alimenta da exclusão, da exploração do trabalho e, pasmem, da própria violência. Se um país como o Brasil onde quase quinhentos bilhões de reis são sonegados ou não declarados anualmente no imposto de renda, e o pouco que é arrecadado é mal gerido, já é de se acreditar que o resultado é o que estamos acompanhando diariamente, escolas e hospitais públicos aos pedaços e crianças e adolescentes pelas ruas sem qualquer expectativa de futuro.
Enquanto isso a população brasileira acompanha atônita através da grande mídia as repetidas denúncias diárias de fraudes, corrupções entre outros crimes envolvendo figuras expressivas que comandam empresas importantes como a Petrobras e grandes empreiteiras. São bilhões de reais solapados dos cofres públicos transferidos para paraísos fiscais que poderiam ser aplicados na reforma de escolas públicas ou em projetos de infraestrutura que assegurasse o acesso das crianças das áreas de risco a projetos culturais em horário integral. Em qualquer democracia que se preza que considera a opinião pública como princípio elementar para tratar de questões polêmicas como a redução da maioridade idade penal deveria, antes de tudo, promover um grande diálogo nacional, para depois sim consultar a população mediante plebiscito, como o que ocorreu no passado recente para tratar sobre o desarmamento.
Países sul americano como o Equador e o Uruguai se utilizaram com eficiência desse dispositivo para tratar também de temas complexos e polêmicos semelhantes. Por que não adotar também esse procedimento no Brasil? Por que vem se isentando desse importante mecanismo? Talvez pelo fato de não querer envolver a sociedade na discussão, pois certamente, lhe capacitaria compreender os bastidores deste cenário cujos atores envolvidos, na sua maioria, legislam em benefício próprio ou de seus patrocinadores.  Seguramente os 80% da população influenciada pela mídia, que se posicionaram favoráveis a redução da maioridade penal, mudariam de opinião acerca da proposta. No entanto, poucas são as expectativas de que tais ações serão concretizadas. Isso porque não há interesse do atual congresso ultraconservador que representa os interesses não da sociedade, mas de uma fração abastada assentada na ignorância e na marginalidade de milhões de brasileiros.
O exemplo disso são os resultados já sabidos sobre a pseudo reforma política que está em curso. Tudo que está sendo feito é promover mudanças de tal modo que  nada se mude e assim assegurar o domínio sobre toda estrutura de poder. E quanto aos ajustes estruturais cujos protagonistas insistem em afirmar  que são para restabelecer os rumos da economia do Brasil, escondem do povo que o plano é aumentar os lucros do capital especulativo intensificando a recessão, o desemprego, a miséria social e a violência generalizada. Promover mudanças paliativas sem alterar a base de sustentação da estrutura de poder mantém inabalada as benesses que tal sistema proporciona aos donos do poder. Outro aspecto que está sendo desconsiderado ou negligenciado pelo congresso quando a proposta de redução da maioridade penal, é que já existem legislações específicas que tratam desse assunto.
O próprio ECA(Estatuto da Criança e do Adolescente) define penalidades e ações corretivas para os infratores entre 12 a 18 anos. O que se vê é a inoperância do próprio Estado em não oferecer condições mínimas para que o adolescente infrator possa se recuperar. Por último, outro aspecto que deve ser ressaltado na questão da maioridade penal são as inúmeras legislações, resoluções ou convenções internacionais, muitas das quais assinadas pelo Brasil, que asseguram proteção à criança e ao adolescente, que não são compridas. Dentre as legislações destacam: a Constituição Federal, os Art. 5º e 6º;  a Doutrina de Proteção Integral do Direito Brasileiro, sobre direitos universais da criança e a Convenção sobre Direito da Criança e do Adolescente, da ONU em que o Brasil é um dos países signatários.
Diante do exposto, é preciso refletir a forma como tal assunto vem sendo tratado por aqueles que teriam por função fiscalizar e exigir do Estado brasileiro o cumprimento das legislações e convenções em vigor. As mais importantes são as que tratam sobre as garantias dos programas de prevenção criminal; assistência social eficazes às comunidades mais pobres e educação pública e de qualidade para todos. São essas entre outras metas mínimas que o Estado deveria cumprir e não cumpre. Não assegurando as metas mínimas definidas em leis ou convenções o resultado é o que estamos hoje vivenciando, um país que ao mesmo tempo adota como lema de governo “Estado Pátria Educadora”, bilhões de reais são suprimidos do orçamento para educação e escolas públicas em todo Brasil estão sendo interditadas pelo simples motivo de não garantir as mínimas condições de segurança. . 
Prof. Jairo Cezar    
  



[1] http://negrobelchior.cartacapital.com.br/2015/03/30/18-razoes-para-nao-reduzir-a-maioridade-penal/

Audiência Pública e as manobras políticas para a liberação de atividade mineradora em morro no município de Maracajá

Atendo aos desdobramentos relativos ao impasse envolvendo ONG, mineradora, poder público municipal e Ministério Público Federal quanto a permissão ou não de atividade mineradora no lado norte morro no município de Maracajá, na terça feira, 07 de junho, foi realizada nova audiência pública cuja intenção dialogar ouvindo os argumentos favoráveis e contrários a essa atividade e abrir espaço para a população decidir através do voto qual a melhor opção. Segundo relatou a coordenadora da ONG, no final da audiência houve uma manobra política articulada pela administração pública de tal modo que não fosse realizada a votação. Disse que o prefeito “vendeu o voto” decidindo em favor das empresas, contrariando o que ele mesmo defendeu em outra ocasião quando admitiu que as empresas mineradoras não revertiam em lucros ao município.
Sendo assim, com a decisão tomada, a partir de agora a Secretaria do Planejamento poderá permitir a mineração do morro também no lado norte, que será uma tragédia. No entanto, disse ela que a ONG tomará outros caminhos como protocolar denúncia no MPF e na Polícia Federal para que seja realizado levantamento de todas as irregularidades cometidas no município por ambas as empresas. O representante de uma das empresas presente na audiência, afirmou que há mais de quarenta anos a atividade mineradora vem sedo praticada no município, que concorda que haja algumas imperfeições no processo de extração. Diante do que falou a procuradora, deu garantia que irá acatar a sugestão do órgão federal de realizar um EIA-RIMA da área pretendida onde será possível dar clarividência de todas as peculiaridades do morro. Argumentou que quando a empresa se instalou no município não havia a obrigatoriedade de estudos desse gênero, que em função das conversas que teve com a procuradora irá acatar as sugestões.
Já o prefeito relatou que faltam regras estruturais no município para tratar desse assunto e que o plano diretor terá essa função.  Quanto a atividade minerado admite que as empresas envolvidas no impasse têm direito de explorar devido a existência de leis federais que lhes dão garantia. Qualquer impedimento as atividades às respectivas empresas ambas podem impetrar na justiça ações indenizatórias podendo inviabilizar economicamente o município. Que sua preocupação é com o futuro do município. Que a lei relativa ao plano diretor que está sendo encaminhada à câmara estabelecerá regras quanto a exploração minimizando os danos ambientais. Quanto a ação da ONG solicitando a não exploração do lado norte do morro, argumentou que a proposta da prefeitura favorável a criação de Zona de Permissão Especial é a mais correta, que na mesma lei existe regras judiciais onde notificará as empresas que descumprirem as normatizações. Por não haver legislação específica no município que trata sobre o tema, o licenciamento ambiental liberando a mineração foi autorizado pela FATMA.  Sobre a não votação da proposta, o motivo foi que não havia clima, pois inviabilizaria todo o projeto.
Já a Procuradora da República deixou claro que as licenças ambientais concedidas pela Fatma não foram acompanhadas de EIA-RIMA que é obrigação segundo normas federais. Que todas as reuniões ocorridas foram proveitosas, pelo fato de melhor esclarecer a população todos os detalhes da complexidade ambiental que cercam o morro. Quanto ao TAC, não sabe ainda se será possível conceder às empresas. No entanto não será permitido o avanço da lavra de extração enquanto as empresas não apresentarem o EIA. Quanto ao morro, lado norte, com a decisão do município, através da secretaria de planejamento, de liberar para mineração, será necessário encaminhar Ação Civil Pública, no qual pode, durante o processo, ser celebrado acordo judicial entre as partes conflitantes, se ambas recuarem com suas posições. Quanto ao edital convocando audiência parar votação de itens do plano que trata sobre a atividade mineradora no morro do maracajá, disse a procuradora que desconhece. Admitiu ter ouvido notícias de não ter havido votação de tal tema nas audiências do plano diretor.
Já o arquiteto que vem coordenando os trabalhos de elaboração do plano diretor do município, disse que nas últimas audiências devido aos impasses relativos a atividade mineradora no município, pela falta de consenso entre as partes decidiu realizar consulta ao MPF no qual o orientado a dar sequência ao processo. A questão agora é concluir o plano diretor para que o município tenha uma lei que legisle sobre o respectivo tema. Sendo assim depois de ouvir o MPF, o município decidiu que o Morro seria enquadrado em uma ZPE (Zona de Permissão Especial), sem a necessidade de levar a  votação. Disse também que nem todas as audiências têm caráter deliberativo. Quanto ao tema uso e ocupação do solo nas discussões foi possível chegar a um consenso razoável. Dentro dessa linha, na audiência de terça feira, 07 de junho, visto que as partes litigantes não cediam, a decisão mais racional tomada foi não permitir a votação.
 Portanto, diante desse imbróglio, a prefeitura entrou como mediadora e tomou a decisão de acatar a proposta que fosse melhor para o município que seria a mineração. A decisão pela não votação da proposta, segundo o arquiteto, foi pelo fato do equilíbrio entre os que eram a favor e contrários à mineração.  Visto que a margem era pequena e que poderia conflitar com a legislação foi decidido de antemão pela proposta da prefeitura. Agora o documento do plano diretor sobre uso e ocupação do solo vai passar por um rito processual, sendo enviada para câmara de vereadores para ser apreciada e votada.

Prof. Jairo Cezar            

quarta-feira, 10 de junho de 2015


Ecossistemas frágeis e população reféns de empresas mineradoras no município de Maracajá

A luta pela proteção dos ecossistemas frágeis como muitos imaginam, não é exclusividade apenas de entidades ambientais e órgãos estaduais e federais que atuam no Balneário Morro dos Conventos. Nos demais municípios do Extremo Sul de Santa Catarina como Sombrio, Balneário Rincão e Maracajá, entidades ambientais também tiveram que ser criadas para resistir as ações depredatórias de seguimentos econômicos, bem como do próprio poder público, cujas investidas realizadas até o momento pelo Ministério Público Federal, dão conta que empresas como do setor de mineração de rochas, no município de Maracajá, vem desrespeitando de forma escancarada legislações específicas. O agravante é que as irregularidades, além de avalizadas por órgãos ambientais que teriam por lei restringir tais práticas, põem em riscos aqüíferos importantes cuja recarga ocorre no morro, à fauna, à saúde e a segurança de milhares de pessoas que habitam o entorno da pedreira. 
A temática mineração e as denúncias de irregularidades envolvendo empresas e órgãos ambientais envolvidos na exploração mineral foram um dos temas debatidos na reunião do Conselho Consultivo do Comitê da Bacia do rio Araranguá, na última quinta feira, 23 de maio de 2015, no CENTRAR/EPAGRI, município de Araranguá.  Para explanar o tema mineração em pedreira no município de Maracajá, a convidada foi a professora da rede estadual que é coordenadora da ONG Instituto Socioambiental Maracajá, onde desde novembro de 2014 vem se empenhando junto com os demais componentes da entidade na luta para decifrar os mistérios que cercam as políticas relativas a mineração de rochas (diabásio) naquele município.
Como professora da área de geografia em uma escola da rede estadual próxima a pedreira, começou a perceber que poderia haver algumas práticas na atividade mineradora que seguramente estariam infringindo leis federais e estaduais, especialmente quanto ao processo de detonação de pedras. Disse que com os andamentos da duplicação da Br-101, os recursos oriundos das medidas compensatórias da obra foram destinados para a elaboração do Plano Diretor Municipal, que teve inicio em 2010, porém até o ano passado o referido documento ainda permanece sobre a mesa do executivo municipal. Portanto, o relatório conclusivo do plano ainda não teria sido encaminhado para apreciação na câmara de vereadores e posterior votação. Diante do exposto, o prefeito tomou a decisão de rever plano, sendo que nas discussões do tema zoneamento e Uso e Ocupação do Solo, o que mais gerou polêmica foi saber que chefe do executivo propõe tornar o morro como  zona   de permanência especial. No item permissível, que é uma das três subdivisões da zona de permanência especial, constado no plano diretor, garante a atividade mineradora, cuja autorização passa pela Secretaria de Planejamento. Portanto, a secretaria basta dizer sim, que a exploração dará início.  
Em uma audiência pública na qual participou para discutir o morro do Maracajá, o que mais chamou a atenção da professora foi a questão da água, que segundo relatório apresentado, todos os aqüíferos existentes estão ameaçados. Sendo o Morro um Sistema Natural de recarga dos aqüíferos, que por sua vez abastece os açudes, com a possível mineração de toda a extensão do morro, seguramente haverá o comprometimento dos mananciais do município. Hoje o município é abastecido pela barragem do Rio São Bento, situado no município de Nova Veneza, caso a barragem reduza sua carga de água, o município de Maracajá terá que explorar a água do seu aqüífero. No entanto, com a solicitação para minerar no lado norte do morro, todas as nascentes serão comprometidas. As futuras gerações, como ficam, questionou a professora?
Quando da realização de audiência com a presença do proprietário de uma das duas mineradoras, a SETEP, o mesmo admitiu que a detonação de rochas vem ocorrendo respeitando distâncias estabelecidas por lei, ou seja, 160 metros da escola. Mesmo seguindo essa metragem o risco de acidente seria enorme, disse a professora, pelo fato do morro ser muito íngreme, podendo deslizar rocha sobre a escola. O representante do DNPM (Departamento Nacional de Pesquisas Minerais) presente na reunião admitiu que a respectiva distância dos explosivos  é pequena, que tais atividades são coordenadas por profissionais treinados. Sobre a autorização do órgão para a mineração, alertou que, tal decisão se concretizou mediante o licenciamento ambiental autorizado pela FATMA (Fundação Ambiental do Estado de Santa Catarina), que cabe também a respectiva entidade ambiental recomendar o EIA-RIMA (Estudo de Impacto Ambiental e Relatório de Impacto Ambiental).
Acompanhando os desdobramentos dos fatos e concluindo que os procedimentos adotados tanto pela empresa mineradora como pelo poder público na condução do plano diretor estavam envoltos de possíveis irregularidades, a ONG Instituto Socioambiental de Maracajá encaminhou ofício ao Ministério Público Federal solicitando audiência na sua sede em Criciúma para tratar do tema Morro do Maracajá. Confirmada as denúncias de irregularidades no processo de extração mineral, o MPF (Ministério Público Federal) determinou, em novembro de 2014, o fechamento da empresa alegando inexistência de EIA-RIMA. A empresa, refutando a decisão do órgão federal, argumentou que a autorização pela exploração de área de morro, setor norte, foi autorizada pelo DNPM, isso, é claro, depois que o órgão ambiental estadual, FATMA, liberou o licenciamento ambiental, autorizando a supressão de árvores nativas próxima à escola. Tudo indica que o órgão ambiental estadual poderá vetar a licença, pelo fato de existir legislação específica no município, cujo artigo 178, da lei orgânica, diz que toda árvore do morro é imune de corte, bem como de outros itens como nascentes que são passíveis de proteção.      
Com a intervenção do ministério público, ambos os seguimentos envolvidos nas denúncias justificaram suas ações seguindo decisões das entidades envolvidas como o DNPM e o poder público municipal.   Segundo a Procuradora da República, jamais o órgão ambiental estadual deveria ter permitido o corte de vegetação dessa área por estar situado em uma declividade de 25 graus, infringindo legislação federal. Disse Selma que o erro está quando as duas empresas mineradoras dividiram a área para mineração em polígonos, cada uma podendo explorar até 119 mil metros cúbicos de rocha por ano. A legislação define o morro como um único polígono. A não obrigatoriedade da apresentação de EIA-RIMA pelas duas empresas mineradoras, está fundamentada no CONSEMA, cujo órgão  estabelece a obrigatoriedade de estudos ambientais completos quando qualquer empresa venha extrair 120 mil metros cúbicos de rochas, ou mais.
 Abaixo desse montante, o que se pede é apenas um estudo ambiental simplificado. Nesse sentido, a divisão do terreno em polígonos, cujo montante de material extraído é de 119 mil metros caracteriza as empresas como de pequeno porte. Por mil metros cúbicos a menos de rocha extraído, as duas empresas estão isentas de estudos mais completos como impactos de vizinhança, que seguramente somente esse item seria suficiente para a não liberação de licenciamento por parte da FATMA. No entanto, é muito melhor liberar em pedacinhos o morro ou sua totalidade? Outro agravante nessa questão é quanto a fiscalização, que, segundo a professora, não existe. Para dar clarividência que as empresas omitiam os valores declarados do montante de pedras extraído na área em atividade, foi instalada câmara em uma das ruas utilizadas pela empresa para escoar o material. As imagens confirmam que durante o dia transitaram cerca de 100 caminhões, cada um transportando 12 metros cúbicos de pedra.
Seguindo a lógica matemática se for multiplicado os 12 metros cúbicos por 100 caminhões/dia, o resultado será 1, 200 metros cúbicos transportados por dia. Multiplicado os 1.200 por 22 dias, que é quantidade de dias úteis/mês, o resultado ultrapassa em muito os 119 mil metros cúbicos/ano como informou a empresa. Na realidade são extraídos mais de 300 mil metros cúbico/ano por cada empresa. O que é estarrecedor é o valor repassado por ambas ao município sob a forma compensação, entre 30 a 40 mil reais por ano. Sem contar o passivo ambiental e a dilapidação do patrimônio público que não é compensada pelas empresas. O uso de dinamite na detonação da pedreira, se a empresa segue todas as recomendações legais, também foi tema de discussão na audiência.
Foi confirmado que as detonações estão comprometendo o morro devido a apresentação de rachaduras nas encostas com riscos de deslizamento. Nas discussões sobre o plano diretor foi encaminhado proposição para que toda a área do morro ao norte seja declarada como ZPE (Zona de Permanente Especial), enquanto o trecho sul, já minerado, ZPA (Zona de Conservação Ambiental). Com uma condicionante, que na ZPA as empresas estabeleçam planos de recuperação das áreas já mineradas. Na realidade tais medidas compensatórias são condicionantes essências para a concessão de novas lavras. Fora disso, as empresas estarão impedidas de minerar. Em conversa com o prefeito sobre a proposta, o mesmo se opôs alegando incompatibilidade com a legislação municipal. Diante da negativa do poder público municipal, na audiência pública programada para o dia 10 de junho vai ser encaminhado pedido para nulidade de todas as licenças autorizando a mineração no morro, bem como a proibição definitiva da dessa atividade no município.
O que está ocorrendo no maracajá envolvendo as duas empresas mineradoras pode seguir a mesma trajetória da empresa Saibrita, que foi autuada por ter extraído 640 milhões de metros cúbicos de rocha sem autorização dos órgãos ambientais, estando o patrimônio da empresa indisponível atualmente. O agravante nesse imbróglio é que a população acompanha os fatos sem compreender com clareza os desdobramentos. Uma clara manipulação de tal modo a mantê-las passivas frente às manobras envolvendo o poder público e seguimentos econômicos. Sobre a posição negativa do poder legislativo sobre a proibição da mineração, o representante do DNPM argumentou que mesmo que o legislativo tivesse se posicionando favorável, sua ação seria inglória, porque, quando se trata de mineração, a decisão é de exclusividade da União, por se tratar de subsolo.
O caminho seria a aprovação de uma legislação municipal específica restringindo tal atividade, como se sucedeu no município de Urussanga, depois do acidente que vitimou dezenas de pessoas em uma mina de carvão. Porém, mesmo assim não há qualquer garantia que tal lei possa inviabilizar a atividade de mineração. Sobre as questões hídricas no município, cabe ao município exigir da empresa o pagamento das medidas compensatórias previstas em lei, cujos recursos podem ser utilizados para pesquisas envolvendo aspectos hídricos e ambientais das áreas envolvidas pela mineração.
A professora denunciou que a empresa descumpriu decisão do MPF de que não seria permitida a detonação de rochas depois da ocorrência de chuva. Disse também que a prefeitura liberou as licenças para exploração por não haver legislação proibindo essa atividade.  Quanto ao Comitê, o Conselho deliberou que fosse encaminhada solicitação ao coordenador da Defesa Civil, regional sul, cujo membro é também conselheiro do comitê, para inspecionar o local. Para o DNPM, a prefeitura poderia estabelecer regras disciplinando o deslocamento de caminhões evitando possíveis riscos à segurança da população. 
Como bem ressaltou a professora, a intenção do movimento não é inviabilizar definitivamente a atividade mineradora no município. O que se quer é que sejam esclarecidos todos os procedimentos hoje adotados pelas empresas no processo de mineração e o papel do poder público municipal e dos órgãos ambientais na concessão de licenciamentos e fiscalização das atividades. Que a atividade mineradora continue sendo praticada, porém, somente na área já explorada, seguindo todas as normas ambientais obrigatórias. Enquanto na parte norte, seja inviabilizado por considerar área de Conservação Ambiental Especial, podendo assim transformá-la em área de contemplação ambiental ou Unidade de Conservação, como atrativo turístico, capaz de incrementar ainda mais a economia do município.    
Prof. Jairo Cezar                             

terça-feira, 9 de junho de 2015

Projeto Orla e os debates sobre políticas públicas de Preservação e difusão do Patrimônio Arqueológico da faixa costeira do município de Araranguá

Na quinta feira, 22 de maio, parcela expressiva do publico que esteve nas dependências do Hotel Morro dos Conventos seguramente se sentiu privilegiado pelo fato de ter tido a oportunidade de sanar dúvidas em relação à Arqueologia, ciência ainda pouco conhecida pela esmagadora parcela da população brasileira. Para explanar sobre arqueologia e as descobertas arqueológicas no balneário Morro dos Conventos, foi convidado o professor doutor Juliano Bittencourt, do IPAT/UNESC, cujos estudos desenvolvidos ou em andamento tiveram e tem o balneário e faixa costeira do extremo sul catarinense como campo de investigação.
No entanto antes do início da explanação o comandante do corpo de bombeiros de Araranguá solicitou a palavra para fazer algumas ponderações à coordenação do projeto orla pelo fato de não ter sido encaminhado convite formal a corporação para participar das reuniões. Segundo o Tenente Marcolino o mesmo ressaltou que sua presença na reunião do dia 22 de maio se deu por puro acaso. Disse também que o equívoco da coordenação também envolveu a polícia militar. Argumentou que o corpo de bombeiro que presta serviço a comunidade tem muito a contribuir nas reuniões que poderia estar participando desde o início, tendo em vista as experiências acumuladas na orla durante a temporada de veraneio.
Informou que atos de vandalismos corriqueiros, como a queima de uma cabana dos salva-vidas no Arroio do Silva, orçada em  sete mil reais dos cofres públicos, deve estar inserido no projeto orla como um problema e ser debatido com a comunidade. Sendo assim sugeriu que a organização do evento elabore convite formal e encaminhe aos comandantes da polícia militar e bombeiros para que ambos participem dos encontros. Diante da critica do tenente, Simon respondeu que vem participando das reuniões um cidadão que se identifica como bombeiro, vindo até a assinar o caderno de presença. O tenente ressaltou que a companhia de Araranguá não autorizou qualquer pessoa para participar dos encontros, que o cidadão descrito, não faz parte da corporação, que fez apenas um curso de salvamento civil, porém, já foi excluído.
 Depois dos inconvenientes relacionados aos comandos da política militar e corpo de bombeiros, o professor Juliano finalmente iniciou sua explanação, primeiro apresentando a equipe que o acompanhava. Pediu desculpas por não ter tido condições de atender o grupo em outra oportunidade, em especial ao professor Jairo que em várias ocasiões lhe teria encaminhado E.mail solicitando sua presença no Morro dos Conventos como haviam agendado em outra oportunidade. Além de mapas demarcando as áreas em estudo na região, distribuiu aos presentes cartilhas didáticas e lúdicas de arqueologia, bem como cópia de um artigo intitulado Arqueologia entre rios: do Urussanga ao Mampituba, Registros arqueológicos pré-históricos no extremo sul catarinense, para que o público presente tivesse noção sobre o que seria discutido. 
 Mostrou também artefatos de caça e peças de cerâmica produzidas em oficinas com estudantes, onde retrata um pouco do cotidiano dos povos que habitaram o extremo sul de santa Catarina, cuja presença mais antiga é datada de mais ou menos quatro mil anos atrás. Sobre a instituição no qual está representando, a UNESC, disse o departamento de arqueologia vem atuando desde 1997, 1998, quando foi contratada para o levantamento arqueológico do trecho onde seria construída a rodovia Interpraias, entre a Lagoa dos Freitas, Içara, até o município de Balneário Gaivota. No trecho foram notificados inúmeros sítios arqueológicos, alguns já pesquisados através de escavações. Os estudos da área onde está a barragem do rio São Bento também foram executados pela equipe de arqueologia da UNESC.
Quanto a BR-101, todo levantamento arqueológico ficou sob a responsabilidade da UNUSUL.  Admitiu que a quantidade de institutos e profissionais envolvidos na arqueologia é aquém do necessário atualmente, sendo que a empresa mais próxima que presta assistência técnica similar à UNESC está localizada em Florianópolis. Com relação aos mapas expostos no interior da sala, três ao todo, disse que ambos mostram as áreas ocupadas pelos distintos grupos, os períodos, e o progressivo avanço humano que ameaça a segurança desses sítios. Um dos mapas apresentados, de cor vermelha, destaca a forte pressão humana sobre os espaços ocupados por sítios, porém, quando se refere ao Morro dos Conventos, esse avanço ainda é, no momento, um tanto quanto limitado. O projeto orla tem entre outras atribuições o estabelecimento de um plano para a definição de áreas possíveis para ocupações reservando aquelas consideradas APPs e as ocupadas por deposições ou elementos que confirmam a presença humana pré-histórica. 
A preocupação é que enquanto o projeto orla não define as políticas para as respectivas áreas todo o acervo arqueológico encontrado está ameaçado, mesmo sabendo que o Ministério Público Federal recomendou ao poder publico municipal que providenciasse a proteção dos mesmos, determinação que não foi cumprida. Informou Juliano que a Unesc vem desenvolvendo trabalhos na região no qual resultou em publicações de pesquisas, seminários e congressos, bem como a participação em eventos em vários estados e no Exterior. Dentre os mais importantes destacou o projeto Arqueologia Entre Rios que é tema de sua tese concluída em abril último.
Dentre as instituições envolvidas em pesquisas na região destacam-se a USP e a UFRJ, que atuam desde 1990; a PUC e a URGS com pesquisas de campo no município de Passo de Torres. O Instituto Anchietão, da UNISINOS/São Leopoldo, é o mais conhecido, cujas pesquisas arqueológicas coordenadas pelo Padre Shimidt, tiveram enorme êxito a partir da década de 1970 com escavações em Araranguá, especialmente mais ao norte da região nos limites do município de Balneário Rincão, cujos materiais encontrados estão em exposição na igrejinha do próprio município.
Sendo a arqueologia uma ciência que necessariamente requer a colaboração de outras ciências afins, como a biologia, história e engenharia ambiental, a pressão promovida pelo departamento de arqueologia fez com que fosse aprovada resolução obrigando a inserção de créditos dessa ciência nesses cursos, permitindo uma melhor qualificação dos profissionais nos exercícios de suas atividades. Destacou também o trabalho com oficinas que o departamento vem desenvolvendo nas escolas da região, uma forma lúdica de familiarizar os estudantes com essa ciência transformando-os em colaboradores e protetores dos possíveis sítios encontrados. Em relação às pesquisas e escavações já realizadas, disse que o sítio com datação mais antiga foi encontrado no município de Jaguaruna datada de oito mil anos.
Já na pesquisa “Entre Rios” no qual coordena, as datações são de 3.340 anos, de grupos caçadores e coletores; e de 700 anos aproximadamente, das etnias guarani, tronco cultural tupi-guarani. A não presença de qualquer indivíduo ou agrupamento guarani na região tem relação direta com o processo de ocupação portuguesa ocorrida a partir do século XVI.  O modelo colonialista escravocrata exportador adotado fez com que os donatários empregassem a mão de obra indígena na extração de madeira, pau Brasil, depois substituído pelo trabalho do africano. A partir do século XIX, o governo imperial adotou políticas para estimular a ocupação do sul do Brasil, chegaram os imigrantes europeus para trabalhar na cafeicultura do sudeste e ocupar as terras do sul do Brasil. Quando aqui chegaram, especialmente imigrantes italianos e alemães, se defrontaram com ocupantes nativos, cujo efeito foi devastador. Nas investidas, especialmente dos bandeirantes paulistas, caçadores de índios, milhares foram mortos, os sobreviventes, transportados para as regiões produtoras de cana onde foram comercializados como escravos.
Convém destacar que os guaranis ocuparam as terras do litoral a cerca de 200 anos antes da invasão portuguesa. Além do mais, acredita-se que os sambaquianos, caçadores e coletores de conchas que habitavam há cerca de quatro mil anos já tinham desaparecidos. Há indícios com base nos artefatos encontrados da presença de caçadores e coletores vindos do interior, que desciam periodicamente ao litoral para a coleta de crustáceos e outros tipos de alimentos. Esse deslocamento via-se comum em períodos de escassez de alimentos em seus ambientes de origem. Os grupos do interior, caçadores e coletores, ou Xokleng, há registros de que os últimos indivíduos desapareceram por volta da década de 1950. Pelo fato de não ter sido encontrado no litoral, elementos peculiares à cultura Xokleng como pontas de flechas, acredita-se que não tenham constituído agrupamentos como dos guaranis, que há registros de que nas décadas de 1920, 1930, e 1940 muitos ainda viviam nas matas com histórias contadas de que crianças brancas teriam sido seqüestradas de criadas na cultura guarani. Diferente dos caçadores e coletores, os gurarins geralmente construíam seus acampamentos ou aldeias próximas a cursos d’água como lagos, lagoas e florestas.  
Com base em pesquisas recentes coordenada pelo departamento de arqueologia da UNESC, na região de Araranguá já foram catalogados oito sítios sambaquianos e um abrigo sobre rocha, cujo material próprio dos que ali habitaram foi totalmente saqueado. Em razão da falta de políticas mais sistematizadas do poder público para pesquisas desse gênero, todos os sítios identificados até o momento suas descobertas se deram de modo casual, ou mediante pesquisas acadêmicas ou empresariais. Empresarial pelo fato da legislação federal obrigar o empreendedor na hipótese de execução de um projeto de infraestrurura, construção de rodovia, represa, entre outros, ter de contratar uma instituição para promover o levantamento do potencial arqueológico. Entretanto, do mesmo modo que a legislação estabelece regras mais rígidas para o setor empresarial, não impõe qualquer restrição ao agricultor em assegurar proteção ao sítio por ele identificado.
Quanto a isso o que se pode fazer é promover programas de Educação Patrimonial podendo ser coordenada pelas secretarias de cultura e educação do município, com a colaboração de setores organizados da sociedade como Ongs, Oscips, Associações de Moradores, etc. Quanto maior for a divulgação maior será a chance de proteger todo esse acervo. Sobre os sítios encontrados no Balneário Morro dos Conventos o que se fez foi apenas o levantamento, cabe agora ao IPHAN promover o estudo dos mesmos. No entanto acredita-se que dificilmente tais procedimentos serão concretizados em decorrência da escassez de pessoal e recursos, já divulgados pelo próprio órgão.
Em 2013, documento enviado pela Oscip Preserv’Ação ao MPF para que intercedesse junto ao IPHAN/SC, para que providenciasse ações de proteção aos sítios do balneário, a resposta da superintendente estadual dizia que os sítios já estavam legalmente protegidos, sendo crime sua destruição. Além do mais no mesmo documento constava também de informação afirmando que quanto ao “Tombamento do Morro” não havia meios legais para fazê-lo por decreto, sendo incumbência do municipal. Para o Iphan o processo de tombamento tornar-se-i-a mais moroso devendo passar por instâncias federais, em sessão do Conselho Consultivo do Iphan/Brasília. Relatou que por restrições orçamentárias o órgão procedeu apenas ações emergenciais, que possivelmente se poderá pleitear o que se pede que é o tombamento do Morro dos Conventos. Deixou claro a superintendente que o poder público tem a obrigação de preservar o local, visto que mais que uma beleza natural, é um patrimônio que pode vir a ser considerado nacional, é sem sobra de dúvida um patrimônio local e regional.
Quanto ao memorando n. 362/PRESI enviado pelo Iphan ao MPF respondendo os questionamentos elencados pela procuradora federal quanto à proteção dos sítios no morro, na leitura do documento a procuradora fez algumas observações ou críticas, pois o órgão do patrimônio federal não especificou quais medidas que seriam tomadas para proteger os sítios, objeto da recomendação. Quanto ao tombamento do monumento Morro dos Conventos, quando alega escassez de recursos para execução, é noticiado que tramita processo de tombamento em curso de Parque Arqueológico do Sul. Com tais informações acredita-se que já é de conhecimento do Iphan, a existência de tais sítios arqueológicos, porém a não imposição de qualquer medida de proteção pode o órgão ser imputado por crime de omissão, pois infringe leis federais que obriga o órgão protegê-los.
A importância do acervo arqueológico encontrado no balneário é de tamanha grandeza que estimulou um acadêmico a universidade a construção de projeto de pesquisa no qual foi aceito no curso de mestrado de uma universidade. Com ênfase a descoberta dos sítios, o feito se constitui como um caso raro pelo fato de ter sido encontrado e divulgado por uma organização não governamental. Outro aspecto curioso verificado pelos profissionais do Ipat/Unesc, contratados pelo poder público municipal para o levantamento dos acervos arqueológicos nas margens do rio próximo à foz, onde serão construídas plataformas de pesca artesanal, foi a inexistência de qualquer vestígio arqueológico no trecho do Rio dos Porcos. Admite-se que tal ausência tem relação com o avanço e recuo das águas do oceano, que possivelmente no período que grupos humanos migraram para a região a área estava alagada.
Nos últimos 10 mil anos o planeta passou por mudanças climáticas regulares, revezando entre ciclos de glaciações e aquecimentos. Todo esse conjunto de fenômenos teve influência no modo como esses grupos se estabeleceram no território que está sendo estudado. O que se constata quando se descobre sítios, geralmente estão situados em áreas mais elevadas, livre de alagamento como no entorno do farol, cuja altura está a 70 metros acima do nível do mar. Dentre as descobertas da equipe de arqueologia, o sítio guarani na comunidade de Ilhas, chamou atenção.
Segundo os pesquisadores, com base nos elementos identificados, restos de fogueira, artefatos cerâmicos, etc., tudo leva a crer que o respectivo aldeamento com área aproximada de 200 m X 200 m foi um aldeamento considerado permanente. Isso significa que os demais sítios encontrados, como do Morro dos Conventos, partindo das características como tamanho e volume de cascas e peças encontradas, foram aldeamentos provisórios, ou seja, pequenos grupos aproveitando os sambaquis, montavam seus acampamentos e ali permaneciam por um determinado período. Depois de coletando os suprimentos, mariscos, peixes e o abatimento de pequenos mamíferos, desfaziam o acampamento e se transferiam para o aldeamento principal, situado em Ilhas.
Quando questionado sobre a destinação do sítio encontrado em terreno cuja intenção do proprietário é loteá-lo, respondeu que se durante as escavações for comprovado que o material enterrado tem certa relevância para a sociedade, a área do sítio pode ser preservada em consonância com a legislação federal.  Citou exemplo de um loteamento pretendido para o município de Rincão, em que o proprietário teve que ceder 12 lotes para que o sambaqui fosse preservado. Talvez sensibilizado e reconhecendo a importância da preservação de tais monumentos arqueológicos, o proprietário do respectivo loteamento doou mais quatro lotes para que fosse criado um centro de incentivo à cultura e as pesquisas de arqueologia.
Além do mapa que mostra a ação antrópica nas áreas ocupadas por sítios, chamou a atenção também o mapa que descreve a  vegetação.  Segundo o professor, para a arqueologia o aspecto paisagístico é imprescindível para os pesquisadores. Isso porque quando certos grupos pré-históricos procuram se instalar em determinados terrenos, uma das preocupações dos grupos foi com a água e a vegetação.  A partir desses elementos se torna possível obter mais informações sobre o modo como se organizavam e suas relações com o ambiente do entorno. Deixou nítido o professor que o poder público tem a responsabilidade de preservar os 54 sítios identificados. Que o caminho é promover o diálogo com todos os seguimentos da sociedade, órgãos públicos, associações de moradores, entre outras. Caso não o faça seguramente todo esse rico patrimônio desaparecerá. Um exemplo são os municípios de Balneário Comburiu entre outros que pela inexistência de políticas públicas de ocupação ordenada os sítios arqueológicos foram destruídos.
Elisa perguntou ao palestrante quais as medidas que devem ser tomadas quando se descobre sítios, e quanto ao município, que ações devem tomar. Juliano respondeu que quem deveria protegê-lo, mapeá-lo, dialogar ações de proteção seria o Iphan, que existem três autarquias regionais, onde a autarquia mais próxima está localizada em Laguna. No entanto devido à falta de pessoas e recursos, como alegam, seguramente são as universidades que vem atuando. Os municípios na ausência do Iphan devem providenciar ações para resguardá-los, como vem fazendo os municípios de Laguna e Jaguaruna com a fixação de placas. Além do mais, os municípios citados, por meio de suas fundações culturais, procuram divulgar o patrimônio à sociedade.
Para o município de Araranguá a arqueologia poderia ser uma grande parceira na divulgação e promoção do desenvolvimento da região. No entanto vem perdendo uma grande oportunidade em envolver a comunidade, as escolas, para preservar e divulgar, transformando-o em atrativo turístico. A prefeitura poderia disponibilizar placas ou criar infraestrutura de tal modo que proporcionasse a visitação dos sítios em especial do abrigo sobre rocha.   A própria tese defendida pelo professor Juliano traz na sua conclusão referência aos sítios identificados no Morro dos Conventos, sua importância e o modo como o poder público de explorá-lo para promover o desenvolvimento do município. Segundo Juliano: “Os sítios do Morro dos Conventos são bons exemplos do potencial museuológico que a região oferece, transformados em museu ao ar livre, com visitas orientadas dentro de um plano de turismo cultural sustentável, que inclua a comunidade”.
Quando faz referência a arqueologia histórica está se referindo aos agrupamentos mais recentes como os quilombolas entre outros que habitaram um determinado território, cujas ruínas deixadas servem de material documental. Elisa levantou questionamento se a antropologia não busca identificar o homem não a partir do nascimento, mas do que veio antes, dos vestígios deixados. Que nós seres contemporâneos possuímos elementos culturais desse povo anterior. Josie, pesquisado do Ipat, respondeu que tanto a antropologia como a arqueologia trabalham com a herança genética, que o ambiente onde viveram são decisivos no processo de pesquisa. Além do mais a arqueologia ajuda a compreender o modo como os grupos humanos se apoderam das paisagens, ajuda a pensar o território, sua relação com os fenômenos climáticos, sua previsibilidade de médio e longo prazo.

Prof. Jairo Cezar