terça-feira, 21 de novembro de 2017

BRASIL: A NAÇÃO QUE OPRIMIDOS RECORREM AOS OPRESSORES PARA  SEREM GUIADOS

Quem acompanha os desdobramentos da política nacional e seus efeitos no campo das organizações e relações sociais, observa que o Brasil vem se cristalizando dias após dia com práticas comportamentais repressores semelhantes aos regimes opressores europeus das décadas de 1930 e 1940. É sabido também que o afloramento maior ou menor desses ciclos de instabilidade comportamentais e suas inserções nas camadas sociais, têm relação com a falta de transparência e corrupção generalizada nas instâncias dos poderes. A violenta guinada à direita nos últimos anos coloca o Brasil em alerta vermelho, sob risco eminente de vir a se repetir o nefasto e trágico regime opressor do militarismo entre os anos 1964 a 1980.
A total descrença da população acerca aos partidos políticos; o crescimento exacerbado da violência; o desrespeito à constituição; à desmoralização da política e políticos, tudo isso faz assombrar a incerteza quanto ao futuro, inclinando ou polarizando as disputas das eleições de 2018 para nomes e partidos que verbalizam discursos populistas ou ultra-reacionários. E a história tem registros documentados de episódios recentes que resultaram em décadas de opressão e violação aos direitos humanos. Isso não significa que o Brasil esteja hoje imune a tais atrocidades protagonizadas pelo “Estado Democrático”. As próprias reformas estruturais, trabalhista, previdenciária, em curso, deixam vácuos perigosos para o aprofundamento das violações e injustiças sociais.
A chacina nas periferias das grandes cidades, o assassinato de índios e trabalhadores sem terra; o feminicídeo; o racismo; a homofobia são consideradas violações aos direitos humanos naturalizadas no Brasil. Ao mesmo tempo em que se descumprem abertamente os princípios contidos na declaração dos direitos humanos, os políticos, na sua maioria, repetem como papagaio o mesmo discurso quando questionado: “é necessário consolidar os preceitos da república e da democracia”.  Que república, que democracia, quando 80% da população brasileira ou acima disso são consideradas analfabetas funcionais, que pouco consegue escrever e interpretar um pequeno parágrafo.
São essas mesmas pessoas e outras tantas que vem declarando voto à Lula e a Bolsonáro, nas eleições do próximo ano. O que esperar do futuro quando ventos ameaçadores seguem em direção contrária, trazendo riscos de vir germinar governos populistas e totalitários. Atacar à criminalidade, à corrupção, com legislações mais severas e edificação de novos presídios não está evitando que o Brasil mantenha-se no topo dos mais violentos. Quando uma sociedade se sente acuada, desprotegida, desperta no imaginário coletivo o desesperado apelo por proteção.
São nesses cenários turbulentos que brotam das profundezas do nosso cérebro a necessidade de uma “messias”, um líder, cujo discurso e promessa, consegue atrair os olhares e as esperanças de parcela significativa da sociedade marginalizada. Propostas como liberação do porte de armas, redução da idade penal, criminalização do aborto, cura guei, escola sem partido, etc, etc, são típicas aberrações que atraem mais e mais atenções do desatento e desassistido eleitorado brasileiro.
Isso mostra que o Brasil não amadureceu nas suas instituições, que tais cenários ameaçadores são reflexos da decadência do sistema educacional público brasileiro. O educador Paulo Freire, atualmente quase esquecido nos espaços acadêmicos e instituições públicas de ensino básico, todas as obras que escreveu trazem extraordinários ensinamentos e inspirações sobre humanidade e o combate a alienação social.  No entanto, os governos que se sucederam ao período pós-ditadura sempre agiram na tentativa de negligenciar suas idéias, teorias, concepções, distorcendo ou inviabilizando o afloramento de qualquer projeto alternativo de educação popular.
O quadro político atual é tão previsível e ameaçador, que forças ultraconservadoras tentam a todo custo criminalizar Paulo Freire e todo o seu legado deixado.  Usam as mídias sociais para replicar conceitos errôneos e até mesmo criminosos acerca da sua rica trajetória política e educacional. A tentativa é enquadrá-lo como personalidade não grata pelos brasileiros, por ter tido no passado ligações com idéias ou teorias revolucionárias que se confrontavam com o conservadorismo retrógrado das elites dominantes. Para uma população semi-analfabeta, que sofre todo o tipo de opressão, expressões descontextualizadas e insistentemente repetidas vão se cristalizando no imaginário social coletivo, ao ponto de se tornar verdades absolutas. Há de concordar que países que menos investem em educação e cultura são mais suscetíveis a golpes de estado e a regimes opressores.    
Mesmo aqueles regidos por governos ditos democráticos, prevalecem o domínio político das castas, dos caudilhos e das oligarquias. No entanto, para assegurar a estabilidade ou status quo institucional desses distintos sistemas, se faz necessário a cooptação do quadro intelectual das classes subalternas, que irão compor os principais postos de decisão do Estado. E por que razão? A resposta, portanto, não é tão simplista como se imagina. As ciências do comportamento, como a psicologia, neurociência, podem contribuir para responder tais questões complexas relativas à psique humana. Por estar inserido em uma cultura historicamente moldada entre dois seguimentos repressores convergentes, Estado e igreja católica, há de se convir que substâncias de um e de outro se amalgamariam no cérebro humano e permaneceriam latentes e atuantes por muitas gerações.  
Por ser uma cultura patriarcal, a mulher se condicionou a condição de subalterna em relação ao sexo oposto, tanto profissionalmente quanto nos espaços de decisão política. Muitas vezes essa condição de desigualdade e de submissão se manifesta de forma inconsciente, quase natural. E as tais hierarquizações não se dão apenas no campo sexual, homem e mulher, são observadas também nas relações professor/aluno, pai/filho, patrão/empregado.   
A escolha de lideranças ou governos mais liberais ou repressores são reflexos do modo como as sociedades foram construídas. Desconstruir conceitos e concepções sobre o modo de ver, pensar, sentir o mundo, dura décadas, até mesmo gerações. Que sirva de alerta às atuais gerações, as duas décadas recentes e outros momentos longos no passado, marcados por regimes políticos totalitários. Os arquivos e livros de história são nossos aliados para que tais episódios sejam relembrados e jamais repetidos.   Embora com todas as falhas e contradições observadas, a democracia ainda é, teoricamente, a que possibilita as vozes de serem ouvidas.
Como fazer valer ouvir as vozes dos oprimidos num regime dominado por meia dúzia mídias tão poderosas que manipulam informações, corações e mentes?  A única esperança é a revolução na educação pública. Fazer germinar os legados de Paulo Freire, Vigotsk, Gramisc, entre outros, que idealizaram uma escola autônoma, transformadora, trazendo para o seu interior os problemas do dia a dia e contextualizá-los com as estruturas dominantes.  Entender que o espaço escolar é repleto de conflitos e contradições é outro quesito importante para a desalienação social. O ato de ensinar, como ensinar e para que ensinar deve ser entendido como ato verdadeiramente político, de construção de possibilidades, de avanços e rupturas das forças opressivas que dominam e os mantém presos na caverna escura do desconhecido.   
Prof. Jairo Cezar                                       


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