CORTES DE RECURSOS À CIÊNCIA E À PESQUISA
APROFUNDARÃO AINDA MAIS NOSSO ABISMO EDUCACIONAL E CULTURAL
Quando um norte
americano é agraciado com o premio Nobel, independente da categoria, geralmente
o contemplado é um imigrante naturalizado. É incrível como esse país já laureou
tantos cientistas. Nos últimos sessenta anos, dos 74 premiados, 43 eram
americanos. No último dia 04 de outubro a Fundação Nobel de Estocolmo informou
os ganhadores do premio na área da medicina, mais uma vez foram dois americanos,
sendo que um deles de origem Armênia, Ardem Potapoution, que fugiu do Líbano
para os Estados Unidos aos 18 anos de idade.
Nos
Estados Unidos Ardem passou a entregar pizza até arrumar emprego de
pesquisador. Já o segundo ganhador foi David Julius, que estudou o ensino médio
em Nova York. Relatou que começou a se interessar pela física a partir das
aulas do seu professor de física, que antes de lecionar era jogador de
basquetebol. Contou que nas aulas de física o professor utilizava a bola de
basquete para analisar sua trajetória, que isso era para ele muito inspirador.
Na
faculdade, Julius começou a estudar a atuação dos cogumelos alucinógenos no
cérebro humano. A intenção era compreender como tudo na natureza influencia
nosso sistema nervoso. Os dois
pesquisadores descobriram como sensações de frio são captadas pelo cérebro. Com essas informações será possível
desenvolver medicamentos capazes de combater a dor. A mensagem que os dois americanos vencedores
do prêmio deixaram ao mundo foi o seguinte: “os caminhos
tortuosos da criatividade amparados pelo rigor da ciência ainda são os mais
curtos para construção coletiva que chamamos de civilização”.
Como é inspirador o que ambos relataram
sobre a ciência, a pesquisa. Ficou explicito
na fala de Davis Julius, que deve ser considerado todo o processo de condução
de um indivíduo ao seu resultado final, o sucesso profissional. Ou seja, os
níveis infantis, elementares, médios e superiores. A presença de bons
professores/as, criativos/as, como foi o seu professor de física, serão
primordiais na construção do caminho de sucesso.
No mesmo instante em que a população
mundial acompanha extasiada a divulgação dos laureados com o Nobel,
corroborando com a certeza de que quanto mais investimentos em ciências,
maiores retornos econômicos e possibilidades de superação de crises teremos, o
governo brasileiro vem seguindo o caminho das sombras com corte de 650 milhões
de reais do orçamento destinado à pesquisa.
Isso explica o fato de o Brasil jamais ter alguém contemplado com o Nobel
em qualquer uma das áreas científicas. A realidade é que continuaremos por muito
tempo excluído, isso se permanecermos elegendo governos e parlamentares que tratam
a educação, a ciência, como políticas públicas sem muita importância.
Há muito tempo o Brasil vem amargando as
ultimas posições na avaliação do PISA (Programa Internacional e Avaliação de
Alunos) entre os quase cem países que integram a OCDE (Organização para
Cooperação e Desenvolvimento). A tendência é que perderemos mais posições
considerando a atual realidade onde estudantes abandonaram a escola em
decorrência da pandemia. O ensino remoto se constituiu como principal
ferramenta para o acompanhamento das aulas. Entretanto esse novo formato de ensino
professor aluno excluiu milhões de crianças e adolescentes por não terem a
disposição boas conexões de internet.
Os que tinham ou tem acesso sofreram e
sofrem com a baixa qualidade do que é ensinado, agravado ainda mais pela cultura
do desleixo ou desinteresse das famílias no acompanhamento dos filhos na
escola. O quadro educacional brasileiro se já era decadente antes da pandemia,
hoje se apresenta como caótico. Em três anos de governo Bolsonaro desfilaram
pelos corredores do MEC quatro ministros da Educação. Incrível que, todos,
incluindo o atual, mantiveram e mantém uma postura de negação à ciência, à
pesquisa, ou seja, de ataque frontal as instituições públicas de ensino superior.
No momento em que o ministro da economia,
Paulo Guedes, cortava 92% dos recursos destinados à pesquisa e transferia para
outros ministérios, o mesmo credenciava a continuidade da subserviência da
pobre nação brasileira às potencias econômicas que investem parte expressiva do
PIB em ciência. Essa posição anti-ciência do ministro da economia e parte
expressiva do congresso nacional se encaixa perfeitamente com o projeto
moralista, autoritário, repressor, fascista, protagonizado pelo presidente e sua
horda de apoiadores.
Uma educação pautada na lógica do
mercado como quer o MEC implementar, elevará ainda mais o grau de atraso
científico e tecnológico. Sem grandes investimentos no ensino básico, com escolas
bem estruturadas e professores bem remunerados, jamais nos tornaremos uma nação
autônoma. Autonomia poderá nos garantir empoderamento, ou seja, consciência e poder
para a tomada de decisões livres de manipulações.
Não é o caso da nossa educação,
profundamente contaminada por ideias e conceitos fabricados por grupos de interesses
e presentes nos currículos. As escolas públicas que deveriam ser espaços de
instigação e construção de um saber crítico e transformador viraram campos de
massificação coletiva. Rebelar-se contra tudo que massifica e oprime no
ambiente escolar é algo a ser estimulado. O espaço e o tempo das aulas devem ser
utilizados para refletir as contradições sociais produzidas por um sistema
econômico que consome nossa força de trabalho.
Com tais rupturas e um novo currículo
construído no sentido de, em primeiro lugar, mostrar que indivíduos são sujeitos
históricos em permanente transformação, será possível almejarmos um novo país
com amor incondicional à bandeira e aos demais símbolos nacionais. Porém, sabemos que tudo isso são caminhos
desafiadores e difíceis que teremos que trilhar. Acreditar que por meio de um pleito
eleitoral nossos problemas serão solucionados inclusive a educação, é acreditar
em papai Noel e coelhinho de páscoa.
Somente isso não resolve. É necessário
reestruturar as bases dos movimentos sociais como instrumentos de mobilização e
pressão aos futuros governantes, mesmo aqueles oriundos das bases populares. O fato é que teremos dias muito difíceis pela
frente. Temos que agir conforme descreveu Antônio Gramsci em uma de suas obras
escritas. Nossa luta é uma guerra de trincheiras, cada passo ou etapa vencida se
deve cavar uma trincheira e lá se instalar, sem recuar um passo.
Prof. Jairo Cesa
Nenhum comentário:
Postar um comentário