terça-feira, 18 de setembro de 2018


ROTEIRO GEOECOLÓGICO COMO ESTRATÉGIA PARA COMBATER A ESTAGNAÇÃO ECONÔMICA E SOCIAL DE ARARANGUÁ

foto - Roteiro Geoecológico Costa de Araranguá

Mais uma etapa do projeto Roteiro Geoecológicos Costa de Araranguá, como uma das demandas do Programa de Gestão Integrada (PGI) do Projeto Orla e patrocinada pela fundação Mata Atlântica foi executa e dessa vez no Balneário de Ilhas – Araranguá/SC. Já que a proposta tem por finalidade empoderar a população local com informações e demandas acerca do território onde habitam, havia expectativa da presença no encontro de integrantes do poder público e órgão ambiental, que decidiram boicotar.
Dezenas de pessoas, muitos dos quais pescadores e lideranças comunitárias acompanharam atentas as explanações da palestrante. Em varias momentos os presentes intervieram indagando ou tecendo críticas severas ao modo como os poderes constituídos vêm agindo na comunidade. Denunciaram que há anos o balneário sofre com o problema da pesca predatória, muitas vezes sendo responsável os próprios órgãos ambientais como o IBAMA por restringir práticas costumeiras de pesca como a “fila do boto”.

foto - acervo  Jairo
Relataram que a colônia promoveu dezenas de reuniões com entidades competentes para discutir soluções sustentáveis à pesca na comunidade. Uma das propostas elencadas foi a definição de uma área de 2.500 metros de preservação para a pesca organizada. Os próprios pescadores gerenciaram esse sistema. No entanto, quando a proposta chegou ao IBAMA à proposta foi vetada, alegando inconformidade legal. “Tiraram o poder da colônia de fiscalizadora da pesca”, confessou o ex-presidente da colônia de pescadores da comunidade.

foto - acervo Jairo
Acrescentou que o veto do IBAMA abriu caminhos para a pesca desorganizada predatória. Relataram algumas experiências bem sucedidas como a pesca do bagre em forma de condomínio. Lembrou da captura de grande quantidade de pescado no passado, como em 2006 e 2007, onde foram pescadas 100 toneladas de tainha. Mesmo com a fixação de placas delimitando as áreas para o exercício da atividade, ninguém respeita essa decisão. O resultado, portanto, é a bagunça sem limites e sem qualquer expectativa de solução em curto e médio espaço de tempo.
Um cidadão lembrou que no começo do século XX, a pressão do escoamento da água na barra do rio Araranguá era mais expressiva que de Laguna. Maior pressão resultava em menor assoreamento da boca da barra. Esse fenômeno contribuiu para a entrada e saída de embarcações de médio porte, levando e trazendo produtos e pessoas de Araranguá, Laguna e Florianópolis. Relatou que na época havia cerca de 250 famílias morando na comunidade. Quanto ao tema fixação da Barra, enfatizou a palestrante que o projeto não foi executado por diversos fatores. A não comprovação técnica que abra solucionaria o problema das cheias cíclicas na montante foi uma delas.

foto - acervo Jairo
Outro fator foi o aumento da salinização da água a montante da bacia comprometendo a cultura do arroz, entre outras. Na palestra anterior a de ILHAS, na UFSC, uma participante destacou um aspecto relevante. Disse que a não fixação da barra foi importante para Ilhas, Morro Agudo, Barra Velha. No fundo do rio estão depositados há décadas sedimentos tóxicos oriundos do carvão mineral. Com a alteração da dinâmica do fluxo de vazão, esses sedimentos seriam removidos e transportados até a foz do rio Araranguá, com impactos a toda cadeia alimentar.
Realçou a palestrante sobre o imenso potencial turístico e científico da região, que muitos estudos e pesquisas precisam ainda ser realizados. Um caso curioso é o roedor conhecido pelo nome de TUCO-TUCO, que habita dunas e praias da região. Informou que não há fontes bibliográficas que comprovam a sua existência aqui, sendo uma espécie endêmica à margem direita do Rio Mampituba. Também foram abertas discussões sobre unidades de conservação, com foco na APA, que envolve toda a área inclusive Ilhas.

foto - acervo Jairo

Explicou a palestrante que embora a APA e a RESEX tenham sido oficializadas por decreto é necessário definir plano de manejo para ambas. Nesse instante, outras denúncias foram levantadas pelos presentes como as freqüentes invasões habitacionais em áreas de preservação. Relatou que a FAMA vem corroborando com toda essa irregularidade, liberando licença de construções em locais que jamais deveriam permitidos. Desmatamento, drenagem de áreas úmidas, instalação de fossas junto aos canais, são alguns dos crimes ambientais avalizados pelo órgão ambiental municipal, relataram os presentes.

foto - acervo Jairo

foto - acervo Jairo

Destacou também a palestrante que os decretos aprovados relativos a APA e a RESEX, definem obrigatoriedade de compensações ambientais. A RESEX, que se estende da balsa à foz, o decreto condiciona o repasse de parcela dos recursos arrecadados na exploração comercial da balsa. As empresas que exploram a mineração de carvão também deveriam pagar compensação a RESEX. Esses recursos arrecadados na RESEX, APA e MONA, serão investidas em ações que estimulem o turismo e a pesquisa na região.

foto - acervo Jairo
O prazo estipulado para que as três unidades tenham os seus chefes escolhidos é 27 de dezembro de 2018. Não se sabe ainda se serão um ou três chefes e como serão escolhidos. Uma sugestão levantada foi de que a comunidade crie uma cooperativa de pescadores, indicando o seu líder. O representante escolhido dos pescadores poderá ser indicado como o chefe da RESEX junto ao comitê do projeto orla.
Esclareceu a palestrante que as rodadas de apresentações têm o objetivo de sensibilizar a população das potencialidades turísticas, que hoje podem ser conferidas visitando as placas distribuídas em cinco pontos distintos da faixa costeira. As placas informativas servem de roteiro para que turistas e visitantes conheçam a região e suas potencialidades. O que se pretende com as palestras é melhorar as placas, ouvindo da população propostas de frases e o envio de imagens relevantes que possam ser adicionadas às placas. Um cidadão criticou a localização da placa fixada em Ilhas, que deveria ser posta em local de maior fluxo populacional.      
O projeto roteiro geoecológico caminhos de Araranguá visa divulgar as potencialidades turísticas. Ilhas entra no roteiro devido ao seu forte potencial pesqueiro, artesanato e culinária. Os aspectos antropológicos e arqueológicos devem também ser ressaltados. Nas comunidades de Ilhas e Morro dos Conventos foram identificados há pouco tempo verdadeiros tesouros a céu aberto, sítios arqueológicos sambaquianos que podem ter servido de lar para outros grupos humanos como os guaranis. 
No entanto a faixa costeira onde concentram os sítios está sendo acometida dos mesmos problemas do restante do país, que é a perda gradativa da sua identidade histórica. Em Ilhas, poucos moradores sabem, possui um precioso patrimônio arqueológico semelhante aos catalogados na região de Laguna e Jaguaruna. Pesquisas realizadas dataram os sítios na costa de Araranguá de 4 a 5 mil anos de existência.  

foto - acervo Jairo
O que é revoltante para a comunidade científica e os apaixonados pela cultura material é se deparar com sítios abandonados, depredados. O sítio citado está há poucos metros do centro do Balneário. Pela dimensão do casqueiro acredita-se ter havido dezenas ou mesmo centenas de indivíduos, facilitado pela abundante eco-fauna terrestre/marinha.     Mesmo catalogados e sob proteção oficial do IPHAN, todos os sítios da faixa costeira de Araranguá estão desprotegidos. Veículos automotores, motocicletas, cavalgadas, plantações e a pecuária são alguns exemplos de antropisações sofridas pelos sítios.
Diante desses riscos a Oscip Preserv’Ação protocolou inúmeras denúncias no MPF e IPHAN, Santa Catarina, para que providências fossem tomadas para preservá-los. Tais insistências resultaram em uma reunião no gabinete do prefeito municipal de Araranguá em junho de 2016, tendo a presença também dos seguintes profissionais do IPHAN: procurador geral, chefe de divisão técnica e arqueólogo. O superintendente da FAMA, o coordenador da OSCIP PRESERV’AÇÃO, o secretário de comunicação da prefeitura e o chefe do departamento de pesquisa arqueológica do IPAT/UNESC, também estavam presentes.  

foto - acervo Jairo
  Como uma das propostas acordadas no encontro foi a realização de um seminário regional para dar arrancada a questão do patrimônio arqueológico regional.  Foi sugerido a primeira semana de agosto, o dia 10, como dada do próximo encontro, com o convite estendido aos demais órgãos municipais, como educação, cultura e turismo. Foi a primeira e última reunião. Nunca mais houve qualquer encontro a partir daquele momento.[1]  
O encontro foi tão importante que houve até publicação de reportagens do evento em jornais e revistas da região. O exemplo foi a Revista Semanal W3, que em 22 de junho de 2016, lançou extenso texto explanando o importante fato do ano com a seguinte manchete: “Projeto ambiental será elaborado para preservação de sítios arqueológicos – Ações educativas envolvendo escolas e a comunidade também devem ser realizadas”.

foto - acervo Jairo

Nada do que foi escrito na reportagem se concretizou, apenas promessas jamais concretizadas como a que foi pronunciada pelo superintendente da FAMA da época:Nesta reunião foram tratadas estratégias para solucionar os problemas ligados a preservação dos sítios arqueológicos existentes em território araranguaense. Desta forma todos os presentes se manifestaram cientes da situação e das prioridades. Por isso decidiram que seria elaborado um projeto para realizar o salvamento do sítio. Os encaminhamentos inicialmente serão voltados quanto da sequência a ser seguida, para promover a proteção, e a possível colocação de placas, entre outras ações, atendendo de forma gradativa os demais sítios”. 

foto - acervo Jairo
  O próprio prefeito municipal também se pronunciou sobre os sítios, falando o seguinte: “Entendemos que a preservação dos sítios arqueológicos existentes é essencial para que se possa estudar a história daqueles que aqui habitaram há milhares de anos. Com isso estaremos valorizando o passado e oferecer ao presente e futuro o conhecimento e a possibilidade de manter viva esta história. Vamos aguardar a apresentação do projeto e analisar a viabilidade de sua implementação. Mesmo assim, medidas paliativas de preservação já serão tomadas a fim de preservar os sítios e envolvendo a comunidade neste processo”.[2]

foto - acervo Jairo
A Constituição Federal, art. 23, II, IV; Lei 9.605/07 sobre crimes ambientais, Art. 63; Lei Complementar n.150/12 - plano diretor municipal, Art. 47, parágrafo único; Lei 2.608/07, que dispõe sobre a Fundação Ambiental do Município de Araranguá (FAMA), Art. 2, ambas possui atribuições específicas que rezam sobre a proteção do patrimônio histórico e artístico brasileiro, dentre eles os sítios arqueológicos. A sensação que fica é que todas as leis existentes não são suficientes para assegurar nosso rico patrimônio cultural que a cada dia um pouquinho da nossa história é apagado da memória.
Prof. Jairo Cezar  



Nenhum comentário:

Postar um comentário