NOSSA
CASA COMUM, A MÃE TERRA
Todas
as pandemias que se tem notícia tiveram suas origens em momentos de enorme instabilidade
econômica e ambiental. A peste negra que dizimou milhões de pessoas durante a
idade média, bem como a gripe espanhola no começo do século XX, são dois
exemplos que ilustram bem esses dois momentos distintos. Depois da gripe
espanhola que matou cerca de 50 milhões de pessoas no mundo, a primeira e
segunda guerras mundiais, juntas conseguiram superar a gripe em vinte milhões a
mais de vítimas. Isso mostra o estrago que um vírus pode causar a toda uma
geração.
Ninguém
imaginava que outra pandemia com dimensões parecidas com a gripe espanhola
pudesse ocorrer um dia. A AIDS, nos seus mais de trinta anos de existência
ceifou a vida de milhares de pessoas no mundo. Até o momento, não foi
encontrado uma vacina que pudesse evitar o seu contágio. Porém, um coquetel de
comprimidos faz com que o indivíduo contagiado consiga ter uma vida normal.
Outras
doenças também contagiosas protagonizaram momentos de grande tensão no mundo,
como as GRIPE SUÍNA, EBOLA, SARS, o MAL DA VACA LOUCA, etc. Não há como deixar de listar outras patologias, algumas letais, transmitidas por
insetos, como a DENG, FEBRE AMARELA, ZICA VÍRUS, CHIKUNGUNYA. Não há dúvida
que quase todas as endemias, epidemias ou pandemias conhecidas, seus vetores
são animais oriundos de áreas silvestres que sofreram algum tipo de intervenção
atropica, humana.
Nos
últimos cinqüenta anos o planeta vem passando por perigosas transformações, com
impactos quase que irreversíveis em todos os biomas conhecidos. O modelo
econômico vigente, do qual se nutre da exploração irracional dos recursos
naturais, vem dando sinais de que é preciso repensar esse modelo produtivo,
pois resultará na extinção da espécie humana.
O
aquecimento global vem dando sinais claros de que a terra está no seu limite
máximo de exploração, que não havendo ações emergenciais, o planeta terá todos
os recursos necessários à sobrevivência humana estagnados, inclusive a água. Os
governos das nações mais ricas como EUA, China, Japão, vinham resistindo ao
máximo em acatar as determinações dos encontros de cúpula sobre o clima global.
Para
evitar um possível colapso climático, as potências que mais degradam o planeta
deveriam disponibilizar cifras maiores de recursos para projetos que limitassem
ao máximo a liberação de poluentes à atmosfera. As comunidades científicas que
monitoram o clima global já vinham alertando de que catástrofes climáticas mais
severas estariam pra acontecer com mais freqüência nas próximas décadas do
século XXI, se os níveis de poluentes continuassem seguindo o mesmo ritmo.
Poucos
talvez imaginassem que uma catástrofe profetizada ocorreria não por meio de
estiagens ou enxurradas, que arruinariam safras inteiras de alimentos, mas de
outro modo, silencioso e invisível, um minúsculo vírus letal que mataria
milhares ou milhões de pessoas no mundo. Quem achava que os constantes alertas
vindos de pesquisadores e estudiosos do clima e da natureza sobre as ameaças
que se abateria sobre a espécie humana eram discursos falaciosos de opositores ao
capitalismo, estão agora de barbas de molho, vendo suas fortunas se esvair pelo
ralo com água.
A
pandemia do corona vírus pode ter sido desencadeada pelo modo como os detentores
do capital atuavam e atuam no manejo dos seus métodos produtivos, tanto na agricultura
como na pecuária. Na agricultura, cada vez mais novas áreas de florestas são
derrubadas dando lugar a monoculturas, mediante emprego de tecnologias
sofisticadas, dentre elas o veneno, contaminando, solo, água e alimentos.
Tanto
o desmatamento e queimadas de extensas áreas de florestas, como as registradas
no Brasil, Austrália, EUA, Portugal, nos últimos meses, ambas foram
responsáveis pela destruição de ecossistemas complexos, muitos servindo de habitats
de animais hospedeiros de doenças contagiosas. Em outros casos, muitos animais
silvestres com a destruição seus habitats são forçados a migrarem para as áreas
urbanizadas, suscetíveis ao contágio por doenças. Suínos, aves, bovinos, entre
outros espécies criadas em cativeiros, como uma fábrica, tendem a se
transformarem em hospedeiros de vírus transmissores de moléstias contagiosas.
O
sistema capitalista criou verdadeiras fábricas de criação de animais confinados,
muito semelhantes a uma fábrica de produção em série. Quem já visitou uma
fazenda de suínos e frangos confinados para o mercado, deve ter observado o
tamanho estresse que esses animais estão submetidos em tais ambientes. É claro
que qualquer animal até mesmo o ser humano, submetido à ambientes estressantes,
seu organismo fica mais fragilizado e suscetível as doenças oportunistas.
A
pandemia do corona vírus tenderá a provocar profundas transformações no sistema
capitalista, pois ficou explícito que o livre mercado não consegue dar conta de
conter a grave crise produzida pela doença. A ideia de estado mínimo tão
desejado pelos defensores do neoliberalismo colapsou. Como em outras oportunidades
no passado, a exemplo da crise de 1929 e o pós- segunda guerra, o Estado
assumiu papel decisivo recuperando empresas, bancos, com bilhões de dólares dos
cofres públicos.
Será
que mais uma vez a história se repetirá, a exemplo das crises passadas, através
do socorro do Estado salvaguardando o que restará do capitalismo em chamas? Se isso
ocorrer, com certeza a sociedade global não mais olhará o sistema de livre
mercado como antes. As relações de produção não serão mais a mesma. Os
governantes tenderão a adotar políticas visando melhorar sistemas de
infraestrutura na tentativa de reduzir as desigualdades sociais.
A
crise da pandemia da corona vírus deixará uma grande lição. As desigualdades
sociais criadas pelo capitalismo contribuíram para o agravamento da
proliferação da pandemia. A doença não escolheu a quem contaminar primeiro,
ricos e pobres, sentiram na pele o terror de um mal que poderia ter sido
minimizado se serviços essenciais como saúde fosse priorizado. Os países que
priorizaram esse seguimento, os números de infectados e mortes foram bem
menores.
O
Brasil é um bom exemplo de país onde investimentos em serviços públicos de saúde,
educação, segurança e saneamento básico são pífios. Nas últimas décadas parcela
significativa de recursos públicos foram destinados a execução de projetos
mirabolantes e fúteis, como a construção de arenas esportivas bilionárias para olimpíada
e a copa do mundo. Esses espaços, depois dos eventos esportivos, permaneceram
ociosos. O que é irônico é saber que muitos desses espaços foram montados
hospitais improvisados para atender o público infectado pelo corona vírus.
Os
governos estaduais e federal vêm insistentemente lançando campanha atreves dos meios
de comunicação pedindo para as pessoas não saírem de casa para não serem
contaminadas. Diante dessa campanha, como ficam os 13 milhões de pessoas que
vivem nas favelas, outros seis milhões sem moradia justa, trinta e cinco
milhões sem acesso a rede de abastecimento de água e a metade da população, cem
milhões, que não possuem rede de coleta e tratamento de esgoto. Tudo isso são fatores
agravantes do corona vírus no Brasil.
Sem
um sistema de saúde satisfatório, essas comunidades pobres onde famílias vivem
apinhadas em pequenos cômodos, no momento que o vírus lá chegar o colapso do
sistema de saúde já colapsado, se transformará em um filme de terror. O individualismo
apregoado pelo capitalismo não terá mais motivo de existir. As comunidades onde
os laços de solidariedade são mais presentes, as dificuldades do dia a dia são
resolvidas mais rapidamente.
Entretanto,
o que esperar do futuro pós pandemia. Não há dúvida que as pessoas sairão das
suas clausuras mais sensíveis, reconhecendo que o convívio comunitário saudável
somente será possível, cuidando de si e do outro. Nossa casa comum, nossa
terra, deve ser entendida como local de todos, compartilhando o mesmo ar, a
mesma água, o mesmo alimento. Estaremos agindo com ética conosco e com as
futuras gerações, quando entregarmos em condições ideais de sobrevivência
aquilo que foi nos presenteado por uma complexa combinação de átomos há cerca
de cinco bilhões de anos, nossa minúscula e sensível mãe terra.
Prof.
Jairo Cezar
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