quinta-feira, 6 de agosto de 2015

70 anos depois da destruição de Hiroshima e Nagasaki, o ser humano insiste em brincar de “Deus”.

Depois de 70 anos do lançamento das duas bombas atômicas às cidades japonesas de Hiroshima e Nagasaki que forçou o país a rendição incondicional, a vida humana e das demais espécies vivas na terra ficaram sob risco eminente se parcela das usinas atômicas em funcionamento sofrerem qualquer tipo de avaria na proporção dos acidentes ocorridos em Chernobyl e Fukushima. A experiência atômica no Japão, em 1945, mudou radicalmente o conceito de guerra convencional até então conhecido. Os artefatos bélicos tradicionais transportados por aviões, os blindados e outros tantos armamentos pesados e letais utilizados nos dois últimos conflitos mundiais, tornaram-se meros brinquedos no instante que se aprendeu a fórmula do enriquecimento de urânio, que pode ser transformando em plutônio, um dos elementos radioativos artificiais mais perigosos necessários para a fabricação da bomba atômica.
Quando se imaginava que o episódio japonês poderia servir de exemplo às demais nações alertando-as do perigo acerca da manipulação inadequada de substâncias radioativas, o começo da década de 1950, até 1989, se caracterizou como as quatro décadas onde duas potências nucleares dominariam o cenário global com investimentos bilionários em tecnologias de uso militar. Envoltos com o manto “átomos para a paz”, ou seja, uso da energia nuclear exclusivamente para fins “pacíficos”, periodicamente jornais, rádios e demais veículos de comunicação em massa, noticiavam testes nucleares sendo realizados nos quatros cantos do planeta. Se o acordo sobre energia atômica era de uso exclusivamente pacífico, por que dos testes atômicos, com ogivas cada vez mais potentes, mais radioativas, mais destrutivas que aquelas lançadas no Japão.
Se o objetivo dos chefes das duas grandes potências nucleares era tão somente demonstrar seu poderio de fogo, ao ponto da disputa alcançar a orbita terrestre com a instalação de satélites de espionagem, para os bilhões de mortais, habitantes do planeta terra, era um prenúncio de que o “fim do planeta estava próximo”, bastando um leve movimento dos dedos das mãos e, boom, adeus vida na terra. Entretanto, o começo da década de 1990 o pesadelo nuclear que provocava insônia a bilhões de pessoas, aparentemente recuaria com o fim da União Soviética.
Além dos Estados Unidos e Rússia, outras tantas nações tiveram acesso às tecnologias de enriquecimento de urânico, podendo agora facilmente produzir seus arsenais nucleares, bem como usinas atômicas para a produção de energia elétrica. O fim da corrida armamentista ou guerra fria, não significaria que o planeta estaria isento dos efeitos contaminantes e irreversíveis da radiação nuclear. Muito pelo contrário, se for somar o número de pessoas vitimadas pelos efeitos radiativos dos acidentes ocorridos nas últimas décadas, o percentual hoje de vítimas letais superaria ao número de óbitos resultantes das bombas atômicas nas duas cidades japonesas.
O que chama atenção são os efeitos terríveis e permanentes da irradiação nuclear, que mesmo depois de milhares de anos, os sinais da sua presença no solo, na água, ainda poderão ser detectados. Os três grandes acidentes nucleares da história, em Three Mile Sland, Estados Unidos; Chernobyl e Fukushima abriram novas discussões sobre a segurança das usinas nos países que adotam essa matriz energética. Embora os governos insistam em justificar o uso dessa matriz por considerá-la limpa, que não contribui com o aquecimento global, movimentos ambientalistas, entidades científicas de todo planeta, vêm alertando quanto aos riscos de acidentes e a necessidade de substituí-las por fontes renováveis, como a eólica, solar, etc.
O acidente de Fukushima, no Japão, em 2011, é talvez o acontecimento mais contundente do século XXI, que mais chamou atenção dos governos e da população mundial. Mas, por que Chernobyl não causou tanto frisson como o acidente na cidade japonesa? O fato é que o primeiro acidente se deu num país considerado pobre e sob o domínio da União Soviética. O Japão, moderno, que superou o ataque atômico de 1945, que se orgulha pela sua organização, investimento em educação, tecnologia de ponta, cujas construções suportam terremotos até de alta magnitude, ninguém imaginava que um terremoto de 8,9 graus na escala Richter, provido de um Tsunami, produzissem explosão em usina nuclear em Fukushima pondo por terra qualquer certeza sobre o uso seguro da energia nuclear.
Mesmo quatro anos depois do acidente, milhares de pessoas permanecem recolhidas em abrigos sem perspectiva de retorno às suas residências. O próprio governo japonês, pasmem, vem promovendo campanha publicitária com a distribuição de folhetos no intuito de convencer as pessoas que a região afetada não traz mais riscos à saúde. Essa atitude pode se comparar a um atestado do óbito antecipado àqueles que ousarem retornar às suas casas, cujos efeitos da radiação já são observados pelo aumento vertiginoso de tumores registrados.
Os reflexos do acidente de Fukushima também causaram temor e apreensão junto aos grupos ambientalistas e a comunidade científica brasileira, pelo fato do Brasil ter em seu território duas usinas atómicas, sendo que a terceira deve ficar concluída em 2018. O fato é que a decisão esquizofrênica do uso dessa matriz energética partiu dos governos militares com a compra da Alemanha de equipamentos já sucateados. Décadas depois da instalação das duas usinas na cidade de Angra dos Reis, Rio de Janeiro, a população brasileira mantém-se desinformada a tudo que se refere às políticas sobre energia nuclear, os possíveis riscos de acidentes e os impactos ao ambiente local.
Cabe ressaltar que as usinas angra I e angra II estão localizadas não distantes de três grandes metrópoles densamente povoadas, SP, RJ e MG, que na hipótese de um acidente nas proporções de Fukushima, os efeitos da radiação serão incalculáveis. A própria população de Angra dos Reis não recebe treinamentos de como deve se comportar em situação de emergência. Embora a região esteja aparentemente livre de sofrer abalos sísmicos pela sua constituição geológica, o que causa apreensão são os riscos de desastres climáticos extremos como as enxurradas ocorridas em 2011 e 2013, que poderiam ter afetado as usinas.
A obra em execução de Angra III, prevista para entrar em funcionamento em 2018, está envolto de suspeitas de irregularidades no processo de licitação. Nas denúncias de corrupção envolvendo a Petrobras, o caso chegou a Eletronuclear com provas concretas de envolvimento de representante do alto comando da estatal, beneficiando empresas construtoras em troca de propina. O custo da execução da obra está orçado em quase quatro bilhões de reais. Se não bastassem os problemas estruturantes como das duas usinas, que conforme as normas estabelecidas pelas agências internacionais de energia nuclear apresentam inconformidade, tem agora a corrupção envolvendo a Eletronuclear.
Como ter certeza que serão respeitadas todas as recomendações necessárias na construção da obra para tornar a usina segura? A falta de transparência e os problemas resultantes de acidentes nas duas usinas transcendem os limites do território de Angra dos Reis, podendo afetar diretamente milhões de pessoas situadas num raio de quinhentos quilômetros. A principal matéria prima para o funcionamento dos reatores das usinas, o Urânio, também é motivo de preocupação da população próxima as áreas de extração. A falta de transparência das empresas nos procedimentos de prospecção, extração e transporte desse produto levou o próprio ministério público federal a entrar com ação civil pública contra as empresas, multando-a por ter cometido crime ambiental.
Mesmo depois de governos como da Alemanha noticiar que desativará suas usinas nucleares como forma de evitar episódios com no Japão em 2011, o governo brasileiro representado pelo Ministro das Minas e Energia Eduardo Braga foi categórico em afirmar que o governo brasileiro tem interesse em ampliar a matriz energética nuclear construindo mais 12 usinas até 2050. Essa informação vai na contramão dos fatos quando país com menor potencial de fonte renovável em comparação ao Brasil vem desativando seus parques. Por que o Brasil com um enorme potencial de fontes limpas insiste na energia nuclear? Isso sem contar, que as usinas angra I e II, seus equipamentos e planos de evacuação da população não atendem as mínimas recomendações internacionais depois do acidente em Fukushima.
Outro acontecimento que causou estarrecimento foi saber que há poucos dias a Polícia Federal, dentro da operação Lava Jato, detectou corrupção na própria Eletronuclear envolvendo chefões que receberam propina para beneficiar empresas no processo de licitação para construção de Angra III. É importante informar que o custo total da usina está orçado em mais de quinze bilhões de reais. Se os que deveriam agir de forma honesta, ética, especialmente quando se trata de obras tão complexas e de elevado risco a milhões de cidadãos, não os fazem, o que esperar depois da obra concluída, da manipulação de elementos radioativos complexos, do cuidado e manutenção dos equipamentos, da divulgação dos relatórios, etc.? Um país como o Brasil contaminado pelo “vírus” da corrupção, pela manipulação das informações, pela pouca transparência dos veículos de comunicação, as chances são enormes de o Brasil vir a sofrer um acidente nuclear, talvez não de proporções a Chernobyl, Fukushima, menor quem sabe, porém, os efeitos poderão ser devastadores.
Prof. Jairo Cezar