sábado, 21 de outubro de 2023

 

O CONGRESSO NACIONAL AFRICANO E O INÍCIO DO APARTHEID EM 1948

 

Embora o CNA (Congresso Nacional Africano) tenha se constituído como organização de resistência e de defesa da igualdade étnica na África do Sul em 1912, a presença de Nelson Mandela, entre outros ativistas que entraram no movimento, se deu em 1942 quando reivindicavam a transformação do CNA em Partido Político. Com a vitória do Partido Nacional, minoria branca, por meio de eleições gerais na África do Sul em 1948, dá início ao regime do Apartheid. Em 1949, centenas de ativistas, dentre eles Nelson Mandela iniciam um movimento de boicote e greves em todo país em resposta às políticas excludentes do regime que se instalou no país.

Estando o CNA reformulado, contendo agora nos seus quadros Walter Sizulo como secretário geral e Mandela como membro do comitê executivo, em 1950, Mandela fez viagem ao país inteiro promovendo campanha de desobediência civil. Como já era previsível, o governo branco instalado, o acusou de atos subversivos contra o Estado. Imediatamente Mandela foi detido em Johanesburgo, porém, mais tarde foi absolvido e mantido em liberdade condicional por seis meses. Nesse período foi impedido de participar de reuniões  públicas.

Em 1955, escreveu uma carta onde expôs seu pensamento quanto ao futuro e seu país. (FILME – MANDELA: O CAMINHO PARA A LIBERDADE) Disse que a África do Sul pertence a todos que lá vivem. Novamente foi preso em 1956 junto com outros 156 ativistas. As condições de vida da população negra e mestiça ficaram piores, quando em 1958, o governo do Apartheid baixou norma instituído a lei da passagem, que restringia o movimento de pessoas negras, ou seja, negros e brancos teriam direitos distintos.

Filme sobre a vida de Nelson Mandela


Movimentos de resistência contra o Apartheid e a eleição de Nelson Mandela em 1994

Contrárias a tais leis ditas absurdas centenas de africanos negros e mestiços saem às ruas em 1960, em protesto. A resposta da política foi violenta com o saldo de 69 pessoas mortas. O governo acusou o CNA de estar por trás das manifestações e a resposta foi torná-lo ilegal, decretando estado de emergência no país. Estando Mandela em liberdade, o mesmo, em resposta a truculência do governo, passa a articular atos violentos pelo país, sabotando empresas, minas, entre outros. Mesmo disfarçado, a polícia conseguiu capturá-lo e o levou a prisão em 1962.

Seu julgamento ocorreu em Pretória, sendo que ele mesmo se encarregou de promover sua defesa, pois era advogado. FILME – MANDELA: LUTA PELA LIBERDADE. Como se previa, mesmo com todos os argumentos e justificativas apresentadas em sua defesa, a corte o condenou a prisão perpétua. Poderia a corte ter sentenciado a pena de morte, não o fez, pois havia certeza que com a sua morte desencadearia convulsão social, guerra civil. Tanto ele quando os demais ativistas presos sofreram todo tipo de tortura. Mandela teve o joelho esquerdo quebrado, e lhe era servido alimento de três em três dias.

Filme onde retrata a vida de Mandela na prisão de Robben Island



Da prisão onde hoje é a  sede da Corte Constitucional, Mandela foi transferido para a prisão de Robben Island, uma pequena ilha próxima a Cidade do Cabo, no qual ficou preso por 18 anos. O espaço da sela onde esteve preso era estreito, tendo direito apenas a um cobertor, uma lata para fazer as necessidades e uma bíblia. No inverno o vento e o frio na ilha eram cortantes que podiam levar uma pessoa a morte em pouco tempo se não estivesse bem agasalhada. Imagine 18 anos preso em um local gélido. Tais condições insalubres, fez com que Mandela contraísse pneumonia e tuberculose, mas não foram suficientes para tirar sua vida. 

Em 1982, Mandela foi transferido para outro presídio e Junto com ele seguiu o carcereiro que se transformou em seu mordomo por nove anos. Essa relação de amizade fez com que o carcereiro lançasse um livro mais tarde com o titulo “A minha amizade com Mandela”. A década de 1980 foi decisiva para o futuro do Apartheid. Dois fenômenos se constituíram como marco decisivo para o regime de repressão e de discriminação racial chegasse ao fim depois de 41 anos. Um desses fenômenos ocorreu fora da África quando várias nações decretaram embargo econômico contra a África do Sul, arruinando a economia do país.


Livro escrito pelo carcereiro de Mandela


O massacre de estudantes em Soweto e as retaliações contra o regime do Apartheid

 

Tudo isso de seu a partir de uma manifestação espontânea de 10 mil  estudantes em Soweto em julho de 1976, que protestaram nas ruas da cidade contra mudanças no ensino que os prejudicariam. Todos os dias, no início das aulas era obrigatório cantar o hino nacional da África do Sul. As crianças se recusaram em cantá-lo, no lugar do hino entoavam canções sul africanas  cujo título de uma delas era “Deus abençoe a áfrica”.

Os professores, percebendo a rebeldia dos estudantes, os disseram que não poderiam se comportar daquela forma, pois poderiam ser repreendidos pela polícia. Quando se dirigiam para o interior das salas, saíram por um portão em direção às ruas do bairro, carregando placas contendo frases como “não queremos o idioma africâner”. Pouco instante depois, a polícia chega e começa a disparar tiros, matando 545 crianças. No instante das manifestações, um fotógrafo, que estava indo para o trabalho, entrou em uma lata de lixo e começou a fotografar, pois se a polícia os visse fotografando, sua máquina seria confiscada e ele poderia ser prisão.[1]

Antes de sair do local, decidiu retirar o filme da máquina com as imagens do massacre e o pôs dentro da cueca, fixando outro filme no local. Já fora recipiente de lixo, a polícia lhe confiscou a maquina, retirou o filme que estava dentro e a quebrou na sua frente. Ao chegar ao trabalho em Lesoto, pegou filme com as imagens e encaminhou para os jornais europeus. No dia seguinte os jornais já estavam divulgando as imagens do massacre para o mundo todo, cujas reações foram imediatas. A própria ONU realizou reunião de emergência para tratar de sansões que seriam aplicadas a África do Sul. A Índia foi o primeiro pais a decretar embargo econômico; o segundo foi a União Soviética e o terceiro a China.

A foto que realmente impactou o mundo foi de uma criança de 13 anos, Heitor Peterson, baleada pelas costas e que estava sendo carregado no colo por um jovem mais velho, um dos organizadores do movimento.  Na imagem também aparece uma menina, irmã de Hector, que também foi baleada nas costas. Hector foi colocado em um carro e transportado a um hospital, porém não resistiu aos ferimentos e veio a falecer. Sua irmã sobreviveu, porém, ficou paraplégica e vive até hoje em cadeira de rodas. Quando chegaram ao hospital, a polícia já os esperavam. O jovem, líder da manifestação foi preso e nunca mais foi visto.

Imagem de criança baleada pela polícia em manifestação ocorrida em escola pública no bairro de Soweto.

Outros países, como Suécia, Finlândia também se aliaram aos demais e decretaram embargo à África. Além dos embargos, na África do Sul os trabalhadores começam a se organizar em sindicatos adotando políticas que resultaria em forte crise na economia do país. Em vez de greve, que era proibido, os trabalhadores adotaram medidas para a redução da produção. O país cada vez enfraquecido economicamente, o governo do apartheid foi forçado a recuar  e propor um plano para por fim ao Apartheid. Em 1990, Nelson Mandela foi solto. Até hoje não se sabe quantas foram as vitimas fatais dos 41 anos do regime do apartheid.

Breve relato dos cinco anos do governo de Nelson Mandela e alguns fatos que marcaram sua vida

 

Somente entre 1990 a 1994 morreram 14 mil pessoas. Com o fim do Apartheid, em 7 de abril de 1994, ocorreram eleições livres na África do Sul sendo que o eleito, com 67% dos votos, foi Nelson Mandela, que se manteve por 05 anos na presidência.  Em cinco anos de governo construiu 2.5 milhões de casas populares, 100 escolas e 50 hospitais. O programa de casas populares continuou mesmo depois do fim do governo de Mandela. Em 2015 foram edificadas 500 mil, sendo que todos os anos 200 a 300 mil novas casas são construídas, contendo água e eletricidade de graça. Quase todas as casas populares possuem equipamentos que transformam a luz solar em energia.

  Fatos curiosos narrados pelo guia durante a viagem de ônibus até a cidade de White City, onde o grupo passaria as duas noites seguintes, pois próximo do hotel estava o Parque Kruger contendo animais selvagens na savana. Contou o guia que quando Mandela foi presidente, recebeu de presente dos trabalhadores da Mercedes bens um veículo Mercedes k-320, um dos mais modernos da fábrica, todo feito manualmente. Durante os cinco anos, Mandela usou o automóvel, porém, quando terminou o mandato fez questão de devolvê-lo aos trabalhadores.  Os trabalhadores se recusaram recebê-lo. Mandela então, em sinal de generosidade, pagou o veículo e ficou com o mesmo.

Também, no início do seu governo, se divorciou da sua segunda esposa, Winne, pois a mesma esteve envolvida em negócios fraudulentos, ou seja, tinha recebido recursos ou doações não contabilizadas. Disse que não seria ético estar casado com alguém com envolvimentos em negócios escusos. No entanto, sua separação foi apenas formal, pois se  mantiveram. Winne, como Mandela, entre outros, teve sua história ligada aos movimentos de luta pela liberdade da África do Sul. Também foi presa, torturada, e outras tantas situações de perversidades como os demais.

Winnie Madikilela – a segunda esposa de Mandela – Militante política contra o Apartheid

Na década de 1950, narrou o guia, que Mandela fez viagens para o interior do país, cujo objetivo era promover a consciência negra, especialmente nas pequenas cidades. Quando chegava nas cidades, reunia as pessoas e discursava como forma de  levantar a auto estima. Dizia que todos tinham direitos e que era necessário para assegurá-los. Pedia que todos escrevessem em papéis, o que eles queriam para a África. Os papeizinhos com as mensagens eram recolhidos e os levava consigo.

Para avaliar o tamanho da sua sensibilidade e defesa pela vida, contou o guia que quando ele viajava para a cidade de Porto Elizabeth, uma das maiores cidades de África do Sul, no caminho o automóvel que viajava atropelou uma cobra. Pediu que parasse o carro, desembarcou e foi ver o animal ferido. Quando chegou perto começou a chorar, pois se sentiu culpado por ter matado o animal. Relatou também que Mandela quando montou um escritório multirracial para atuar em questões ligadas as etnias do país, convidou para trabalhar mulheres representando as principais etnias do país. Para representar a etnia branca, indicou uma mulher Africâner chamada Zelda. Mais tarde, Zelda escreveu um livro sobre a vida com Mandela tendo como título “Bom dia Senhor Mandela”. Bom dia, Sr. MandelaBom dia, Sr. Mandela

 

Livro escrito pela secretária de Mandela onde descreve o cotidiano de um presidente da república


No livro tem uma passagem que narra o instante que ficou sabendo que Mandela queria vê-la. Seu pai, um militar, lhe recomendou que não fosse porque  poderia ser estuprada, violentada, pois Mandela era um terrorista perigoso. Quando entrou no escritório de Mandela, começou a chorar de desespero. Mandela foi até ele, pediu para se acalmar, foi à cozinha fez um chá e lhe deu como forma de respeito e carinho. Conta também o livro que Mandela não conhecia Hambúrguer, CD, não carregava consigo dinheiro e nem caneta.

Disse também o Guia que Mandela quando estava em Nova York para arrecadar fundos para sua fundação, quando estava se dirigindo para assistir um show com o cantor  Mono Vox da banda U2, que não o conhecia inda,  saindo do elevador para encontrar com o músico, a secretaria Zelda o apresentou e ele fez o seguinte comentário: “eu gosto muito de sua música sertaneja”. Disse que Mandela sempre ligava para personalidades da música e da política como Bill Clinton e Michael Jackson, pedindo dinheiro para a fundação.  

Na tradição africana é costume ainda hoje oferecer vacas como dote de casamento. Outro aspecto importante a considerar, na África do Sul a poligamia é legalizada, ou seja, os homens podem ter quantas esposas puderem sustentar. No entanto, o processo não é tão simples assim. Depois do primeiro casamento, caso queira oficializar um segundo matrimônio, o casamento ter o consentimento da primeira esposa, e assim sucessivamente.  Mandela teve 3 esposas, sendo que quando oficializou matrimônio com a última, teve que pagar 85 cabeças de gado para o pais da mesma. O rei da Suazilândia, reinado que fica dentro do território africano, o mesmo possui 18 esposas.

Prof. Jairo Cesa

 

 

 



[1] http://www.resumofotografico.com/2016/06/a-foto-que-colocou-o-mundo-contra-os-horrores-do-apartheid.html

Nenhum comentário:

Postar um comentário