MOVIMENTO
TERRA LIVRE: A RESITÊNCIA CONTRA O GENOCÍDIO INDÍGENA INTITUCIONALIZADO PERMANECE
O encontro em Brasília que reúne mais de cinco mil
representantes das populações indígenas, deve se configurar como um dos fatos
mais relevantes e decisivos dos últimos tempos à garantia da sobrevivência às
mais de 300 etnias. Nesse ano o tema escolhido para o 18 evento foi –
“Retomando o Brasil: demarcar territórios e aldear a política”. Nos quinhentos e
vinte e dois anos de ocupação de suas terras pelos portugueses, a luta hoje dos
que resistem ao permanente genocídio é a demarcação das áreas ainda não regularizadas,
entre outras demandas.
A ascensão de um neofascista/genocida à presidência
da república resultou em um abissal retrocesso às poucas conquistas asseguradas
constitucionalmente. O avanço do agronegócio, a grilagem homicida, o garimpo
ilegal, são alguns dos inúmeros modos ilícitos utilizados pelo capital para
ocupar, expulsar e matar indígenas e demais comunidades tradicionais.
Um dos temas polêmicos na agenda de debates no
acampamento Terra Livre Brasília será o PL 191/2020 que trata sobre a mineração
em terras indígenas. O tema mineração ganhou mais relevância nos últimos dias em
decorrência dos conflitos que estão ocorrendo no leste da Europa envolvendo
Ucrânia e Rússia. A Rússia, por exemplo,
é um dos maiores exportadores de potássio do mundo, insumo químico necessário
ao agronegócio. Mais de 70% desse fertilizante é importado pelo Brasil.
Frente ao conflito na Ucrânia e a dificuldade para a
importação desse e outros insumos, o governo Brasileiro, de modo astuto, pôs na
pauta de prioridades do congresso nacional a votação urgente do PL 191/2020 que
permite a mineração em terras indígenas em caráter emergencial. A justificativa
da urgência do PL se deve ao fato de as jazidas desse mineral estar em
territórios indígenas, argumento esse que não condiz com a realidade. Conforme
levantamento geológico sobre recursos minerais no Brasil, somente 11% dos
milhões de toneladas de potássio estão em área indígenas. Sendo assim, 2/3 de
todo o potássio brasileiro estão nos estados do Sergipe, Minas Gerais e São Paulo.
Então ficou claro, mais uma vez que o governo
federal se utiliza de artifícios enganosos para continuar passando a boiada
sobre legislações de proteção ao meio ambiente, comunidades indígenas e
quilombolas. Essa PL, em questão, já de entrada afronta a própria constituição
federal, nos seus artigos 231§ 7º; 171 §§ 3 e 4. Além de afrontar regras
constitucionais, o projeto de lei desconsidera acordos assinados pelo governo
brasileiro na convenção da OIT (Organização Internacional do Trabalho).
Mesmo com as investidas do atual governo federal e
do congresso nacional em querer exterminar os verdadeiros donos das terras
invadidas pelos portugueses há mais de quinhentos anos, o 18 encontro Terra
Livre em Brasília, mostrou que os povos indígenas estão preparados para resistir.
Um dos temas norteadores do encontro foi estimular a participação indígena nos
pleitos eleitorais municipais, estaduais e federais. Essa demanda de cunho
eleitoral é compatível ao tema do encontro, pautada na demarcação territorial e
no aldeamento da política.
É consenso de que tendo maior representatividade de
indígenas em espaços importantes de decisão como o congresso, por exemplos,
muitos projetos de lei em tramitação hoje e que impactariam a vida desses povos
poderiam ter mais dificuldades para a sua aprovação. Nas eleições municipais de
2020 houve 2.111 candidatos indígenas. Desse total foram eleitos 236, sendo 214
vereadores, 10 prefeitos, 12 vice-prefeitos. Dos 513 deputados federais eleitos
em 2018, há apena uma deputada indígena eleita pelo estado de Roraima.
Não há duvida que o aspecto institucional seja
importante como instrumento paliativo de resistência as investidas do capital.
No entanto, somente esse dispositivo não, lop0se mostra suficiente para assegurar
todos os direitos, principalmente à salvação do planeta. Pode ser útil como
estratégia de construção de novos consensos, de um empoderamento político das
bases.
É consenso que a eleições previstas para o próximo mês
de outubro é decisiva a sobrevivência para as mais de trezentas etnias que
habitam o território brasileiro. O esforço desses grupos e dos mais de cem
milhões de brasileiros é por um fim definitivo nesse terrível cenário de
retrocessos sociais, ambientais, patrocinado pelo governo Bolsonaro e o
congresso nacional. As propostas que estão em pauta no congresso para serem
votadas ou ratificadas pelo TF dão uma noção do tamanho da encrenca que atinge
diretamente as populações indígenas.
Além do PL 191/20 que permitirá a mineração em
território indígena, existem também o PL 6299/02, que flexibiliza o uso de
agrotóxico; o PL 2159/21, que trata sobre o afrouxamento da licença ambientai e
os PLs 2633/20 – 510/21, relativo à grilagem de terras públicas. Os ataques não
se encerram por aí. O assunto mais polêmico e recheado de muita expectativa por
todas as nações indígenas é a votação no próximo me de junto no TF do PL 490/07
obre o marco temporal, ou seja, sare ocupada por indígena depois da constituição
de 1988.
Toda a polêmica se deu a partir do processo
demarcatório envolvendo a terra indígena Ibirama La Klãnõ, habitada por povos
das etnias Xokleng, Kaigang e Guarani. Quem conhece um pouco da historia desses povos
no estado de Santa Catarina sabe da tragédia que se abateu sobre ele, com
destaque os Xokleng, literalmente dizimados pela ação de bugreiros, para
escravisá-los ou limpar o território atendendo interesses das companhias de
imigração.
Os poucos índios que sobreviveram à hecatombe vivem
em pequenos enclaves/reservas, permanentemente ameaçados por ações de grupos
econômicos e até mesmo pelo próprio Estado interessado em tomar as terras para
projetos de infraestrutura. O caso do povo Guarani Mbyá na região do Morro dos
Cavalos, Palhoça/C, é um bom exemplo de violência patrocinada pelo Estado.
Tanto esse povo quanto outros tantos espalhados pelo território brasileiro
vivem sob permanente ameaça de caçadores, garimpeiros, madeireiros e grileiros
e do próprio governo federal e do congresso com projetos de leis homicidas.
A questão envolvendo a área em litígio em Ibirama
reivindicada pelo povo Xokleng, a decisão a ser tomada pelo STF em junho
próximo, caso seja favorável a esse povo, influenciará em muitos outros casos
similares em todo o Brasil. A tese defendida por governistas e até mesmo por um
integrante do STF favorável ao marco temporal é de que a terra pretendida estava
já ocupada por pequenas propriedades agrícolas ou fazendeiros.
É claro que até a data da seção do supremo haverá
uma forte mobilização dos povos indígenas e da população em geral para que a
corte decida contrário ao Marco Temporal. Na hipótese de vitória ao PL 490, não
teremos dúvida que se deflagrará em território brasileiro uma verdadeira ação
genocida às populações indígenas que não cederão a mais uma violência branca
contra o pouco do que sobrou da suas terras tomadas há mais de quinhentos anos.
Prof. Jairo Cesa
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