domingo, 5 de abril de 2020


NOSSA CASA COMUM, A MÃE TERRA

Todas as pandemias que se tem notícia tiveram suas origens em momentos de enorme instabilidade econômica e ambiental. A peste negra que dizimou milhões de pessoas durante a idade média, bem como a gripe espanhola no começo do século XX, são dois exemplos que ilustram bem esses dois momentos distintos. Depois da gripe espanhola que matou cerca de 50 milhões de pessoas no mundo, a primeira e segunda guerras mundiais, juntas conseguiram superar a gripe em vinte milhões a mais de vítimas. Isso mostra o estrago que um vírus pode causar a toda uma geração.
Ninguém imaginava que outra pandemia com dimensões parecidas com a gripe espanhola pudesse ocorrer um dia. A AIDS, nos seus mais de trinta anos de existência ceifou a vida de milhares de pessoas no mundo. Até o momento, não foi encontrado uma vacina que pudesse evitar o seu contágio. Porém, um coquetel de comprimidos faz com que o indivíduo contagiado consiga ter uma vida normal.
Outras doenças também contagiosas protagonizaram momentos de grande tensão no mundo, como as GRIPE SUÍNA, EBOLA, SARS, o MAL DA VACA LOUCA, etc. Não há como deixar de listar outras patologias, algumas letais, transmitidas por insetos, como a DENG, FEBRE AMARELA, ZICA VÍRUS, CHIKUNGUNYA. Não há dúvida que quase todas as endemias, epidemias ou pandemias conhecidas, seus vetores são animais oriundos de áreas silvestres que sofreram algum tipo de intervenção atropica, humana.
Nos últimos cinqüenta anos o planeta vem passando por perigosas transformações, com impactos quase que irreversíveis em todos os biomas conhecidos. O modelo econômico vigente, do qual se nutre da exploração irracional dos recursos naturais, vem dando sinais de que é preciso repensar esse modelo produtivo, pois resultará na extinção da espécie humana.
O aquecimento global vem dando sinais claros de que a terra está no seu limite máximo de exploração, que não havendo ações emergenciais, o planeta terá todos os recursos necessários à sobrevivência humana estagnados, inclusive a água. Os governos das nações mais ricas como EUA, China, Japão, vinham resistindo ao máximo em acatar as determinações dos encontros de cúpula sobre o clima global.
Para evitar um possível colapso climático, as potências que mais degradam o planeta deveriam disponibilizar cifras maiores de recursos para projetos que limitassem ao máximo a liberação de poluentes à atmosfera. As comunidades científicas que monitoram o clima global já vinham alertando de que catástrofes climáticas mais severas estariam pra acontecer com mais freqüência nas próximas décadas do século XXI, se os níveis de poluentes continuassem seguindo o mesmo ritmo.  
Poucos talvez imaginassem que uma catástrofe profetizada ocorreria não por meio de estiagens ou enxurradas, que arruinariam safras inteiras de alimentos, mas de outro modo, silencioso e invisível, um minúsculo vírus letal que mataria milhares ou milhões de pessoas no mundo. Quem achava que os constantes alertas vindos de pesquisadores e estudiosos do clima e da natureza sobre as ameaças que se abateria sobre a espécie humana eram discursos falaciosos de opositores ao capitalismo, estão agora de barbas de molho, vendo suas fortunas se esvair pelo ralo com água.
A pandemia do corona vírus pode ter sido desencadeada pelo modo como os detentores do capital atuavam e atuam no manejo dos seus métodos produtivos, tanto na agricultura como na pecuária. Na agricultura, cada vez mais novas áreas de florestas são derrubadas dando lugar a monoculturas, mediante emprego de tecnologias sofisticadas, dentre elas o veneno, contaminando, solo, água e alimentos.  
Tanto o desmatamento e queimadas de extensas áreas de florestas, como as registradas no Brasil, Austrália, EUA, Portugal, nos últimos meses, ambas foram responsáveis pela destruição de ecossistemas complexos, muitos servindo de habitats de animais hospedeiros de doenças contagiosas. Em outros casos, muitos animais silvestres com a destruição seus habitats são forçados a migrarem para as áreas urbanizadas, suscetíveis ao contágio por doenças. Suínos, aves, bovinos, entre outros espécies criadas em cativeiros, como uma fábrica, tendem a se transformarem em hospedeiros de vírus transmissores de moléstias contagiosas.
O sistema capitalista criou verdadeiras fábricas de criação de animais confinados, muito semelhantes a uma fábrica de produção em série. Quem já visitou uma fazenda de suínos e frangos confinados para o mercado, deve ter observado o tamanho estresse que esses animais estão submetidos em tais ambientes. É claro que qualquer animal até mesmo o ser humano, submetido à ambientes estressantes, seu organismo fica mais fragilizado e suscetível as doenças oportunistas.
A pandemia do corona vírus tenderá a provocar profundas transformações no sistema capitalista, pois ficou explícito que o livre mercado não consegue dar conta de conter a grave crise produzida pela doença. A ideia de estado mínimo tão desejado pelos defensores do neoliberalismo colapsou. Como em outras oportunidades no passado, a exemplo da crise de 1929 e o pós- segunda guerra, o Estado assumiu papel decisivo recuperando empresas, bancos, com bilhões de dólares dos cofres públicos.
Será que mais uma vez a história se repetirá, a exemplo das crises passadas, através do socorro do Estado salvaguardando o que restará do capitalismo em chamas? Se isso ocorrer, com certeza a sociedade global não mais olhará o sistema de livre mercado como antes. As relações de produção não serão mais a mesma. Os governantes tenderão a adotar políticas visando melhorar sistemas de infraestrutura na tentativa de reduzir as desigualdades sociais.
A crise da pandemia da corona vírus deixará uma grande lição. As desigualdades sociais criadas pelo capitalismo contribuíram para o agravamento da proliferação da pandemia. A doença não escolheu a quem contaminar primeiro, ricos e pobres, sentiram na pele o terror de um mal que poderia ter sido minimizado se serviços essenciais como saúde fosse priorizado. Os países que priorizaram esse seguimento, os números de infectados e mortes foram bem menores.
O Brasil é um bom exemplo de país onde investimentos em serviços públicos de saúde, educação, segurança e saneamento básico são pífios. Nas últimas décadas parcela significativa de recursos públicos foram destinados a execução de projetos mirabolantes e fúteis, como a construção de arenas esportivas bilionárias para olimpíada e a copa do mundo. Esses espaços, depois dos eventos esportivos, permaneceram ociosos. O que é irônico é saber que muitos desses espaços foram montados hospitais improvisados para atender o público infectado pelo corona vírus.
Os governos estaduais e federal vêm insistentemente lançando campanha atreves dos meios de comunicação pedindo para as pessoas não saírem de casa para não serem contaminadas. Diante dessa campanha, como ficam os 13 milhões de pessoas que vivem nas favelas, outros seis milhões sem moradia justa, trinta e cinco milhões sem acesso a rede de abastecimento de água e a metade da população, cem milhões, que não possuem rede de coleta e tratamento de esgoto. Tudo isso são fatores agravantes do corona vírus no Brasil.
Sem um sistema de saúde satisfatório, essas comunidades pobres onde famílias vivem apinhadas em pequenos cômodos, no momento que o vírus lá chegar o colapso do sistema de saúde já colapsado, se transformará em um filme de terror. O individualismo apregoado pelo capitalismo não terá mais motivo de existir. As comunidades onde os laços de solidariedade são mais presentes, as dificuldades do dia a dia são resolvidas mais rapidamente.
Entretanto, o que esperar do futuro pós pandemia. Não há dúvida que as pessoas sairão das suas clausuras mais sensíveis, reconhecendo que o convívio comunitário saudável somente será possível, cuidando de si e do outro. Nossa casa comum, nossa terra, deve ser entendida como local de todos, compartilhando o mesmo ar, a mesma água, o mesmo alimento. Estaremos agindo com ética conosco e com as futuras gerações, quando entregarmos em condições ideais de sobrevivência aquilo que foi nos presenteado por uma complexa combinação de átomos há cerca de cinco bilhões de anos, nossa minúscula e sensível mãe terra.   
Prof. Jairo Cezar

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