sábado, 17 de dezembro de 2016

O RELATÓRIO DO PISA (ORGANIZAÇÃO PARA A COOPERAÇÃO E O DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO) REVELOU O PROFUNDO ABISMO QUE ENVOLVE A EDUCAÇÃO PÚBLICA BRASILEIRA


A menos de um mês da homologação da Medida Provisória 746/2016 que alterou significativamente artigos e parágrafos da LDB, lei n°. 9394/96, em relação ao ensino média, na ultima terça feira, 06 de dezembro, saiu o resultado da avaliação do PISA (Programa Internacional de Avaliação de Estudantes) envolvendo 72 países que integram a OCDE (Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico). Nenhuma surpresa em relação ao Brasil, continua nas últimas posições e piorando.  O que chamou a atenção não foram exatamente os números, que para quem acompanha o dia a dia das escolas públicas brasileiras e conhece a realidade, não se surpreendeu.  Foi a certeza inequívoca do erro comedido pelo governo federal de outorgar medida provisória insistindo que a causa dos péssimos resultados na educação pública está no  ensino médio.
A avaliação do PISA ocorre a cada três anos com estudantes com idade de 15 anos nas áreas de matemática, ciências e leitura. Nessa idade o estudante está concluindo o ensino fundamental, portanto, se tivesse que ocorrer alguma reforma jamais deveria partir do ensino médio, mas do ensino fundamental incluindo aí o ensino infantil. O que é revoltante é chegar à escola um dia depois da publicação da pesquisa e ter de ler reportagem publicada no Jornal Diário Catarinense pelo Diretor de Políticas de Planejamento Educacional da SED (Secretaria da Educação) onde afirma que para reverter o mau desempenho do ensino no estado estão sendo tomadas algumas medidas como a implantação do ensino de nove anos e o fim da progressão automática.
Em nenhum momento o jornal fez qualquer menção aos problemas estruturais das escolas e ao violento ataque à carreira docente. E olha que Santa Catarina comparada com os demais estados da federação, obteve um desempenho um tanto quanto satisfatório, se classificando entre os cinco primeiros. Imagine a situação dos demais estados?  Agora se for comparado os pontos obtidos pelo estado nas três áreas avaliadas, pelo índice geral do PISA, é de causar vergonha e requerer asilo político em outro país. Pois vejamos: em ciências a media da OCDE foi de 493, já o Brasil alcançou a 66ª colocação, com média 401. Santa Catarina ficou na quinta posição entre os estados, com média 418. No campo da leitura a média da OCDE manteve-se igual a de ciência, 493. O Brasil, com a posição 50 obteve média 407. Já o estado catarinense a média em leitura foi a mesma obtida em ciências, também lhe assegurando a 5ª colocação.
Agora na área da matemática, a posição 66 do Brasil, entre os 72 países avaliados, já mostra que algo de muito errado está ocorrendo com educação. Enquanto a nota da OCDE foi de 490, o Brasil alcançou 377. No entanto há algo muito curioso nesse item relativo à matemática envolvendo o estado de Santa Catarina e que merece reflexão. Se a nota obtida pelo Brasil foi de 377, Santa Catarina recebeu nota 398, conquistando a terceira posição entre os 27 estados da federação. O país melhor posicionado em matemática entre os 72 participantes foi Cingapura, cuja média foi 564.    Para a OCDE, a média 2 obtida nas provas é considerada adequada para a ascensão social.  Com base nesse parâmetro, quase a metade dos estudantes brasileiros não se configuram como cidadãos, pois receberam menos de 2 pontos. Somente em matemática 70,25% dos estudantes não conseguiram a média mínima.  
No geral, 41,1% dos estudantes brasileiros com idade de 15 anos estão abaixo do nível 2 considerado limite ideal pela OCDE. A conclusão que se tem é que esse grupo de pessoas tem dificuldades ou não consegue interpretar dados ou fórmulas simples de matemática. O fato é que são inúmeros os fatores que contribuem para o Brasil chegar a esse nível tão desolador e pessimista em relação a educação pública. O que mais está contribuindo para isso além de outros fatores é claro que é o sócio-econômico. Quanto mais desenvolvidos, mais investimentos em escolas, formação de professores e salários, melhores foram os resultados. A diferença entre estes e os mais pobres chegou aos 37 e 38 pontos. A repetência também contribui para os resultados negativos, pois desestimula os estudantes a estudarem ou continuarem os estudos, levando a evasão precoce.
Outro dado importante no relatório do PISA é que poucos foram os países que tiveram melhorias no seu desempenho educacional e que o problema da educação pública não é exclusividade apenas do Brasil. Na América do Sul, países como Chile, México e o Uruguai apresentaram desempenho pouco melhor que o brasileiro, porém, ambos, incluindo o Brasil, estão muito abaixo dos países com melhores posições como China, Coréia do Sul, Cingapura, Hong Kong, Japão. Nesses países não acontece o que está se verifica no Brasil, o ataque brutal à profissão docente, particularmente dos que atuam na educação básica, com perdas de direitos de arrochos salariais. Os prognósticos para os próximos anos para a educação não são nada animadores. A tendência é a queda ainda maior da posição no ranque do PISA em 2018 quando sairá divulgada nova pesquisa.  
A aprovação da PEC 055 dos gastos públicos em segundo turno no senado, quarta feira, 14 de dezembro, e sua sansão pelo presidente da republica um dia depois, abriu novo ciclo para educação, saúde, cujos reflexos poderão ser notados já no primeiro ano de sua execução. O agravamento da qualidade desses serviços oferecidos à população é um deles. Alguns dados relevantes, os jornais e os demais veículos de comunicação de massa se eximiram de mostrar em relação ao PISA. No Brasil os investimentos públicos por estudante dos 6 aos 15 anos, ou seja, em todo o ensino fundamental, é de 38.190 dólares. É equivalente a 42% do montante investido pelos demais países da OCDE que apresentaram os melhores resultados, totalizando 90.294 dólares.  Os investimentos são expressivos na carreira docente, tanto na formação inicial como a continuada.     
Agora em se tratando de remuneração dos professores o fosso é mais profundo. Enquanto o salário médio anual do professor na OCDE alcança os 42.062 dólares, no Brasil os profissionais da educação têm de conviver com míseros 12.337 dólares anuais. Bem abaixo dos 26.048 dólares recebido pelo professor de séries iniciais no Chile e 28.262 dólares, no México. Outro agravante é o percentual de horas trabalhadas pelos professores brasileiros, 42 horas semanais. São cinco horas a mais, comparada aos demais países que integram a OCDE, ou seja, 37 horas semanais. A Lei do Piso Nacional do Magistério, conquistada mediante acirradas luta pelos professores do ensino básico brasileiro, certamente perderá sua validade com a promulgação da PEC 055, que estabelece como parâmetro pra o reajuste dos salários dos trabalhadores o percentual de inflação do ano anterior. As previsões de inflação medida pelo IBGE para 2015 serão de 5.5 a 6%. 
Desde a promulgação da lei do piso, em quase todos os estados, para assegurar alguns ganhos reais ao vencimento, os professores tiveram que enfrentar longas greves, a pressão dos governos e do aparato policial estabelecido para repreender o punir os professores. Sabemos que é consenso de quase a totalidade dos professores brasileiros que é utopia almejarem remunerações salariais nos moldes recebidos pelos professores de Cingapura, Japão, Suécia e principalmente da Finlândia. Em âmbito comparativo, o professor que atuava no ensino primário na Finlândia em 2015 recebia mensalmente 3.132 euros mensais, que convertido em reais chega a 11.800 reais. Já o professor de ensino médio seu salário mensal é de 3.832 euros. Enquanto a media salarial anual dos professores de ensino básico na Finlândia supera os 130 mil reais, no Brasil é pouco mais ou pouco menos de 43 mil reais.
E a propaganda mentirosa do governo estado de Santa Catarina em relação a eficiência do ensino continua ocupando as páginas dos jornais. O Diário Catarinense e o A Noticia trouxeram em anexo, no dia 15 de dezembro, caderno Informativo Educação SC, da Secretaria de Estado da Educação. As inúmeras reportagens ali contidas não correspondem à realidade das mais de mil escolas públicas estaduais. Todas as reportagens e imagens ali contidas procuram forjar um ambiente que realça alegria, otimismo e sucesso. A intenção é induzir as pessoas a acreditarem que as medidas que estão sendo tomadas pelo governo e seu secretario da educação são as corretas e que revolucionarão a educação. Se isso fosse verdade, as avaliações do PISA, nas áreas de matemática, ciência e leitura, não teriam sido tão baixas e motivo de constrangimento público.
Na página 7 do informativo onde discorre  sobre “Escolas com Jornada Ampliada em SC” traz especificações  de como será o novo ensino médio catarinense.  Dentre as muitas medidas se destaca a que se refere ao papel dos educadores vistos agora como “sujeitos inspiradores”.  Segundo o governo: “isso se conseguirá com um bom clima escolar e com aulas coesas, estruturadas, intencionais, compromissadas, colaborativas e desafiadoras”. O professor que está diariamente em sala de aula sabe que nada disso corresponde a realidade. O fato é que muitas das escolas que tiveram suas jornadas ampliadas sofrem também o descaso, com educadores pouco inspirados para o desenvolvimento de projetos, da promoção do protagonismo e das competências dos estudantes.  Quem consegue inspiração trabalhando em ambientes insalubres, com goteiras por todos os cantos, paredes rachadas?
Outra farsa do Estado é quanto às promessas de reforço da Tecnologia Educacional, que está descrito na página 9 do informativo.  A manchete da página traz a seguinte inverdade: “Internet, jogos, smartfhones e conteúdos interativos são utilizados no ambiente escolar como instrumentos facilitadores do aprendizado, além de preparar os jovens do Ensino Médio para o vestibular e Enem”.  Realmente tanto o governo como o secretário da educação desconhecem o cotidiano das escolas estaduais. Afirmar que foram investidos 11 milhões para melhorar a velocidade de conexão à internet em todas as regionais é piada e uma afronta aos professores como da EEBA de Araranguá, que foram forçados a fazerem uma “vaquinha” para angariar recursos e aumentar a velocidade da internet da escola. Quanto à sala de informática, são apenas quatro computadores que estão funcionando, para atender uma demanda de quase mil estudantes.
A impressão que se tem é que existem dois planetas, a Terra, habitada pelos mortais, professores, estudantes e a população em geral, e urano, milhões de quilômetros de distância onde vivem alguns “lunáticos superpoderosos políticos”, que governam a terra sem o mínimo de discernimento da realidade. Essa é a situação de Santa Catarina. Ao mesmo tempo em que centenas de escolas, ginásios e quadras esportivas necessitam urgentemente de reparos para evitar tragédias, o governo vem falando uma linguagem que milhares de professores ainda não dominam como: Pesquisa Guia EduTec; Sala Web; Aplicativos Mobile; Google for Education, etc, etc. Na opinião do governo: “as novidades do mundo tecnológico já ganharam o espaço escolar. Aulas mais dinâmicas, atividades interdisciplinares, e aplicação de recursos tecnológicos têm enriquecido o aprendizado e servem para aproximar professores e alunos da rede pública estadual”. Tem que deixar claro que as escolas catarinenses, se algum resultado positivo vem sendo alcançado, é porque o professor dá um duro danado preparando suas aulas nos finais de semana, sem qualquer remuneração extra. Expressiva parcela desses professores trabalha em duas, três e até quatro escolas semanalmente para preencher sua carga horária.  Imaginemos 20 anos o profissional da saúde, educação, segurança, sem um ganho real nos seus salários que possa lhes proporcionar o mínimo de qualidade de vida.
Interessante que em nenhum momento o governo fez qualquer menção aos livros didáticos e as bibliotecas das escolas que estão se tornando depósitos.   Antes de gastar milhões de reais com recursos tecnológicos geralmente distantes da realidade das escolas, seria melhor que as escolas parassem suas atividades por um tempo e reavaliassem tudo, do currículo as estruturas físicas e pedagógicas. Uma comissão seria constituída na escola para fazer o levantamento completo da realidade. Talvez o que causaria mais impacto seria constatar a enormidade de livros didáticos, revistas e caixas e mais caixas de materiais didáticos de apoio que jamais foram utilizados. Se quantidade de livros e materiais didáticos fosse sinônimo de qualidade de ensino, o Brasil seguramente estaria entre os primeiros países classificados no ranque do PISA.  

Prof. Jairo Cezar









   

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