domingo, 3 de maio de 2020



ENSINO VIRTUAL OU REMOTO, A QUEM INTERESSA?

Nos últimos anos a falta de políticas consistentes e permanentes do Estado para educação pública de nível básico transforma esses ambientes em campos minados,  onde converge  toda a tensão, revolta, desesperança, vivida pela sociedade. Uma das enormes dificuldades enfrentadas pelos docentes no cotidiano escolar é despertar a atenção dos estudantes para o trabalho educativo. Dar conta de múltiplas tarefas diárias, muitas vezes utilizando ainda quadro/giz, todo esse esforço descomunal dos/as trabalhadores/as em educação consegue assegurar resultados satisfatórios em avaliações como do Enem.
Esse fosso abissal que atinge as escolas públicas brasileiras tem sim responsabilidade direta e indireta no modo como os gestores públicos gerenciam esse segmento. Não bastam apenas bons projetos e planos educacionais mirabolantes, é preciso maior aporte de investimentos em infraestutura, qualificação profissional e salários justos. Sem isso jamais nos livraremos do ciclo de atraso histórico, onde eleva ano a ano o percentual de sujeitos desprovidos de instrução.
Todo o problema relatado acima já era observado em uma conjuntura social dita normal, agora tende a se agravar quando milhões de estudantes permanecem fora da sala de aula diante da pandemia do Corona vírus. É difícil, portanto, vislumbrar no horizonte um cenário pior do que está a educação pública.  Para não comprometer definitivamente o ano letivo, estados e municípios promovem ações “paliativas” como o ensino remoto e outras metodologias não presenciais.  
O fato é que o acesso à internet entre os estudantes das escolas públicas é imensamente desigual em comparação aos estudantes das escolas particulares. Outro dato preocupante é o desequilíbrio entre os estados em termos de acesso das famílias à internet. Em nível de comparação, no distrito federal 78% dos domicílios possuem rede de banda larga. Já o estado do Pará, somente 29% dos domicílios tem esse serviço assegurado.  
Mesmo sabendo que milhões de estudantes estão desprovidos de tais suportes tecnológicos necessários, governos como do estado de São Paulo e Santa Catariana, determinaram o recomeço das atividades de forma não presencial. Para atender o público desprovido de internet, os professores terão que desenvolver atividades e posteriormente encaminhadas às escolas para serem fotocopiadas e entregues aos estudantes.   
As organizações sindicais ligadas aos professores alertam que poderá haver o aglomero de pessoas nas escolas durante o recolhimento dessas atividades, com risco até de contrair o corona vírus. Em vários estados brasileiros, muitas ações foram encaminhadas à justiça pedindo o cancelamento do calendário letivo ou pedindo a anulação da exigência de que as aulas remotas sejam computadas como hora aula.
As alegações são várias, dentre a mais importante é o que está descrito no artigo 205, da constituição federal: “A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho". Mas é necessário fazer reflexões mais profundas acerca dessa nova realidade envolvendo a educação brasileira. Há consenso de que tais iniciativas possam até serem mantidas, porém, sem que sejam concebidas como determinantes no processo aprovação ou reprovação docente.   
Não há dúvida que tanto o ensino remoto quanto outras metodologias que excluem a necessidade de professores presenciais, ambas servem de laboratório para grandes conglomerados no setor de tecnologia digital como Google, Facebook, entre outras, que controlarão esse poderoso e bilionário marcado educacional no futuro. Com essas novas modalidades de ensino em execução, escancara um cenário ainda mais preocupante, a violenta exclusão das classes menos abastadas do direito a uma educação de qualidade.
Outro aspecto que também preocupa é quanto ao papel do professor diante desse cenário digitalizado. Para os governos será muito mais barato contratar empresas que fornecerão plataformas para o ensino remeto ou a distância. Claro que tal estratégia atingirá em cheio as escolas públicas, com a redução do quadro de profissionais. Mas nem tudo está perdido. Um aspecto positivo que a pandemia do corona vírus deixará é a compreensão por parte da sociedade do grande e complexo papel exercido pelo professor no ensino dos seus filhos.
Mesmo com ferramentas tecnológicas disponíveis, ambas não são suficientes para suprimir dúvidas durante as atividades não presenciais dos estudantes. Se desejarmos uma sociedade mais solidária, fraternal ou mais humanizada, jamais poderemos imaginar a aquisição desses adjetivos sem a existência do espaço escolar. É lá que se constroem laços de solidariedade, vínculos afetivos, amizade, entre outros pontos importantes, o sentimento de pertencimento da mesma aldeia global, o planeta terra.            
Prof. Jairo Cezar

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