quinta-feira, 10 de fevereiro de 2022

PERMANENTES DESMATAMENTOS ESTÃO POR TRAS DAS SUCESSIVAS E PROLONGADAS ESTIAGENS QUE ASSOLAM SANTA CATARINA

Jornal de circulação regional no sul de Santa Catarina trouxe na capa a seguinte manchete: Prejuízos causados pela estiagem somam quase 16 milhões em Içara. O problema da estiagem não problema exclusivo somente desse município. O estado inteiro, especialmente o oeste e o extremo oeste já vem enfrentando a falta de chuvas há vários meses, com prejuízos incalculáveis à agricultura, atividade que é responsável por parcela significativa do PIB estadual.

De fato o sul do Brasil está sob a influência do la niña, fenômeno climático que resulta na redução do fluxo de chuvas nessa região. Ao mesmo tempo em os fluxos pluviométricos são escassos no sul do Brasil, na outra ponta, sudeste e nordeste são acometidos por enormes precipitações. Além de São Paulo, Minas Gerais, que sofreram violentas enxurradas, no estado da Bahia, cidades como Itabuna, Ilheus, entre outras, foram literalmente devastadas pela força das águas.

É importante destacar que fenômenos climáticos extremos localizados como os relatados acima são reflexos sim do aquecimento global, cada vez mais real e presente nas nossas vidas. O que é curioso e ao mesmo tempo espantoso é o fato de mesmo com a realização de importantes encontros milionários como as COPs, a exemplo de Glasgow, na Escócia, os desmatamentos na Amazônia e a queima de combustíveis fósseis vem crescendo exponencialmente no mundo inteiro.

A comunidade científica mundial vem insistentemente alertando que a terra já atingiu o seu limite máximo de aquecimento, que daqui em diante todos os países deveriam, sem perda de tempo, dar início aos programas de redução de emissões de gases causadores do efeito estufa.   As violentas ondas de calor escaldante registradas no Canadá, EUA, Austrália e no Cone Sul (Argentina, Uruguai, Paraguai e Brasil) são sinais evidentes de que a terra está no seu limite crítico, ou mudemos nossa relação com ela ou ela mesma nos eliminará como já aconteceu no passado com os dinossauros.  

Diante de um cenário climático preocupante, o que seria obvio por parte de países como o Brasil era o fortalecimento de um consenso envolvendo os setores produtivos, poderes legislativos e executivos, em defesa de todos os biomas, principalmente o amazônico. Infelizmente não é exatamente o que vem se sucedendo, muito pelo contrário. Quem acompanha os noticiários diários, todos os biomas brasileiros estão sofrendo expressivas perdas da sua cobertura florestal pressionada principalmente pelo agronegócio. Floresta Amazônica, Serrado e a mata atlântica são, inquestionavelmente, os biomas mais impactados.

A cultura da soja e a pecuária estão devastando milhões de hectares de áreas de florestas. O agravante é que no serrado estão as nascentes de rios importantes como o rio Paraná, Parnaíba, São Francisco, entre outros.  O estado de Santa Catarina, como outros estados, seus governos vem procurando flexibilizar legislações ou impor reformas estruturais na mesma linha do governo federal. O segmento ambiental, sem sombra de dúvida, foi o mais visado pelos detentores do poder. Santa Catarina sempre foi considerado um estado pujante na agricultura. Entretanto, nas últimas décadas parcela significativa da cobertura vegetal primária foi completamente devastada, dando lugar à cultura da soja, milho, arroz, etc.

Para agravar ainda mais o preocupante cenário, nem mesmo as APPs das margens dos rios e topos de morros foram respeitadas. O código ambiental catarinense elaborado em 2009, no qual serviu de modelo ao código florestal brasileiro é um bom exemplo de retrocesso ambiental. O fato é que o código catarinense foi objeto de várias ações na justiça por ser menos restritivo ambientalmente que o código florestal brasileiro, aprovado em 2012. Por treze anos, os catarinenses adeptos ao permissivo código ambiental de 2009 vinham, insistentemente, tentando convencer a população da necessidade de revisar o código ambiental em vigor sancionado em 2014.

A alegação era de que o mesmo se mostrava incompatível à atual realidade. Claro que tudo foi uma jogada política, um esquema envolvendo grupos econômicos interessados em estender seu domínio sobre áreas consideradas protegidas. A ALESC, no entanto, assumiu o compromisso de criar cenários apropriados para dar a sentido de que o processo de revisão foi participativo, democrático. É aqui que está o imbróglio. ONGs, Universidades, Secretaria da Educação do estado e até mesmo a Polícia Militar Ambiental ficaram de fora dessa manobra institucional.

Foram oito audiências públicas no estado, sendo que quase todos os participantes, representantes de entidades, pouco se divergiram com as propostas lançadas ao novo código ambiental.  E por que será?   Um exemplo de proposta considerada como um grande retrocesso foi o que trata sobre multas ambientais aplicadas, que poderão ser pagas em até 24 parcelas, podendo ser aumentada para até 60 parcelas, mediante o oferecimento de garantia real. Essa nova redação garante a impunidade dos que cometerão infração ambiental.

É o estímulo ainda maior ao desmatamento, principalmente do bioma da mata atlântica, profundamente ameaçado pela indústria da especulação imobiliária. Mais ameaçado ainda com a redução de poderes da Polícia Militar Ambiental, que não poderá mais lavrar auto de infração ambiental. A atribuição agora do órgão será apenas emitir notificação de fiscalização e encaminhar ao órgão licenciador.  Nesse caso, o órgão licenciador citado será o IMA (Instituto do Meio Ambiente). Quem conhece um pouco o histórico desse órgão estadual do meio ambiente, antiga FATMA, sabe da sua forte parcialidade no trato das questões infracionárias.

Por ser um órgão estadual, os cargos de chefias ou de presidentes são indicados pelo governador do estado. Nas várias inserções realizadas pela PMA e que resultam em autos de infração, parcela significativa dos autuados foram médios e grandes proprietários de terras e gestores municipais. É possível que o tratamento dado pelo IMA aos futuros casos infracionários não terá o mesmo peso dado pela PMA.

Para beneficiar ainda mais os infratores ambientais, o novo Código Ambiental instituiu o JARIAs (Juntas Administrativas Regionais de Infrações Ambientais). Vendo como as juntas serão constituídas, sua criação é mais um instrumento de proteção àqueles que cometerão crimes ambientais. Por que essa certeza de impunidade? Observe quem compõem as JARIAs: 1(um) representante do IMA,  1(um) representante da PMA; 1(um) Secretário da Agricultura e 3 (três) representantes do setor produtivo. Com esse formato, é o mesmo que colocar uma raposa para cuidar do galinheiro.

Outro tema discutido em quase todas as audiências foi em relação às araucárias, espécie ameaçada, que com o novo código poderá ser extraída por meio de manejo adequado. Mais uma vez, ratifico a preocupação dos defensores dessa espécie acerca da decisão. O fato é que os órgãos fiscalizadores, IMA, PMA, carecem de estrutura mínima para exercer tal incumbência.  Ninguém duvida que com a permissão para a exploração sustentável da Araucária, milhares de árvores centenárias serão suprimidas comprometendo o futuro genético da espécie.

Prof. Jairo Cesa

 

 

https://leisestaduais.com.br/sc/lei-ordinaria-n-18350-2022-santa-catarina-altera-a-lei-no-14-675-de-2009-que-institui-o-codigo-estadual-do-meio-ambiente-e-estabelece-outras-providencias-e-adota-outras-providencias    

https://advambiental.com.br/prin     


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