quinta-feira, 13 de outubro de 2022

 

FRAGMENTOS DA COMPLEXIDADE POLÍTICA QUE PERMEIAM ALGUNS PAÍSES DA AMÉRICA LATINA

Penso ser oportuno fazer algumas considerações relativas às afirmações errôneas, maldosas, ditas por pessoas sobre sistemas de governos socialistas e comunistas. É corriqueiro ouvir de pessoas que se dizem apoiadores de Bolsonaro, quando afrontadas, responderem agressivamente: vá para a Venezuela, vá para Cuba!!! São indivíduos que pouco ou nada conhecem a fundo a realidade política e econômica desses e outros países, mesmo sendo capitalistas. Suas informações são fundamentadas em opiniões de grupos de redes sociais ou em leituras fragmentadas de sites sem qualquer credibilidade científica. O mais grave de tudo, aí sim demonstrando profunda limitação cognitiva, é de insistir taxar qualquer indivíduo que pensa que questiona o atual governo, de defender o comunismo.

Comunista na sua concepção filosófica se define aquele indivíduo ou grupo social cujas relações de convívio, de produção são compartilhadas entre os seus integrantes. No entanto, comunismo é um estágio de evolução extremamente complexo que somente foram atingidos por alguns grupos sociais bem específicos, como certas comunidades indígenas na América Latina. A Revolução Russa em 1917, primeiro país a experimentar o socialismo idealizado por Karl Marx e outros teóricos, no seu curso, vários equívocos foram cometidos pelos seus líderes resultando na sua derrocada em 1989, com a derrubada do muro de Berlim, principal fronteira entre o mundo soviético/socialista e o ocidente/capitalista.

China, Cuba, Vietnã, são países que embora se caracterizem como socialistas, tem parte da sua economia gestada por empresas do segmento privado, principalmente de altas tecnologias como o Vietnã e China. Cuba, por exemplo, mais de trinta por cento do PIB é oriundo do setor privado, na sua maioria empresas ligadas ao setor de turismo. A China é outro exemplo de nação, onde embora o Estado tenha o controle de parcela de suas empresas estratégicas, a economia é significativamente dominada por fluxos de capitais globalizados. Atualmente, são chineses e norte americanos que dominam o tabuleiro geoeconômico mundial, sendo o Brasil como parceiro econômico importante exportador de commodities a essas potências.

Já a Venezuela, país da América do Sul, jamais foi e é uma nação socialista ou comunista, como muitos insistem em afirmar que é.  Como todas as sociedades latino americanas, a Venezuela sofreu o mesmo processo de espoliação colonial a partir do século XV. A Venezuela tem no petróleo a sua principal base de sustentação econômica, grau de importância tão expressivo que lhe garantiu inclusão no seleto grupo da OPEP (Organização dos Países Exportadores de Petróleo). As crises cíclicas do capitalismo que assolam o planeta, seus efeitos são mais relevantes naqueles países cujas economias são menos diversificadas e dependentes da exportação de commodities, a exemplo da Venezuela, que depende da exportação de petróleo.

Vamos tentar aqui procurar quebrar os espectros dos termos bizarros expressados por bolsonaristas ultraconservadores/neoliberais, que demonstram sentir saudades da ditadura de 1964, usando expressões agressivas do tipo, vá morar na Venezuela, vá morar em Cuba, para aqueles que não comungam com suas concepções. Como já expressei em um parágrafo acima, Venezuela jamais foi e é uma nação comunista, e Cuba, que é socialista e não comunista, já possui mais de 20% da população do país empregada na iniciativa privada, somando mais de 30% do Píb para o país.

Afinal como está estruturado o mapa político ideológico da América latina, sabendo que somente um país, Cuba, se caracteriza como socialista, porém com uma pequena abertura para o capitalismo. Vamos entender, portanto, como cada nação ou grupo de nações da América Latina e Caribe se enquadram segundo as tendências políticas ideológicas fundamentadas no sistema de produção capitalista. Podemos começar falando sobre aqueles que se enquadram como integrantes da DIREITA CONSERVADORA. Temos exemplos do Paraguai, de Mario Abdo Benitez, atual presidente, e da Colômbia, quando governada por Ivan Duque. Ambos os líderes adotaram ou adotam posições contrárias a legalização do aborto, ao casamento do mesmo gênero, entre outras pautas conservadoras de cunho neoliberal.

O segundo grupo são aqueles classificados de DIREITA FLEXÍVEL. Temos exemplos do Chile, quando governado por Sebastião Pinheira e da Argentina, por Mauricio Macri. Embora Macri tenha realizado algumas privatizações como energias e centrais térmicas, ambas revogadas pelo sucessor Alberto Fernandes, o estadista argentino foi o primeiro a defender a legalização do aborto em seu país, posição semelhante do seu colega chileno, Pinheira. O chileno, no final do mandato, já propunha a aprovação de leis que garantisse o casamento entre os mesmos gêneros. No final de quatro anos de governo Macri, a Argentina havia contraído uma divida pública de mais de 200 bilhões de dólares.

O terceiro grupo de países são aqueles que defendem pautas ultraconservadoras, nacionalistas, anticosmopolitas, militaristas e fundamentalistas. Nesse caso, temos como exemplo o presidente brasileiro Jair Bolsonaro, considerado um DIREITISTA EXTREMISTA. Suas ideias e conceitos se aproximam de ex-presidentes golpistas como Alfredo Stroessner, do Paraguai e Augusto Pinochet, do Chile. Ambos protagonizaram golpes políticos, cujas ditaduras resultaram em centenas de milhares de mortos e desaparecidos.  

Tivemos e temos na América Latina nações e governos cujos mandatos seguiram e seguem diretrizes políticas com pautas mais progressistas no campo social e econômico. Esses grupos são identificados de esquerdas dentro do capitalismo.  Deixar claro aqui que por serem considerados esquerdistas não significa que defendam rupturas econômicas estruturais, nada disso, defendem políticos de melhor distribuição de renda e relativo controle de empresas estratégicas pelo Estado. Observando os mandatos desses países, todos, sem exceção, mantiveram algum grau de alinhamento com o sistema financeiro internacional, porém, mais focados em investimentos em programas sociais como educação, saúde, segurança, meio ambientes, etc.

Estiveram e estão nesse grupo de ESQUERDAS PROGRESSISTAS os ex-governos Tabaré Marques e José Mujica, ambos do Uruguai, e o atual presidente do Chile, Gabriel Borges. São governos que defenderam explicitamente pautas ditas progressistas como a legalização do aborto, da maconha, o casamento entre pessoas do mesmo sexo. Existem também governos dentro da esquerda latino-americana que se definem conservadores, contrários as políticas de legalização do aborto, casamento homo afetivo, etc. Entretanto, no campo social e econômico concordam que o Estado se mantenha forte e atuante na concessão e preservação de políticas que proporcionem o bem estar social. Pedro Castilho, do Peru, é um exemplo de estadista mais alinhado a esse viés social conservador, comparado a outros líderes também de esquerda, porém, mais progressistas no campo social.

Por últimos, talvez muitos queiram até discordar desse rótulo ideológico de esquerda extremista concedido a dois estadistas, um dá América do Sul, Nicolau Maduro, da Venezuela, e o segundo, da América Central, Daniel Ortega, da Nicarágua. As mídias corporativas e grupos à direita da América latina e de outros continentes definem esses dos mandatários como ditadores, por apregoarem o terror em seus países. Embora sendo governos esquerdistas, muitos alegando até esquerdistas reacionários, em nenhum momento proferiram algum discurso defendendo a estatização de toda a estrutura produtiva dos seus países.  

O caso da Venezuela é emblemático, pois o governo vem sofrendo sérias sansões econômicas, que deixaram o país desabastecido, principalmente com medicamentos para o enfrentamento da COVID 19. As mídias e o próprio governo brasileiro  se aproveitaram do momento critico vivido pela Venezuela para taxar o governo maduro de ditador, de culpado pelo quadro social e econômico caótico.    

Fato curioso é quando os mesmos que incitam aos que se opõem ao governo Bolsonaro a saírem do país e viverem na Venezuela, por serem socialista/comunista, esses mesmos que criticam têm Portugal como um dos destinos preferidos. Atualmente o país europeu é o segundo destino de brasileiros. O que muitos desses não sabem ou fingem não saberem é que Portugal é governado por um presidente socialista, isso mesmo, socialista, como outros países europeus. Portanto, por que não fazem a mesma crítica, chacota com aqueles que viajam para Portugal, na sua grande maioria para trabalhar?

Outra contradição desses que vêem no atual presidente a possibilidade de instalação de uma ditadura no Brasil e que tornará a economia mais liberal. Não sabem e deveriam estudar mais que durante o regime militar o Brasil se fechou para o mundo, quase nada era importado, em vez de privatização, foi o período de maior estatização da história recente do Brasil, mais de 300 empresas importantes passam para o regime público. Se imaginavam que estatização, passar para as mãos do Estado, é coisa de regime socialista/comunista, qual a explicação que se poderia dar aos governos militares?  

A Argentina, durante a ditadura, manteve forte comércio bilateral com a União Soviética, que era socialista!! Então, como explicar a postura dos generais argentinos, que se reafirmavam anticomunistas? Como irão reagir muitos dos adeptos ao governo ultradireitista de bolsonaro, que acreditam que somente com uma ditadura é possível solucionar os problemas econômicos e sociais, entregando tudo para a iniciativa privada. Quando souberem desses fatos envolvendo os governos militares com estatizações em massa e fechamentos brutais da economia terão surtos psicóticos.

Prof. Jairo Cesa 

https://www.brasildefato.com.br/2019/02/04/10-mentiras-sobre-a-venezuela-que-de-tanto-repetirem-se-tornaram-base-para-opiniao

https://www.bbc.com/portuguese/internacional-62598789

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