quarta-feira, 15 de junho de 2016

O MAPA DA PRESSÃO IMOBILIÁRIA NOS FRÁGEIS ECOSSISTEMAS DO MORRO DOS CONVENTOS - ARARANGUÁ/SC


Desde os primeiros encontros do projeto orla há quase dois anos, os desdobramentos nas reuniões já davam mostras de que estaria sendo forjado um cenário cujo objetivo principal era tornar oficial/legal o processo de ocupação imobiliária em áreas frágeis. O agravante é que o próprio órgão ambiental municipal, cuja função institucional é de fiscalizador, vinha e vem fazendo vista grossa a tais irregularidades e prova inflacionaria é que não falta. Essas afirmações são fundamentadas em inspeções feitas pelo MPF a partir de 2012, quando pela primeira vez a Procuradora do órgão federal, Rafael esteve no balneário, acompanhada pelo promotor público estadual Henrique Aieta; o Superintendente da FAMA, Luiz Lemmer, no qual foram constatados construções em áreas de APP sem licenciamento ambiental que uma prerrogativa essencial concedida pelo órgão ambiental municipal para qualquer tipo de empreendimento.
E não parou por ai, em 21 de fevereiro de 2013, o Oscip Preserv’Ação, encaminhou ao FAMA, oficio solicitando cópias das autuações realizadas pelo órgão ambiental contra cidadãos que descumpriram normas ambientais na parte baixa do balneário. Em resposta, o órgão ambiental encaminhou relatório contendo a lista de seis autuações, duas delas por descumprimento do artigo 41 da lei 9.605/98[1] e Art. 36 da lei complementar municipal n. 2.930 de 2010; três por infringir a resolução do Conama n. 303/02 e Art. 36 da lei municipal e um por desconsiderar o art. 4 da lei federal n. 12.651/12; resolução 302 do Conama e lei complementar municipal n. 2.930/2010. Não se tem notícia se todas as ações, multas e embargos impetrados tanto pelo órgão ambiental municipal como pela polícia ambiental foram concluídos e seus infratores púnicos como determina a legislação.
Com o aumento da demanda por áreas situadas na faixa costeira do município de Araranguá pelo fato dos terrenos tornarem-se cada vez mais valorizados, o Projeto Orla criou uma expectativa, especialmente entre os ambientalistas, que se tornaria um instrumento eficaz para restringir categoricamente a fúria da ganância imobiliária em áreas de APP. A própria escolha do local para a realização dos encontros se caracterizou como um mecanismo eficaz para excluir expressiva parcela da população da parte superior do balneário. Na verdade, nos encontros o público com participação mais efetiva se constituiu de proprietários de terrenos e empresários de imobiliário. Salvo integrantes da Associação de Moradores do Bairro, entidades ambientais e vez ou outra dois ou três moradores do bairro. E olha que a população do bairro hoje oscila entre 1500 a 2000 pessoas. Por que a não realização dos encontros no barracão da igreja católica, um espaço tradicional da comunidade que certamente convergiria um público muito maior que dos encontros no hotel.
Outro, os convites para os encontros freqüentemente eram feitos via radio ou pelas redes sociais, jamais houve a iniciativa de contratação de um carro som convidando a população para os encontros. O próprio ministério público federal somente foi encaminhado convite em junho de 2015, isso é claro, por iniciativa da própria Oscip que protocolou convite na própria sede do órgão em Criciúma. Antes da presença do procurador do Ministério Público Federal Fábio de Oliveira em um dos encontros do orla no Morro dos conventos, integrantes da Oscip participaram de reunião com o mesmo para discutir os desdobramentos do projeto e ouvir o posicionamento do órgão federal quanto a essa iniciativa. Deixou claro que não alimenta muita expectativa quanto aos resultados.
Que há outras iniciativas similares em andamento, algumas já bem avançadas cujos resultados são semelhantes ou melhores do que os pretendidos no Orla. Citou o mapeamento, através de imagens aéreas, da faixa costeira que está sendo realizado pela Secretaria de Planejamento do Estado; das reuniões que vem ocorrendo na capital do estado entre o MPF e os administradores públicos dos municípios da faixa costeira, com intuito de regularizar tais áreas, que tais propostas não são bem assimiladas pelos prefeitos pelo fato dos mesmos não quererem gerar conflitos com a população situadas nas áreas ocupadas irregularmente; que está sendo procedido ações de demarcação da linha da preamar como forma de preservar o patrimônio da união. Por fim, disse o procurador, que há outra proposta, uma terceira via que é a regularização fundiária mediante zona magro-regional, ou seja, um estudo integral de toda faixa costeira, entre Balneário Rincão e Passo de Torres, que apresentam características similares. São abordagens distintas do projeto orla que tratam de ações específicas de um micro-território fragmentado.
Nas dezenas de encontros do Projeto Orla, em nenhum momento teve a presença de algum representante do Iphan ou do IBAMA, órgãos federais importantes. Antes do início dos encontros do Orla, quando foram encaminhados convites às entidades para indicarem seus delegados, a data limite para protocolar os ofícios na FAMA era para o dia 15 de outubro de 2015. A Oscip cumpriu exatamente o prazo estabelecido. Dias depois veio informação que o prazo tinha sido prorrogado para o dia 30 de outubro do mesmo ano.  Quando deram inicio as reuniões a informação era que somente os delegados indicados e protocolados no órgão ambiental na data que foi definida, 30 de outubro teriam direito ao voto, sendo que para os demais participantes seria permitida apenas manifestação oral.
O que se esperava no primeiro encontro era que a coordenação procedesse a leitura dos nomes dos delegados e entidades únicas com direito ao voto. Nada disso ocorreu. Se o projeto orla é de iniciativa do poder público era de se esperar que a coordenação ficasse sob a responsabilidade da secretaria de obras e não do órgão ambiental municipal, sendo órgão fiscalizador e autônomo. Outro erro que passou batido. Todos nós sabemos que eventos como o projeto orla fosse procedida elaboração de ata dos encontros. Acredite, a primeira ata elaborada somente foi lavrada sete meses depois do primeiro encontro, isso graças a insistência dos participantes. Como ficam as deliberações anteriores? Diante dessa situação embaraçosa, a Oscip Preserv’ação encaminhou, em outubro de 2016, ofício à coordenação do orla solicitando cópias das atas e dos ofícios, este último identificando os delegados indicados pelas entidades.
Até o presente momento nenhuma resposta foi dada pela entidade responsável. Até que ponto tudo o que foi deliberado nesse quase dois anos de reuniões tem validade legal. No começo de 2016 a própria Oscip enviou ofício ao MPF para que fosse tornado nulo o Orla, se por ventura a coordenação não atendesse a solicitação da Oscip. E as denuncias continuaram. Outra prova que o projeto orla terá apenas papel figurativo se repetiu durante 2015 e 2016, quando proprietários deliberadamente expandiram ruas e construíram imóveis sem qualquer impedimento dos órgãos ambientais competentes. Se as discussões sobre regularizações das áreas destinadas à construção imobiliária e APPs estavam em andamento, o mínimo que se esperava era autuação do órgão ambiental municipal inviabilizado qualquer obra sem antes ter aprovado o plano diretor com os indicativos do Orla. Nada aconteceu.
A própria câmara de vereadores também intercedeu de forma irresponsável propondo também deliberadamente ações para o balneário, sem que o vereador propositor jamais tivesse tido participação de algum encontro. Portanto, a audiência pública da terça feira, quando foi apresentado o mapa do morro dos conventos constando os códigos das áreas permissíveis e não permissíveis às construções, ficou explícito aos olhos de quem enxerga o Morro além do capital, de que nosso frágil e complexo santuário está com os dias contados. A presença de cerca de cinquenta pessoas no encontro, desse total, apenas três ambientalistas, já dá uma noção a quem realmente beneficiará o projeto orla.
Prof. Jairo Cezar


[1] Art. 41. Provocar incêndio em mata ou floresta: Pena - reclusão, de dois a quatro anos, e multa. Parágrafo único. Se o crime é culposo, a pena é de detenção de seis meses a um ano, e multa.

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