terça-feira, 30 de agosto de 2016

VIGIAR TORNA NOSSAS ESCOLAS MAIS SEGURAS?


Há poucos dias um estudante de uma escola pública estadual foi informado de que haviam sido instaladas câmeras de vigilância nos banheiros da unidade de ensino onde estuda. Sua resposta, de imediato, foi enfática, verbalizando a seguinte expressão: Chegou... BBB!!! Cadê o Bial?? Sua resposta foi uma alusão ao nome de um programa de entretenimento famoso da televisão brasileira, onde pessoas são confinadas em uma casa por várias semanas e monitoradas por dezenas de câmeras espalhadas por todos os cômodos. O fato é que os desdobramentos que redundaram na decisão muitas vezes unilateral de instalação das câmaras nos ambientes escolares, como banheiros e salas de aulas, foram motivados por episódios como pequenos furtos, atos de vandalismo e violência entre estudantes e também atingindo professores (as).




Diante de situações constrangedoras que estão comprometendo o curso normal do processo educacional e que são reflexos da atual realidade social repleta de contradições e injustiças, o corpo gestor das escolas e seus vários seguimentos, incapacitados ou com dificuldades de enfrentar pedagogicamente os obstáculos, adotam medidas repressivas e antipedagógicas, instalando câmeras de vigilância em vários ambientes.  A sensação de segurança trazida por tais equipamentos é apenas aparente, pois não atinge as reais causas, que estão além dos muros das escolas, isto é, as instâncias de decisões políticas federais, estaduais e municipais.


Afinal, quem ganha, quem perde com todo esse desarranjo político que eleva o estado de insegurança individual e coletiva? É claro que os beneficiados são as poderosas corporações que fabricam e comercializam equipamentos caros de segurança, que promovem lobbies nas instâncias de decisões políticas, financiando candidatos favoráveis à permanência dos atuais quadros de fragilidades dos sistemas de segurança pública. Quem perde é a própria sociedade, que se sente refém e sua intimidade invadida, vasculhada por milhares de olhos eletrônicos curiosos, intensificando a sensação de estar sendo vigiado. Quem se lembra do filme Show de Truman o Show da Vida, protagonizado pelo ator Jim Carrey. O filme, em resumo, retrata a vida de um sujeito, pacato, que desde o seu nascimento, sem que soubesse, passou a viver numa cidade cenográfica e monitorado 24 horas por bilhões de pessoas espalhadas pelo mundo. Subjetivamente os sistemas de vigilância atuam no campo comportamental e psíquico dos indivíduos, padronizando atitudes ditas “normais” e politicamente aceitáveis na lógica do marcado.


E as escolas, portanto, aproveitando-se do despreparo e da alienação dos seus dirigentes e profissionais, vem se deixando dominar por um cenário educacional confuso, de desobediência e rebeldia do corpo discente.  É conveniente admitir que tal situação de “instabilidade comportamental” é agravada devido ao modo como a educação é proporcionada às crianças e adolescentes no ambiente familiar. São pais e mães despreparos, sem o mínimo de autoridade com os filhos (as), que quando vão à escola ousam comportarem-se do mesmo modo, achincalhando, ameaçando moralmente e fisicamente professores quando tentam fazer valer algumas regras regimentais.
Não há outro dispositivo para solução dos imbróglios que hora inundam os diferentes seguimentos da sociedade como os espaços escolares que não seja o diálogo franco e aberto. Em se tratando de violência, pequenos furtos, consumo de drogas e outros tantos infortúnios do cotidiano das escolas, é necessário parar e repensar a escola como um corpo sistêmico, de conexão, envolvendo pais, professores, estudantes, ministério público, Conselho Tutelar, entre outros. No entanto, o que se procura fazer nas escolas, são ações eminentemente paliativas sem abalar as estruturas podres de um sistema, apenas inibir ou postergar patologias sociais para o futuro. O que se constata é uma espécie de ciclo vicioso permanente na escola, da falta de projetos ou da sua descontinuidade quando existem. Na realidade a escola pública ainda está longe de se conceber como pertencente ao povo, mas sim de um agrupamento de partidos conservadores que as utilizam para se perpetuar no poder.
O uso de câmeras de vigilância não seria um desses instrumentos capazes de postergar os incômodos e também tirar do professor a sua autoridade como mediador transferindo para um grupo ou comitê o veredicto/sentença baseado em imagens captadas? George Orwell, autor do livro 1984 e pensador Francês Michel Foucault, na obra Vigiar e Punir, ambos já alertavam como seria a sociedade do futuro, cujas pessoas passariam a ser monitoradas, disciplinadas e punidas.  Há de se presumir que na tomada de posição quanto a temas complexos como instalações câmeras de vigilância em ambientes públicos como escolas, além do momento oportuno para estimular a democracia, seria imprescindível que se investigasse as legislações em vigor das quais discorrem sobre o assunto.


É sabido que ainda são discretas as jurisprudências relativas ao tema, porém, existem dispositivos na Constituição Federal de 1988; na LDB, lei n.9394/96; no ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente) que podem servir de subsídios para reflexão e tomada de decisão, especialmente quando se pretende instalar câmeras em ambientes escolares, especialmente banheiros.  O Art. 205 da CF diz que “a educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho”.
Quando o artigo disserta sobre o pleno desenvolvimento da pessoa, está se subtendendo total liberdade de aprendizagem, que não haja nenhuma interferência externa no processo. Esse princípio parece ser mais esclarecedor no Art. 206, II, da CF onde afirma que “a escola deve ser concebida como ambiente que garanta a liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar o pensamento, a arte e o saber”. Porém, na concepção de muitos especialistas acerca do assunto, não é exatamente isso que ocorre quando estudantes e demais profissionais sabem que estão sendo monitorados.
É fato, que partindo desse pressuposto, os movimentos e atitudes espontâneas adquirem outra conotação, influenciando, portanto, tanto no modo de ensinar e aprender. Não há qualquer dúvida que o desenvolvimento humano pleno requer plena autonomia, que se pressupõe liberdade. Por conseguinte, liberdade está na ausência de vigilância ostensiva.   No instante que câmeras são afixadas em ambientes públicos ou particulares, todos, sem distinção, passam a ser monitorados, suas intimidades invadidas e expostas ao público.

Embora o argumento pró-instalação de câmeras esteja fundamentado em pressupostos que é a segurança do cidadão, constitucionalmente lhe é resguardado o direito de imagem conforme o Art. 5, X, CF, onde diz: são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação. É claro que as imagens coletadas permanecem armazenadas numa espécie de dispositivo ou memória. Quem garante que rackears oportunistas não acessar tais dispositivos e se apropriem de tais imagens? Já a LDB, Lei. N. 9394/96, no seu Art. 3 estabelece com base nos princípios e fins que “a educação é inspirada nos valores de liberdade e nos ideais de solidariedade humana”.
Na sequência, deve ser realçado também artigos dispositivos do ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente) que seguindo os fundamentos da Constituição federal estabelece no seu Art. 17 que “o direito ao respeito consiste na inviolabilidade da integridade física, psíquica e moral da criança e do adolescente, abrangendo a preservação da imagem, da identidade, da autonomia, dos valores, idéias e crenças, dos espaços e objetos pessoais”. Somente esse artigo seria suficiente para impedir que procedimentos como os que estão adotados nas unidades de ensino das distintas redes fossem inviabilizados.
É perceptível que a adoção de tecnologias de ponta como câmaras de monitoramento, bem como a reclusão de marginais e construção de novos presídios não estão influenciando nas estatísticas de violência pelo Brasil. E por que será? A resposta para esse cenário de quase guerra civil está no modelo de sociedade que se adotou, com uma das distribuições de renda mais desigual e injusta do planeta.   Como se poderia então, superar essa terrível conjuntura social a partir da escola sem se amparar a artifícios repressivos que em nada contribui para a humanização dos sujeitos?
Mais uma vez é importante reiterar do engajamento dos pais (mães) e responsáveis com a educação dos filhos (as).  É imperativo eclodir a cultura que ainda perpetua nas escolas públicas do país cuja sociedade ainda não a vê como integrante da sua vida.  É só prestar atenção no contingente de pais que as visitam diariamente. Muito pouco diante da sua dimensão como instrumento de transformação social. O contato permanente propiciaria o convívio amistoso, a troca de experiências e soluções de adversidades que hoje estão recaindo para o corpo docente e gestores escolares. É injusto transferir toda a responsabilidade pelo sucesso e fracasso escolar aos profissionais da educação. Verdade seja dita, pensar e querer construir uma escola verdadeiramente transformadora demanda muito mais que preparação e execução de conteúdos e avaliações.
É recomendável, primeiro, articular o que deve ser ensinado, sempre ponderando os elementos conflitantes da sociedade como subsídios integrantes dos currículos. Se a escola é um catalisador das adversidades da sociedade, não poderá ela se eximir de conduzir para o debate e propor soluções. Se as escolas carecem de esportes, cultura, de entretenimento para crianças e jovens, é imprescindível construir tais oportunidades dentro da escola. E fundamental fortalecer os vínculos interdisciplinares, através da promoção feiras multidisciplinares, festivais de talentos, eventos esportivos, manifestações culturais e contraculturais: música, dança, pintura, etc. A atribuição dada a “pichação” como ato de contravenção, também é uma forma de manifestação espontânea carregada de significados. É pouco convincente admitir que criminalizando ou penalizando os autores, tais manifestações deixarão de ocorrer. Trazer a cultura, as várias manifestações sociais para dentro da escola e inseri-las nos planos de aulas nos diferentes níveis de ensino são uma forma de valorizar a história e as diversidades sociais locais.
Quem realmente deveria ser criminalizado é os gestores públicos, a exemplo o governo do estado, por ser ele o responsável pelo grau de depredação e abandono das escolas públicas estaduais. Afinal, o que indigna mais pichação no banheiro, muro, etc. ou dezenas de goteiras e rachaduras que põem em risco a vida de milhares de estudantes e professores. Quantos governos até hoje foram processados ou presos por descumprir legislações acerca do não repasse de recursos para educação; por irregularidades em obras, como ginásios esportivos; por inúmeras escolas interditadas, entre outros?  A resposta é, nenhum.
Que moral, portanto, terão professores e gestores de querer punir estudantes, pelo fato de os mesmos terem descumprindo regras dos regimentos escolares? Porém, isso não é justificativa para o total descumprimento das regras nas escolas. Claro que não. Regras quando construídas coletivamente devem ser cumpridas. As escolas devem servir de exemplo quanto à ética e gestão colaborativa para os gestores públicos.   Uma gestão colaborativa se constitui de mediadores de conflitos, que devem ser estimulados na escola. Esses tais mediadores devem atuar também junto com organizações sociais como associações de moradores através do compartilhamento de decisões. Tal qual a educação visto como um processo de longa duração, seu sucesso está ligado à permanência e ao compartilhamento de um projeto de escola. Não havendo essa permanência e compartilhamento, os projetos serão concluídos, se transformando em um ciclo vicioso de um começar constante.    
Prof. Jairo Cezar
               
















segunda-feira, 22 de agosto de 2016

A ESCOLA E A SEU IMPORTANTE DESAFIO DE DESCONSTRUIR MITOS SOBRE SEXO, SEXUALIDADE E IDENTIDADE DE GÊNERO



Foi a partir da década de 1960 influenciado pelos movimentos feministas e demais organizações que enfrentam discriminações como de homossexuais, transexuais, entre outros, que os debates sobre sexo, identidade de gênero e sexualidade permitiu que emergisse os abusos e atos criminalizantes sofridos bem como a luta incessante por direitos sociais e maior liberdade para decidir qual a opção sexual que mais lhes convém. Em se tratando de Brasil a luta das mulheres por conquista e reconhecimento de direitos, mesmo violentamente reprimida durante séculos, adquiriu corpo e notoriedade nas décadas finais do século XX.


A Constituição Federal de 1988 fez emergir um cenário social no qual revelou um espaço público e privado predominantemente machista, cujo desafio das mulheres é se fazer ouvir frente as suas reivindicações.  É uma longa história de repressão e submissão condicionada a posição de coadjuvante frente à figura masculina, lhe restringindo apenas funções domésticas, de procriação e de educação dos filhos.  Fora disso, outras opções eram possíveis, porém restrita a um publico feminino seleto, abastado financeiramente, que seria seguir a carreira do magistério ou a clausura dos conventos. E não parou por ai. A mulher também reivindicava a autonomia de decidir acerca do modo como deveria agir quanto ao seu próprio corpo, quebrando preconceitos, mitos, de corpo sacralizado, à fonte de prazer, de satisfação e da conquista da felicidade plena. 


Porém, seguindo na contramão do processo emancipatório das mulheres e grupos sociais congêneres, estão os movimentos conservadores articulados que vêem nas lutas das mulheres quanto ao seu corpo a ameaça sobre o modelo de família tradicional, um dos instrumentos ideológicos de controle social.  Paralelo ao debate sobre o feminismo abriu-se outras frentes para discutir além da questão da sexualidade, as diferentes dimensões interpretativas do gênero. Isto é, não havendo possibilidades de decisão quanto ao seu caráter fisiológico, masculino e feminino, a luta converge agora na tentativa de naturalizar, sem criminalizar, novos tipos de relacionamentos homoafetivos. O processo não é tão simples, pelo fato de que há sociedades cujas condutas e comportamentos são moldadas à partir de conceitos ideológicos inerentes a sua própria cultura.
O fator religioso é um deles.  Como querer adentrar em um território tão espinhoso, repleto de conservadorismo e preconceito, onde agrupamentos religiosos distintos representados nas instâncias do legislativo federal articulam lobby para que dispositivos constitucionais sejam aprovados seguindo critérios que lhes é conveniente. É claro que a liberdade sexual e de pensamente interfere diretamente num processo histórico de controle e domínio do corpo como ferramenta de trabalho e reprodução. Sexo e ato sexual, como manifestação física que transcende as fronteiras do campo moral e do controle social, vem sendo reivindicado e debatido, porém, enfrenta severas barreiras nas esferas de poder religioso e político.


A escola pública por sua vez deve assumir a responsabilidade de trazer para o debate os conflitos e as contradições de temas polêmicos como sexualidade e identidade de gênero. O que se pretende não é impor verdades absolutas e descabidas, de querer induzi-los os estudantes a assumirem suas identidades sexuais levando em consideração o modismo e a pressão de grupos minoritários. Também, por outro lado, não se deve admitir que seguimentos doutrinários alojados nos interstícios dos poderes decisórios definam aleatoriamente como as escolas devem agir quanto ao ensino sobre sexualidade. Muito menos querer criminalizar ou tentar coagir professores de maneira que se sintam reprimidos em dialogar com estudantes temas polêmicos como orientação sexual e gênero, vistos ainda pela ótica social e familiar como tabus.


Embora o Plano Nacional de Educação tenha sofrido um revés em relação a temática orientação sexual pressionado por setores conservadores sobre o Congresso Nacional, isso não impede ou que as escolas oportunizem os estudantes a abordarem o assunto de modo saudável. Excluir o silenciar tais temáticas do currículo escolar ou tratá-lo sob uma ótica preconceituosa e sexista é estar incorrendo no risco de elevar os níveis de violência contra homossexuais, transexuais, entre outros.  Intensificar o diálogo sobre sexualidade e igualdade de gênero no interior da escola, a partir do ensino infantil, certamente contribuirá para tornar cidadãos mais livres e felizes.
Pois o fato é que grande parte dos traumas e deficiências na aprendizagem, enfrentados pelos adolescentes, tem relação com a sua sexualidade, da sua insegurança, pois os próprios pais não se sentem preparados para tratar sobre o assunto.  O ensino da ciência, nível fundamental e da biologia, médio, se configuram como os contatos e noções que os estudantes adquirem de conceitos relacionados ao corpo humano, que dentre os órgãos que mais lhes despertam a atenção está reprodutor feminino e masculino. É a partir desse entendimento que cada indivíduo poderá adquirir consciência do funcionamento do seu órgão genital e propor medidas que possam evitar doenças infecto contagiosas como AIDS, Sífilis, gonorréias, HPV, etc.
Quando se procura abordar assuntos como sexo, sexualidade, gênero, além do olhar exclusivamente biológico, que serve de construção da identidade e da personalidade, se presume que o (os) profissional (as) da área estejam desprendido de preconceitos, mitos e tabus. Muitas vezes isso não acontece nas escolas, pelo fato dos profissionais da área se manterem presos a crenças e valores conservadores que os impedem de ir além do campo teórico.  Fugir dos preconceitos e tabus históricos relacionados ao tema foi o que pretendeu fazer a enfermeira “Tiane” que conduziu sua fala para aproximadamente trezentos estudantes da EEBA. Além do uso de imagens e outros recursos que fez fluir naturalmente a sua exposição, o domínio e fluidez do tema, seu carisma, foram ingredientes preponderantes para o sucesso do encontro. Não há dúvida que os estudantes e professores presentes no auditório tiveram muitas das suas dúvidas sanadas, especialmente sobre maturidade sexual, fecundidade e patologias resultantes de descuidos durante a relação sexual. 


A questão é que sexualidade e identidade de gênero, de acordo com as legislações educacionais em vigor, se constituem como temas transversais do currículo nacional. Portanto, invariavelmente, devem ser discutidos cotidianamente pelos profissionais da educação. No entanto, não cabe somente ao professor a responsabilidade pela informação e educação sexual dos estudantes. A família como uma das principais instituições sociais de formação da personalidade e do caráter individual, tem de estar inserida nesse debate, atuando como parceira na construção de um diálogo franco, sem preconceito que ajude na condução da escolha do gênero que preferir.


Foram especificamente os temas sexualidade e gênero que fecharam com chave de ouro o encontro do sábado, quando a professora e psicanalista Elisa Fátima Stradiotto, trouxe para o debate algumas abordagens ainda silenciadas no interior das escolas e ambientes familiares, homossexualidade e transexual idade, manifestação espontânea do corpo ou transtorno psíquico?  Os próprios pais ou grupos de convívio, pela falta de compreensão, não se sentem a vontade para discorrer tal assunto, interpretando certos comportamentos não heteronormáticos, como desvios de personalidade ou certo tipo de patologia que deve ser tratada, medicada. 

        
O convite aos pais para se fazerem presentes em encontros importantes como o que ocorreu não deveria ter passado em branco. Muito do que foi apresentado, ambos deveriam ter acompanhado, lhes oportunizando a compreender sistematicamente o processo de maturação biológica, as doenças sexualmente transmissíveis e a escolha do gênero que moldará sua vida psíquica e social.  A desconstrução de preconceitos e tabus sobre sexo, sexualidade e gênero, entre jovens e seus dependentes, professores, é o inicio da construção de uma nova geração de jovens e adultos psiquicamente mais saudáveis e tolerantes.  
Prof. Jairo Cezar                                   

        

     

terça-feira, 16 de agosto de 2016

 A FRAGILIDADE DAS POLÍTICAS PÚBLICAS PARA O ATLETISMO  E  OUTROS ESPORTES NO "JERVA” E DEMAIS COMPETIÇÕES  

  


Todos (as) que acompanharam as competições dos (as) atletas no 36° JERVA (Jogos Abertos do Vale do Araranguá) e do 8° PARAJERVA, sexta feira e sábado, no município de Turvo, devem ter ficado satisfeitos e emocionados, por perceber que a região do Extremo Sul de Santa Catarina o “espírito” de um dos eventos mais antigos e importantes do esporte catarinense, embora com todas as dificuldades, ainda permanece vivo. O fato é que muitos dos (as) atletas revelados (as) no passado, medalhistas e recordistas em competições nacionais e internacionais, estão esquecidas (os), alguns (as) vivendo em situações de dificuldades para subsistir.



Quem acompanha semanalmente os treinamentos das (os) atletas que obtiveram excelentes resultados nas competições no Turvo, sabe das dificuldades que é preparar uma equipe qualificada com o mínimo de apoio e infraestrutura. Acredito que muitos desconhecem que Araranguá embora seja a capital microrregional da AMESC, pasmem, não possui um espaço público adequado para o treinamento e a prática do atletismo. Os treinamentos permanecem sendo realizados nas dependências do Colégio Murialdo, como vem se sucedendo há quase cinco décadas. Para realçar ainda mais o quadro deprimente vivido pelos profissionais do atletismo no município de Araranguá, um evento do gênero esportivo ocorrido há poucos meses, as competições tiveram que ser realizadas no município vizinho, Arroio do Silva, mobilizando treinadores, atletas e demais envolvidos na organização, para que o evento tivesse sucesso.


 Quem assistiu as ultimas competições do atletismo na Olimpíada do Rio de Janeiro deve ter percebido como o espetáculo atrai e empolga tanta gente. No entanto, se notou que as provas ainda são restritas a seletos atletas bem preparados, que somadas às aptidões fisiológicas, recebem todo apoio dos poderes públicos constituídos. O Brasil já teve medalhistas. Hoje, até o momento nenhum brasileiro conquistou o pódio. Os resultados negativos não seriam reflexos do modo como esse esporte vem sendo tratado nas bases. No caso do Brasil, mais especificamente na região de Araranguá, os fatos revelam como ainda estamos distantes do ideal, engessados às mazelas de governos cujos investimentos disponibilizados para o esporte são pífios, beirando o ridículo em comparação com outros países.


Na realidade o que faz o JERVA acontecer todos os anos é, com certeza, a paixão e a teimosia de abnegados profissionais da área de educação física, que não medem esforços para que nas competições os atletas dêem o seu máximo na expectativa de que galgando o pódio seja o primeiro passo para alçar vôos mais altos, quem sabe, o sonho de competir em uma olimpíada.   Esse é, com certeza, o que estimula a atleta Natalia, estudante do ensino médio da EEBA, revelada pelo professor Zé Fininho na Escola Neusa Osteto Cardoso, do bairro Polícia Rodoviária, onde fez o ensino fundamental.


Acreditem, é ela uma das grandes revelações do atletismo regional, nos 100, 200 e nos revezamentos. Já participou de três edições do JERVA colecionando 12 medalhas, sendo 11 de ouro e um de prata. Além, é claro, não esquecendo a Érica, outra atleta, que é sua colega de escola, onde também brilhou nas modalidades de lançamento de dardo e disco. O que deveria ocorrer que não aconteceu e não acontecerá, pois o município não possui ainda uma identidade cultural esportiva, seria a realização de uma grande festa com o desfile de todos (as) os (as) atletas participantes em carro aberto, do mesmo modo quando ocorre com políticos ou celebridades. Lembram quando a tocha olímpica passou pelo município e dos preparativos para recepcioná-la? Lembram das pessoas convidadas para carregá-las, das homenagens prestadas e de “autoridades carimbadas” que aproveitaram o ensejo para se autopromoção?


Não poderia ter sido feita promoção semelhante com os (as) atletas araranguaenses vencedores (as) do Jerva?    É muito provável que o público sairia às ruas e as (os) aplaudiriam orgulhosos (as), estimulados (as) pelo atual momento em que o país sedia uma olimpíada. O que gera apreensão e preocupação é que as (os) atletas medalhistas tenham o mesmo destino triste que tiveram esportistas renomados do passado, que por falta de projeto e apoio financeiro abandonaram os treinamentos e as competições dedicando-se a outras atividades.
Prof. Jairo Cezar 
















             

sexta-feira, 12 de agosto de 2016

O ESPETÁCULO DAS CONTRADIÇÕES DE UM PAÍS COMO O BRASIL QUE SEDIOU EVENTOS COMO COPA DO MUNDO E JOGOS OLÍMPICOS


Quem acompanhou a abertura dos jogos olímpicos na última sexta feira, 05 de agosto, deve ter se surpreendido pela espetacular organização e exibição de um cenário fictício que pouco corresponde à realidade brasileira. De certo modo a intenção dos protagonistas do espetáculo foi exatamente essa forjar imagens, até em Três D, exibindo a pujançae o sucesso de um estado falido, Rio de Janeiro, com uma dívida de quase 20 bilhões de reais, e de um Brasil marcado porabissais contradições econômicas e sociais, culturais, onde milhões de pessoas aindavivem em condições desumanas.
Durante as quase três horas de profundo transe apoteótico midiático nointerior “lendário maracanã”, não houve qualquer menção aos bravos e heróicos trabalhadores que deram o seu sangue para que tal realidade fosse possível. Por que no momento da exibição da música, Operário em Construção do cantor Chico Buarque de Holanda, uma equipe representando os operários não desfilaram carregando a bandeira do Brasil e exibindo seus trajes e ferramentas do dia a dia.
Foram eles os verdadeiros heróis, os atletas acrobatas, ginastas e construtores dos cenários, que outrosatletasirão se exibir e vistos por bilhões de pessoas. Somente essesreceberão osaplausos, a admiração e lembrados para sempre. Os operários, construtores, tais quais outros milhares de trabalhadores, pobre mortais, anônimos, jamais serão lembrados. Nem medalhas, nem pódios, terão direito, outra certeza é que se somarão as estatísticas dos milhares de desempregados.
Se o exuberante espetáculo montado foi retratar um país de inventores, de um Santos Dumont com seu inigualável 14-BIS, da evolução da vida através do emprego do que de mais moderno se tem em tecnologia gráfica, de igualdade étnica e sustentabilidade ambiental, bem próximo ao local da festa, dois mananciais, a Baia da Guanabara e lagoa Rodrigues de Freitas, exibem, a partir das águas poluídas, o modo descabido como às elites pensam a agem em relação às questões ambientais no Brasil.
Não é somente plantando sementes de árvores, compromisso de cada atleta no desfile de sexta feira, que reverterá o drama do aquecimento global. Enquanto crianças a frente da comitiva de cada país transportava uma muda de arvore e sementes eram introduzidas nos minúsculos potezinhospelos atletas, no mês de junho desse ano, pesquisas davam conta de 97% do aumento do desmatamento na Amazônia em comparação ao mesmo período de 2015. Até que ponto o simbólico plantio das árvores sensibilizará as autoridades globais se o problema do aquecimento está condicionado ao modelo de produção capitalista que alimenta da exploração exacerbada dos recursos naturais. As expectativas de qualquer reversão desse quase irreversível processo que afeta o planeta terra está longe de solução se for considerado os medíocres acordos resultantes das últimas COPs (Conferência das Partes). 
É provável que milhares de brasileiros devam ter ficado aos prantos na frente das TVs, invadidos pela emoção e orgulhosos por visualizarem um país do futuro, pois o país do presente, nenhuma emoção revela aos expectadores atentos. Era, com certeza, essa a intenção dos organizadores do espetáculo, construir um ambiente cenográfico futurista, fictício, capaz de ofuscar os olhos de milhões de brasileiros e encher de brilho outros tantos bilhões espalhados pelos cinco continentes. É espetacular poder, todos os dias, durante as próximas duas semanas, ligar a TV, internet e outras tantas ferramentas de comunicação disponíveis e se deliciar com tantas imagens de atletas de modalidades distintas, e torcendo para que no alto dos pódios subam muitos (as) brasileiros (as) vencedores (as), que possam servir de inspiração para outras milhares de crianças a exemplo da medalhista olímpica Rafaela da Silva, ouro no judô, cuja história de vida não é diferente de tantas outras milhares de crianças dos bairros pobres do Rio de Janeiro, lutar contra à miséria, à violência e a falta de políticas públicas de incentivo ao esporte.  
São o “espírito olímpico" de união dos jogos” onde locutores e comentarias esportivos dos canais de TV abertos e por assinatura, procuram embutir nas milhares de mentes desatentas, que desconhecem o cenário por detrás dos bastidores do espetáculo, onde quase cem mil pessoas tiveram que ser expulsas de suas residências e removidas para lugares distantes. Um “sonho olímpico” possível mediante a exploração exacerbada de trabalhadores, da madeira, do aço, do couro e outros tantos elementos para a construção dos ginásios, velódromos e cômodos confortáveis que acomodarão delegações de chefes de governos e turistas do mundo todo.
Ninguém se prestará em questionar a dureza que foi a vida de milhares de trabalhadores durante a construção das obras de infraestrutura e as condições de subsistência das famílias dos 11 trabalhadores mortos. Quanto aos mais de 1.600 autos de infração e 38 interdições e embargos envolvendo empresas que descumpriram regras legais? Todas pagaram suas penas? Não são essas pessoas, muito menos seus filhos, que terão o privilégio de utilizar dos magníficos ginásios com requinte internacional. São crianças, pobres, que geralmente estudam em escolas públicas dos bairros próximos ao parque olímpico, que não oferecem as mínimas condições de estrutura requerida para o satisfatório desempenho das atividades físicas, muito menos ainda, assegurá-las uma preparação básica para futuros atletas.
O importante é que “somos todos olímpicos”, slogan apresentado e intensamente repetido por uma emissora de TV brasileira, entre um comercial e outro. É claro que somos todos olímpicos. Olímpicos para milhões de brasileiros que precisam acordar todos os dias bem cedo e seguir uma maratona estafante de longas horas para fazer jus a um mísero salário corroído por uma inflação camuflada pelos órgãos do governo. Olímpicos são os milhares de professores que atuam nas redes públicas de ensino, que ser transformar em verdadeiros atletas, ginastas, judocas para lidar com as dificuldades encontradas nas escolas onde trabalham, sem qualquer infraestrutura para o exercício digno da profissão.
Olímpicos são os índios, habitantes de áreas ocupadas e pretendidas por mega projetos de barragens, de grileiros, garimpeiros e desmatadores, que trazem doenças e a desestruturação às suas comunidades. Uma triste realidade que cuidadosamente passou despercebida aos olhos de bilhões de pessoas do mundo inteiro, sexta feira, dia 05, quando foram encenados os contatos amistosos entre índios e invasores europeus, uma imagem que esconde o preconceito e a brutalidade com tal grupo humano é tratado pelas autoridades brasileiras.  
Tiveram o cuidado de não mostrar que ali mesmo, no rio de janeiro, a partir do inicio do século XVI, os corajosos tupinambás, que resistiram à escravidão branca, foram exterminados pela ganância e brutalidade do homem branco. Também não podemos esquecer os tupinambás e outros tantos povos indígenas exterminados pelas doenças e a fome. Hoje são os guaranis Kaowás e outras tantas etnias que habitam o centro oeste e o norte do Brasil, que são expulsos das suas terras para dar lugar às investidas do agronegócio. Não ficaram sabendo os bilhões de telespectadores que o Mato Grosso dos Sul é o campeão em número de índios assassinados nos últimos tempos.
O governo sul mato-grossense obviamente teria direito a alguma condecoração, não é mesmo? É um problema antigo que vem se arrastando a séculos quando as terras eram ainda devolutas, ou seja, sem proprietários oficiais. Os índios já as ocupavam muito tempo antes da chegada dos invasores portugueses. Todo esse imbróglio jurídico já poderia ter sido solucionado se os governos fossem mais sensíveis e levasse adiante os processos de demarcação.
É bem possível que com o atual governo interino e o modo como o congresso nacional está constituído, muitas olimpíadas se passarão sem uma solução definitiva do impasse que envolve as terras indígenas.   Não foram os massacres contra grupos tradicionais (índios e quilombolas) negros, homossexuais e outros agrupamentos minoritários, encenados na fasta de abertura de sexta. Muito menos cenas dos desastres ambientais como a tragédia em Marina, Minas Gerais, a poluição nas bacias hidrográficas do sul de santa Catarina pelo carvão mineral e os impactos irreversíveis à fauna e a flora nos principais rios da norte do Brasil, como o Xingu, provocado pelas grandes hidrelétricas. 
Quanto aos trabalhadores arregimentados para reparação dos problemas identificados nas acomodações das comitivas no parque olímpico, foi constatado pelo Ministério do Trabalho que não houve por parte dos contratantes, cumprimento às legislações trabalhistas em vigor. Onde está, mais uma vez, o tão divulgado espírito olímpico?  A força tarefa montada as pressas submeteu centenas de trabalhadores à carga horária extenuante e sem registro de carteira assinada. Isso não é trabalho escravo? Afinal, qual o real sentido de uma olimpíada? Não é o da solidariedade, da confraternização, da união dos povos?
Outra indagação. Quantos índios estão participando das competições esportivas no Rio de Janeiro? Onde estão os atletas índios, jogadores de futebol e de outras modalidades esportivas? Ah... mas..., olimpíadas..., só participam os melhores dos melhores!! O fato é que no Brasil o processo de iniciação ou preparação de atletas não se dá através das escolas, com raríssimas exceções. O processo é muito mais complexo e limitado a alguns clubes de excelências, cujos praticantes geralmente são de famílias abastadas economicamente. Os demais, de classes econômicas inferiores, dependem de bolsas para poder se dedicar aos treinos. O que é de conhecimento de todos no Brasil é de que não há e não está se construindo uma cultura esportiva no Brasil semelhante a muitos países que historicamente se despontam nas várias competições como as olimpíadas. Esse poderia, sim, ser um dos legados que a Olimpíada no Rio poderia deixar e que não vai.
É tão profundo o abismo esportivo no Brasil que basta você mesmo visitar algumas escolas públicas no seu município e conferir quantas delas possuem quadras esportivas e outros espaços eficazes à atividade física. Querer acreditar no sonho olímpico é “delirar” que com a realização desse evento no país se desencadeará todo um processo de transformação estrutural. Um país com quase 80% de analfabetos estruturais, com cerca de 9 bilhões de reais retirados do orçamento para a educação, estamos muito, muito longe mesmo de realizarmos o tão esperado e real Sonho Olímpico.
Ao mesmo tempo em que se gastaram bilhões para a realização desse mega evento, entre outros como o Pan Americano de 2008 e a Copa do Mundo de 2014, ontem, 10 de agosto de 2016, um jornal de circulação estadual trouxe em uma de suas páginas a seguinte manchete. Olimpíadas escolares têm corte de 50% na verba. É isso mesmo, corte de verbas. Só para lembrar, o Brasil vinha se destacando mundialmente na olimpíada de matemática. Todos sabem que tais competições nas modalidades de matemática, Astronomia, História entre outras é uma forma de incentivar os estudantes do fundamental ao médio à iniciação científica. Se com os recursos integrais já era difícil, com os cortes as expectativas não são nada otimistas.
Esse é mais um exemplo triste de como o Estado brasileiro, nas três instâncias federativas, trata a educação, cultura e o esporte. Como querer que atletas e estudantes tenham resultados expressivos nas várias competições que participam quando não há planejado. Só para se ter idéia, com base no jornal: “para manter a premiação aos 50 mil primeiros alunos, na Olimpíada Brasileira de Astronomia, a organização recorreu a uma vaquinha virtual para conseguir comprar as medalhas, que custam R$ 3 cada”. É isso mesmo, três reais. Não é vergonhoso?
Em síntese, embora a delegação brasileira na olimpíada do Rio seja a maior de todas as demais participantes, o rendimento até o momento dá mostras que poderá ser muito difícil ficar entre os dez melhores em número de medalhas, que é a pretensão do comitê organizador brasileiro.   O que pode ainda salvar o Brasil de um vexame histórico, são as competições coletivas tradicionais como o vôlei de quadra e de praia, o futebol, etc. Nas demais modalidades individuais, ginástica, natação, atletismo, que deveria haver mais planejamento e investimento público, os resultados, até o momento, são decepcionantes. O Jornal A Notícia, de Joinville, na edição do dia 10 de agosto trouxe a seguinte manchete: “Olhar sobre o esporte começa nas escolas”.
A reportagem discorre sobre o descaso dos gestores públicos em políticas que despertem o habito da população para hábitos e atitudes saudáveis. O incentivo à prática esportiva nas escolas seria o caminho. No entanto, destaca o jornal que a educação física foi alijada das escolas, pois não mais vista como disciplina importante para o desenvolvimento motor das crianças. Pais que sempre destacaram em competições esportivas, especialmente nas modalidades que requer refinado grau de habilidade psicomotora, o processo de preparação se inicia bem cedo, nas escolas de ensino infantil.  
Para João Carlos Andrade, presidente da Federação Catarinense de Ciclismo, “o esporte é uma atividade principal e não acessória, como vem sendo julgada ao longo dos anos”.    Já para a técnica de atletismo Margit Weise, “o desporto escolar inexiste tanto local como nacionalmente”.  Acrescentou também que “Enquanto o Brasil não acordar que o esporte tem que ser praticado e difundido dentro da escola, vamos ficar eternamente na mesmice. Tem que ter uma política para os desportos escolares, por meio de espaços descentes, onde se possa desenvolver as atividades dentro das escolas”.
Acredito que deve ser consenso a opinião de todos os profissionais da área de educação física das redes públicas de ensino do Estado de Santa Catarina. E olha que Santa Catarina, as mídias oficiais insistentemente procuram divulgar em âmbito nacional notícias e reportagens destacando o estado como exemplo em excelência em educação. Para desconstruir tais inverdades é só visitar algumas escolas públicas, e não é necessário  ir muito longe, e comprovar em loco o estado infraestrutural das mesmas. Quanto aos espaços para a prática esportiva ou educação física como queira, já dá um indicativo do por que o Brasil está muito longe de se tornar aquilo que a imprensa insiste em divulgar, um sonho olímpico.

Prof. Jairo Cezar          


domingo, 7 de agosto de 2016

Os efeitos perversos da aprovação do Projeto de Lei Complementar 257/ 2016 na vida dos trabalhadores brasileiros. 

As expectativas de que com a posse do presidente interino Michel Temer a situação funcional dos trabalhadores especialmente da iniciativa pública das instâncias federais, estaduais e municipais se deteriorariam ainda mais, se concretizaram quando foi divulgado que o Projeto de Lei Complementar ou PLP 257-16, que trata sobre o refinanciamento das dívidas dos estados, entraria na pauta do congresso já no começo do segundo semestre em caráter de urgência. 
Como não bastasse toda a roubalheira que solapou bilhões e bilhões de reais dos cofres públicos, dinheiro quase que suficiente para amenizar as nefastas condições estruturais dos hospitais, escolas, saneamento básico, segurança pública, entre outros, agora, para agravar ainda mais, um novo ataque do executivo e do legislativo. O que vem se apregoando nos bastidores do poder e através das mídias entreguistas é querer responsabilizar os trabalhadores pelo atual quadro de instabilidade econômica no qual se encontra o Brasil.
É inacreditável pensar que um país tão extenso territorialmente, com pujante capacidade produtiva e de extraordinárias reservas naturais, capaz até de se auto subsistir, esteja passando por terrível “calvário”, fruto da brutalidade insana de um modelo econômico perverso, capitaneado por poderosos grupos financeiros, com total cobertura e apoio de governos entreguistas de plantão.
Não é de hoje que os mal escolhidos “representantes do povo” vêm se comportando como verdadeiros fantoches de seus financiadores de campanha. Nessa direção, as frágeis políticas de gestão política dos países capitalistas periféricos e centrais os mantêm historicamente sob a órbita de poderosas organizações como Banco Mundial, FMI, entre outros tantos grupos financistas. Não podendo esquecer, todavia, da forte dependência do capital especulativo transnacional que consome parte de nossas reservas cambiais aproveitando as generosas taxas de juros oferecidas, uma das maiores do planeta.
  Quando nos atemos aos discursos favoráveis aos ajustes da economia convém lembrar o período pós-ditadura quando iniciou no Brasil um violento processo de reorganização do Estado brasileiro, transferindo parte de patrimônio nacional, empresas de mineração, petróleo, eletricidade, bancos, telefonia, transportes, etc. a verdadeiros conglomerados transnacionais. Todos (as), suponho, devem se lembrar do modo como se procedeu a venda da Vale do Rio Doce. Um patrimônio de trilhões de reais em reservas minerais vendido, vendido não, entregue por um poucos bilhões de reais.
E não parou por aí. Um ajuste também requer limitar gastos públicos em educação, saúde, segurança, etc. Lembram da lei de responsabilidade fiscal homologada em 2000, no governo de Fernando Henrique Cardoso? Um instrumento dito eficiente de controle dos gastos públicos que condicionou o governo brasileiro ao cumprimento de metas fiscais como vendas de ativos públicos e congelamento dos salários.  Tais medidas asseguraram economia de bilhões de reais para o refinanciamento das dívidas com fundos e bancos internacionais.
 Na época, a propaganda que foi intensamente disseminada pelos veículos de comunicação, aliados do poder, procuram justificar os ajustes como medidas imprescindíveis, admitindo que quanto mais “enxuto” fosse o Estado, mais investimentos seriam alocados ao setor produtivo, que por conseqüência alavancaria a economia, o emprego e a renda dos trabalhadores. Nada disso aconteceu. O fato é que Estado enxuto ou mínimo tem, ideologicamente, um sentido ideológico, de desemprego, arrocho salarial e precarização dos serviços básicos oferecidos. A ascensão política do Partido dos Trabalhadores criou a expectativa de um novo ciclo de poder popular, de um possível rompimento definitivo com as tradicionais oligarquias, enraizadas em todas as instâncias do frágil Estado republicano.  Quem se lembra das primeiras edições do Fórum Social Mundial ocorrido no Brasil, na cidade de Porto Alegre?
Quem esteve lá e acompanhou os acalorados discursos sobre outro Brasil que se pretendia construir, deve ter se frustrado a partir do segundo ano de governo Lula e, posteriormente, tendo continuidade por Dilma Rousseff. Ambos não tiveram coragem o suficiente e nem competência para promover o que estabelecia o estatuto do partido dos trabalhadores, ou seja, uma profunda transformação estrutural, que pudesse romper definitivamente com o histórico e nefasto domínio das elites predadoras que, como vampiros vorazes, “sugam o sangue” dos trabalhadores. Nada de revolução, menos ainda melhorias substantivas em áreas estratégicas, que a meu ver a educação deveria ser uma delas por ser um instrumento impulsionador do desenvolvimento.
 No lugar de transformações significativas, o que se viu foram modestas e acanhadas ações de caráter filantrópico, através de transferência de recursos às populações carentes, sem ao menos condicionar o apoio a um plano mais estruturado que pudesse resultar em uma real “revolução social”, não nos moldes tradicionais, mas que brotasse no interior dos grupos sociais, fundamentado em teóricos como o educador brasileiro Paulo Freire, o italiano Antônio Gramisc, entre outros.   
Nem educação, nem saúde, nem segurança foram priorizados durante mais de uma década que perdurou o ciclo “lulismo” e Dilma. E não foi por falta de recursos. Como em qualquer país que alcançou o desenvolvimento econômico e social, como exemplos, Noruega, Suécia, Finlândia, etc. ambos aproveitaram de maneira eficiente suas riquezas naturais: petróleo, minérios, pescados, entre outros, para dinamizar suas economias, transferindo parte dos vultosos recursos para revolucionar a educação.
No Brasil, o processo dito “transformador” foi e está sendo realizado de modo invertido. E por quê? A resposta, portanto, pode estar condicionada a vários fatores, dentre eles, talvez, o que mais aproxima a realidade, é o político administrativo. No Brasil, tal sistema foi forjado há mais dequinhentos anos, que a pretexto de assegurar o bem comum, muitos as utilizam em benefício próprio e de seus “iguais”. Manter a educação pública em condição de precariedade como se vê hoje, permite que sejam reproduzidas as relações de domínio de classe.
 Construir um Estado verdadeiramente republicano no Brasil, seguindo os princípios do modelo clássico, nesse caso o positivismo, está ainda distante para se consolidar. Basta conferir o modo como se sucede as eleições daqueles que integram os poderes legislativos e executivos, nas instâncias federal, municipais e estaduais. Com raras exceções, prevalece até os dias atuais o emprego de critérios questionáveis para alcançar os fins pretendidos, a obsessão exacerbada pelo poder.
O critério de escolha, portanto, ainda se baseia na mercantilização do voto, do toma lá dá cá. Aspectos como competência e capacidade de gestão, compromisso social e honestidade, são esquecidos ou desprezados no instante que o voto é depositado na urna. Para conferir tais adjetivos bastam relembrar o fatídico e emblemático momento em que cerca de trezentos deputados envergonharam milhões de brasileiros expressando frases ou bordões que revelam a limitada capacidade intelectual nos cargos que exercem quando votaram a favor ou contra o impeachment de Dilma Rousseff.
São esses mesmos legisladores que vem decidindo ou vão decidir o futuro de milhões de brasileiros, que os elegeram, na votação de projetos que tornarão a vida desses mesmos brasileiros ainda mais deploráveis. São perdas de direitos e a imposição de sacrifícios ainda mais brutais para tentar recuperar um país devassado pela corrupção e injustiças sociais.  A designação positivista “ordem e progresso”, que se tornou o slogan escolhido pelo governo interino, Michel Temer, já dá o tom de como será seu governo. Quem se lembra dos protagonistas do pensamento Neoliberal do começo da década de 1990, onde seus articuladores, Consenso de Washington, lançaram receituário de reformas estruturais e que foram aceitas e aplicadas inicialmente por Collor de Mello e, posteriormente, FHC. Estado máximo para os trabalhadores e mínimo para o mercado, essa foi a regra estabelecida.
Lembra-se das manifestações dos professores da rede pública estadual do Paraná, no inicio de 2015? É isso mesmo, Estado Máximo foi o que ocorreu, com polícia na rua reprimindo-os com cassetetes, spray de pimenta e balas de borracha. Com o slogan Ordem e Progresso, não há qualquer dúvida quanto sobre o uso da força repressora do Estado, para aqueles que ousarem se opor às políticas de ajustes. Julgam os seus articuladores, que tais medidas restabelecerão os rumos do país, trazendo estabilidade econômica e desenvolvimento social. Isso mesmo, “primeiro fazer crescer o bolo para depois distribuir à população”.  
Afinal qual o custo social para tudo isso? Para um país em crise, com hospitais e escolas aos frangalhos, com todas as benesses possíveis aos seguimentos financeiros internacionais, bem como isenções fiscais generosas às grandes corporações econômicas, o custo social será, com certeza, doloroso. O Projeto de Lei Complementar 157/2016 é um sinal de que teremos dias muitos difíceis se a mesma for aprovada no congresso. O modo como o respectivo congresso hoje está constituído, o mais conservador de todos os tempos, pouquíssimas são as chances de ocorrer um revés favorável aos trabalhadores.
A questão central desse projeto de lei está na proposta de refinanciamento das dívidas dos estados, orçado hoje em cerca de 300 bilhões de reais. Não se enganem a dívida dos estados era muito menor, porém, seus financiadores, os bancos internacionais, criaram um dispositivo de calcular juro sobre o juro.  Como forma de ter o apoio dos governadores num momento delicado, de crise institucional, o acordo fechado com os governadores foi tentar atraí-los a aderir ao plano, cujas dívidas serão proteladas por vários anos. No entanto, como ação compensatória terão os governos estaduais e o próprio executivo federal o compromisso de aplicar as metas do ajuste fiscal.
Mais uma vez o funcionalismo público e companhias estatais de importância estratégica serão penalizados com mais um ajuste estrutural. O fato é que os bancos detentores de fluxo de capitais que transitam pelo planeta e que financiam as economias dos países em desenvolvimento, impõe regras ante populares para assegurar que não haja calote da divida. No entanto, devido a limitação cada vez maior de capitais disponíveis, a tendência são os bancos disponibilizarem os capitais a quem ofereça juros compensadores. Países como o Brasil com uma forte estagnação no setor produtivo, são os elevados e atraentes juros oferecidos que asseguram a entrada de capitais voláteis. Atualmente os juros da taxa Selic são de 14%, muito alto para uma economia quase congelada. O impacto dessa elevada taxa para a economia é o agravamento da recessão.
Outro critério estabelecido tanto para garantir o fluxo de capitais para o pagamento da dívida pública como também a absorção de novos recursos externos via fundo monetário internacional é, além dos ajustes fiscais, a formação de um superávit primário, ou seja, sobras de recursos para o pagamento das dívidas. Para 2017 a proposta do governo federal é reduzir a inflação de 9,5% para 4,5%. A tendência, portanto, é o aumento da taxa da Selic, que por sua vez refletirá na elevação dos preços dos produtos e serviços e a redução do consumo. Isso quer dizer, menos dinheiro circulando, menos consumo, mais desemprego, mais pobreza, mais violência, mais insegurança, etc.  
Preste a atenção de como funcionará essa equação matemática que, segundo o governo federal, será o caminho para a retomada do crescimento econômico. Cada estado da federação deverá promover cortes de despesas com o funcionalismo público, dentre outras medidas. Nesse caso, nos próximos anos nenhum reajuste salarial poderá ser concedido. Na continuidade do déficit público, ou seja, inflação acima do patamar pré-estabelecido, os governos estaduais poderão executar outras medidas mais austeras como suspensão de contratação de trabalhadores e demissões voluntárias.
O sistema previdenciário também sofrerá forte revés. Além da prorrogação do tempo para a aposentadoria, redução dos benefícios e equiparação entre os vários níveis, também ocorrerá a elevação da alíquota cobrada que poderá ultrapassar os 14%. No projeto há dispositivos que estimula os contribuintes a recorrer o regime de previdência complementar. Essa medida cria precedentes para que companhias particulares vinculadas ao seguimento previdenciário se instalem no Brasil e cujos recursos advindos dos fundos complementares ou fundos de pensão serão injetados no capital especulativo rendendo bilhões aos seus proprietários.   É esse mesmo dinheiro dos fundos complementares que financiará as economias débeis como a brasileira. Nosso próprio dinheiro financiando a incompetência dos governos.
Os estados também deverão promover suas reformas administrativas. Santa Catarina saiu à frente e já vem cumprindo tais medidas. No final de 2015 a Assembleia Legislativa aprovou vários projetos flexibilizando direitos já assegurados aos servidores da segurança pública e educação.  Na educação, foi sancionado o novo plano de carreira do magistério público estadual alterando, entre outros, o tempo para a aposentadoria. Além, claro, o congelamento dos salários até 2018, com possibilidade de prorrogação. Talvez depois das eleições o ataque do governo será no regime geral dos servidores que alterará dispositivos jurídicos dos ativos e inativos, extinguindo benefícios e alterando regras de aposentadoria.  
A PLP 157/2016 também autoriza os estados na hipótese das medidas não forem suficientes para atingir os limites pré-estabelecidos de gastos, avançar ainda mais reduzindo em até 30% os gastos com servidores públicos. A tendência aqui é estimular a demissão voluntária no serviço público e alterar o regime jurídico de contratação de trabalhadores, podendo, até, expandir o regime de terceirizados.  Esse já é um dispositivo empregado em vários seguimentos, dentre eles as OS (Organizações Sociais) que administram muitos dos hospitais públicos do Estado. Na educação, serviços como vigilância e alimentação dos estudantes, são terceirizados. A tendência é se estender ainda mais, podendo até o governo terceirizar a contratação de professores e outros serviços executados nas escolas. É só esperar.
E o ataque contra servidores públicos continua. Mais uma vez são os profissionais da educação os alvos diretos do terrorismo praticado pelo governo do estado. E por que será? Por que não adota os mesmos procedimentos contra as Agências de Desenvolvimento Regionais, que acomodam milhares de pessoas em cargos comissionados, cujos benefícios pró-desenvolvimento das regiões são questionáveis? É claro que não!  Por que matar logo a galinha dos ovos de ouro, instrumento que garante a perpetuação de um modelo de governo respaldado por grupos econômicos e grandes empresários da comunicação no estado.
Se a proposta é reduzir gastos públicos mantendo intocáveis tais calcanhares de Aquiles, como ADRs e o seguimento empresarial beneficiando por isenções fiscais milionários, então é necessário forjar bodes expiatórios produzindo situações problemas que justifiquem a adoção de novos procedimentos que resultem na redução do quadro de profissionais, bem como na própria extinção do cargo. A vítima insana do governo desta vez foram os profissionais que monitoram as salas de tecnologia das escolas públicas estaduais.
A questão é que esses profissionais além de exercerem o importante papel de assessorarem os estudantes nos laboratórios de informática, também estão incumbidos de prestar assistência técnica aos equipamentos, assegurando o funcionamento mediante transferência de peças de uma máquina para outra. Isso mesmo. É bem possível que o governo do estado e seu secretário da educação não tenham qualquer noção da condição de abandono e sucateamento dos laboratórios de quase todas as escolas públicas.
Enfim, todo esse imbróglio envolvendo o aparelho estatal, cujos serviços oferecidos são o retrato de um sistema montado para beneficiar partidos políticos e seus apadrinhados, não é de estranhar que nas eleições municipais de outubro de 2016, partidos políticos que integram a base aliada do governo obtenham o máximo de prefeituras e cadeiras no legislativo. Pode ser também que a partir do instante que a população sinta na própria carne os efeitos perversos das medidas previstas na economia, ocorra um revés violento quebrando um ciclo quase centenário de hegemonia das oligarquias no estado. É esperar para ver.
Prof. Jairo Cezar