quarta-feira, 13 de junho de 2012


O Complexo Processo de Construção da Consciência.

Um dos principais legados da espécie humana é a busca incessante da felicidade, do equilíbrio e da paz interior, ambas obtidas mediante gestos simples, atitudes muitas vezes adquiridas na tenra idade. A escola, continuando  o processo educativo iniciado na família assume a função de aprimorar as habilidades apreendidas e que se transformarão em novos saberes. Afinal, o que é educar? Seria apenas um instrumento de transmissão de conhecimentos e de valores ditos como saudáveis e que proporcionam bem estar a todos (as)? Educar é um processo tão complexo e tão dinâmico que só se finda com morte do indivíduo.
  
Sendo assim nossas atitudes, comportamentos estão vinculados ao grau de educação que recebemos na nossa infância na qual  repercutirá na fase adulta na construção da consciência, na revelação humana que o capacita a distinguir o que é certo e errado, bom e mau. Portanto se é a partir da infância que se inicia a construção da consciência (humanização) por que o ser humano mantém comportamentos desumanizados especialmente com o aquilo que deveria mais cuidar, a sua grande casa terra? Por que tanto desprezo a esse lar tão complexo, tão frágil onde habitam infinidades de espécies cuja existência de uma está relacionada a presença de outras. Tal dinamismo torna-se  condição elementar para a sobrevivência da própria mãe terra e da espécie humana.
Se o ser humano somente se constitui como tal quando adquire consciência dos seus atos, então é necessário repensar o conceito  de humano. Humanizar é cuidar, preocupar-se com o outro, com os animais, com os rios que cortam nossas aldeias e cidades, com  lagos, florestas, oceanos, ou seja, com a sua própria casa, “lar doce lar”. Qualquer indício de agressão a um dos  micro-sistemas que integram  a grande aldeia, repercutirá no conjunto ecossistêmico do planeta terra, proporcionando o desaparecimento de espécies vivas da fauna e da flora, fragilizando ainda mais a existência humana no planeta.
  
     É importante ressaltar que atitudes comportamentais estão vinculadas as regras organizacionais de cada sociedade, num determinado tempo e lugar. Porém esse argumento não mais condiz com atual realidade, cujos povos, embora habitem espaços tão distantes, comungam desejos e sentimentos semelhantes em decorrência do poder das tecnologias. Se atingimos  um estágio de progresso tão avançado, que permite as pessoas conectarem uma com as outras em tempo real, era de se imaginar que isso proporcionaria um maior desenvolvimento humano, uma maior consciência da sua existência.
  
Não é o que vem ocorrendo. O crescimento dos conflitos  globais associado ao progressivo processo de degradação dos recursos naturais são acontecimentos que marcam o atual momento histórico.   Não é possível desvincular esses problemas sem mencionar o modelo econômico capitalista que se sustenta mediante a exploração, o desperdício e a desagregação humana. Vive-se a cultura do consumível, descartável, cuja felicidade pode ser atribuída a quantidade de bens materiais adquiridos. Porém como podemos definir tal padrão como modelo de felicidade se quase tudo que consumimos, suas sobras tem como  destino o próprio ambiente em que vivemos.      

segunda-feira, 4 de junho de 2012



A Consolidação da ilegalidade a partir da aprovação do Novo Código Florestal Brasileiro

(Texto revisado em 04/06/12)

Depois de quase meio século em vigor, quando da sua promulgação em 1965, em 16 de dezembro de 2011, o Senado Federal aprovou um novo e controverso Código Florestal cujo relator foi o ex-governador catarinense e agora senador Luiz Henrique da Silveira. Quando governador de Santa Catarina coordenou os trabalhos da elaboração de um Código Florestal específico para o estado, que lhe incorreu em severas críticas por parte de ambientalistas e setores da sociedade civil organizada, como também do próprio Supremo Tribunal Federal que impetrou uma ADIN (Ação de Inconstitucionalidade) ao documento catarinense.
Sua escolha como relator de um projeto de lei importante como o Código Florestal, depois das tantas polêmicas e controvérsias na elaboração do documento catarinense, mereceria maiores reflexões. Havia uma quase certeza de que como relator do Código Florestal no senado, muitos dos dispositivos presentes no código catarinense seriam considerados como referência na construção do texto base. Dito e feito, os quase cem artigos e mais de uma centena de parágrafos que transitaram pelas duas casas do congresso pouco se diferenciaram do texto catarinense. Porém, o projeto aprovado no senado, muitos parlamentares justificaram seus votos alegando tratar-se de um documento menos conservador, especialmente no que se referem as APPs (Áreas de Preservação Permanentes) das margens dos rios, riachos, lagos e lagoas.  
Dentre os argumentos apresentados pelos legisladores e pela própria elite agrária brasileira, visando desconsiderar o documento oficial e construir outro, partiu do princípio de que a legislação vigente apresentava incompatibilidade com a atual conjuntura “Democrático-popular Pós-neoliberal”, portanto sendo necessária ajustá-la de acordo com prerrogativas desenvolvimentistas patrocinadas pela atual administração e seu bloco de sustentação.  O que se constatou quanto ao texto aprovado na Câmara e posteriormente no Senado, é que o código atual apresenta dispositivos normativos muito mais severos em relação aos crimes ambientais, enquanto que o texto que está tramitando no congresso abre brechas para intensificação dos desmatamentos, isentando de multa os infratores que desmataram antes de junho de 2008.
 O (a) cidadão (ã), mesmo aquele (a) com pouca compreensão do assunto, perceberia, lendo atentamente o texto, que o mesmo apresenta dispositivos cuja finalidade primordial é anistiar, ou seja, isentar de pena os proprietários que desmataram durante a vigência da lei. São milhares de propriedades rurais que estão, de acordo com o atual Código Florestal, na ilegalidade, sendo que para sua regularização deveriam ajustar-se a legislação em vigor, pagando as multas e recuperando as áreas destruídas. Porém, aos prantos, os infratores recorreram aos seus protetorados, deputados e senadores, tanto os do baixo como os do alto clero, para que os libertassem do martírio que estavam envolvidos. 
Através de uma manobra política bem sucedida, a bancada ruralista presente no congresso, que representa os interesses do agronegócio nacional e internacional, apoiada por correntes políticas conservadoras e outros de tendência “esquerdista”, atenderam as súplicas e venceram o segundo round, consolidaram a ilegalidade no Brasil. Dentre os itens aprovados e que comprovam a “compaixão” dos congressistas aos respectivos “foras da lei”, destacamos: redução das APP (Áreas de Proteção Permanente), de 30 para 15 metros, nas margens dos rios com largura de até 10 metros. Esse artigo dentre os muitos aprovados representará, se não ocorrer modificações quando retornar à câmara dos deputados e for homologado pela presidente, um profundo retrocesso no que tange a vegetação ciliar, sendo a mesma imprescindível à proteção das margens de rios e córregos, reduzindo a deposição de sedimentos causadores de enchentes.
Em relação ao município do Araranguá, mais especificamente no trecho Centro/foz do rio, cuja largura aproximada alcança cem metros, a lei aprovada exige que seja mantida mata ciliar numa dimensão proporcional a sua largura, ou seja, os mesmos cem metros. Porém, se verificarmos em loco, o trecho citado notaremos que a área preservada, as sua grande extensão, não ultrapassa nem mesmo os cinco metros, e que desrespeitaria até mesmo o próprio código florestal catarinense que está sob júdice devido a sua incompatibilidade com a lei federal.
Discorrendo sobre o Código Florestal Catarinense, sancionado em 2009, sendo posteriormente vetado pela justiça, o mesmo admite que ao longo dos rios ou de qualquer curso d’água, cujas propriedades possuam até 50 (cinqüenta) hectares e estando cortadas por rios ou córregos com largura inferior a cinco (cinco) metros, deverão seus proprietários conservar os mesmos 5 metros de margem.
O argumento proferido pelo governo para justificar os limites mínimos de preservação às margens de rios e córregos partiu de informações obtidas do LAC (Levantamento Agropecuário Catarinense), no qual salienta que 89% das propriedades agrícolas catarinenses, ou seja, 167 mil possuem dimensões equivalentes a 50 hectares, sendo elas identificadas como minifúndios. As regras ambientais em vigência, segundo os defensores do novo código catarinense, não possibilitam o desenvolvimento pleno das atividades agrícolas.
É uma justificativa um tanto quanto descabida e repleta de equívocos. O próprio LAC esclarece que dos seis milhões de hectares destinados à agricultura, um pouco mais de 32% são controladas por 2% dos grandes latifúndios. Portanto, 98% dos proprietários rurais são detentores de 45,68% da extensão fundiária do estado. Esses números comprovam as inverdades do governo para aprovação do documento, deixando explícito que os principais interessados e beneficiados com a implantação do novo código florestal catarinense não seriam os pequenos agricultores e sim o agronegócio catarinense. O que poucos sabem, pasmem, é que o pequeno agricultor familiar, e somente ele, em vista do reconhecido interesse social da sua atividade, já possui autorização legal, pelo próprio Código Florestal (Lei nº 4.771/65) que se pretende revogar, para economicamente utilizar as áreas de preservação permanente, desde que o faça mediante um sistema de manejo agro florestal sustentável.
No caso específico de Araranguá o texto catarinense não difere muito do nacional, porém, é mais subjetivo, dando margem para possíveis interpretações. Um dos artigos afirma que cursos d’água superior a 10 (dez) metros de largura, a preservação da mata ciliar deverá ser de 10(dez) metros, acrescidos mais 50% da medida excedente a 10 metros. Subtende-se que, transportando essa normativa para a realidade araranguaense, onde a largura aproximada do rio é de 100(cem) metros, o código catarinense exige 15 (metros) de preservação. Ficando muito aquém do Código Nacional, que obriga 100 (metros) de área preservada.
Outro item polêmico do projeto e que interessaria aos cidadãos de Araranguá é quanto aos mananciais hídricos Lago Dourado, Lago da Serra e Açude Belinzoni, que são responsáveis pelo abastecimento da população local. Diz o projeto que a área de preservação no entorno dos lagos e lagoas naturais cuja extensão alcance 20 (vinte) hectares de superfície, deverá ser de 50 metros. Nesse caso, os mananciais, Lago Dourando e Lago da Serra, serão contemplados. Exceto o açude Belinzoni que será enquadrado em outro dispositivo, determinando 30 metros de proteção da vegetação existente. Comprovada a existência de nascentes e olhos d’água que proporcionam a recarga dos mananciais, terão os órgãos ambientais, a obrigatoriedade de proteger os 50 metros situados no seu entorno. Quando se trata de vegetação nativa situadas em topos de morros com elevação mínima de 100 metros, consideradas APP, a mesma deverá ser preservada. O Balneário Morro dos Conventos estaria enquadrado nesse dispositivo, pois expressiva parcela de sua área é formada por APP. O que gerou estranheza foi o fato de que o projeto de lei do código floresta brasileiro aprovado no senado e com as emendas recebidas na câmara, conseguiu se tornar mais retrógrado que o próprio documento catarinense, especialmente em relação as APPs de topos de morros, permitindo a utilização das mesmas para a pecuária.
Sobre as áreas de preservação urbanas o Art.4 e § 2 do texto aprovado no senado estabelece que a sua supressão dependerá de autorização do órgão ambiental competente, desde que o município possua Conselho de Meio Ambiente com caráter deliberativo e plano diretor, mediante anuência prévia do órgão ambiental estadual competente fundamentada em parecer técnico. Sobre as margens dos rios ou qualquer curso d’água que cortam os perímetros urbanos, o texto do relator Piau, no seu Art. 65, parágrafo 2, define que para fins de regulação ambiental prevista no caput, será mantida faixa não edificável com largura mínima de 15 metros de cada lado.
A solução de pendengas como essa de acordo com projeto aprovado no senado e depois na Câmara federal ficará submetida às decisões locais, leis orgânicas, planos diretores e fundações ambientais. O documento aprovado suprime a participação da Conata (Conselho Nacional do Meio Ambiente) nas resoluções de atividades de utilidade pública, de interesse social e de baixo impacto ambiental. Se as responsabilidades ficarão a cargo dos municípios tudo indica levando em consideração a nossa herança cultural, que não prevalecerá o bem censo nas decisões e sim os interesses dos apadrinhados vinculados ao poder vigente.
Dentre os vários artigos polêmicos verificados no projeto aprovado no senado, destacam-se artigos que se pode considerar como avanços em relação ao Código Florestal em vigor, especialmente no que tange ao Art. 26 que obriga o poder público municipal a assegurar o equivalente a 20 metros quadrados de área verde por habitante. Exigia-se também, no texto do senado que para a liberação de novos loteamentos seriam necessárias informações detalhadas explicitado os espaços destinados às áreas verdes.   
No entanto, acreditava-se que este dispositivo seria reafirmando quando retornasse para nova apreciação na câmara. Porém, o novo texto do relator Piau foi inserido emendas suprimindo os 20% da área definida, permitindo apenas a manutenção das Apps em margens de rios urbanos, sem delimitação da extensão, que ficaria sob a responsabilidade dos planos diretores municipais. A nova redação também outorga o plantio de árvores produtoras de frutas ou outros produtos em áreas de Apps, abrindo caminho para frutificultura, a seringueira e as árvores madeireiras como pinus e eucalipto. A nova lei exclui enormes extensões de manguezais com categorias de Apps.
A anistia as infrações ambientais cometidas anteriormente a junho de 2008, desrespeita descaradamente muitos artigos e parágrafos estabelecidos na Lei de Crimes Ambientais, denominada Lei 9605/98. Dentre os mais de 80 artigos que consiste a Lei de Crimes Ambientais, cinco deles poderão perder sua validade caso o texto do código florestal aprovado no senado não sofrer alterações na câmara. A Lei no 9605/98, no seu Art. 38 estabelece que destruir ou danificar florestas consideradas de preservação permanente, mesmo que em formação, resulta em pena de detenção, de um a três anos, ou multa, ou ambas as penas cumulativamente. O mesmo artigo no seu parágrafo único define que se o crime for culposo, a pena será reduzida a metade. O Art. 39 define o corte arvores em floresta considerada de preservação permanente, sem permissão da autoridade competente, como crime e a pena será de detenção, de um a três anos, ou multa, ou ambas as penas cumulativamente. O Art. 44 também estabelece que extrair de florestas de domínio público ou consideradas de preservação permanente, sem previa autorização, pedra, areia, cal ou qualquer espécie de minerais, o infrator receberá pena de detenção, de seis meses a um ano, e multa.
O Art. 48, diz que impedir ou dificultar a regeneração natural de florestas e demais formas de vegetação o infrator será submetido a pena de detenção, de seis meses a um ano, e multa. Para finalizar, destacamos o Art. 50, no qual salienta que destruir ou danificar florestas nativas ou plantadas ou vegetação fixadora de dunas, protetora de mangues, objeto de especial preservação, incorre o infrator de pena de detenção, de três meses a um ano, e multa. No caso específico deste último artigo o mesmo faz referência ao município de Araranguá que possuiu uma extensão aproximada de 15 km de praia, sendo que mais da metade da mesma é constituída por dunas e restingas.
É visível o processo depredatório no qual esses ecossistemas estão sofrendo. Embora a legislação estabeleça sanções aos infratores, poucas são as situações em que ocorreram autuações dos criminosos. Não há por parte das autoridades argumentos que possam justificar sua recusa em impedir que a infração seja cometida. Como forma de dar mais consistência ao Art. 50 da Lei de Crimes Ambientais, o Conama, na sua resolução 303/02 estendeu a proteção às restingas em faixa mínima de trezentos metros, medidos a partir da linha de preamar máxima e em qualquer localização ou extensão, quando recoberta por vegetação com função fixadora de dunas ou estabilizadora de mangues. Com base nessa resolução podemos concluir que a área situada na parte baixa do balneário Morro dos Conventos ocupa as dimensões estabelecidas pelo Conama, ou seja, os 300 metros exigidos, portanto, qualquer ação humana sobre esse ecossistema estará imbuído de irregularidade.
Embora as leis sejam um tanto quanto genéricas e muita das quais não representando os verdadeiros sentimentos das realidades locais cabe aos órgãos ambientais locais adaptá-las de forma que atendam a esses princípios. No caso de Araranguá, o plano diretor que está sendo construído, busca criar uma política sustentável para o Balneário, ou seja, aproveitar todo potencial natural ali existente de forma que possa reverter em benefício da sociedade local, mas sempre com um olhar nos impactos que essas transformações podem ocasionar a curto, médio e longo prazo.  O que mais se constata na região da Bacia do Rio Araranguá, nas propriedades destinadas à rizicultura é progressiva redução ou a completa eliminação da vegetação primária. A legislação em vigor obriga o proprietário a manter protegidas 20% da reserva legal. Com o código aprovado no senado, continuará os mesmos 20%, porém, admitem-se que 50% da área desmatada poderão ser ocupadas por espécies exóticas, como pinos, eucaliptos, etc. Esse dispositivo que trata da reserva legal em muito se assemelha ao Art. 125 do código catarinense onde afirma que para o cumprimento da manutenção da área de RL (Reserva Legal) em pequena propriedade ou posse rural, nos termos definidos nesta lei, poderão ser computados os plantios de árvores frutíferas, ornamentais ou industriais, compostas por espécies exóticas, em sistema intercalar ou em consórcio com espécies nativas.
Nas propriedades com até quatro módulos fiscais, de acordo com o senado, o município de Araranguá, por exemplo, o proprietário ficará isento de recompor a reserva legal.  Se não houver alteração ou veto desse artigo pela presidente, o que poderá ocorrer nas propriedades não contempladas pelos quatro módulos fiscais, especialmente no norte do Brasil, é um intenso processo de fracionamento das mesmas, reduzindo-as em extensão para escaparem das obrigações.      
De forma sutil, o relator Piau retirou o termo pequena propriedade e propôs que fosse definido em outro momento mecanismos de preservação do potencial produtivo das pequenas e médias propriedades. Este dispositivo mantém a possibilidade de que médias e grandes propriedades possam se subdividir em propriedades de quatro módulos e, com isso, ficarem fora de recompor a vegetação da reserva legal que é de 80% na Amazônia. Quando se trata de recomposição da vegetação da reserva legal, a nova redação da câmara torna mais flexível quanto às espécies a serem plantadas, sendo que 50% de mesma pode ser de espécies exóticas, ou seja, este dispositivo abre brechas para a entrada de eucaliptos na Amazônia.   Não obriga a nova redação de recompor a reserva legal dentro do mesmo bioma, ou seja, o proprietário que tiver duas ou mais propriedades, podendo ser em outro estado, e própria para a agricultura, ele estará autorizado a desmatar toda vegetação presente numa delas, desde que transfira a conservação da reserva legal para outra área, que poderá ser em outro estado.
Os proprietários de acordo com o Art. 11 § 1º, do projeto de lei do relator Piau, que manterem conservadas suas áreas de reserva legal, podem utilizá-las como cotas de Reserva Ambiental, que transforma cada hectar de floresta em títulos que poderão,  obrigatoriamente, serem aplicados em bolsas de valores. Este item atende os preceitos definidos no Rio 92, que transforma as florestas preservadas em biomas imprescindíveis para o seqüestro de carbono, retirando da atmosfera percentuais adicionais de poluentes e que  proporciona o melhoramento da qualidade do clima planetário.  Desse modo, as florestas serão transformadas em alvos de especuladores financeiros. Além disso, os títulos poderão ser comprados por desmatadores como forma de compensação ambiental indireta. Na prática, as cras podem transformar-se em salvo condutos para a prática do livre desmatamento. Uma vez comercializado a Cras (Cotas de Reservas Ambientais), o agricultor não poderá retirar sua floresta do sistema financeiro, a não ser que o comprador garanta a aquisição de outra área ou outra cota.
 Mais uma vez, reitera-se a ilegalidade e a impunidade aos criminosos ambientais no Brasil. E para agravar, reitera-se também o profundo desconhecimento ou desrespeito dos legisladores à Constituição Federal, especialmente ao Art. 225, § 3º onde diz que as condutas e atividades consolidadas lesivas ao meio ambiente sujeitarão aos infratores, as sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados. Portanto, a constituição brasileira no artigo citado acima, não deixa nenhuma margem de dúvidas, desmatamento e outros crimes ambientais, não serão isentos de penalidades, sendo obrigação infrator reparar o dano.
Verifica-se um conflito jurisprudencial entre as legislações ambientais existentes. Afinal, qual das normativas deverá prevalecer: Lei de Crimes Ambientais, de 1998, Código Florestal ou a Constituição Federal de 1988? Em qualquer sociedade, com um mínimo de democracia todos sabemos que o documento que prevaleceria seria a Constituição Federal, e que seu descumprimento imputaria ao infrator sanções severas. Sendo assim, os deputados e senadores que aprovaram o novo código Florestal estarão sujeitos as penalidades legais, por desrespeitarem a carta magna? E como ficaria a Presidente frente à opinião pública internacional coso sancione o respectivo documento sem a concessão de emendas? Durante os quatro meses em que o texto do relator Piau esteve tramitando na Câmara o mesmo foi submetido a emendas transformando-o em menos conservador, quando aprovado no senado, o mais conservador e retrógrado.
Dos 460 parlamentares presentes na Câmara, votaram a favor do relatório de Piau, 274 deputados, com 184 votos contrários e duas abstenções. Em relação a participação das bancadas partidárias no momento da votação, o PSB, Pc do B e PP, por falta de consenso dos seus parlamentares quanto as propostas apresentadas, os líderes desses partidos autorizaram que os mesmos votassem de acordo com  suas convicções. O PT, PRB, PV e Psol, mantiveram sua posição em defesa do texto do senador Luiz Henrique da Silveira, portando votaram contra o relatório de Piau. Em relação aos parlamentares catarinenses cabe destacar os que votaram a favor do texto do deputado Piau e aqueles que votaram contra, ou seja, mantendo o documento aprovado no senado. Os que votaram a favor são eles: Celso Maldaner, Ronaldo Benedet, Valdir Colato, Edinho Bez, mauro Mariane e Rogério Peninha Mendonça, ambos do PMDB; Carmem Zanotto, do PPS; Onofre Santo Agostinho e Jorge Boeira, do PSD; Marco Tebaldi, do PSDB; Espiridião Amin e João Pizzolatti, do PP. Os que  votaram contra o texto de Piau, mantendo o texto do senador Luiz Henrique da Silveira, foram os deputados Décio Lima e Lucí Choinacki, ambos do PT. 
Porém nem tudo está perdido. Cabe agora o bom censo da Presidente da República, em honrar o seu discurso de campanha quando prometeu vetar as anistias, a redução de proteção ambiental e os incentivos aos novos desmatamentos. Mas, ao mesmo tempo, estará desencadeando um forte conflito com o PMDB, cujo relator do projeto é o senador Luiz Henrique da Silveira, membro do partido que é majoritário no congresso e que pertence a sua base de sustentação.
O que pode levar a presidente a rever suas posições no momento de sancionar o documento, que poderá ocorrer já no primeiro semestre de 2012, é o encontro do Rio+20, que ocorrerá no Rio de Janeiro em julho próximo. Se vetar totalmente o Projeto de Lei do relator Piau, e por uma medida provisória aprovar o texto do senado, a presidente certamente será aclamada a líder ambientalista da Rio+20. Será uma cartada de mestre, pois sairão como vitoriosos o rolo compressor chamado PAC ( Programa de Aceleração Econômica) e o setor ruralista. Porém, para a grande mídia, os vencedores com o veto da presidente seriam os ambientalistas.
A expectativa quanto aos  vetos da presidente da república ao texto do Código Florestal aprovado pela câmara dos deputados  se encerraram dia 25 de maio, sexta feira, quando foi apresentado novo documento com 13 cortes e 32 modificações. Aquilo que se esperava por parte dos ambientalistas e da comunidade científica de que a presidente pudesse vetar o projeto na sua totalidade, não se confirmou. No entanto, tanto para os ambientalistas como para setores vinculados ao agronegócio, os vetos não significaram avanços para ambas as partes. O agronegócio alega que os vetos podem representar uma redução das áreas produtivas acarretando a diminuição da produção de alimentos. Os ambientalistas por sua vez afirmam que se for sancionado o código da forma com os vetos da presidente, o problema da degradação das florestas continuará persistindo. No que tange ao argumento proferido pelo seguimento pertencente ao agronegócio, o mesmo não condiz com a realidade brasileira, pois 90% das propriedades rurais são consideradas pequenas, que representam aproximadamente 24% da área agrícola cultivada. São estes 24% que participam com  70% dos alimentos consumidos no Brasil.
Com a publicação da Medida Provisória 571/2012, no diário oficial da união, ocorrida em 28 de maio, provisoriamente o Brasil passa a ter um novo código florestal, que terá validade durante o período em que o congresso estará avaliando os vetos da presidente. Se as alterações feitas pela presidente forem mantidas pelos parlamentares, o documento retorna à presidente para sua sansão, transformando em lei. Caso contrário, se for derrubando os vetos da presidente, a medida provisória perderá sua validade, que dará início a um novo processo, sem data marcada para iniciar ou terminar.
Em relação aos vetos ou alterações ao texto do deputado Paui, contidos na medida provisória destaca-se o Art-4, cuja nova versão no inciso IV define que as áreas no entorno das nascentes e dos olhos d’água perenes, qualquer que seja sua situação topográfica, no raio mínimo de 50 (cinqüenta) metros, devem ser preservadas. O que alterou em relação ao inciso anterior foi a subtração do termo “perenes”, que dá garantia à área onde está a nascente de manter-se preservada, independente da redução ou desaparecimento provisória da mesma. No mesmo artigo 4 foi acrescentado um novo parágrafo o 9 e 10 que dão autonomia aos municípios mediante planos diretores e leis de uso do solo, ouvidos os conselhos estaduais e municipais,  nas definições das APPs, respeitando o Código Florestal Federal. Sobre o Art. 17 § 3, que trata das áreas de reserva legal,  a medida provisória torna o parágrafo mais enxuto, estabelecendo apenas a suspensão imediata das atividades nessas áreas que foram desmatadas após 22 de julho de 2008. No texto do deputado Paui, sobre o mesmo parágrafo, já estabelecia os procedimentos que os infratores deveriam seguir para livrar-se nas sanções. No entanto, no documento da presidente, um novo parágrafo é oecrescentado obrigando o proprietário que sem prejuízo das sanções adminitrativas, civis e penais, a iniciar o processo de recomposição da Reserva Legal em até  2(dois) anos contados a partir da data da publicação desta lei, devendo tal processo ser concluído nos prazos estabelecidos pelo Programa de Regularização Ambiental – PRA, de que trata o art. 59.  Em relação a esse dispositivo que está contido no art. 59 do novo Código Florestal, estabelece que cada Estado brasileiro deverá fazer um  estudo amplo do Zoneamento Econômico Ecológico (ZEE), no prazo estabelecido pelo parágrafo 3. Quanto Capítulo III,que trata do Controle e Origem dos Produtos Florestais, no seu  art. 35 §1, a  medida provisória exclui o termo espécie exótica, incluído do documento anterior. Portanto, caso o proprietário queira reflorestar sua propriedade com espécies nativas poderá fazer observadas as limitações e condições previstas nesta lei, devendo ser informados ao órgão competente, no prazo de 1 (um) ano, para fins de controle de origem.   
Sobre a seção II que trata das Áreas Consolidadas em áreas de Preservação Permanente, o art-61,  diz que nas APPs é autorizada, excluisvamente, a continuidade das atividades agrossivipastoris, de ecoturismo e de turismo rural em áreas rurais consolidadas até 22 de julho de 2008. Porém, este artigo teve alterações nos seus quatro parágrafos, estabelecendo critérios mais amplos do modo como os proprietários deveram atuar em suas propriedades. No primeiro parágrafo define que imóveis ruais com até um módulo fiscal, nos cursos d’água naturais, será obrigatória a recomposição das respectivas faixas marginais em 5(cinco) metros, independente da largura do curso d’água. Os imóveis com 1 a dois módulos fiscais, a recomposição é de 8 metros; de 2 a 4, será de 15 metros; de  4 a 10 módulos fiscais, o inciso I define 20 (vinte) metros de largura, para imóveis de  4 (quatro) a 10 (dez) módulos fiscais. Nos demais casos, com base no inciso II, levar-se-á em consideração a extensão correspondente à metade da largura do curso d’água, observado o mínimo de 30 (trinta) e o máximo 100 (cem) metros, contados da borda da calha do leito regular. Áreas consolidadas de APPs em torno de nascentes e olhos d’água perenes, será permitida manuenteção de atividades agrossilvipastoris, de ecoturismo ou de turismo rural, porém o proprietário deverá recuperar no mínimo 5 (cinco) metros de vegetação para imóveis de até 1(um) módulo fiscal; 8 (oito) metros para imóveis de 1 (um) a 2 (dois) módulos fiscais e 15 (quinze) metros para as propriedades superior a 2  (dois) módulos fiscais.
As APPs em áreas consolidadas situadas no entorno de lagos e lagoas naturais, será permitida a manutenção de atividades agrossilvipastoris, de ecoturismo ou de turismo rural com a recomposição de 5 (cinco) metros das margens para propriedades com 1 (um) módulo fiscal; 8 (oito) metros, para imóveis de 1 a 2 módulos fiscais; 15 (quinze) metros para imóveis de 2 a 4 módulos fiscais e 30(trinta) metros para área superior a 4 (quatro) módulos fiscais.
O mesmo art. 61estabelece que a recomposição da vegetação em áreas já consolidadas e destinadas as atividades agrossilvicuturais, ecoturismo e turismo rural, poderá ser feita isolada ou conjuntamente com espécies lenhosas, perenes ou de ciclo longo, podendo ser de espécies nativas ou exóticas.   A medida provisória determina que após cinco anos da data da publicação desta lei, as instituições financeiras só consederão crédito agrícola, em qualquer de suas modalidades, para proprietários de imóveis rurais que estejam inscritos no Cadastro Ambiental Rural – CAR e que comprovem sua regularidade nos termos desta lei.
A nova versão do texto mantém como APPs todas as nascentes, veredas, áreas úmidas, pântanos, mangues e topos de morros. Não isenta de multa os proprietários que desrespeitaram a legislação até julho de 2008, estando todos, pequenos, médios e grandes produtores passivos de recuperarem as áreas desmatadas, especialmente a vegetação ciliar das margens de rios, riachos, córregos, entre outros, que deverão seguir os respectivos parâmetros: todos os rios que apresentarem o  equivalente a dez metros de largura e o  proprietário possuir uma gleba de terra de no máximo um módulo fiscal [1]  o mesmo deverá recuperar cinco metros de vegetação; de um a dois módulos, oito metros; de dois a quatro, quinze metros; de quatro a dez, vente metros e acima de dez módulos, trinta metros. Para os rios com largura superior a dez metros, e com área equivalente a um módulo fiscal, o proprietário deverá recuperar cinco metros de mata ciliar; de um a dois módulos, oito metros; de dois a quatro, quinze metros; de quatro a dez e acima destes valores, de dez a cem metros de área protegida. No Brasil, 9% da área agrícola é composta por extensões de terras que vão de zero a um módulo fiscal, que equivalem a 52 milhões de hectares.
No que se refere ao município de Araranguá, cuja largura do rio é superior a dez metros, 80% das propriedades que margeiam o rio estão acima de quatro módulos fiscais. Portanto, deverão os proprietários, para não incorrerem de multa assinar um termo de compromisso para recuperá-las. Se no prazo estipulado, cinco anos possivelmente, o agricultor reflorestar a área desmatada, terá a multa suspensa. Porém, como forma de ter maior controle sobre o modo como os agricultores estão atuando em suas propriedades,  o novo texto determina que os mesmos façam o CAR (Cadastro Rural), num prazo de cinco anos, quando da promulgação da nova lei. 
Prof. Jairo Cezar


[1] Módulo fiscal é uma unidade de medida agrária usada no Brasil, instituída pela Lei nº 6.746, de 10 de dezembro de 1979. É expressa em hectares e é variável, sendo fixada para cada município, levando-se em conta: tipo de exploração predominante no município; a renda obtida com a exploração predominante; outras explorações existentes no município que, embora não predominantes, sejam expressivas em função da renda ou da área utilizada.O módulo fiscal corresponde à área mínima necessária a uma propriedade rural para que sua exploração seja economicamente viável. A depender do município, um módulo fiscal varia de 5 a 110 hectares. Nas regiões metropolitanas, a extensão do módulo rural é geralmente bem menor do que nas regiões mais afastadas dos grandes centros urbanos.