domingo, 30 de setembro de 2018



NEOLIBERALISMO E XENOFOBIA SE ESPALHAM PELO PLANETA

Imigrantes - centro de Estocolmo/Suécia

Quanto estive na Suécia há quatro anos era visível no semblante dos habitantes da capital Estocolmo certo ar de insatisfação dos cidadãos suecos frente ao crescimento vertiginoso do fluxo de imigrantes pobres espalhados por todos os cantos da cidade. Muitos cidadãos, especialmente os nacionalistas, responsabilizavam os governos pela situação. A preocupação com o aumento do fluxo migratório também era sentida nas vizinhas, Noruega e Finlândia, que juntas com a Suécia, “integram” o grupo dos países nórdicos com excelentes níveis IDH, porém ameaçados pela fúria neoliberal.  
É claro que a presença de estrangeiros no país aguça ainda mais a insatisfação de grupos extremistas, vinculados em partidos direitistas, dos quais defendem posturas mais austeras dos governos para controlar as fronteiras. Mas não é somente a imigração a causa da exacerbação de grupos extremistas xenófobos na Suécia. As reformas estruturais em curso, com cortes em investimentos sociais tendeu a intensificar o ódio conforme ia se intensificando as desigualdades sociais. Resultado foi o que já era de se esperar no último pleito eleitoral, com 17,5%, dos votos para os candidatos da extrema direita.
De acordo com pensador norte americano Neon Chomsky, o modelo econômico neoliberal teve a sua origem no começo da década de 1970, como reação do capitalismo aos avanços de categorias sociais até então desassistidas como mulheres, LGBT, negros, etc, que reivindicavam direitos. Como forma de frear tais ameaças, o mercado teve que se reordenar adotando políticas restritivas, rebaixando salários e reformulando sistemas de ensino público.
A participação do FMI e do BANCO MUNDIAL foi decisiva à formatação desse novo modelo de ensino ajustado à ordem produtiva descartável, com sujeitos dóceis e maleáveis. Com a concretização desse modelo produtivo altamente excludente, os lucros no mercado cresceram mais de 1000%, enquanto que os salários declinaram vertiginosamente.
Com a crise financeira de 2008 nos Estados Unidos, a economia seguiu um caminho tortuoso aumentando a leva de trabalhadores precarizados. Entre 2005 a 2015, a força de trabalho temporária na América do Norte atingiu 95%. O que se vê hoje é uma pulverização desse modelo de trabalho informal para além das fronteiras dos Estados. O capital financeiro especulativo vem agindo com força nos países periféricos e centrais, afrouxado relações formais de trabalho e enfraquecendo democracias. As reformas neoliberais em curso no Brasil na hipótese de vitória de candidatos não comprometido com investimentos sociais, a tendência é o agravamento do quadro de exclusão social.
 Temos experiências de sobra que comprovam que regimes autoritários não foram suficientes para solucionar problemas sociais históricos. O que se fez foi reprimi-lo, fechando sindicatos, censurando jornais, prendendo e torturando, como forma de tornar o caminho livre à aplicação dos programas desenvolvimentistas, que gerou um dos maiores endividamentos do Estado brasileiro. Mais uma vez é importante deixar claro que as causas do desarranjo das estruturas do Estado brasileiro têm como uma das origens a histórica cultura da corrupção, associada à forte dependência aos fluxos de capital especulativo externo.  
Uma gigantesca parcela da população desassistida em educação e saúde tenderia mais cedo ou mais tarde descambar no atual quadro de insatisfação e aversão as instituições republicanas. Se há insatisfação pelo modo como certos políticos se comportam, nosso dever de cidadão é expurgá-los da vida pública.
Por isso a necessidade de eleições em quatro em quatro anos. Uma democracia que se deseja ideal, deve ser construída por todos, a partir dos erros e acertos. Todas, até mesmo na Grécia, berço desse sistema, passaram por situações conflitantes.  Se houve erros cometidos por quem esteve à frente do poder, cabe a nós puni-los, escolhendo candidatos comprometidos com verdade, ética.
Há cerca de uma semana das eleições, o que se vê é um cenário de tensões gigantescas diante do fortalecimento da polarização de forças antagônicas. Num momento como esse, é necessário ter bom senso e capacidade de discernimento dos discursos, muitas vezes contraditórios, preconceituosos, que apregoam o ódio e a violência. Nosso futuro, dos nossos filhos e netos está em nossas mãos.
Na democracia quando elegemos um mau governo, podemos expurgá-lo na eleição seguinte. Agora, quando uma sociedade inteira tem esse direito suprimido, a exemplo do fascismo, nazismo e tantos outros regimes totalitários ainda hoje presentes em muitos países, nossa liberdade, nosso direito de ir e vir, de criticar, de reclamar, de falar, tudo isso deixa de existir. O medo, a dúvida e a desconfiança se tornam regras.  Quem quiser saber mais sobre esse terrível momento da história brasileira, basta ler Brasil Nunca Mais, da Editora Vozes, cujo prefácio foi escrito por Dom Paulo Evaristo, Cardeal Arms.
Prof. Jairo Cezar
     

quinta-feira, 27 de setembro de 2018


PROPOSTAS ANTIAMBIENTALISTAS DE PRESIDENCIÁVEIS PODEM GERAR MAIS DESMATAMENTOS E VIOLÊNCIA NO CAMPO



Desde a ECO-92, RIO+20 e todas as dezenas de Conferência das Partes Sobre o Clima, conhecidas por COPs, centenas de chefes de Estados e de seguimentos ambientais, vem participando desses encontros e assinando acordos que limitam as emissões de gases do efeito estufa. Poucos foram os avanços significativos nesse seguimento, a resposta negativa disso são os últimos três anos consecutivos de temperaturas médias do planeta superando médias históricas. Não é somente a queima de combustíveis fósseis a responsável pelas disfunções climáticas no global.  A supressão das florestas tropicais (Amazônia e Serrado), também são grandes emissores de CO2.
A pressão do agronegócio tende a ser um dos grandes obstáculos na execução dos acordos climáticos. A progressiva desertificação de extensas áreas no nordeste e a redução contínua das chuvas são provas concretas de que os governos precisam repensar suas políticas no seguimento ambiental. O Brasil e dezenas de outros países assinaram em 2015, em Paris, na COP 21, protocolos cujo compromisso é até 2033, entre outras coisas, combater o desmatamento ilegal e investir em energias limpas. 
Quase três anos depois do encontro de Paris, discretas ou nenhuma foram as resoluções executadas. O que se constatou mesmo foi uma avalanche de ataques a tudo que se refere a proteção ambiental. Por trás desse retrocesso estão setores conservadores alojados no congresso nacional, representando latifundiários e poderosas corporações do agronegócio que faturam bilhões comercializando sementes modificadas e agrotóxicos.
Como já é rotineiro, as esperanças contra tais retrocessos sempre se renovam a cada quatro anos, quando a população tem nos dedos a oportunidade de eleger governantes e parlamentares engajados com a causa ambiental. Analisando o atual cenário eleitoral, dos treze candidatos à presidente, quatro apresentam propostas nítidas contrárias ao meio ambiente. Desses quatro, o que provoca calafrios às comunidades científicas e ambientalistas é o candidato do PSL, Jair Bolsonaro.
O que se vê no seu plano não são medidas reparatórias ou ajustamento de normas tornando as regras ambientais mais ou menos flexíveis no campo ambiental. É, com certeza, um verdadeiro ataque criminoso contra tudo o que se conquistou nas últimas décadas nessa área. Sua proposta é de fusão do MMA com o Ministério da Agricultura; o fim do acordo de Paris sobre o clima; o enfraquecimento ainda maior do IBAMA e do ICMBio. Pretende também avançar em áreas protegidas e florestadas; flexibilizar regras de licenciamento ambiental e a liberação de armas para proprietários rurais.
A tendência será na hipótese de ser eleito, o campo se transformar em palco de batalhas pela posse da terra. Isso terá o agravante com a liberação do porte de armas para produtores rurais.  Outro candidato com proposta nada animador para o ambiente é Geraldo Alckmin, do PSDB, que defende a aprovação da PL dos agrotóxicos ou “lei do remédio”.  Também é a favor do porte de armas para proprietários rurais - fazendeiros. O PDT, chancelado por Ciro Gomes, também apresenta um plano de governo conservador na área ambiental.
Não surpreende pelo fato de ter como candidata à vice-presidente, uma das representas do agronegócio, defensora de tudo que possa favorecer os seus pares ruralistas. É contrária a lei da lista suja que expõe à sociedade os nomes daqueles que cometeram crime submetendo pessoas a condição de trabalho análogo a escravidão.  Confessou ela que a lista suja é um apedrejamento antecipado, que não deveria ser divulgado.
Prof. Jairo Cezar   

domingo, 23 de setembro de 2018


O RETRATO DESOLADOR DO SANEAMENTO BÁSICO NO BRASIL

Foto - acervo Jairo

Na coordenação do projeto escola sustentável junto com a colega de trabalho da EEBA - Araranguá, entre as várias temáticas abordadas nos quase dois anos de atividades, uma das demandas elencadas para 2018 foi discutir o saneamento básico como um dos vetores à saúde da população. Sabendo que legislação em vigor estabelece que todos os municípios brasileiros tenham seu plano de saneamento já concluído, é possível contar nos dedos aqueles que coletam e tratam 100% dos seus efluentes domésticos e industriais.
O cenário vislumbrado no horizonte não é nada animador. Os gestores públicos municipais justificam o atraso no cumprimento dos planos devido a crise econômica, pois o governo federal alega falta de recursos para o financiamento de obras de infraestrutura. Uma rápida radiografia do saneamento básico no Brasil deixa explícito um cenário  parecido ao da Europa do século XII, XIII, idade média, quando não havia cuidado algum cuidado com a água e esgoto.
Em se tratando de saneamento básico, entre as cinco regiões brasileiras não há grandes contrastes quando o assunto é sistemas rede coletora de efluentes domésticos e industriais. No total, 55% do esgoto produzido no Brasil são jogados na natureza. São 35 milhões de brasileiros sem água tratada em suas casas. Regiões como norte e nordeste, lideram o ranque nacional de desassistidos nesses seguimentos. Apenas 26,8% dos moradores dos nove estados do nordeste são contemplados com rede de esgoto. Dos 22 entre os 27 estados que compõe o território brasileiro, menos da metade do esgoto produzido por ambos passa por tratamento.
O estado de Pernambuco a situação é quase catastrófica, sete em cada 10 moradores não tem saneamento básico. O tratamento dos efluentes atinge somente 30% da população do estado. Na região norte, os números mostrados fazem qualquer um acreditar que são dados falsos, mal intencionados, de agências pesquisadoras. O pior é que os números são realmente verdadeiros. A região que concentra o maior percentual de água doce do país, quiçá do planeta, apenas 55,37% dos habitantes possui água encanada. No quesito tratamento dos efluentes, o índice é vergonhoso, pouco supera os 10%.
Isso significa que parte desse resíduo não coletado é lançado nos rios e igarapés, responsável por inúmeras enfermidades. O estado do Amapá comemorou a façanha de ter elevado sua cobertura de esgoto tratado de 3,8 para 5,9%. A capital, Macapá, somente 40% dos habitantes tem rede de água tratada. Agora, o município que lidera a lista dos piores em saneamento básico está no estado do Pará, e se chama Ananindeua, com 0,75% das casas com rede de esgoto, já com água tratada são 29,98% da população. A situação calamitosa desse município paraense é uma mostra de um problema que atinge todo aquele estado, especialmente a capital, Pará, onde todos os bairros não são atendidos por saneamento básico.  O percentual de residências atendidas com rede de esgoto em Belém é de 12%.
O Centro Oeste e Sudeste parcela significativa da população também padecem de saneamento básico.  É 89,7% o percentual de pessoas nos quatro estados da região centro oeste que recebem em suas casas água tratada. Contudo, o problema começa quando a metade da população não tem coleta de esgoto. Campo Grande, capital do Mato Grosso do Sul, é um dos únicos estados da região que coleta 77,88% do esgoto. O contraste entre água tratada e rede de coleta de esgoto é observado em Cuiabá – Mato Grosso.
Ao mesmo tempo em que 98,13% população da capital tem acesso a água, 48,61% não tem rede de esgoto. Apenas um terço, dos 48,61%, é tratado. O que gera mais apreensão disso tudo é que um dos principais rios do estado, o rio Cuiabá, é formador do pantanal. Todos os dias o rio despeja nesse que é um dos mais complexos ecossistemas do planeta, toneladas de efluentes poluidores. O estado de Goiás fica atrás do seu vizinho Mato Grosso em tratamento de água, são 87,99% da população atendida, porém fica pouquinho acima em rede de esgoto, 50%.
Quando imaginávamos que a região sudeste por ser a “locomotiva do Brasil” já atendesse 100% da população com rede de água, veio a surpresa, 8,8% da população ainda é desassistida desse serviço. Isso também ocorre com coleta de esgoto, 78,6% da população é beneficiada. O Rio de Janeiro que durante algum tempo vem dominando os noticiários televisivos com reportagens nada agradáveis, também é um estado desassistido em saneamento básico. De cada 10 cidadãos fluminenses, quatro não recebem água tratada em suas residências.
O caso mais assustador no estado é o município de Duque de Caxias, na baixada fluminense, que ser comparado ao município Ananindeua, no Pará.  Numa lista de 100 municípios, Duque de Caxias fica em 92 em saneamento básico. O lixo e o esgoto é tanto, cujo rio Calombé, que corta a cidade, chegou a pegar fogo devido a grande quantidade de resíduos químicos lançados no seu leito. 

      
A região sul do Brasil, que sempre é vangloriada pelos gestores públicos e pela mídia corporativa como exemplo em qualidade de vida, também amarga um triste cenário no quesito saneamento básico. Embora a cobertura com água tratada atenda 90% dos três estados, no tratamento de esgoto o percentual baixa abruptamente para 42,5%. O estado do Paraná lidera no tratamento de esgoto, chegando a 67,9% dos moradores. Já com água tratada, o percentual é de 93,33%. É possível que quase a totalidade do esgoto coletado e tratado no estado do Paraná se concentre nas principais cidades, a exemplo de Curitiba. Tal certeza é fundamentada nos relatórios divulgados afirmando que 91 municípios do estado apresentam índices de saneamento abaixo da média nacional.
O estado de Santa Catarina continua envergonhando os seus cidadãos, quando números mostram que apenas 20,9% de todo o esgoto é coletado é tratado. Alguns municípios catarinenses apresentam cenários muito parecidos com os do norte e nordeste. O exemplo é a Palhoça, na grande Florianópolis, dos 170 mil habitantes, 20 mil tem rede de esgoto. Florianópolis, a capital dos catarinenses e a preferida das celebridades, têm 60,25% do esgoto coletado e tratado. O restante é despejado em córregos que desembocam nas várias baias e mangues que circundam a cidade.
 A região do extremo sul de santa Catarina o cenário é mais desolador ainda. Incluindo a região da AMREC e AMESC, ou seja, 16 municípios com 600 mil habitantes que estão inseridos na Bacia do Rio Araranguá, na época da aprovação do plano de recursos hídricos, em 2015, a quantidade de esgoto coletado e tratado era de 4%. Hoje, inclusão Araranguá e a ampliação da rede em Criciúma o percentual pode ter se elevado para 10 ou 15%.
Quando afirmamos que a quantidade de rede de tratamento de esgoto construída na região da bacia hidrográfica de Araranguá é de 10 a 15%, não significa que tal percentual esteja sendo coletado na sua totalidade. Para entender melhor tudo isso vamos usar como exemplo o município de Araranguá. Na visita realizada pelos/as estudantes da EEBA a ETE I, próxima a câmara de vereadores, a técnica informou que as duas estações jutas têm capacidade para coletar e tratar esgoto de 30.600 habitantes, quase a metade da população, que é de quase 68 mil habitantes. O problema, segundo a monitora, é que hoje, depois de quase um ano de ter sido inaugurado do sistema, são coletados e tratado menos de 4% dos efluentes.
A ETE I, na qual tem capacidade para tratar 37 mil metros por segundo de efluentes domésticos e industriais, processa apenas pouco mais de 3 mil litros, que é 10% da capacidade da estação. É preciso sensibilizar a população araranguaense da necessidade de se ligar a rede de tratamento, ressaltou a monitora. Sem a conexão das residências e empresas nas tubulações distribuídas por cinco bairros e o centro, o complexo sistema, além de trabalhar na sua capacidade mínima, os efluentes continuarão sendo lançados na natureza. Para comprovar tal realidade, basta dar uma olhada na “água” que escorre pelo córrego que atravessa a Avenida 15 de novembro, nas proximidades do ginásio de esportes “bolha”. É desanimador.
É possível, portanto, que o município de Araranguá também esteja incluído no rol dos demais municípios espalhados pelo Brasil que gastaram cerca de 100 milhões de reais do SUS em 2017 com tratamento de doenças oriundas da falta de saneamento básico, como diarréias, doenças de pele, dengue, entre outras. Foram 263,4 mil pessoas internadas, segundo o Ministério da Saúde naquele ano. O mesmo órgão afirma que o resultado de 2017 foi melhor que o ano anterior, 2016, quando foram atendidos 350,4 mil pelo SUS, com gasto de 129 milhões de reais.
Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), cada $1 investido em saneamento básico, seriam economizados $ 4,3 em saúde no mundo. Conforme estabelecido no plano nacional de saneamento básico, a meta do Brasil é universalizar esses serviços até 2033. São hoje, cerca de 1.600 dos 5.570 municípios brasileiros que possuem pelo menos um sistema de coleta e tratamento de esgoto. Se o sistema fosse hoje universalizado, o governo estaria economizando cerca de R$ 1,4 bilhão em saúde. 
Ao longo dos 15 anos que restam para expirar o prazo estipulado para a universalização do saneamento básico, municípios, estados e o governo federal, juntos necessitariam desembolsar aproximadamente R$ 30 bilhões por ano. Se até o momento, pouco mais de 20% dos municípios já cumpriram parcialmente com o programa, é acreditar em Papai Noel achar que em 15 anos o restante dos municípios, 3.970, cumpram as metas.
Por que todo esse pessimismo? Em 2015 o governo brasileiro investiu R$ 13.2 bilhões de reais com saneamento. No ano seguinte, justificando contenção de despesas, os investimentos encolheram 1.7 bilhão. Com a crise que se segue e o aumento da dívida pública, somada a corrupção, é de se prever que os anos seguintes, 2017 e 2018, o valores devem ter sido reduzido ainda mais.
Prof. Jairo Cezar
        

              

quinta-feira, 20 de setembro de 2018


O PLANO NACIONAL DE EDUCAÇÃO (PNE) NOS PROGRAMAS DE CAMPANHA DOS/AS CANDIDATOS/AS À PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA


Quem diria o Plano Nacional de Educação - PNE,  um plano tão importante e decisivo para retirar a educação brasileira do atoleiro secular,  aparece somente nos programas de cinco dos treze presidenciáveis. É muito pouco para uma proposta que embora não contemple todas as demandas necessárias da educação pública, é um documento que se executado as 10 diretrizes, 20 metas e 250 estratégias até 2024, o Brasil poderá dar um passo decisivo na superação de gargalos seculares na educação como o financiamento. Embora alguns candidatos não tenham citado o PNE em suas propostas, todos, sem exceção, dão destaque ao tema, alguns de forma sucinta e outros com mais detalhes.
Passando os olhos rapidamente em cada um dos planos, me detive à atenção na síntese do projeto do candidato do PSL, onde não consegui conter a raiva quanto ao que estava escrito no documento. Estava escrito que os conteúdos deverão ser sem doutrinação e sexualização precoce, que vai mudar a base nacional curricular comum "expurgando a ideologia de Paulo Freire".[1] Talvez no campo da psicologia comportamental seja possível que se encontre explicações sobre disfunções no cérebro humano, das quais possam levar pessoas a querer governar um país tão desigual a expressarem opiniões tão absurda, doentia, acerca do educador Paulo Freire.
Muito do que está escrito no PNE, BNCC e nos milhares de Projetos Políticos Pedagógicos de escolas públicas e privadas, foram fundamentados em conceitos progressistas pensados por Vigostsky, Piaget, Walon, Paulo Freira. Expurgar do currículo Paulo Freire é expurgar todos esses e demais intelectuais. Portanto, como ficaria a educação brasileira sem ambos?
 Quanto as 20 metas do PNE, uma apenas foi cumprida, a n. 13 que determina que o ensino superior seja de 75% e 35% seja de mestres e doutores. As demais não há qualquer perspectiva de que sejam cumpridas até 2024 como educação na pré-escola, desempenho no ensino fundamental que está estagnado, oferta do ensino no tempo integral, que retrocedeu, plano de carreira e salário dos professores e investimento do PIB para educação, orçado em 10% até 2024.
 A primeira experiência de um plano de educação geral no Brasil ocorreu em 1937, durante o estado novo. Antes disso, em 1931, foi criado CNE, que se transformou numa espécie de PNE, que definiu as diretrizes de toda educação e políticas de financiamento. A urgência de um plano geral de educação na época era para tentar resolver gigantescos gargalos existentes, principalmente quando se tratava de ensino fundamental ou primário, onde mais de 60% das crianças não dispunham de escolas.
Era consenso entre educadores e políticos da época que um Plano Nacional de Educação corroboraria para combater distorções no ensino, além de apregoar uma visão dos problemas em vista de soluções pertinentes. Oitenta anos depois do primeiro PNE, o cenário que deparamos hoje mostra que as distorções no ensino continuam e as soluções pertinentes estão longe de ocorrer.       
Na década de 1960, outro plano nacional de educação foi construído, com o intuito de conter fissuras no débil processo educacional. Dentre as propostas do plano se destacaram: o combate ao analfabetismo, a universalização do ensino, melhorar a qualidade do ensino e a formação humanista, científica e técnica de trabalho. No entanto, nem o primeiro e nem o segundo plano, tiveram êxito a ponto de evitar que o Brasil se tornasse uma das nações mais atrasadas em educação.  Ainda assim, elites políticas e econômicas conservadoras estufem o peito se vangloriando pelo fato do Brasil ocupar o posto da 10 economia do planeta.
Depois de mais de vinte anos de regime militar cujo foco no tecnicismo e remetendo os demais níveis para um patamar inferior, a grande reforma de 1996, lei n. 9394/96, trouxe mais uma vez esperança de superação de problemas diagnosticados no começo do século XX, que não obtiveram êxito.  Dois novos planos se seguiram posteriormente, o de 2001 a 2010 e o de 2014 a 2024.  Tanto o primeiro quanto o segundo plano, ambos vem sendo avaliados por especialistas, educadores, como verdadeiros fracassos. A explicação desse fracasso, todos sabem, falta de previsão orçamentária.
  Quantos anos ou décadas serão necessárias para que o país tenha um plano nacional de educação verdadeiro e que permaneça forte independente de qual governo seja eleito. Países como a Finlândia, Suécia, Coréia do Sul, Canadá, Cuba, entre outros, com bons IDH, tem seus planos de educação estruturados. Deveria ser obrigação constitucional que todo partido ou pessoa que queira concorrer à vaga de presidente, governador ou prefeito, tenha explícito no seu programa de governo as diretrizes, metas e estratégias. Por que será que poucos se importam com isso, mesmo afirmando categoricamente que a educação é a prioridade das prioridades?
Prof. Jairo Cezar  


[1] http://divulgacandcontas.tse.jus.br/candidaturas/oficial/2018/BR/BR/2022802018/280000614517//proposta_1534284632231.pdf

terça-feira, 18 de setembro de 2018


ROTEIRO GEOECOLÓGICO COMO ESTRATÉGIA PARA COMBATER A ESTAGNAÇÃO ECONÔMICA E SOCIAL DE ARARANGUÁ

foto - Roteiro Geoecológico Costa de Araranguá

Mais uma etapa do projeto Roteiro Geoecológicos Costa de Araranguá, como uma das demandas do Programa de Gestão Integrada (PGI) do Projeto Orla e patrocinada pela fundação Mata Atlântica foi executa e dessa vez no Balneário de Ilhas – Araranguá/SC. Já que a proposta tem por finalidade empoderar a população local com informações e demandas acerca do território onde habitam, havia expectativa da presença no encontro de integrantes do poder público e órgão ambiental, que decidiram boicotar.
Dezenas de pessoas, muitos dos quais pescadores e lideranças comunitárias acompanharam atentas as explanações da palestrante. Em varias momentos os presentes intervieram indagando ou tecendo críticas severas ao modo como os poderes constituídos vêm agindo na comunidade. Denunciaram que há anos o balneário sofre com o problema da pesca predatória, muitas vezes sendo responsável os próprios órgãos ambientais como o IBAMA por restringir práticas costumeiras de pesca como a “fila do boto”.

foto - acervo  Jairo
Relataram que a colônia promoveu dezenas de reuniões com entidades competentes para discutir soluções sustentáveis à pesca na comunidade. Uma das propostas elencadas foi a definição de uma área de 2.500 metros de preservação para a pesca organizada. Os próprios pescadores gerenciaram esse sistema. No entanto, quando a proposta chegou ao IBAMA à proposta foi vetada, alegando inconformidade legal. “Tiraram o poder da colônia de fiscalizadora da pesca”, confessou o ex-presidente da colônia de pescadores da comunidade.

foto - acervo Jairo
Acrescentou que o veto do IBAMA abriu caminhos para a pesca desorganizada predatória. Relataram algumas experiências bem sucedidas como a pesca do bagre em forma de condomínio. Lembrou da captura de grande quantidade de pescado no passado, como em 2006 e 2007, onde foram pescadas 100 toneladas de tainha. Mesmo com a fixação de placas delimitando as áreas para o exercício da atividade, ninguém respeita essa decisão. O resultado, portanto, é a bagunça sem limites e sem qualquer expectativa de solução em curto e médio espaço de tempo.
Um cidadão lembrou que no começo do século XX, a pressão do escoamento da água na barra do rio Araranguá era mais expressiva que de Laguna. Maior pressão resultava em menor assoreamento da boca da barra. Esse fenômeno contribuiu para a entrada e saída de embarcações de médio porte, levando e trazendo produtos e pessoas de Araranguá, Laguna e Florianópolis. Relatou que na época havia cerca de 250 famílias morando na comunidade. Quanto ao tema fixação da Barra, enfatizou a palestrante que o projeto não foi executado por diversos fatores. A não comprovação técnica que abra solucionaria o problema das cheias cíclicas na montante foi uma delas.

foto - acervo Jairo
Outro fator foi o aumento da salinização da água a montante da bacia comprometendo a cultura do arroz, entre outras. Na palestra anterior a de ILHAS, na UFSC, uma participante destacou um aspecto relevante. Disse que a não fixação da barra foi importante para Ilhas, Morro Agudo, Barra Velha. No fundo do rio estão depositados há décadas sedimentos tóxicos oriundos do carvão mineral. Com a alteração da dinâmica do fluxo de vazão, esses sedimentos seriam removidos e transportados até a foz do rio Araranguá, com impactos a toda cadeia alimentar.
Realçou a palestrante sobre o imenso potencial turístico e científico da região, que muitos estudos e pesquisas precisam ainda ser realizados. Um caso curioso é o roedor conhecido pelo nome de TUCO-TUCO, que habita dunas e praias da região. Informou que não há fontes bibliográficas que comprovam a sua existência aqui, sendo uma espécie endêmica à margem direita do Rio Mampituba. Também foram abertas discussões sobre unidades de conservação, com foco na APA, que envolve toda a área inclusive Ilhas.

foto - acervo Jairo

Explicou a palestrante que embora a APA e a RESEX tenham sido oficializadas por decreto é necessário definir plano de manejo para ambas. Nesse instante, outras denúncias foram levantadas pelos presentes como as freqüentes invasões habitacionais em áreas de preservação. Relatou que a FAMA vem corroborando com toda essa irregularidade, liberando licença de construções em locais que jamais deveriam permitidos. Desmatamento, drenagem de áreas úmidas, instalação de fossas junto aos canais, são alguns dos crimes ambientais avalizados pelo órgão ambiental municipal, relataram os presentes.

foto - acervo Jairo

foto - acervo Jairo

Destacou também a palestrante que os decretos aprovados relativos a APA e a RESEX, definem obrigatoriedade de compensações ambientais. A RESEX, que se estende da balsa à foz, o decreto condiciona o repasse de parcela dos recursos arrecadados na exploração comercial da balsa. As empresas que exploram a mineração de carvão também deveriam pagar compensação a RESEX. Esses recursos arrecadados na RESEX, APA e MONA, serão investidas em ações que estimulem o turismo e a pesquisa na região.

foto - acervo Jairo
O prazo estipulado para que as três unidades tenham os seus chefes escolhidos é 27 de dezembro de 2018. Não se sabe ainda se serão um ou três chefes e como serão escolhidos. Uma sugestão levantada foi de que a comunidade crie uma cooperativa de pescadores, indicando o seu líder. O representante escolhido dos pescadores poderá ser indicado como o chefe da RESEX junto ao comitê do projeto orla.
Esclareceu a palestrante que as rodadas de apresentações têm o objetivo de sensibilizar a população das potencialidades turísticas, que hoje podem ser conferidas visitando as placas distribuídas em cinco pontos distintos da faixa costeira. As placas informativas servem de roteiro para que turistas e visitantes conheçam a região e suas potencialidades. O que se pretende com as palestras é melhorar as placas, ouvindo da população propostas de frases e o envio de imagens relevantes que possam ser adicionadas às placas. Um cidadão criticou a localização da placa fixada em Ilhas, que deveria ser posta em local de maior fluxo populacional.      
O projeto roteiro geoecológico caminhos de Araranguá visa divulgar as potencialidades turísticas. Ilhas entra no roteiro devido ao seu forte potencial pesqueiro, artesanato e culinária. Os aspectos antropológicos e arqueológicos devem também ser ressaltados. Nas comunidades de Ilhas e Morro dos Conventos foram identificados há pouco tempo verdadeiros tesouros a céu aberto, sítios arqueológicos sambaquianos que podem ter servido de lar para outros grupos humanos como os guaranis. 
No entanto a faixa costeira onde concentram os sítios está sendo acometida dos mesmos problemas do restante do país, que é a perda gradativa da sua identidade histórica. Em Ilhas, poucos moradores sabem, possui um precioso patrimônio arqueológico semelhante aos catalogados na região de Laguna e Jaguaruna. Pesquisas realizadas dataram os sítios na costa de Araranguá de 4 a 5 mil anos de existência.  

foto - acervo Jairo
O que é revoltante para a comunidade científica e os apaixonados pela cultura material é se deparar com sítios abandonados, depredados. O sítio citado está há poucos metros do centro do Balneário. Pela dimensão do casqueiro acredita-se ter havido dezenas ou mesmo centenas de indivíduos, facilitado pela abundante eco-fauna terrestre/marinha.     Mesmo catalogados e sob proteção oficial do IPHAN, todos os sítios da faixa costeira de Araranguá estão desprotegidos. Veículos automotores, motocicletas, cavalgadas, plantações e a pecuária são alguns exemplos de antropisações sofridas pelos sítios.
Diante desses riscos a Oscip Preserv’Ação protocolou inúmeras denúncias no MPF e IPHAN, Santa Catarina, para que providências fossem tomadas para preservá-los. Tais insistências resultaram em uma reunião no gabinete do prefeito municipal de Araranguá em junho de 2016, tendo a presença também dos seguintes profissionais do IPHAN: procurador geral, chefe de divisão técnica e arqueólogo. O superintendente da FAMA, o coordenador da OSCIP PRESERV’AÇÃO, o secretário de comunicação da prefeitura e o chefe do departamento de pesquisa arqueológica do IPAT/UNESC, também estavam presentes.  

foto - acervo Jairo
  Como uma das propostas acordadas no encontro foi a realização de um seminário regional para dar arrancada a questão do patrimônio arqueológico regional.  Foi sugerido a primeira semana de agosto, o dia 10, como dada do próximo encontro, com o convite estendido aos demais órgãos municipais, como educação, cultura e turismo. Foi a primeira e última reunião. Nunca mais houve qualquer encontro a partir daquele momento.[1]  
O encontro foi tão importante que houve até publicação de reportagens do evento em jornais e revistas da região. O exemplo foi a Revista Semanal W3, que em 22 de junho de 2016, lançou extenso texto explanando o importante fato do ano com a seguinte manchete: “Projeto ambiental será elaborado para preservação de sítios arqueológicos – Ações educativas envolvendo escolas e a comunidade também devem ser realizadas”.

foto - acervo Jairo

Nada do que foi escrito na reportagem se concretizou, apenas promessas jamais concretizadas como a que foi pronunciada pelo superintendente da FAMA da época:Nesta reunião foram tratadas estratégias para solucionar os problemas ligados a preservação dos sítios arqueológicos existentes em território araranguaense. Desta forma todos os presentes se manifestaram cientes da situação e das prioridades. Por isso decidiram que seria elaborado um projeto para realizar o salvamento do sítio. Os encaminhamentos inicialmente serão voltados quanto da sequência a ser seguida, para promover a proteção, e a possível colocação de placas, entre outras ações, atendendo de forma gradativa os demais sítios”. 

foto - acervo Jairo
  O próprio prefeito municipal também se pronunciou sobre os sítios, falando o seguinte: “Entendemos que a preservação dos sítios arqueológicos existentes é essencial para que se possa estudar a história daqueles que aqui habitaram há milhares de anos. Com isso estaremos valorizando o passado e oferecer ao presente e futuro o conhecimento e a possibilidade de manter viva esta história. Vamos aguardar a apresentação do projeto e analisar a viabilidade de sua implementação. Mesmo assim, medidas paliativas de preservação já serão tomadas a fim de preservar os sítios e envolvendo a comunidade neste processo”.[2]

foto - acervo Jairo
A Constituição Federal, art. 23, II, IV; Lei 9.605/07 sobre crimes ambientais, Art. 63; Lei Complementar n.150/12 - plano diretor municipal, Art. 47, parágrafo único; Lei 2.608/07, que dispõe sobre a Fundação Ambiental do Município de Araranguá (FAMA), Art. 2, ambas possui atribuições específicas que rezam sobre a proteção do patrimônio histórico e artístico brasileiro, dentre eles os sítios arqueológicos. A sensação que fica é que todas as leis existentes não são suficientes para assegurar nosso rico patrimônio cultural que a cada dia um pouquinho da nossa história é apagado da memória.
Prof. Jairo Cezar  



sexta-feira, 14 de setembro de 2018


NOSSO VOTO PODE SER DECISIVO ESCOLHENDO A CIVILIZAÇÃO OU A BARBÁRIE 

Diante do atual quadro político e social perturbador, a barbárie se desponta como ameaça à democracia. Dia sete de outubro é a data limite do/a eleitor/a decidir o futuro do Brasil,  votando pela civilização ou pela barbárie. Foram vários os países que passaram por experiências terríveis de barbárie, a exemplo da Alemanha e Itália, tomadas por forças ultra-direitistas, nazismo/fascismo. Tais feridas histórias ainda não cicatrizadas vez ou outra ameaçam ressurgir com poderio colossal.
Na realidade tais patologias sociais cíclicas têm a sua gênese no equivocado projeto civilizatório calcado no mercado insano, que se nutre do esgotamento da natureza e das desigualdades sociais. A democracia ocidental foi concebida  como estratégia do Estado liberal para equilibrar as forças antagônicas do sistema produtivo, sem perder o domínio sobre o trabalhador.  O Estado, portanto, nasceu de uma necessidade, uma espécie de apetrecho ideológico apaziguador ou repressor das fissuras sociais. O Brasil durante os seus mais de quinhentos anos de existência não viveu qualquer experiência de democracia plena. Foram séculos de dominação, primeiro da metrópole portuguesa sobre a colônia; segundo do imperialismo britânico e norte americano; terceiro  das oligarquias rurais e urbanas, e por último do capital financeiro especulativo globalizado.
Os mesmos grupos de dominação sempre se revezaram no poder a partir da colonização, basta comparar nomes e sobrenomes dos políticos ocupantes de postos de poder  na época com a atualidade. Um embrionário processo de republicanização brasileira começou a ser finalmente encubado com a constituição de 1988. Porém, os mesmos que protagonizaram esse feito histórico passaram a corrompê-la temendo ameaças aos seus interesses. Desde o final do regime militar, os ocupantes da cadeira do executivo federal não ousaram sanar as feridas deixadas pelos generais.
Nem mesmo governos gerados nas camadas populares tiveram capacidade de reverter um cenário de desigualdade que tendeu manter-se inalterado nos anos seguintes. As crises que se seguiram minaram qualquer expectativa de construção de um projeto de sociedade no mínimo justa  em um país controlado por poderosas facções tanto na economia como nas mídias de massa. A monstruosa engrenagem do capital especulativo global sempre se beneficiou das benesses oferecidas pelos governos fantoches entrincheirados nas periféricas do capital.
Foi por meio de benesses como isenções fiscais, juros faraônicos e uma dívida pública impagável, que o capital celebra a chance de voltar a reinar mais soberano na hipótese de vitória de candidatos conservadores e ultraconservadores. É claro que a trajetória que garantiu a ascensão de uma figura caricata e esculpida nas hastes do militarismo, virtual candidato à vaga ao segundo turno eleitoral, tem como agentes desencadeadores, a crise econômica, a crise partidária, a crise das instituições clássicas e a forte influência da mídia monopolista ideológica.
Afina, como se deu a intercessão da mídia manipuladora na desconstrução dos aparatos institucionais clássicos? O processo foi simples. Uma população constituída majoritariamente de analfabetos estruturais, um jeito fácil é repetir todos os dias inverdades, fazendo-as acreditarem como reais. Criminalizar certos políticos ou partidos como se todos fossem a mesma coisa, são formas sorrateiras e mal intencionadas de fortalecer candidatos oportunistas de viés extremista que surfam na onda do caos, do quanto pior melhor. Não há como superar tais crises que assolam as instituições elegendo governos que incitam à violência, o ódio.
Não há outra experiência vivenciada no mundo melhor que a democracia. Mesmos as sociedades que experimentaram práticas comunistas ou anarquistas de governo, como certas comunidades indígenas, o exercício da democracia sempre prevaleceu e prevalece. O que devemos lutar não é contra a democracia, os partidos, os políticos, os juízes, os procuradores, acreditando que suprimindo-os teremos uma sociedade melhor. Temos que lutar sim para preservá-los, torná-los mais fortes e que cumpram o que está descrito na constituição federal.  Os regimes militares que tiveram presença no Brasil, na Argentina, Chile, Uruguai e Paraguai, muitos dos quais ainda sofrem seus efeitos perversos, devem estar sempre na memória de todos/as como página trista da história que jamais deve se repetir.
Devemos lutar bravamente pela prevalência das instituições democráticas. Melhor seria se pudéssemos alcançar níveis de maturidade política a ponto de eleger políticos verdadeiramente comprometidos com a justiça e a transformação social.  Talvez tal utopia possa levar gerações para se concretizar, exigindo ainda maturidade cultural. Se não temos condições históricas reais para empreendermos uma revolução de cunho socialista ou comunista, temos sim a chance histórica de começar esse desafio, atuando nas franjas do sistema capitalista. São nas comunidades, nos movimento sociais, associações de bairros, igrejas, sindicatos, que se dará a transformação.
Fiquemos atentos aos sinais sociais e os alertas dos  historiadores. Do mesmo modo que um paciente quando atendido pelo médico cumpri a risca o tratamento recomendado, os historiadores devem ter a mesma importância, serem escutados como foram os escribas, os gurus, os pajés e outros tantos anciãos que conseguiram evitar tragédias sociais anunciadas. Talvez ainda resta tempo, pois do contrário precisaremos de muito tempo para recomeçar tudo de novo. Em 1964, os militares precisaram de uma justificativa para consolidar o golpe, os "comunistas", "liderados" pelo então presidente deposto João Goulart. Agora os filhotes da ditadura culpam as esquerdas pelo caos econômico e político, como se toda esquerda fosse a mesma coisa. É tão sério e perigoso o que estamos presenciando, que muita gente, impulsionada pela mídia ou recalque inconsciente, vem destilado ódio nas redes sociais.
O que é ainda mais assombroso é quando um general, que é candidato a vice-presidente na chapa de e um capitão, ousou postar nas redes sociais na ocasião do atentado à faca. Disse ele: “se querem usar a violência, os profissionais da violência somos nós”. Portanto, aqueles que já declaram voto ao candidato cujo vice incita a violência, tomemos bastante cuidado, pois o meu, o seu, o nosso voto, podem comprometer o futuro de muitas gerações.
Prof. Jairo Cezar                                             

quinta-feira, 13 de setembro de 2018


INCÊNDIO NO MUSEU NACIONAL NO RIO DE JANEIRO PODE SER COMPARADO AO DESASTRE AMBIENTAL EM MARIANA/MG


No texto publicado há poucos dias afirmei que em 15 ou no máximo 20 dias a população brasileira não lembraria mais do incêndio que consumiu o prédio do museu nacional no Rio de Janeiro. Não duraram três dias o tempo necessário para que toda a imprensa brasileira deslocasse o foto das atenções ao atentado que vitimou o candidato à presidência da republica, Jair Bolsonaro. É claro que incêndios como o do museu nacional, facadas como a que foi desferida a um presidenciável, despertam muito a curiosidade do público, elevando às alturas os índices de audiência de qualquer veículo de comunicação.
Depois do episódio da facada, é possível contar nos dedos os jornais e telejornais das principais emissoras do país que lançaram informações ou reportagens mais robustas sobre o museu. O que se viu mesmo foi à tentativa de setores conservadores de querer politizarem o fato, acusar ou criminalizar à UFRJ, como se fosse a universidade a principal culpada de toda uma política de desmando dos últimos governos contra a cultura e a educação pública brasileira.  Para corroborar com tais reflexões, vale a pena aqui pontuar algumas observações ditas pelos entrevistados, museólogos, historiadores, arqueólogos, de conceituadas universidades brasileira, no Programa Faixa Livre, da Radio Band, Rio de Janeiro, que foi exibido no dia 06 de setembro. 
Disseram que no Brasil a expansão dos museus se deu no período posterior ao regime ditatorial, como estratégia para o fortalecimento da democracia. Mesmo assim, o número de museus em funcionamento no país é muito discreto, comparado com os Estados Unidos. Enquanto aqui nos consideramos orgulhosos com 3800 museus, nos Estados Unidos, os números são absurdamente superiores aos nossos, chegando a 18 mil espalhados por todo o território. E olha que a população dos EUA é pouco superior a brasileira. A resposta desse flagrante absurdo de poucos museus pode é flagrada na campanha dos presidenciáveis.  Somente 2 ou 3 têm descrito nos seus planos de governo proposições voltadas aos museus brasileiros. Isso não ocorre somente no Brasil. Na Argentina, o governo Macri desativou o ministério da cultura.
De acordo com os entrevistados, o museu nacional sua existência é bem anterior às universidades. Tudo o que se sabe sobre pesquisa científica no Brasil, começou no Museu nacional. Portanto, o mesmo possuía uma simbologia muito além do que havia de material no seu interior, peças arqueológicas, múmias, pedras, plantas, documentos etc. O prédio foi o palácio imperial, ou seja, tinha sido a residência dos reis, imperadores, príncipes que governaram o Brasil por 40 anos. Isso é muito forte, simbólico, para um país que almeja ocupar um grau de excelência entre as nações desenvolvidas.
É preciso que a população compreenda a real função dos museus, para que realmente servem? Não se faz cidadania sem uma reflexão com o passado. Os museus, portanto, são ferramentas essenciais para fortalecer sentimentos de pertencimento, de membro integrante de uma cultura, nação. O museu nacional foi o local onde milhares de famílias ser reuniam nos finais de semana. Além de uma imensa área verde transformada em parque, também há um zoológico, onde atraia milhares de jovens, crianças.
O que é absurdo, conforme relataram os entrevistados/as, foi a fortuna gasta pelo Estado para construir o Museu do Amanhã e outros mega projetos que integram o pacote dos grandes eventos esportivos no Brasil: Jogos Pan-americanos, olimpíada e copa do mundo. Enquanto isso, o museu nacional, com 200 anos de história, vinha penando por recursos para se manter em pé.  Revelaram os entrevistados/as que estão sendo discutidas nos bastidores dos poderes constituídos, propostas de transferir a gestão dos museus às OSS, modelo já adotado por outros setores do serviço público a exemplo da saúde. Outro dado estarrecedor foi o custo orçado para a reforma do maracanã, valor esse que seria suficiente para manter o museu nacional funcionando em boas condições por 2000 anos.
Uma proposta interessante que vem sendo aplicada na Espanha, que poderia ser aqui ser adotada é reverter 1% de toda a licitação pública para o fundo de patrimônio. Nos EUA, o governo federal entra com muito dinheiro para o financiamento dos museus. No Brasil, os governos devem fazer valer o que está escrito na constituição federal sobre cultura, que não estão fazendo. A própria UNESCO, em resolução aprovada, recomenda a destinação de 1% do PIB de todos os países à cultura.
Um exemplo para provar que no Brasil cultura não prioridade dos governos, na administração Fernando Collor de Melo, o percentual destinado à cultura foi de 0,05%. A única exceção desse longo caminho de retrocesso na cultura foi na gestão do ministro Gilberto Gil, cujo percentual para a cultura esteve próximo de 1% do PIB. De lá para cá os recursos vem caindo paulatinamente. Foi através do museu nacional que se criou a cultura da museulogia no país. Para o pensador português, Boaventura Santos: “um povo que chora o seu museu é um grande público”.
Embora sabendo que os argumentos críticos e propostas inovadoras, ditas pelos entrevistados no programa faixa livre, tenham dificuldades de atingir um grande público, suas falas podem ser replicadas e compartilhadas nas redes sociais a partir desse texto. É possível também que texto possa contribuir para reflexão acerca da realidade dos acervos locais, museus, sítios arqueológicos, como ambos estão sendo geridos pelos administradores públicos, se há inserção de tais temáticas nos currículos do ensino básico, etc.
O hábito de visitar museus, entre outros espaços culturais, não se caracteriza como regra na nossa cultura. Se há exceções a regra, é porque professor/as ou entusiasta/s da cultura, não medem esforços para superar barreiras impostas pela burocracia e a escassez de recursos financeiros. Isso talvez seja a explicação do enorme desprezo da população com o passado: casarios antigos, monumentos, arquivos, bibliotecas, sítios arqueológicos e até mesmo com os idosos, que carregam consigo vasto acervo da nossa história, que quando morrem, morre um pouquinho da nossa memória.
São possível que o museu nacional tenha o mesmo desdobramento ocorrido com a comunidade de Pedro e o Rio Doce, ambos totalmente devastados com rejeitos da mineradora Samarco. Depois de três anos da ruptura da barragem, os responsáveis pelo crime não foram punidos, muito menos o pagamento das multas milionárias como medida compensatória ao gigantesco passivo ambiental deixado. O rio doce precisará de séculos para recompor parte de sua fauna e flora. O incêndio do museu nacional e o desastre ambiental em Mariana foram dois acontecimentos anunciados que poderiam ter sido evitados se tivéssemos governos realmente comprometidos com cultura, educação, meio ambiente, segurança, saúde.
Depois do desastre em Mariana, outros episódios similares se repetiram como no Maranhão, quando uma empresa Norueguesa que extraía minério de ferro se descuidou, deixando escorrer rejeitos tóxicos da barragem de contenção para rios e igarapés. Vários jornais, nos dias que seguiram ao incêndio do Museu Nacional, publicaram inúmeras reportagens retratando a situação dos museus espalhados pelo Brasil. É quase certo que nenhum governo estadual ou municipal tomará medidas cabíveis para a proteção desses espaços.  Caso se confirme essa previsão, é só uma questão de dias ou meses para que um novo incêndio ou desabamento aconteça e apague um pouquinho mais da nossa história.                   
Prof. Jairo Cezar