segunda-feira, 11 de maio de 2020


ENSINO REMOTO EM TEMPO DE CORONA VÍRUS EXPÕE A TRISTE REALIDADE DE MILHÕES DE BRASILEIROS

Imagino que muitos brasileiros/as devem estar incomodados/as com a repedida propaganda veiculada nas principais mídias abertas onde quatro indivíduos jovens, provavelmente bem pagos, expressam opiniões convergentes estimulando estudantes a fazerem as inscrições para o Enem. Os/as mesmos/as expressam tons de entusiasmo nas suas falas, admitindo que mesmo diante das dificuldades que ora afligem a sociedade afirmam que a “vida não pode parar”, “que é preciso ir à luta”, “se reinventar”, “superar”.
São frases meticulosamente elaboradas das quais verbalizam o pensamento de um grupo específico que defende a meritocracia, o esforço individual, como caminho para o sucesso. Penso também, que muitos/as não discordam dessas premissas, porém, é claro que num momento onde houvesse o equilíbrio no acesso do saber. Não no caso brasileiro, em que milhões de jovens estão fora das salas de aulas devido a pandemia, cuja parcela significativa das residências que habitam não possui água potável, muito menos rede de esgoto.   
Diariamente, integrantes dos órgãos da saúde e da imprensa em geral vêm insistentemente recomendando às pessoas a permanecerem em suas casas para evitar o contagio ou disseminação do vírus. Outra recomendação é que lavem bem as mãos e usem máscaras. Para cerca de cinquenta milhões de indivíduos, o simples ato de lavar as mãos diariamente é um hábito quase que impraticável, pois estão desprovidas/os dessem recurso natural.
Imaginemos agora essas milhares de famílias desprovidas dessas mínimas condições para sobrevivência, onde cinco, dez ou mais indivíduos dividem um pequeno cômodo apertado e ainda por cima apavorados com medo de serem contagiados pelo corona vírus. Como essas pessoas, principalmente as crianças e adolescentes terão equilíbrio psicológico para estudarem. Se durante a normalidade, anterior a pandemia, o processo de aprendizagem já era difícil devido as fragilidades estruturais das escolas públicas, quiçá agora, com a adoção do sistema de ensino remoto.  
Se não há água para lavar as mãos nas milhares de residências espalhadas pelo território brasileiro, agora pensemos outros recursos adicionais como computadores, internet, consideradas ferramentas essenciais à prática dessas metodologias não presenciais oferecidas pelas redes de ensino públicas. No Brasil, dados de 2018, revelavam que 20% dos domicílios, dos quais reúnem 17 milhões de unidades residenciais não possuíam conexão com a internet. Na propagando relativa ao Enem são expressas frases com tom otimista, reafirmando o pensamento de um governo que desconhece a realidade da sociedade brasileira.   
“A vida não pode parar”; “é preciso ir à luta”; “se reinventar, superar”; “estudem de qualquer forma”, “de diferentes formas”; “seu futuro já está aí”. É claro que esse futuro desejado jamais poderá ser alcançado por vasta gama de estudantes brasileiros, que já estão passando fome, pois seus pais estão desempregados e sobrevivem graças a doações.  É notória a falta de sensibilidade do governo com os estudantes das escolas públicas, que mesmo aqueles que apresentam condições mínimas para o acompanhamento das aulas não presenciais, não são suficientes para adquirir uma base satisfatória de conhecimento.
Em contato com colegas professores/as de escolas públicas, as opiniões de ambos/as são quase consensuais quando ao modelo de ensino não presencial. Ambos/as relataram que os estudantes têm muitas dificuldades para resolver individualmente questões simples das atividades encaminhadas. Há exemplos de estudantes que necessitam se deslocar por longas distâncias para acessar a internet de um parente, pois na sua casa não há conexão, que dirá banda larga.  
Tem exemplos de famílias onde há apenas um celular pré-pago, geralmente compartilhado entre os membros da casa. “Estudar de qualquer forma” soa de modo agressivo, mortal em muitos casos, para milhares de famílias que são forçadas saírem de casa para ir à escola dos filhos buscarem ou entregar as atividades encaminhadas.    A pergunta que não quer calar é por que essa obsessão do governo em querer realizar o Enem num momento tão adverso como o atual?
As respostas são diversas, mas o ponto central da decisão é político, uma atitude que soa revanchismo às posições contrárias de órgãos como o Ministério Público que encaminhou ação pedindo transferência ou adiamento do Enem. Era o memento do governo, nesse caso do ministro da educação, semanalmente, fazer pronunciamento à nação, transmitindo calma aos estudantes, bem como se solidarizar com as famílias que perderam algum anti-querido com o vírus.
Ao mesmo tempo, deveria comunicar o adiamento do Enem para esse ano, bem como criar estratégias como a criação de um canal de TV com transmissões diárias de informações sobre o vírus, os cuidados e outros temas de relevância à sociedade. É obvio que jamais acontecerá em um governo, onde o ministro da educação se mostra despreparado para o exercício do cargo. Desde o inicio, quando assumiu a pasta da educação, esteve envolvido em polêmicas com professores e estudantes, achincalhando ou ameaçando-os em redes sociais. Sua postura sempre foi de criar confusões, até chegar ao limite de ser denunciado por crime de racismo contra chineses.
Outro aspecto importe a ser considerado nessa modalidade de ensino a distância ou remoto, são as pressões advindas de organismos como o Banco Mundial, fundações e poderosas corporações do setor de tecnologia que estão aproveitando o momento de crise para faturar vendendo seus produtos. Com a Pandemia, o Banco Mundial admitiu que o processo educacional no mundo inteiro terá um expressivo retrocesso. Para o capital, o impacto no ensino afetará profundamente o processo produtivo devido a escassez de profissionais habilitados, principalmente de trabalhadores com formação técnica.
Diante dessa crise no sistema educacional, o Banco Mundial e outros organismos como a UNISEF, OMS, UNESCO, OCDE, entre outras, vem coordenado um programa de coalizão global de educação durante a pandemia, com objeto de dar suporte para que o processo de ensino tenha continuidade. Entretanto, o modelo pensado por esses organismos segue uma agenda empresarial, onde empresas de tecnologias, fundações assumem o papel de financiadores e definidores dos programas e metodologias que deverão ser adotadas nas escolas. Dentre os organismos envolvidos nessa agenda, podemos destacar a GOOGLE e a FUNDAÇÃO LEMANN, cujo modelo de ensino dessa fundação está distribuído em vinte estados da federação.
A proposta encaminhada pelo Banco Mundial tem a aceitação de muitos países, dentre eles o Brasil. Porém, tudo isso tem um custo enorme que afeta diretamente a classe trabalhadora, principalmente os profissionais ligados a educação. A recomendação do organismo financeiro é que os estados que adotarem essa agenda terão que acatar algumas recomendações, como a flexibilização de contratos e na organização do trabalho dos professores.   A pandemia, portanto, está servindo de laboratório para a experimentação dessas novas ferramentas que tenderá a permanecer mesmo depois da crise alterando profundamente as relações de convívio e trabalho.
Prof. Jairo Cezar

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