quarta-feira, 10 de junho de 2015


Ecossistemas frágeis e população reféns de empresas mineradoras no município de Maracajá

A luta pela proteção dos ecossistemas frágeis como muitos imaginam, não é exclusividade apenas de entidades ambientais e órgãos estaduais e federais que atuam no Balneário Morro dos Conventos. Nos demais municípios do Extremo Sul de Santa Catarina como Sombrio, Balneário Rincão e Maracajá, entidades ambientais também tiveram que ser criadas para resistir as ações depredatórias de seguimentos econômicos, bem como do próprio poder público, cujas investidas realizadas até o momento pelo Ministério Público Federal, dão conta que empresas como do setor de mineração de rochas, no município de Maracajá, vem desrespeitando de forma escancarada legislações específicas. O agravante é que as irregularidades, além de avalizadas por órgãos ambientais que teriam por lei restringir tais práticas, põem em riscos aqüíferos importantes cuja recarga ocorre no morro, à fauna, à saúde e a segurança de milhares de pessoas que habitam o entorno da pedreira. 
A temática mineração e as denúncias de irregularidades envolvendo empresas e órgãos ambientais envolvidos na exploração mineral foram um dos temas debatidos na reunião do Conselho Consultivo do Comitê da Bacia do rio Araranguá, na última quinta feira, 23 de maio de 2015, no CENTRAR/EPAGRI, município de Araranguá.  Para explanar o tema mineração em pedreira no município de Maracajá, a convidada foi a professora da rede estadual que é coordenadora da ONG Instituto Socioambiental Maracajá, onde desde novembro de 2014 vem se empenhando junto com os demais componentes da entidade na luta para decifrar os mistérios que cercam as políticas relativas a mineração de rochas (diabásio) naquele município.
Como professora da área de geografia em uma escola da rede estadual próxima a pedreira, começou a perceber que poderia haver algumas práticas na atividade mineradora que seguramente estariam infringindo leis federais e estaduais, especialmente quanto ao processo de detonação de pedras. Disse que com os andamentos da duplicação da Br-101, os recursos oriundos das medidas compensatórias da obra foram destinados para a elaboração do Plano Diretor Municipal, que teve inicio em 2010, porém até o ano passado o referido documento ainda permanece sobre a mesa do executivo municipal. Portanto, o relatório conclusivo do plano ainda não teria sido encaminhado para apreciação na câmara de vereadores e posterior votação. Diante do exposto, o prefeito tomou a decisão de rever plano, sendo que nas discussões do tema zoneamento e Uso e Ocupação do Solo, o que mais gerou polêmica foi saber que chefe do executivo propõe tornar o morro como  zona   de permanência especial. No item permissível, que é uma das três subdivisões da zona de permanência especial, constado no plano diretor, garante a atividade mineradora, cuja autorização passa pela Secretaria de Planejamento. Portanto, a secretaria basta dizer sim, que a exploração dará início.  
Em uma audiência pública na qual participou para discutir o morro do Maracajá, o que mais chamou a atenção da professora foi a questão da água, que segundo relatório apresentado, todos os aqüíferos existentes estão ameaçados. Sendo o Morro um Sistema Natural de recarga dos aqüíferos, que por sua vez abastece os açudes, com a possível mineração de toda a extensão do morro, seguramente haverá o comprometimento dos mananciais do município. Hoje o município é abastecido pela barragem do Rio São Bento, situado no município de Nova Veneza, caso a barragem reduza sua carga de água, o município de Maracajá terá que explorar a água do seu aqüífero. No entanto, com a solicitação para minerar no lado norte do morro, todas as nascentes serão comprometidas. As futuras gerações, como ficam, questionou a professora?
Quando da realização de audiência com a presença do proprietário de uma das duas mineradoras, a SETEP, o mesmo admitiu que a detonação de rochas vem ocorrendo respeitando distâncias estabelecidas por lei, ou seja, 160 metros da escola. Mesmo seguindo essa metragem o risco de acidente seria enorme, disse a professora, pelo fato do morro ser muito íngreme, podendo deslizar rocha sobre a escola. O representante do DNPM (Departamento Nacional de Pesquisas Minerais) presente na reunião admitiu que a respectiva distância dos explosivos  é pequena, que tais atividades são coordenadas por profissionais treinados. Sobre a autorização do órgão para a mineração, alertou que, tal decisão se concretizou mediante o licenciamento ambiental autorizado pela FATMA (Fundação Ambiental do Estado de Santa Catarina), que cabe também a respectiva entidade ambiental recomendar o EIA-RIMA (Estudo de Impacto Ambiental e Relatório de Impacto Ambiental).
Acompanhando os desdobramentos dos fatos e concluindo que os procedimentos adotados tanto pela empresa mineradora como pelo poder público na condução do plano diretor estavam envoltos de possíveis irregularidades, a ONG Instituto Socioambiental de Maracajá encaminhou ofício ao Ministério Público Federal solicitando audiência na sua sede em Criciúma para tratar do tema Morro do Maracajá. Confirmada as denúncias de irregularidades no processo de extração mineral, o MPF (Ministério Público Federal) determinou, em novembro de 2014, o fechamento da empresa alegando inexistência de EIA-RIMA. A empresa, refutando a decisão do órgão federal, argumentou que a autorização pela exploração de área de morro, setor norte, foi autorizada pelo DNPM, isso, é claro, depois que o órgão ambiental estadual, FATMA, liberou o licenciamento ambiental, autorizando a supressão de árvores nativas próxima à escola. Tudo indica que o órgão ambiental estadual poderá vetar a licença, pelo fato de existir legislação específica no município, cujo artigo 178, da lei orgânica, diz que toda árvore do morro é imune de corte, bem como de outros itens como nascentes que são passíveis de proteção.      
Com a intervenção do ministério público, ambos os seguimentos envolvidos nas denúncias justificaram suas ações seguindo decisões das entidades envolvidas como o DNPM e o poder público municipal.   Segundo a Procuradora da República, jamais o órgão ambiental estadual deveria ter permitido o corte de vegetação dessa área por estar situado em uma declividade de 25 graus, infringindo legislação federal. Disse Selma que o erro está quando as duas empresas mineradoras dividiram a área para mineração em polígonos, cada uma podendo explorar até 119 mil metros cúbicos de rocha por ano. A legislação define o morro como um único polígono. A não obrigatoriedade da apresentação de EIA-RIMA pelas duas empresas mineradoras, está fundamentada no CONSEMA, cujo órgão  estabelece a obrigatoriedade de estudos ambientais completos quando qualquer empresa venha extrair 120 mil metros cúbicos de rochas, ou mais.
 Abaixo desse montante, o que se pede é apenas um estudo ambiental simplificado. Nesse sentido, a divisão do terreno em polígonos, cujo montante de material extraído é de 119 mil metros caracteriza as empresas como de pequeno porte. Por mil metros cúbicos a menos de rocha extraído, as duas empresas estão isentas de estudos mais completos como impactos de vizinhança, que seguramente somente esse item seria suficiente para a não liberação de licenciamento por parte da FATMA. No entanto, é muito melhor liberar em pedacinhos o morro ou sua totalidade? Outro agravante nessa questão é quanto a fiscalização, que, segundo a professora, não existe. Para dar clarividência que as empresas omitiam os valores declarados do montante de pedras extraído na área em atividade, foi instalada câmara em uma das ruas utilizadas pela empresa para escoar o material. As imagens confirmam que durante o dia transitaram cerca de 100 caminhões, cada um transportando 12 metros cúbicos de pedra.
Seguindo a lógica matemática se for multiplicado os 12 metros cúbicos por 100 caminhões/dia, o resultado será 1, 200 metros cúbicos transportados por dia. Multiplicado os 1.200 por 22 dias, que é quantidade de dias úteis/mês, o resultado ultrapassa em muito os 119 mil metros cúbicos/ano como informou a empresa. Na realidade são extraídos mais de 300 mil metros cúbico/ano por cada empresa. O que é estarrecedor é o valor repassado por ambas ao município sob a forma compensação, entre 30 a 40 mil reais por ano. Sem contar o passivo ambiental e a dilapidação do patrimônio público que não é compensada pelas empresas. O uso de dinamite na detonação da pedreira, se a empresa segue todas as recomendações legais, também foi tema de discussão na audiência.
Foi confirmado que as detonações estão comprometendo o morro devido a apresentação de rachaduras nas encostas com riscos de deslizamento. Nas discussões sobre o plano diretor foi encaminhado proposição para que toda a área do morro ao norte seja declarada como ZPE (Zona de Permanente Especial), enquanto o trecho sul, já minerado, ZPA (Zona de Conservação Ambiental). Com uma condicionante, que na ZPA as empresas estabeleçam planos de recuperação das áreas já mineradas. Na realidade tais medidas compensatórias são condicionantes essências para a concessão de novas lavras. Fora disso, as empresas estarão impedidas de minerar. Em conversa com o prefeito sobre a proposta, o mesmo se opôs alegando incompatibilidade com a legislação municipal. Diante da negativa do poder público municipal, na audiência pública programada para o dia 10 de junho vai ser encaminhado pedido para nulidade de todas as licenças autorizando a mineração no morro, bem como a proibição definitiva da dessa atividade no município.
O que está ocorrendo no maracajá envolvendo as duas empresas mineradoras pode seguir a mesma trajetória da empresa Saibrita, que foi autuada por ter extraído 640 milhões de metros cúbicos de rocha sem autorização dos órgãos ambientais, estando o patrimônio da empresa indisponível atualmente. O agravante nesse imbróglio é que a população acompanha os fatos sem compreender com clareza os desdobramentos. Uma clara manipulação de tal modo a mantê-las passivas frente às manobras envolvendo o poder público e seguimentos econômicos. Sobre a posição negativa do poder legislativo sobre a proibição da mineração, o representante do DNPM argumentou que mesmo que o legislativo tivesse se posicionando favorável, sua ação seria inglória, porque, quando se trata de mineração, a decisão é de exclusividade da União, por se tratar de subsolo.
O caminho seria a aprovação de uma legislação municipal específica restringindo tal atividade, como se sucedeu no município de Urussanga, depois do acidente que vitimou dezenas de pessoas em uma mina de carvão. Porém, mesmo assim não há qualquer garantia que tal lei possa inviabilizar a atividade de mineração. Sobre as questões hídricas no município, cabe ao município exigir da empresa o pagamento das medidas compensatórias previstas em lei, cujos recursos podem ser utilizados para pesquisas envolvendo aspectos hídricos e ambientais das áreas envolvidas pela mineração.
A professora denunciou que a empresa descumpriu decisão do MPF de que não seria permitida a detonação de rochas depois da ocorrência de chuva. Disse também que a prefeitura liberou as licenças para exploração por não haver legislação proibindo essa atividade.  Quanto ao Comitê, o Conselho deliberou que fosse encaminhada solicitação ao coordenador da Defesa Civil, regional sul, cujo membro é também conselheiro do comitê, para inspecionar o local. Para o DNPM, a prefeitura poderia estabelecer regras disciplinando o deslocamento de caminhões evitando possíveis riscos à segurança da população. 
Como bem ressaltou a professora, a intenção do movimento não é inviabilizar definitivamente a atividade mineradora no município. O que se quer é que sejam esclarecidos todos os procedimentos hoje adotados pelas empresas no processo de mineração e o papel do poder público municipal e dos órgãos ambientais na concessão de licenciamentos e fiscalização das atividades. Que a atividade mineradora continue sendo praticada, porém, somente na área já explorada, seguindo todas as normas ambientais obrigatórias. Enquanto na parte norte, seja inviabilizado por considerar área de Conservação Ambiental Especial, podendo assim transformá-la em área de contemplação ambiental ou Unidade de Conservação, como atrativo turístico, capaz de incrementar ainda mais a economia do município.    
Prof. Jairo Cezar                             

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