terça-feira, 21 de junho de 2011

A DEVASTAÇÃO DE NOSSAS FLORESTAS E O NOVO CÓDIGO FLORESTAL BRASILEIRO

Este artigo foi desenvolvido a partir dos Códigos Florestais criados em 1934, 1965 e das propostas inseridas no projeto de lei do novo código que foi aprovado na Câmara e deverá agora passar pelo crivo do Senado. Caso o seja aprovado por essa casa, o mesmo poderá ser vetado ou aprovado pela Presidente Dilma Rousseff. 
A DEVASTAÇÃO  DE NOSSAS FLORESTAS E O  NOVO CÓDIGO FLORESTAL BRASILEIRO
PROF. JAIRO CEZAR
O processo de degradação das nossas florestas têm a sua gênese  com a chegada dos colonizadores  que datam do início do século XVI. Porém, é importante salientar que essas práticas exploratórias, trazidas pelos portugueses e espanhóis, estavam inseridas em suas culturas com características judaico-cristãs, que por séculos foi se moldando até a  consolidação definitiva de um tipo de imaginário, mecânico-racionalista, que levou na constituição da civilização ocidental.   
Extrair da terra tudo o que proporcionasse ganhos extraordinários e imediatos era a tônica dos colonizadores. No início foi o pau-brasil, que ocupava extensa área da mata atlântica; depois a cana-de-açúcar; a pecuária; o café e outras atividades. Não havendo leis específicas que disciplinassem o manejo dessas atividades, a floresta nativa  foi paulatinamente sendo destruída e o resultado é o que vemos hoje, especialmente com a floresta atlântica, restando um pouco mais que 6%.
Além desse complexo bioma litorâneo, outros também sofreram e vem sofrendo ações depredatórias em graus jamais vistos, como a floresta amazônica, o cerrado, a caatinga, o pantanal, os pampas, os campos gerais e outros ecossistemas menores.
Embora a ocupação do território brasileiro tenha ocorrido no começo do século XVI, foi somente em 1934, ou seja, quatrocentos anos mais tarde que, por iniciativa governamental, foi elaborado o primeiro decreto n. 23793/34, que estabeleceria as primeiras regras de uso e manejo da floresta brasileira.
Porém, cabe ressaltar que a institucionalização do primeiro código florestal brasileiro, em 1934, teve a sua elaboração motivada pelas mudanças estruturais que o país vinha sofrendo naquele período. Na época, a população que vivia nos centros urbanas e também na área rural, tinha como principal fonte de energia o carvão e a lenha. Com a expansão da atividade cafeeira, as florestas próximas as áreas urbanas passaram a dar lugar às plantações de café, tornando-se caro, para a população, a aquisição da lenha decorrência da distância na qual a mesma deveria ser transportada.
Tentando equacionar o problema, o Código Florestal de 1934, exigiu que as propriedades particulares devessem manter preservada 25% de cobertura vegetal. O objetivo, portanto era manter o estoque de lenha capaz de abastecer a população da época.
Mesmo com a existência do respectivo decreto ou código florestal, o processo depredatório dos diferentes ecossistemas brasileiros continuava ocorrendo. Era necessário portando estabelecer regras mais rígidas acerca desse tema. Um código florestal mais amplo com políticas fiscalizadoras e punitivas aos infratores deveriam ser instituídas imediatamente. Diante dessa realidade, em 15 de setembro de 1965, foi aprovada no congresso nacional a lei n. 4.771, que passou a ser designado de Código Florestal Brasileiro,
O  respectivo documento foi considerado avançado para época, pois o Brasil estava vivenciando uma nova experiência governamental, um novo regime de governo estava iniciando sob a ótica dos militares, cujas políticas adotadas primavam o desenvolvimentismo pragmático. Nesse sentindo, a sociedade brasileira tinha dúvidas quanto a eficácia do código ambiental em vigor, pois restringia certas ações do regime, principalmente quando se referia a ocupação da floresta amazônica.
Durante as décadas posteriores à implantação do código florestal, as ações depredatórias das florestas brasileiras continuaram ocorrendo em ritmo acelerado, em especial a Floresta Amazônica com os projetos expansionistas que levou na abertura da transamazônica, um projeto depredador e jamais concluído.
Além da transamazônica, o governo militar, visando a ocupação das áreas de fronteiras, especialmente da amazônica, oferecia, gratuitamente, áreas de terras na Amazônia para ser ocupada. O proprietário deveria preservar 50% da vegetação existente. Caso o proprietário descumprisse a lei, o mesmo receberia do governo outra área de floresta para que o mesmo ficasse na legalidade.
 Mais uma vez se percebeu que não leis inovadoras capazes de impedir os crimes ambientais. Além das leis, outras estratégias deveriam ser pensadas como forma de conter os abusos. Mas, como evitar as atrocidades ambientais, principalmente na época do regime militar, sabendo que o maior depredador das florestas era o próprio estado e cujos órgãos legisladores e fiscalizadores eram controlados pelo próprio regime.
Outro fator  que deve fazer parte dos debates quando o tema recursos naturais, florestas, climas, uso da água, etc. é qual o tipo de modelo econômico na qual esses temas estão inseridos. Sem essa reflexão, não encontraremos respostas apropriadas à problemática sócio-ambiental na qual estamos vivenciando.
Foi a partir da década de 1970 que a questão ambiental deixou de ser discutida localmente e alcançou uma dimensão global. O planeta terra começou a dar seus primeiros sinais de que era necessário repensar as práticas até então adotadas quando ao uso dos recursos naturais. Diversos encontros intergovernamentais começaram a ser realizados em diversos países para discutir e buscar soluções conjuntas quanto aos problemas ambientais existentes.
Foi no Brasil, no ano de 1992, quando da realização da Eco-92 que se lançou o primeiro alerta acerca da “saúde” do planeta terra. Se o ritmo de exploração continuasse sendo mantido, a sobrevivência da biodiversidade, em especial a do homem estaria comprometida.   
Deste período em diante um amplo programa de ações em escala global foram sendo desenvolvidos e cuja temática ultrapassou os limites especificamente locais para uma abordagem mais ampla, envolvendo o planeta em seu todo.
Nesse sentido, o Brasil, paulatinamente, passou a ocupar os espaços da mídia global, com imagens e notícias estarrecedoras de crimes ambientais, que em escala crescente, colocavam em risco o maior bioma do planeta, a Floresta Amazônica. Sem contar, é claro, com o bioma Mata Atlântica, considerado, como o da Amazônia,  um dos mais complexos e importantes ecossistemas do planeta.
É importante que se ressalte que a progressiva destruição dos diferentes biomas brasileiros, principalmente a partir das duas últimas décadas do século XX, foi em decorrência das políticas econômicas perversas adotadas pelos governos que se sucederam. O agronegócio, a partir da década de 1990, se transformou em um dos  principais pilares da ótica desenvolvimentista, em especial, as culturas de soja e cana-de-açúcar. Diante da ganância exacerbada do agronegócio, mais e mais áreas de terras passaram a ser ocupadas, resultando em vastas extensões de florestas destruídas, desrespeitando abertamente as legislações ambientais existentes.
Não estando totalmente satisfeitos, o agronegócio, representado por uma expressiva parcela de parlamentares no congresso, passou a pressionar o governo federal para que promovesse reformas no código florestal brasileiro sancionado em 1965, alegando que o mesmo estava inadequado, ultrapassado, não atendendo mais aos preceitos desenvolvimentistas do estado moderno.
Em agosto de 1996, o governo Fernando Henrique Cardoso assinou  medida provisória n. 1.511-96, aumentando a área de Reserva Legal da Amazônia de 50 para 80%. Essa decisão colocou na ilegalidade as propriedades que até julho de 96 estavam na legalidade. No entanto, essa medida jamais foi apreciada pelo poder legislativo e não tendo eficácia nenhuma quanto a sua aplicabilidade.
Atendendo as pressões advindas da bancada ruralista, em 2008, a Câmara dos Deputados revogou a lei  4.771/65. Dentre as modificações visadas, destacam-se as que vêm gerando maior discordância entre ruralistas e ambientalistas que são as áreas de preservação permanente e de reserva legal. Diante desse fato, uma batalha titânica está sendo travada entre esses dois setores, porém, tudo indica que as vozes dos ambientalistas não terão eco e não sensibilizarão os corações de nossos parlamentares.  
Os ambientalistas argumentam que o novo código florestal que está para ser aprovado na câmara é um verdadeiro retrocesso no que tange as políticas de conservação das florestas. Enquanto que para o relator do Projeto, o deputado do PC do B, Aldo Rebelo, o novo código florestal brasileiro beneficiará os “pequenos agricultores”. Essa argumentação é totalmente descabida e mentirosa, pois a agricultura familiar, a propósito, atualmente é responsável por mais de 70% da alimentação que chega à mesa dos brasileiros, e este setor vem convivendo muito bem com as leis ambientais em vigor, pelo menos desde 1965, quando foi editado o atual Código Floresta.
O que se sabe, porém pouco conhecido pela sociedade, é que o agronegócio está por trás dessa manobra indigesta acerca do novo código florestal. Durante décadas, para suprir sua ganância por mais e mais riquezas, os latifundiários destruíram quase que a  totalidade da vegetação presente em suas propriedades, mudas desses proprietários devastaram ultrapassando até os limites de 80%, da Amazônia; 35%, Cerrado e 20%, da mata atlântica, proibido pela legislação.
Diante das pressões advindas dos representantes do agronegócio, um novo código florestal é elaborado e apresentado à sociedade cujo teor proporcionou pânico generalizado entre  ambientalistas e a comunidade científica brasileira.
Dentre os  artigos apresentados no projeto do novo código florestal, os considerados mais polêmicos são os que tratam da obrigatoriedade da manutenção das reservas legais para as médias e grades propriedades, ou seja, as propriedades situadas na região da Amazônia terão que manter intactas 80% das florestas, enquanto que às localizadas no cerrado, a área de reserva deverá ser  de 35%, às situadas na mata atlântica, o percentual deverá abranger 20%.
 Ficarão isentas dessa lei, as pequenas propriedades cuja extensão não ultrapasse quatro módulos fiscais. Em relação ao módulo rural, o tamanho da propriedade pode variar dependendo do município e da região do país, podendo chegar de cinco a 110 hectares. Em alguns lugares, propriedades com área de 1.100.000 m quadrados ou 110 hectares não precisarão manter uma única árvore em pé. Em outros, as empresas e latifundiários poderão comprar diversas “pequenas propriedades” cada uma delas sem nenhuma reserva legal.
O que pode ocorrer caso esse item seja aprovado é o crescimento de processos nos cartórios para a viabilização de desmembramentos das propriedades, principalmente na Amazônia e cerrado, transformando as grandes propriedades em pequenas áreas fragmentadas para fugir da legislação.
Outra questão conflitante acerca do item reserva legal e que beneficiará os latifúndios é o fato de que havendo na reserva legal uma pequena nascente, o proprietário poderá “descontar” no tamanho da reserva, ou seja, no caso Araranguá, poderá reduzir de 20 para 15%.
Sobre as multas à serem aplicadas aos infratores, o novo código  beneficia os que cometeram desmatamento anterior a julho de 2008, isentando-os de multa. Porém, terão por obrigação recompor a áreas destruídas em um prazo de 20 anos. A bancada ruralista contestou a redação desse item admitindo que a mesma não atenda aos interesses da categoria, pois exigem a redução dessas áreas de reserva legal.
Sobre a punição dos proprietários que não reporem a floresta no prazo determinado pela legislação, que pode afirmar que com a aproximação do prazo um novo código florestal poderá entrar em vigor isentando os infratores dessa obrigatoriedade.
Além das reservas legais, as APPs, Áreas de Preservação Permanente, situadas nas margens dos rios, córregos, lagos e encostas de morros conhecidas como Áreas de Preservação Permanente, também tiveram destaques no novo código.
A lei atual penaliza aqueles que utilizaram essas áreas tanto para o cultivo agrícola quanto  para a ocupação imobiliária. Para os infratores, a legislação estabelece sanções sob a forma de multas que variam de (50) cinqüenta reais a (50,000,000) cinqüenta milhões de reais. Sobre as APPs, o novo código florestal traz a seguinte redação:  a propriedades localizadas nas margens de rios com largura equivalente a 5 metros, deverão manter protegida 15 metros de vegetação. A lei anterior obrigava 30 metros.
Em relação as encostas de morros, onde hoje é ocupado por construções imobiliárias e culturas agrícolas, o código determina que esse item seja transferido para os estados, e que os mesmos adéqüem de acordo com suas necessidades.
Com base nesses dados, admite-se que o novo código que está tramitando na câmara, caso seja aprovado sem os destaques dos ambientalistas e da comunidade científica, representará a morte iminente do que resta de nossas florestas e, consequentemente, de toda biodiversidade  existente.
O que vem causando irritação por parte da comunidade cientifica brasileira é a exclusão dos mesmos na construção do documento. Alegam os cientistas que o texto apresentado é retrógrado e atende somente os interesses de uma parcela da população que são os grandes proprietários rurais. Seriam necessários, segundo os mesmos, dois ou três anos para que se fizesse um estudo mais aprimorado, discutindo com a sociedade todos os itens que estão inseridos no texto original.
O que se constata em relação aos parlamentares envolvidos na construção do novo código florestal é de que os mesmos se utilizam da Tribuna da Câmara para “encenar”, uma espécie de teatro, cuja platéia são eles próprios, pois, como é sabido, o projeto de lei será aprovado da forma como pretendem, tanto a oposição, que é minoria, como os demais setores da sociedade organizada, não representam ameaças para os mesmos.
 Muitos políticos têm suas campanhas eleitorais financiadas pelas empresas interessadas em expandir seus negócios para as áreas atualmente protegidas. A única espécie de preservação com que tanto o relator Aldo Rebelo como os demais parlamentares defensores do projeto estão realmente preocupado é com relação aos cargos que ocupam.
Durante a seção plenária da câmara dos deputados, ocorrida no dia 12 de maio, o circo estava preparado para que o projeto do novo código fosse votado. No entanto, o presidente da câmara, suspeitando fraude no texto, suspendeu a seção, para que o documento fosse analisado com mais detalhes.
A polêmica na qual levou na suspensão da seção foi por conta do item relativo as Apps (Áreas de Preservação Permanente). O relatório estabelecia que ficaria proibida a ocupação para o plantio e pecuária nas matas ciliares em rios largos. O governo queria que as exceções fossem regulamentadas por decreto presidencial.
Durante a seção correu boatos que no texto, teria sido incluída uma emenda que estabelecia que nas APPS seriam liberadas  atividades “agrossilvopastoris, ecoturismo e turismo rural”.  Essa prerrogativa abriria uma brecha na legislação e que daria oportunidade para que todas as atividades agropecuárias pudessem ser contempladas.
Se o projeto do código fosse aprovado com essas alterações, o governo Brasileiro poderia sofrer críticas dos governos e entidades internacionais que passariam a estabelecer restrições ao Brasil na liberação de recursos para a aplicação em projetos sociais.
Ao mesmo tempo, o Brasil descumpriria os acordos estabelecidos quanto a redução da emissão de CO2 na atmosfera. É importante ressaltar que em 2012, ocorrerá no Brasil a Rio+20, ou seja, o encontro mais importante depois da Rio-92, cuja temática em questão será o aquecimento global e o cumprimento das resoluções estabelecidas na Conferência do Rio, em 1992.  
No entanto, o projeto de lei foi novamente a plenário no dia 25 de maio, sendo agora aprovado com 410  votos a favor e 63 votos contra. Durante a seção, os deputados do PMDB, encaminharam uma emenda, a de número 164, que desautorizava o governo federal e concedia autonomia às Assembléias Legislativas para elaborarem leis específicas sobre as áreas de APPs. Para o governo federal, essa emenda foi interpretada como derrota, principalmente quanto partiu de sua base política de sustentação, o PMDB.
Dentre os itens aprovados no novo código florestal, destacamos: ficou mantido os mesmos índices da lei anterior em relação a reserva legal, 80%, região amazônica; 35%, cerrado e 20%, nas demais regiões do pais; desmatamentos de encostas e das margens de rios, somente serão recuperados se o programa de regularização ambiental da União e dos estados assim o exigirem; as propriedades que já foram desmatadas, seus proprietários poderão compensar as áreas já devastadas em outros estados, porém, essas áreas deverão pertencer ao mesmo bioma, ou seja, se a área for de mangue, a recuperado deverá ser desse mesmo bioma. Poderão também, os proprietários, pagar para compensar as áreas desmatadas.
Quando se trata das áreas de reserva legal, principalmente àquelas destinadas à proteção da fauna e da flora, poderá a mesma ser explorada através de um manejo sustentável. Ficou mantido o item referente aos módulos fiscais. Estarão livres de multas e da reposição da floresta, as propriedades que possuírem até quatro módulos fiscais. Esse índice estabelecido, não poderá seguir os mesmos padrões nas diferentes regiões do Brasil. A região sul do Brasil, um módulo fiscal pode corresponder até 20 ha, enquanto que na região amazônica, esse índice é de aproximadamente 300 ha.
Em áreas já desmatadas, o novo código permite que seja reflorestado com até 50% de vegetação não nativa, como eucalipto e outras espécies exóticas;  admite-se cultivos lenhosos perenes, atividades florestais e de pastoreio nas APPs de topos de morro, encostas e de altitudes elevadas de 1.800 metros. Em relação a Emenda 164, que provocou um profundo desgaste ao governo, a mesma permite a manutenção de atividades agrossilvipastoris, ecoturismo e de turismo rural nas APPs se estiverem em áreas consolidadas até 22 de julho de 2008. Se no município, algum empreendedor tiver interesse de desenvolver algum projeto em áreas cujas características são classificadas como APPs, o empreendimento pode ser efetivado, quando os órgãos ambientais estaduais e municipais demonstrarem que o mesmo não está em área de risco. 

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