quinta-feira, 30 de junho de 2016

ESCOLA SEM PARTIDO?: quem serão os beneficiados com a despolitização na escola pública?

Tanto eu como acredito que outros milhares ou milhões de pessoas ficam bestializados quando observam o imenso volume de besteira dita por um punhado de mentes desocupadas que vem propagando nas redes sociais e até em sites exclusivos, opiniões defendendo propostas absurdas como (escala sem partido??). Acredito que é possível até contar nos dedos alguns desses que arriscam defender tais absurdos que já transitaram por uma sala de aula, muito menos conheceu a realidade de alguma das milhares de escolas públicas espalhadas por todo território brasileiro.
São estruturas físicas quase que impraticáveis o exercício da árdua tarefa de professar ou ensinar. É claro que com tais condições de trabalho é comum que professores (as) mais inconformados (as), críticos (as), rompam o doentio silêncio que perpetua pelos corredores e expressam sua indignação criticando governos e partidos políticos descomprometidos com educação, saúde, segurança, etc, etc, bem como organizando-(os)(as) estudantes para lutarem e defenderem com bravura o “sagrado” direito de estudar com dignidade em escola pública paga com o sacrifício de todos os trabalhadores.
No entanto, é um direito cada vez ameaçado pelas políticas entreguistas e assassinas dos governos de plantão, que disponibilizam mais dinheiro para construção de presídios do que em reformas ou construção de escolas. Se quisermos uma educação realmente de qualidade precisamos, sim, gritar, mobilizar os estudantes, a comunidade, informando-os (as) das “maracutaias” promovidas com o dinheiro dos nossos impostos, onde são desviados para fins escusos, distribuídas sob a forma de propina ou caixa 2 para financiar campanhas eleitorais.
O que dizer também do dinheiro desviado da merenda escolar sem que seus responsáveis sofressem qualquer punição; de escola pública arrombada mais de trinta vezes durantes seis meses, cujo próprio governo do estado se omite em tomar qualquer providência para solucionar.  E não para por aí. Somados aos furtos, a violência contra professores e o consumo de drogas, temos que conviver também com outros problemas quase que insolúveis: goteiras por todos os cantos, rachaduras, fossas entupidas, falta de equipamentos e mantimentos como material de limpeza, papel higiênico, computadores, internet e quadra esportiva. Em entrevista realizada a um dos coordenadores da vigilância sanitária da região que congrega a 22 Gered (Araranguá), o mesmo responde que se fossem considerados todos os itens recomendados pelas legislações em vigor, talvez uma ou duas escolas das dezenas existentes permaneceriam funcionando.
O risco de acidente nessas unidades de ensino ronda às cabeças das crianças e dos (as) professores (as) todos os dias. Como ficar calado com tal desrespeito? Acredito que aqueles que vêm se prestando em gastar seu preciso tempo postando informações fúteis defendendo a proposta de “escola sem partido”, se se prestassem em visitar uma ou mais escolas públicas, como a que foi citada acima por ato de arrombamento por mais de trinta vezes, teria vergonha de continuar escrevendo tantas informações vazias, que só contribui para aguçar a violência e a despolitização social.
É ridículo e até certo modo grotesco, a falta de clareza e embasamento teórico nos argumentos apresentados para criticar conceitos e personalidades importantes no campo da educação que contribuíram com ideias para tornar a escola pública e a sociedade um pouco mais democrática e livre. Como podem afirmar tais redentores da moralidade, que professores vêm pregando apologia à idéias comunistas ou a partidos ditos de esquerda em suas aulas. Se assim o fosse, hoje a composição do congresso nacional não estaria constituído majoritariamente de deputados e senadores ultra-liberais, apoiados ou financiados certamente por muitos dos quais vem apregoando a “cassa de professores doutrinadores”.
Afinal quem elegeu tais “representantes do povo”? Um exemplo do grave equívoco cometido e do, talvez, desconhecimento do modo como funciona o interior das unidades de ensino básico públicas, é que raro são as bibliotecas que têm em seus acervos um único volume da obra o Capital de Karl Marx. Porém, quase todas devem ter em algum lugar, guardado, tanto o volume I como o II, da principal obra de Adam Smith, A Riqueza das Nações, considerada a bíblia do pensamento liberal. Então qual a escola ou professor (a) que estão fazendo alguma apologia às ideias esquerdistas?   
Nessa direção, o que se vê, contraindo os ditos “apartidários” de plantão, é o aumento vertiginoso de eleitores votando em candidatos da direita. Basta observar os números levantados pelo IBGE/2016 relacionados aos percentuais de filiados nos partidos que constitui os poderes legislativos e executivos nas três instâncias federal, estaduais e municipais.  Do total, 15,6% estão filiados no PMDB; 10%, PT e 8,9% no PSDB.  Agora vamos calcular quantos vereadores, deputados ou senadores eleitos pelo PCB, PSTU ou PSOL, considerados ideologicamente partidos originalmente de esquerda. Apenas o Psol, tem alguns representantes no congresso. Os demais, nenhum. Portanto, onde está a ideologização da escola apregoada por tais defensores desinformados.
E os absurdos não param. Quando afirmam que está havendo doutrinação em salas de aula, seus protagonistas levam em consideração pesquisa divulgada pela Revista Veja em 2008 onde discorreu ter havido presença de idéias doutrinárias em 33 escolas pesquisadas. É um número infinitamente irrisório se considerarmos os 43 milhões de  estudantes matriculados em todo território nacional. Afinal, quantos estudantes aproximadamente comporiam esse montante de 33 escolas. A própria metodologia aplicada pela revista é questionada, pois não considera outros fatores que seriam importantes para assegurar uma maior confiabilidade.   
Se o que é pretendido pelos ditos “apartidários”, defensores da escola sem partido é combater a ideologização nas salas de aula, o que dizer então da ADI 4439 encaminhada ao STF pela Procuradoria Geral da República com pedido de liminar, para discutir a inserção ou não do ensino religioso nas escolas públicas brasileiras.  Os argumentos levantados pela procuradoria tratam o ensino religioso como modalidade exclusiva de confissões religiosas, bem diferente do que está descrito na Constituição Federal que define a educação como sendo laica, ou seja, desprovida de qualquer credo religioso.    Como explicar que no Rio de Janeiro lei aprovada na Câmara de Vereadores em 2012 tornou obrigatório o ensino religioso nas escolas públicas municipais? Foram 100 professores contratados, sendo 45 para o ensino católico; 35 para o evangélico; 10 para a doutrina espírita e mais 10 para afro descendente.
Por que o mesmo grupo anti-doutrinação política partidária não fez a mesma manifestação ou página especial na internet para criticar tal proposta de lei que prega a doutrinação religiosa. Isso também não se caracteriza como doutrinação? Agora se sabe por que o congresso nacional exige que a proposta da BNCC passe pelo crivo do legislativo federal, pois inúmeros dispositivos contidos na proposta, como os que discorrem sobre questões ligadas as sociedades indígenas e afro descentes, não condiz com os interesses se seguimentos fundamentalistas presentes na casa.
Dos 19 deputados envolvidos em projetos inspirados no movimento Escola Sem Partido, 11 deles têm alguma ligação com igrejas.  Então há algo de estranho nesse confuso e intrincado movimento. Ao mesmo tempo em que se atribui, olha só, a Paulo Freire, de proselitista, atribuindo-lhe o papel de “catequizador” ou pregador de certas verdades ou ideologias extremistas na educação, se recusam a fazer a mesma inferência às bancadas proselitistas no congresso, como dos seguimentos religiosos, que exercem papeis até de manipulação para fazer valer proposições ou projetos de leis de interesse das corporações das quais representam.
São esses mesmos grupos que pregam, vejam só, a “liberdade de expressão nas escolas” que vem incentivando a aprovação de qualquer proposta que torne os ambientes escolares locais de debates mais francos e abertos sobre temas polêmicos como sexualidade e diversidade de gênero. Alegam que tais atribuições devam ser de responsabilidade das famílias. Agora imaginemos que cada família irá tratar desses assuntos segundo critérios e preceitos vinculados ao credo do qual seguem. Não se constituiria aí também certo proselitismo? Na escola, diferente do que ocorre no espaço doméstico, esses temas seriam abordados seguindo conceitos e correntes filosóficas diversificadas.
É com ênfase nessas posturas conservadoras que vem tornando o Brasil um dos países com mais relatos de violência contra mulheres e homossexuais no mundo. Impedir que o tema gênero como outros tantos ligados a grupos sociais minoritários, indígenas, negros, sejam debatidos nas escolas, atribuindo-lhes apologia política e sexual, é querer defender ainda mais propagação da violência, do preconceito e do crescimento de casos de estupros, como ocorreu no rio de janeiro, que ganhou as manchetes dos jornais do mundo inteiro.
É necessário combater com todas as forças possíveis a postura hipócrita daqueles que, sem apresentar qualquer credibilidade moral e ética, procuram desviar a atenção da população dos reais problemas das escolas, pregando ideias arcaicas que em nada irá contribuir para tirar o Brasil do secular e quase crônico atraso social e econômico. Por que não incluir nos currículos todos esses temas polêmicos? Qual o medo?
Um exemplo para comprovar o nosso atraso em vários setores, países como Nova Zelândia, Finlândia, França, entre outros, têm no seu currículo temas relacionados à homossexualidade e identidade de gênero. Observe o ranking desses países em comparação ao Brasil especialmente na área da educação. São anos luz de distância. O que deveria estar sendo discutido e defendido por essas tais “paladinos da liberdade”, no lugar do slogan Escola em Partido, deveria ser “Educação Pública e de Qualidade Para Todos”, aí sim estariam fazendo um ato nobre que certamente teria o apoio de todos.

Prof. Jairo Cezar                

2 comentários:

  1. Parabéns amigo. Muito bem exposto. Tenho muito receio das barbáries que estão sendo anunciadas por aí. Ditos "conscientes", mas carregados de ideologias. É uma pena que essas pessoas que se posicionam como "esclarecidas" ainda permanecem na "escuridão". Compartilharemos sua ideia. "Educação pública e de qualidade para todos". Rogério B. Marcelino

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