sexta-feira, 4 de novembro de 2022

 

O ESPECTRO  GOLPISTA BATE A PORTA DA SOCIEDADE BRASILEIRA



Encerrada a apuração dos votos e declarada à vitória ao candidato do PT à presidência da república, Luiz Inácio Lula da Silva, na comunidade onde resido era possível ouvir buzinas de automóveis e discretas manifestações de populares, porém, tudo se dissipou muito rapidamente e um profundo silêncio tomou à noite.  Havia expectativa que os apoiadores do candidato à presidente derrotado fizessem alguma ação na tentativa de tumultuar o país alimentando a esperança de Bolsonaro permanecer no poder. O que não se sabia era a forma como se daria o tumulto.

Claro que qualquer tentativa de reverter o resultado das urnas seria interpretado como golpe, e isso a extrema direita tem experiência em realizar. Dito e feito, na madrugada daquela mesma noite, caminhoneiros autônomos deram início a bloqueios em diversos pontos de rodovias federais em vários estados da federação. O que espantou a todos, até mesmo apoiadores do presidente Bolsonaro foi que os manifestantes paralisaram as estradas reivindicando a tomada do poder pelo exército. Alegavam que a decisão de ocupação estaria fundamentava no artigo 142 da constituição federal, que autorizava o exército a assumir o poder na hipótese de ocorrência de irregularidade no processo eleitoral ou desordem popular.  

Nem uma coisa nem outra o que houve de fato foram atos irresponsáveis cometidos por caminhoneiros bolsonaristas fanáticos não imaginando que o “mito” fosse derrotado no pleito eleitoral do dia trinta de outubro. Durante entrevistas afirmavam que somente desobstruíam as estradas se o presidente, o capitão, viesse a publico e solicitassem que saíssem. Já tendo havido transtornos e desabastecimentos de combustíveis e alimentos em todo o território nacional, finalmente na tarde do dia primeiro de novembro, 40 horas depois do resultado, o presidente finalmente aparece fazendo um breve discurso de dois minutos.

Em nenhum momento citou o nome do candidato eleito Lula, porém, concordou que fará o processo de transição chancelando o ministro da Casa Civil, Ciro Nogueira para coordenar os trâmites. Quanto aos atos, disse que se sente honrado por continuar sendo o líder que defende as cores verde amarela. Deixou certa dubiedade no ar quanto ao seu posicionamento de liberar ou não as rodovias, razão pela qual fez com que os manifestantes permanecessem bloqueando inúmeros pontos no Brasil inteiro.

Essa postura golpista que se instalou no Brasil pós resultado das urnas mostrou o tamanho da fragilidade das estruturas republicanas instituídas na América Latina a partir do final do domínio espanhol e português. Foram centenas de golpes e tentativas de golpes protagonizadas por forças políticas e econômicas forjadas durante e depois do domínio colonial. Os caudilhos sulistas, os coronéis e outros tantos grupelhos de extrema direita sempre estiveram direta e indiretamente no epicentro das ações golpistas.

Argentina, Uruguai, Paraguai, Chile e o próprio Brasil são nações que experimentaram ditaduras sanguinárias duradouras. Se observarmos os históricos dessas nações em vivências ou experiências democráticas, sempre foram períodos muito curtos, turbulentos e constantemente sob o espectro de possível golpismo durante os pleitos eleitorais.

Na Argentina foram mais de 30 mil mortes e outros tantos desaparecidos pelo regime militar. No Brasil, embora os números de mortos e desaparecidos não fossem tão expressivos quanto ao país vizinho, as feridas de mais de vinte anos de militares no poder permanecem não cicatrizadas até o momento. O que impressiona é que jamais os favorecidos pelo regime militar se conformaram entregar o poder às forças democráticas, mesmo sendo de direita e centro esquerda como foram os quase quinze anos de governo do Partido dos Trabalhadores.

A vitoria de um remanescente do regime militar em 2018 abriu, metaforicamente, as portas do inferno para que os demônios/domínios fossem libertados e tomassem de assalto milhões de mentes vulneráveis. A posse de um remanescente da ditadura foi motivo para que milhões de brasileiros ativassem o sinal de alerta de que algo muito perigoso estava acontecendo. Não precisou muito tempo, quatro anos de governo foi suficiente para detonar tudo o que havia sido reconstruído com tenacidade em pouco mais de 30 anos de redemocratização política.

A única esperança real de o Brasil não ser novamente golpeado por falanges extremistas, neofascistas, bem como restabelecer os princípios republicanos, seria derrotá-los nas urnas.  Fim da apuração e o TSE declarando oficialmente Lula presidente, o inacreditável foi o comportamento insano demonstrado pelos bolsonaristas derrotados, de não aceitaram o resultado das urnas. Bloquear rodovias, ocupar espaços como frentes de quartéis se tornaram atos corriqueiros em todo o Brasil no dia 02 de novembro.

Muitos profissionais da rede estadual de ensino de Santa Catarina vendo as ações pró golpismo se espalharem em vários pontos do estado devem ter relembrado das vezes que realizaram algo parecido na frente do Palácio Barriga Verde, ALESC e SED, reivindicando melhores condições salariais e trabalho. Nessas ocasiões, rapidamente as forças de segurança do estado eram acionadas e os manifestantes expulsos com sprey de pimenta e cassetete nas costas.  Isso porque reivindicavam direitos assegurados constitucionalmente. Agora os ocupantes das rodovias e outros espaços, quartéis, por exemplo, estão lá reivindicando ação militar para tomada do poder !!!!

Fatos insanos como os que aconteceram certamente estarão escritos em inúmeras páginas dos livros de histórias, didáticos e paradidáticos, cujos professores terão que se esforçar ao máximo para explicar e convencer os estudantes que todo esse absurdo golpista aconteceu aqui mesmo, no Brasil em pleno século XXI. Explicar que dessa vez não foi a CIA ou o próprio exercito brasileiros que protagonizaram tais fatos bizarros. Foram trabalhadores, no primeiro momento, caminhoneiros, que vivem a penúria diária pela sobrevivência; no segundo momento homens, mulheres, jovens, crianças, todos cegados pelo vírus da ignorância.

É consenso que tais manifestações teriam que ter como propósito a redução dos preços absurdos cobrados pelos combustíveis, bem como fazer valer resoluções aprovadas no congresso acerca da atividade do caminhoneiro, que não está sendo cumprida. Mas não foi nada disso, o que pretendiam em pretendem é a decretação de um ato golpista, simples assim. Para quem lecionou ou leciona história sabe que fatos como os atos golpistas são construídos ou forjados a partir de “verdades” disseminadas por indivíduos ou grupos de indivíduos interessados na tomada do poder. No caso dos caminhoneiros, grande maioria pessoas humildes, não há dúvida que estão servido de escudo ou massa de manobra de empresários do segmento ou políticos interessados na instalação do caos social.

Quem imaginou que os protestos fossem exclusividade de caminhoneiros, se enganou. No dia 02 de novembro, feriado religioso, milhares de pessoas em todo o Brasil, vestidos de verde e amarelo, saíram às ruas, realizando passeatas e se concentrando em frente aos quartéis e outros espaços das três forças armadas. Nos deslocamentos as pessoas gritavam em coro frases do tipo, intervenção militar já. Esses atos pró-golpismo muito fazem lembrar mobilizações parecidas ocorridas às vésperas do golpe de 1964, quando milhares de mulheres saíram às ruas no Brasil gritando slogans como deus, pátria e família.  

Na época essas mobilizações se deram depois da posse de João Goulart, que assumiu a presidência do Brasil no lugar de Jânio Quadros, que havia renunciado o posto. A alegação das elites a favor das manifestações pró golpe foram os boatos divulgados de que o presidente da república, João Goulart, estaria articulando com a China ou União Soviética manobras para a instalação do comunismo no Brasil. É importante frisar que não há fontes bibliográficas disponíveis que confirmam ter havido essa articulação golpista ou desejo real de promover rupturas estruturais no Brasil. De fato o que o presidente da época propunha era promover reformas estruturas de base, claro que sem tocar em temas complexos como direito de propriedade.

Dessa vez a marcha pró-golpismo não participou somente mulheres, havia homens, jovens e crianças, quase todos trajados de verde amarelo empunhando a bandeira nacional. Incrível é a ignorância desse povo, pois deviam saber que no instante que um país é tomado oficialmente por um regime militar, adeus manifestação, adeus liberdade, adeus imprensa Livre adeus eleições, adeus congresso, adeus redes sociais, etc, etc.

O mais assustador nisso tudo é que tanto na Itália fascista de Mussolini e na Alemanha Nazista de Hitler, não foram as polícias e todo o aparato do Estado que se encarregaram de levar o terror em seus territórios. A própria população, “ordeira”, que se dizia cristã, que pregava os bons costumes, o casamento heterossexual, foram essas mesmas que se incumbiram de dedar, denunciar o seu vizinho judeu, cigano, negro, homossexual, a Gestapo alemã e a Organização para a Vigilância e a Repressão do Anti-Fascismo), polícia política italiana.

Lá o processo foi parecido com das manifestações ocorridas aqui entre os dias 31 a 2 de novembro. Um dos fatos macabros ocorridos durante as agitações de apoio ao protofascista presidente aconteceu em São Miguel do Oeste, quando manifestantes cantaram o hino nacional fazendo, acredita-se, fazendo apologia ao Nazismo. Em reportagem publicada no G1, o Gaeco são Miguel do Oeste admitiu a partir de investigações preliminares, de não havido ato criminoso durante a exibição do hino. Disse que, ouvindo testemunhas e organizadores do evento, que a postura do braço levantado à frente como se estivesse saudando o Fuher Adolfo Hitler, era para emanar vibrações positivas aos presentes.

Prof. Jairo Cesa  

Nenhum comentário:

Postar um comentário