segunda-feira, 4 de outubro de 2021

 

PROSPECÇÃO DE PETRÓLEO E GÁS NO LITORAL DE ARARANGUÁ: QUEM PODERÁ E QUEM GANHARÁ COM ESSA INICIATIVA?

Foto - Jairo


Frente às mudanças climáticas que estão alterando importantes biomas no mundo inteiro e dos quais comprometerão a própria existência da espécie humana, organizações ambientais, entidades universitárias, científicas e a própria ONU estão correndo contra o tempo na tentativa de frear essa real hecatombe climático. As inúmeras conferências e reuniões de cúpulas já realizadas, a exemplo da COP-23, que ocorreu em Paris em 2015, os ousados plenos de mitigação do aquecimento foram construídos conjuntamente para impedir que a temperatura média do planeta chegue a 1.5 graus Celsius até o final do século XXI.

Dentre as vastas ações acordadas está o desenvolvimento de fontes limpas de energia em substituição as de matrizes fósseis, petróleo, carvão, gás, etc. O protocolo assinado também destaca ações visando à proteção das florestas tropicais, fontes de uma rica e complexa biodiversidade e concentração de carbono.  Não estão excluídos desse “combo” ambiental os oceanos, que guardam em suas profundezas inimagináveis quantidades de espécies aquáticas. A produção de pescados e crustáceos dos quais movimentam a economia de importantes nações como o Brasil, se devem a existência de uma complexa área marinha onde espécies se reproduzem. 

O estado de Santa Catarina, no entanto, tem a sua costa oceânica como uma das mais ricas em pescados em todo o território nacional. Além do mais, o estado é contemplado por possuir um litoral constituído por praias paradisíacas, atraindo o ano inteiro milhares de turistas nacionais e internacionais. Nesse sentido, combinando a atividade pesqueira e o turismo é mais de um milhão de pessoas no estado que tem a sua subsistência vinculada a essas duas atividades.

Nações importantes que tem o petróleo como base da sua economia vêm discutindo há algum tempo estratégias de transição dessa atividade para outras mais sustentáveis. O turismo, no entanto, é uma dessas alternativas. O fato é que o Brasil diferente dos demais está caminhando na contramão, insistindo em setores cujos dias estão contados, o petróleo e o carvão.   

Por que estamos enfatizando aqui o estado de Santa Catarina e suas potencialidades turísticas e pesqueiras? A resposta vem da preocupação de entidades ambientais, políticas e desses dois setores da economia por terem informações concretas de que há por parte do governo brasileiro e de grandes corporações do petróleo interesse na instalação no mar catarinense mais de 60 dos 90 blocos previstos para a prospecção de petróleo.  

Um plano tão ameaçador à vida de milhões de catarinenses ainda é pouco discutido e compreendido pelos catarinenses. O próprio governo vem vendendo a falsa idéia de que a instalação das petroleiras trará ganhos substanciais de recursos em forma royalties aos municípios litorâneos. Frente a esse enfadonho “presente de grego” aos catarinenses uma intensa atividade de informações e esclarecimento em forma de audiências vem acontecendo em diversos municípios litorâneos do estado, com a coordenação da ONG internacional  ARAYARA.

O encontro em Araranguá aconteceu em 29 de setembro de 2021, nas dependências da câmara de vereadores, no qual foi mediado pelo vereador Jair Anastácio, do PT, no qual atua na comissão de meio ambiente da câmara. Inúmeras entidades locais foram convidadas para estarem presentes no evento, dentre os quais os integrantes do legislativo e do executivo. Infelizmente somente quatro vereadores se dispuseram a participarem da audiência. Pior ainda foi o executivo municipal, ausentando-se todos os seus representantes.  A não presença de ambos pode ser justificada ou pelo desconhecimento acerca do fato ou porque acreditam que a extração de petróleo e gás no litoral reverterá em polpudos royalties ao município.

Foto - Jairo


Se for esse o motivo da ausência, os debates e as palestras proferidas deixaram uma impressão muito negativa para o estado e o município na hipótese de haver sucesso nos leilões dos blocos.  Um dos palestrantes foi o Professor Dr. Paulo Horta, da UFSC[1] com vasta experiência e estudos sobre mudanças climáticas e a poluição de nossos ecossistemas. O professor Paulo tem um invejável currículo voltado às pesquisas relacionadas à estrutura oceânica catarinense. Além da sua atuação como docente, há mais de vinte e cinco anos o professor pratica mergulho investigativo em toda a costa catarinense. Esse é o seu grande diferencial, onde associa teoria e pesquisa, conhecendo mais do que muitos a realidade de todo nosso assoalho marítimo e suas particularidades.

Foto - Jairo


O que mais impressionou em sua fala foi do seu vasto conhecimento da faixa costeira do município de Araranguá, onde destacou com muitos detalhes a RESEX (Reserva Extrativista - Unidade de Conservação) criada por decreto em 2016 e cujo propósito é promover o desenvolvimento sustentável da região de Ilhas. Enfatizou com orgulho e preocupação que facha oceânica de Araranguá é rica em biodiversidade marinha, apresentando um amplo ecossistema de centenas de espécies, peixes e outros crustáceos.

Foto - Jairo


Foto - Jairo



Sua preocupação se deve ao fato de estarem esses ecossistemas ameaçados diante da precariedade dos serviços de saneamento básico prestado. Hoje em dia os resíduos de carvão mineral são considerados passivos ambientais extremamente impactantes para os ecossistemas do extremo sul. Citou exemplos de crimes ambientais ocorridos ultimamente, como o rompimento da barragem em Mariana que atingiu toda a bacia hidrográfica do Rio Doce, cujos impactos ambientais, sociais e econômicos foram incalculáveis.

Em relação à atividade petrolífera na costa araranguaense ressaltou, quem irá se responsabilizar por possíveis danos resultantes de acidentes com vazamentos de petróleo? Enfatizou a necessidade de haver o engajamento de todos os araranguaenses contrário a 17ª rodada dos leilões do petróleo na bacia de pelotas, onde serão leiloados 90 blocos para extração de petróleo e gás. Citou os inúmeros acidentes e crimes ambientais cometidos pela Petrobras e das demais interessadas na aquisição desses blocos.

 

Foto - Jairo

Alertou que somente a Petrobras tem em um ano, mais de 370 vazamentos em suas plataformas. As demais tiveram milhares de vazamentos. E são essas que querem se instalar no nosso oceano, ressaltou. Um exemplo de tragédia ambiental cujos responsáveis jamais foram responsabilizados ocorreu em 2019 na costa nordestina brasileira. Milhões de litros de petróleo devastaram ecossistemas inteiros levando ao desespero milhares de pessoas que dependiam do turismo e da pesca.

A ideia esboçada pelas companhias de que a extração de petróleo reverte em desenvolvimento social e econômicos é considerada falsa por muitos. Se fosse verdadeira o estado do Rio de Janeiro seria um dos mais desenvolvidos do país. Que acompanha os noticiários televisivos diariamente sabe exatamente a realidade principalmente da capital fluminense e de outros tantos municípios atendido pelos royalties do petróleo. A violência, a miséria, a corrupção, o trafico, etc, são alguns dos péssimos legados deixados.

Foto - Jairo


Será que agora com os leilões dos 90 blocos na bacia de pelotas serão diferentes? Claro que não. O que pode e vai ocorrer, a exemplo de Macaé e São João da Barra, municípios fluminenses, é a criação de bolsões de miséria nos municípios litorâneos de Santa Catarina. Isso se dará estimulada pela forte onda migratória de pessoas influenciadas pela expectativa de trabalho.

A COP 26 (Encontro das Partes) que terá como sede Glasgow, na Escócia, será um momento propício para discutir alternativas econômicas de baixo carbono. Somente a União Europeia investiu mais de um bilhão de euros em tecnologias produtivas alternativas. Disse o professo Paulo que mais de cem empresas assinaram documento se comprometendo em fazer a transição para uma economia de baixo carbono. O Brasil, no entanto, até 2025 estará extraindo mais de vinte bilhões de barris de petróleo, quantidade que dará ao país grau de autossuficiente nessa matriz. Portanto, segundo o professor, não é mais necessário se aventurar em novas prospecções. Atualmente tudo que está no subsolo, petróleo e gás, por exemplo, têm de ser discutido com muita atenção.

A segunda exposição acerca dos riscos da prospecção de petróleo e gás no litoral catarinense foi do Professor Dr. Juliano Araújo, integrante da ONG ARAYARA e do observatório petróleo e gás. Demonstrou muita preocupação sobre os possíveis leilões dos mais de 60 blocos no território catarinense, pois poderá levar mais de trezentos mil trabalhadores ao desemprego. A pesca, no entanto, é o seguimento mais impactado, pois o mar catarinense é considerado um dos mais ricos em diversidades marinhas.

Com o início das prospecções, daqui a sete anos, caso os leilões se concretizarem, a costa marítima catarinense terá expressiva elevação da quantidade de navios cruzando essas áreas, muitos dos quais de companhias internacionais. Além dos riscos de acidentes essas embarcações infestaram nossos mares com espécies exóticas e predatórias à fauna e à flora marinha. Serão centenas de perfurações para a prospecção de petróleo, sendo que parte delas se dará exatamente nos berçários marinhos onde se reproduzem centenas de espécies de pescados e crustáceos.   

Citou o exemplo do ex mega empresário Eike Batista, dono de uma petroleira que realizou centenas de perfurações na costa do Rio de Janeiro, sem sucesso e com um passivo ambiental bilionário. O petróleo, por exemplo, nos próximos dez anos não será mais a principal commoditie global. Muitas empresas automobilísticas e de alta tecnologia já estão modificando suas plantas no mundo inteiro. A eletricidade vem progressivamente substituindo a gasolina e o diesel como combustível para os automóveis.  

Termoelétricas a carvão, gás, petróleo, etc, estão sendo desativadas e substituídas por fontes limpas, eólica, fotovoltaica, entre outras. No estado de Santa Catarina, Joinville, por exemplo, muitas empresas importantes já estão discutindo a transição para “plantas verdes”. Em Araranguá já era para estar sendo discutida proposta de instalação de sistemas de recargas para automóveis movidos a eletricidade, pelo fato de receber muitos turistas, ressaltou o professor Juliano.

O impasse envolvendo a 37ª rodada do leilão dos blocos da bacia de pelotas previsto para o dia 07 de outubro iniciou a partir da audiência pública sobre o tema no Rio de Janeiro. Foram quatro pessoas representando o estado de Santa Catarina nesse encontro. Na audiência foram observados inúmeros equívocos no projeto, dentre eles a inexistência de itens relativos aos riscos à biodiversidade marinha. Não apareceram também outras variáveis de risco, como fenômenos climáticos extremos: furacões, ciclones, tornados, já considerados como eventos climáticas  consolidados no nosso território.

Ressaltou que a biodiversidade marinha é muito rica, principalmente de espécies de algas que poderiam reverter em bilhões de reais à nossa economia através da indústria de biofarmaceuticos. Mais uma vez destacou a responsabilidade do legislativo araranguaense acerca desses riscos potencias. Defendeu que os vereadores de Araranguá devem se integrar aos demais 93legisladores do estado que assinaram documento contrário a prospecção de petróleo e gás no nosso litoral.  Importante também foi a posição tomada por uma juíza da capital catarinense, Florianópolis, onde elaborou documento de quase cinquenta paginas contrários a prospecção de petróleo.

Foto - Jairo


Alertou o professor Juliano que na hipótese de um acidente em uma das plataformas instaladas na costa catarinense, em duas horas no máximo o óleo chegará as nossas praias. O agravante é que nosso estado não possui qualquer estrutura para lidar com tais problemas. Afinal que se responsabilizará pelo ônus de uma possível e real tragédia anunciada. Fica o exemplo de Mariana, Córrego do Feijão, praias do nordeste, golfo do México, entre outras centenas de desastres todas ligadas ao seguimento da mineração.

Prof. Jairo Cesa   

 https://arayara.org/soslitoralsc-querem-destruir-o-litoral-catarinense-com-a-exploracao-de-petroleo/       

https://arayara.org/quem-somos-2/



[1] https://lafic.ufsc.br/equipe/

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