A
GEOGRAFIA MUITO MAIS PRESENTE EM NOSSAS VIDAS COM AS CATÁSTROFES AMBIENTAIS
https://noticias.uol.com.br/cotidiano/ultimas-noticias/2024/05/12/enchentes-rio-grande-do-sul-nivel-agua.htm
Lembro-me
que quando licenciava geografia em algumas escolas públicas estaduais de
Araranguá, com muita frequência retirava os estudantes de sala de aula e os
levava para conhecerem a geomorfologia do bairro, município, identificar os rios,
riachos, lagos, o relevo, a cobertura vegetal, bem como os problemas de
saneamento básico. Esse tipo de atividade possibilitava-os relacionar os
assuntos aprendidos em sala com a realidade do seu espaço e de todo o seu
entorno. Atualmente a geografia nunca esteve tão presente nas nossas vidas,
isso mesmo, as enxurradas, as estiagens prolongadas, os ciclones
extratropicais, tornados, entre outros tantos fenômenos climáticos extremos são
temas presentes nos currículos das nossas escolas, talvez não tão bem
trabalhados pelos nossos profissionais da área, tamanha as dificuldades
apresentadas nas escolas.
As
mudanças climáticas em curso, assunto esse que ainda sofre resistência e até
mesmo negação, deveria já estar no centro dos debates em todas as esquinas, em
todas as escolas, em todas as famílias do mundo inteiro. Em todas as estações
climáticas, todos os anos, em ambos os hemisférios, populações inteiras são
afetadas ou por calor e frio extremos, enxurradas ou estiagens devastadoras. O que
mais espanta é que o tema mudanças climáticas vem sendo discutido em todas as
partes do planeta desde a primeira conferência do clima que aconteceu em Estocolmo,
em 1972. Desde então foram 29 conferências ou COPs (Conferências das Partes) que
já consumiram somas bilionárias em logísticas, com resultados práticos
patéticos, pois o planeta continua aquecendo em níveis assustadores.
Não
há algo de errado nisso? Claro que há, pois muitos dos países participantes
dessas conferências são de fato os que mais contribuem para o aquecimento,
comercializando e queimando toneladas de combustíveis fósseis e outras
substâncias que causam o efeito estufa. O Brasil, embora não esteja no grupo
dos mais industrializados e queimadores de combustíveis fósseis, é considerado
um dos grandes emissores de Co2 e gás metano, devido a destruição das suas
florestas e a produção de commodities, grãos, carne e petróleo.
A
floresta amazônica se caracteriza como um enorme refrigerador do planeta. A perda
substancial de áreas florestadas para campos de gado e cultura da soja vem
impactando todos os demais biomas do país e do planeta. É da Amazônia que saem à
umidade em forma de rios voadores dos quais levam chuvas às regiões centro
oeste, sudeste e sul do Brasil. As ondas de calor escaldantes que se incidem
tanto no hemisfério norte como no sul estão influenciando diretamente no curso
das chuvas. No caso do Brasil, no atual outono, as temperaturas no centro oeste
e sudeste estão quatro, cinco graus acima da média para a estação. Um grande
bloqueio atmosférico está impedindo o deslocamento das frentes frias para essas
regiões. Os rios voadores em vez de transportarem umidade para essas regiões, o
forte calor faz com que essas nuvens sejam empurradas para a parede da cordilheira
dos Andes e direcionadas para o sul do Brasil.
Isso
explica as enxurradas frequentes que estão devastando os estados do sul,
principalmente Santa Catarina e Rio Grande do Sul. Não tem como achar que tudo
o que vem ocorrendo com o clima, como chover 700 mm em quatro ou cinco dias, são
fatalidades, ou seja, acontecimentos da própria natureza sem influência antrópica/humana.
O que aconteceu no Rio Grande do Sul na última semana onde dois terços do
território foram literalmente devastados por enxurradas, tem relação sim com o
modo de produção capitalista que se alimenta da exploração, depredação da
natureza. A pressão do agronegócio sobre áreas florestadas, bem como a ocupação
de áreas de riscos, margens de rios e encostas de morros, são fatores quase que
determinantes da tamanha destruição e perdas de vidas.
O
problema mais grave é que muitos governos, principalmente dos dois estados mais
afetados do sul, nos últimos anos, protagonizaram ações de supressão de políticas
da área ambiental. Tanto o RS quanto SC promoveram mudanças substanciais nos
seus códigos ambientais, tornando-os mais flexíveis, favorecendo segmentos do
agronegócio, imobiliário, entre outros. Questões
como proteção das matas ciliares cujo código florestal determinou cotas de
preservação não tão significativas para todos os biomas, os códigos ambientais
em questão, a exemplo de SC, limitou ao máximo essa porção, onde em algumas
bacias, como a do Araranguá, não supera os cinco metros de APP. O pior é que
nem esse limite, que é o mínimo do mínimo sequer é respeitado.
A
retirada da mata ciliar bem como o desmatamento de extensas áreas de floretas
no sul para dar lugar à soja, o arroz, etc, tem sendo visto por pesquisadores e
ambientalistas, como um dos principais vilões ao agravamento das tragédias ambientais
em curso. Claro que os impactos dessas enxurradas poderiam ter sido minimizados
ao máximo se a onda do negacionismo não tomasse com tanta força o imaginário de
autoridades, segmentos políticos extremistas e a sociedade, guiada pela opinião
de grupos empresariais do segmento jornalístico.
Já
foram inúmeras as enxurradas que se abateram nos dois estados do sul nos
últimos anos. Portanto, as autoridades, governos estaduais e prefeitos, ambos
têm reunido um forte cabedal de informações, experiências que podem ou poderiam
ajudar em ações para mitigar os efeitos das tragédias. A execução de planos de adaptação
as mudanças climáticas já era para estar fazendo parte dos programas governamentais
de todas as prefeituras. O que mais se ouve de muitas autoridades é a expressão
“novo normal”.
Como
assim novo normal? Esse é um tipo de consenso equivocado construído por mentes
que sempre tiraram vantagens aplicando políticas de desmontes das estruturas de
instituições públicas como as que são ligadas ao meio ambiente. Ou vocês acham
que o que aconteceu em Porto Alegre, a água passando por cima de diques e
invadindo todas as áreas baixas é algo normal? Muitos devem ter presenciado a
cena onde dezenas de pessoas tentavam barrar a água do Lago Guaíba passando
pelos diques depositando sacas de areia, sem qualquer sucesso.
A
conclusão tirada desse e outros episódios confusos, tanto em Porto Alegre como
de outras regiões do estado era de que não havia qualquer plano de ações
emergenciais o mínimo que fosse para esse tipo de situação. Fala-se muito em
reconstruir o estado devastado, porém para isso serão necessários bilhões de
reais, parte desse recurso vindo dos cofres do governo federal. Claro que são valores
bem superiores as somas que poderiam ter sido alocadas pelo Estado e Municípios
em políticas de planejamento e adaptações climáticas.
Prof.
Jairo Cesa
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