quarta-feira, 18 de março de 2015

A PEC 215 (Proposta de Emenda Constitucional) e a Reedição do Polêmico Código Florestal Brasileiro

Depois das intensas manifestações ocorridas em dezembro de 2014 nas imediações do congresso nacional promovidas por indígenas de diversas nações, quilombolas, etc., e respondidas com cassetetes, balas de borracha por parte da polícia, a PEC 215/2000 que trata da transferência da homologação de terras indígenas, quilombolas e unidades de conservação para o legislativo, finalmente foi tirada da pauta de votação até segunda ordem. Na segunda feira, assistindo ao programa Roda Viva da TV Cultura, cujo entrevistado foi o presidente da Câmara Federal Eduardo Cunha, o mesmo disse com certo orgulho que uma das suas bandeiras seria o desarquivamento da PEC, que já entraria em discussão na Comissão de Constituição de Justiça, no dia seguinte, terça feira, 17 de março. Na verdade, para os ambientalistas e demais organizações que atuam em defesa do ambiente, a PEC 215, caso seja aprovada sem alteração, se constituirá em novo Código Florestal, abrindo espaço para novas ocupações de extensas áreas de florestas prestes a serem homologadas como áreas indígenas e quilombolas pelo Executivo.
 É bom que se diga que a código floresta aprovado em 2012 se caracteriza como um dos maiores retrocessos em termos de legislação ambiental de todos os tempos. A sua homologação permitiu que milhares de infratores ambientais tivessem seus crimes praticados até 2008 anistiados, bem como a flexibilização e redução das áreas de APPs em margens de rios e demais cursos de água beneficiando grandes corporações do setor imobiliário e seguimentos vinculados ao agronegócio. O resultado dessa incongruência legislativa já está sendo sentido hoje com o agravamento da estiagem e a falta de água em regiões importantes como o sudeste proporcionando impactos sociais e econômicos sem precedentes.
O desarquivamento da PEC já mobilizou lideranças políticas no congresso na qual representam os latifundiários, mineradores, madeireiros, entre outros, instaurando a Comissão Especial para apreciação do texto, que seguirá posteriormente para votação. Dentre os inúmeros parlamentares interessados na aprovação da PEC 215, os destaques são catarinenses Casildo Maldaner, senador, pelo PMDB, que concluiu seu mandato em 2014, e o Deputado Valdir Collato, também do PMDB, reeleito para mais quatro anos nas eleições do ano passado.  São deputados que direta e indiretamente tiveram ou tem relação com empresas ou setores do agronegócio interessados nessa proposta de emenda constitucional. Para se ter noção do que realmente está incutida na aprovação desta PEC, basta analisar a trajetória política desses dois parlamentares catarinenses no congresso, cujas participações sempre foram pautadas na defesa de interesses desses seguimentos, além é claro de terem votado a favor do novo Código Florestal Brasileiro em 2012.
Quanto à questão indígena, ambos a frente do parlamento jamais demonstraram qualquer sensibilidade à causa, muito pelo contrário, sempre procuraram dificultar ao máximo qualquer iniciativa que os beneficiassem, dentre elas a ação de demarcação de suas terras. Somente o senador Collato encaminhou oito projetos de lei contra os direitos indígenas. Em relação a sua condição sócio econômica, declarou possuir mais de dois mil hectares de terras, sendo a maior área no estado de Rondônia, onde se concentra o Arco do Desmatamento, ou seja, extensa área territorial que ocupa uma área de 500 mil quilômetros quadrados que vai do leste e sul do Pará, em direção oeste, passando por Mato Grosso, Rondônia e Acre. Sobre os financiamentos de campanhas eleitorais, no pleito de 2010 obteve ajuda financeira de empresas como a Bung Fertilizantes e outras dos setores sucroalcooleiros, frigoríficos e de armas e munição. 
Quanto à posição política do deputado Collato acerca do desarquivamento da PEC 215, em 2010 fez severas críticas ao um decreto que declarava área quilombola no meio oeste de Santa Catarina. O senador Casildo Maldaner, seguiu a mesma linha de seu colega parlamentar. Também, além de votar a favor do polêmico Código Florestal, sempre se posicional contra qualquer medida que garantisse direito aos indígenas. Um fato que realça sua condição de anti indígena ocorreu em 2003 quando integrava a Frente Parlamentar da Agropecuária, no qual defendeu a anulação da portaria do Ministro da Justiça que estabelecia os limites das terras da nação guarani Mbya, localizado no Morro dos Cavalos. Em 2011, outro fato emblemático envolvendo o senador. O episódio ocorreu na reunião do Fórum Parlamentar Catarinense em Brasília para tratar do encaminhamento das obras de duplicação da BR 101.
Dentre os assuntos tratados, os integrantes do fórum enfatizaram os gargalos previstos como o Túnel do Formigão, em Tubarão; Ponte de Laguna e Túnel do Morro dos Cavalos, obras complexas que teriam dificuldades para iniciar devido às licenças ambientais. No caso do Morro dos Cavalos já se sabia de ante mão o impasse envolvendo a população indígena que ocupa aquelas terra há décadas. Disse o senador Maldaner que faria de tudo para remover todos os obstáculos impeditivos à obra de duplicação. Quanto a sua renda declarada, cabe frisar que sua formação é professor do ensino fundamental. Declarou possuir cinco mil hectares de terras espalhadas nos estados da Bahia e Pará, bem como 900 cabeças de gado. A soma total do seu patrimônio estava orçada em 1.689.133,00.  Dentre as empresas financiadoras de suas campanhas eleitorais destacaram as do setor madeireiro, indústrias químicas e frigoríficas.
Portando é questionável a tamanha rapidez do congresso em querer desarquivar a PEC 215 com o argumento mentiroso de que sua aprovação beneficiará pequenos agricultores, mesmo discurso adotado na época da aprovação do Código Florestal. Mais uma vez as nações indígenas, quilombolas, afetadas com a proposta, deverão se mobilizar indo a Brasília para pressionar o congresso contra sua aprovação. Por outro lado, a população brasileira não poderá ficar assistindo os desdobramentos deitado em berço esplendido. É preciso denunciar mais essa manobra articulada por parlamentares, na maioria vinculada ao agronegócio, interessados unicamente na expansão de suas propriedades.  Além de intensificar os problemas ambientais, abre caminho para o agravamento dos conflitos contra os indígenas, que vivem a expectativa da demarcação por parte do governo federal, na qual assegurará o direito sobre as terras. 

Prof. Jairo Cezar    

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