sexta-feira, 16 de dezembro de 2016


 AS DIFICULDADES E OS DESAFIOS PARA A INCLUSÃO DO DEFICIENTE VISUAL

MÁQUINA DE ESCREVER BRAILLE

Fazendo uma breve retrospectiva de importantes civilizações quanto as suas concepções em relação ao tratamento de pessoas com certas deficiências como a cegueira, há de se convir que as posições e interpretações sobre o assunto são distintas uma das outras.  Tais observações são importantes para compreender o desdobramento social, cultural e político no tempo e no espaço e suas contribuições para a oficialização de políticas públicas que tornam pessoas com deficiências, integradas socialmente. 
Enquanto em certas culturas o deficiente visual era concebido como incapaz, dependente, chagando ao extremo da sua condenação à morte, no Japão, Grécia, Roma, eram venerados e vistos como sujeitos especiais e dotadas de extraordinárias habilidades cognitivas. Muitos desses “especiais” se tornavam letrados, historiadores, poetas e contadores de histórias. O Egito, na antiguidade era conhecido como o território dos cegos. Isso se deve pelo fato da alta incidência de calor e poeira que derivavam em lesões nos olhos das pessoas.

IMPRESSORA BRAILLE
 Com o tempo e com as transformações no campo social e econômico, o deficiente visual tornar-se-ia um entrave social, que incluído com mendigos e desocupados, redundou em legislações que lhes assegurariam abrigo e assistência por parte do Estado. Essa condição de discriminação se manteve durante toda a idade média. Nas diversas passagens e interpretações bíblicas do passado, se justificava a cegueira como fruto do pecado, da falta de fé, ou seja, um castigo de divino. Portanto, nas muitas literaturas, lendas, contos, o deficiente visual ou cego sempre teve relegado a algo ruim, negativo.
A superação de tais preconceitos começou a mudar nos últimos duzentos anos quando diversas culturas elaboraram legislações assegurando aos deficientes direitos de acessibilidade social. Um dos acontecimentos marcantes da história na metade do século XIX e que acarretou transformações importantes na vida dos deficientes visuais foi a invenção do sistema de leitura Braille. Durante as duas grandes guerras mundiais foram potencializados programas para reabilitação de operárias e outros incapacitados decorrentes dos efeitos da guerra. No Brasil, as primeiras iniciativas de assistência e reabilitação de pessoas especiais ocorreram na década de 1950, porém foi em 1960 que se criou o primeiro centro de reabilitação de pessoas com deficiência.

SOROBÃ - MATEMATICA PARA DEFICENTES VISUAIS

A constituição de 1988 trouxe pequenos avanços no que tange as políticas dedicadas às pessoas com necessidades especiais. Na esteira da CF (Constituição Federal) outras leis foram criadas e artigos da constituição regulamentados relativos ao tema. No entanto, muitas dos direitos embora assegurados não estão sendo suficientes para suprir as demandas, sucedendo no constrangimento e dependência dos deficientes ao assistencialismo barato e humilhante.  A promulgação da LDB, lei n. 9394/96 se configurou, mesmo frente às limitações e aos jogos de interesses individuais, em importantes progressos na educação brasileira, onde contemplou também o ensino especial.  Está escrito no capítulo V da LDB e distribuídos nos artigos 58; 59 e 60 as normatizações que tratam sobre essa modalidade de ensino.


Como forma de dar mais ênfase ao tema deficiência visual, em 1999, o ministro da educação do governo Fernando Henrique Cardoso lançou portaria n. 1.697/99 no qual estabeleceu entre outras medidas a acessibilidade nas unidades de ensino para atender estudantes com deficiência física, visual e auditiva. No item que trata sobre deficiência visual, a portaria define que as escolas que atendem tais estudantes deverão ter a disposição: lupas, réguas de leituras; escâner acoplado no computador; máquina de datilografar, impressora braile, etc. Apesar de as legislações em vigor procurarem assegurar aos deficientes visuais as mesmas oportunidades de ascensão social, a realidade escancara um cenário um tanto quanto preocupante, pelo fato das unidades de ensino não oferecerem condições estruturais e pedagógicas satisfatórias para o desenvolvimento pleno do educando.


Se as legislações que estão a disposição dedicam-se a inserção do indivíduo com necessidades especiais à sociedade, não cabe tão somente ao profissional, segundo professor, arcar com todas as responsabilidades pelo sucesso ou fracasso no processo educativo.  É rara a oferta de cursos ou oficinas por parte do estado para os demais profissionais docentes que lidam diariamente com estudantes especiais, muitas vezes na dependência exclusiva do segundo professor. Todo processo pedagógico, planejamento e atendimento individualizado ficam sob a responsabilidade do profissional especializado que o acompanha diariamente.
No que correspondem as patologias, cegueira absoluta, parcial, congênita ou adquirida, o resultado do sucesso ou fracasso do individuo até a fase adulta vai depender de um longo e espinhoso caminho que deverá iniciar desde a tenra idade. Todos os profissionais que acompanham crianças e adolescentes portadores de cegueira no cotidiano da sala de aula deveriam ser munidos de um completo acervo de conhecimentos relativos ao tema. A primeira etapa do processo de formação seria a compreensão etimológica do conceito deficiência, as causas e as patologias que conduzem a perda total e da baixa visão.
De fato essa etapa correspondente às patologias cabe ao profissional da medicina fazer, pois requer o conhecimento sistematizado sobre miopia, cataratas, degeneração molecular, glaucomas entre outras síndromes. Conforme o diagnóstico, o profissional da educação montará seu plano de trabalho adaptando o currículo segundo as peculiaridades do público a ser assistido. Para aprimorar outras habilidades, o individuo com deficiência visual necessita estimular outros sentidos, o visual, tacto, auditivo, olfato e o paladar. 
A criação dos SAEDE (Sala de Apoio ao Estudante com Deficiência) para o atendimento diferenciado tem importante papel para motivar a integração do estudante especial ao ensino normal. São espaços adaptados nas escolas contendo equipamentos pedagógicos destinados a um publico específico. A intenção é fazer com que permaneça o mínimo de tempo possível nesse ambiente para não se sentirem excluídos ou tratados diferentemente dos demais colegas de classe.


As atuais políticas relativas a definição das patologias associadas à visão, cegueira e visão subnormal, o modo como devem ser lidadas e tratadas foram definidas pela OMS (Organização Mundial da Saúde), na Suíça em 1981. Em relação ao modo como tais patologias devem ser tratadas e os reflexos no bom ou mau desenvolvimento do individuo, dependerá da educação, da cultura e do ambiente em que estiver inserido. A existência de políticas públicas informativas e educativas às famílias com crianças que apresentam deficiências visuais extremas e parciais é o primeiro passo do sucesso pedagógico quando o individuo estiver em idade escolar. 


Amiúde aos ataques dos governos à educação pública englobando igualmente a especial, é imperioso enaltecer o empenho desses profissionais, muitos dos quais verdadeiros heróis e merecedores de reconhecimento público pelo trabalho que estão prestando à educação especial. O destaque e reconhecimento especial são para os profissionais envolvidos com crianças e adolescentes que apresentam alguma deficiência visual. Na região que congrega a 22ª Gered poucos sabem que a Escola Estadual Professora Mota Pires, do bairro Sanga da Toca, mesmo com todas as dificuldades, vem executando um trabalho primoroso na região no que se refere a inclusão de estudantes cegos ao convívio social.


Por cerca de duas horas a professora Alexandra Schutz, que coordena o SAEDE acompanhando dois estudantes deficientes visuais e outros seis especiais, discorreu sobre o cotidiano da escola e seu trabalho paralelo. A professora que é pós-graduada em educação especial, falou das dificuldades, das barreiras e dos preconceitos que ainda permeiam o ambiente das unidades de ensino em relação a educação especial. O pior é que geralmente a discriminação parte dos próprios colegas de trabalho motivado pela incompreensão de como deve ser tratado o estudante deficiente visual.
A família também é outro elemento importante no processo educativo que requer atenção especial. Muitos pais ou responsáveis quando percebem que um membro da família apresenta cegueira absoluta ou parcial, chegam ao ponto de isolá-lo ao pondo de mantê-lo reclusão. No entanto, quando se conscientizam que o individuo cego possui as mesmas condições de aprendizagem e de aprimorar as potencialidades, geralmente estão com idades um tanto quanto avançadas cujas dificuldades de superação são maiores.
Na escola onde atua, a professora acompanha uma estudante de oito anos, que apresenta deficiência congênita absoluta, e um estudante de 11 anos, no qual teve a perda da visão com sete ou oito anos de idade. São dois casos distintos que sevem de modelo para compreender o papel do SAEDE como instrumento de reabilitação, aceitação, adequação e superação de traumas e preconceitos que poderão dificultar a inserção social.  Deve ser destacado que além dos dois estudantes com deficiência visual, a professora também acompanha outros seis com outras deficiências. Há o caso de uma estudante diagnosticada com transtorno fóbico, que lhe exige atenção quase que exclusiva.  Diferente dos demais estudantes especiais, os alunos cegos não necessitam do acompanhamento do segundo professor, porém, é imprescindível que seja criado ambiente apropriado para o acompanhamento das atividades complementares.

SALA DE RECURSOS - SAEDE 

Como muitos imaginam o contrário, não são necessárias grandes adaptações na escola para atender o estudante cego. Conhecendo o local, ele próprio, individualmente, se deslocará por todos os ambientes. Os bons resultados dos trabalhos com estudantes especiais exigem formação qualificada e permanente dos profissionais. A participação e o acompanhamento dos trabalhadores da área da saúde ainda hoje comprovam ser muito superficiais, comentou a professora. São mínimas as políticas públicas consistentes voltadas ao público cego e aos demais indivíduos especiais. Isso pode ser comprovada no quesito mobilidade urbana e acessibilidade.
Na escola são raros os professores que participaram de cursos de formação continuada que os capacite à auxiliar o segundo professor na sala de aula. Ressaltou a professora o exemplo de uma escola que promoveu o ensino de libras para os estudantes de uma sala onde havia uma estudante com deficiência auditiva. Não se vê iniciativa desse tipo por parte do Estado. Os próprios educadores não se sentem estimulados para buscar informações. A Fundação Estadual de Estudante Especial, em Florianópolis, tem alojamento para atender os professores interessados.


Quando a estudante com deficiência visual entrou na escola em 2014, a escola não possuía qualquer conhecimento sobre o assunto. A própria mãe desacreditava que a filha pudesse um dia se alfabetizar. A professora titular da turma não sabia o que fazer com relação à estudante cega. A própria atitude dos colegas era de superproteção, haja vista que a sala havia desenvolvido programa de apoio solidário conhecido como “ajudante do dia”, tendo também o ajudante da estudante cega. Foi necessário desconstruir essa visão destorcida em relação ao modo como deve ser tratado o indivíduo cego, que ele ou ela podem aprender individualmente. 

    
Relatou a professora que os estudantes cegos desenvolvem habilidades específicas como o aprimorando da audição, tato, gustação, etc. Isso faz com que tenham predisposição para as artes, musica canto e a manipulação de instrumentos musicais. O caso do aluno que perdeu a visão aos sete ou oito anos de idade é um caso singular. A professora informou que o processo de adaptação na escola foi mais difícil. Alguns vícios de comportamento teriam que ser superados, além é claro do elevado grau de ansiedade que desenvolveu. Tal realidade obrigou a professora a querer conhecer mais, lhe exigindo novas leituras e pesquisas de fontes relativas ao assunto. Outro empecilho ao bom desenvolvimento do aluno especial é a rotatividade de professores todos os anos nas escolas públicas. Somente em 2016, a sala do 5° ano onde estuda o aluno com deficiência visual, foram três ou quatro professores. 

Frente ao modelo de política educacional ainda muito distante do ideal, a respectiva professora que atende alunos com diferentes necessidades nessa escola, se sente apreensiva e pessimista quanto ao futuro do SAEDE na escola onde atua. Disse que para 2017 retornará para sala de aula onde lecionará para estudantes do ensino “normal”, enquanto que a sala especial será ocupada por outro (a) profissional ACT. 2016 foi um ano de intenso trabalho, pesquisa e experiências que poderá ser barrado por um sistema de ensino equivocado que não consegue visualizar as particularidades no contexto educacional.


A escola professora Mota Pires é um caso específico que deveria ser considerado pelo Estado. Por se tratar de estudantes com deficiências visuais e sendo que na região são apenas quatro profissionais capacitados para o acompanhamento desse público, deveria haver por parte do estado dispositivos legais que lhes assegurassem às vagas. Isso é claro, depois de rígido levantamento acerca do desempenho tido em classe e com as famílias dos estudantes deficientes visuais.
Informou também a professora que a partir de 2017 a aluna que possui perda total da visão estará no sexto ano, portanto, terá seis professores com seis disciplinas distintas. Condição que exigirão mais esforços e preparação dos professores das disciplinas e do profissional que atuará na sala do SAEDE. Segundo a professora, lidar com criança cega é algo complexo. O sucesso da aprendizagem não está somente no elevado conhecimento dos temas por parte dos professores. O sucesso, portanto, está  no processo didático, ou seja, nas metodologias e recursos pedagógicos adotadas para atrair e estimular a aprendizagem.


Foi enfática em afirmar que tanto ela quanto o corpo gestor da escola se esforçarão ao máximo para dificultar o acesso de professor na escola que não possua habilidades com o escrito Braile. Se todos os esforços forem em vão, a professora teme pelo futuro dos estudantes deficientes visuais. Quanto aos materiais didáticos disponíveis para o atendimento desse público específico, informou que jogos, materiais lúdicos, entre outros, foram ou são obtidos através de recursos do PDDE. Enquanto que os livros didáticos, todos os anos, no mês de outubro, são feitas a escolhas e encaminhadas à editora para as devidas adaptações. Acontece que, para 2017, a editora não encaminhou os livros que serão adotados pela aluna do sexto ano. Isso certamente gerará atraso e transtorno à escola e ao professor ACT do SAEDE no início do próximo ano letivo. 
  
Prof. Jairo Cezar
                                





































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