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EXTREMO SUL DE SANTA CATARINA SOFRE AS CONSEQUÊNCIAS DO AQUECIMENTO GLOBAL
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Em
dezembro de 1995 a região do Extremo Sul do Estado de Santa Catarina foi violentamente
acometida por uma enxurrada que devastou municípios das encostas da serra
geral, com destaques Timbé do Sul e Nova Veneza. De acordo com estudos feitos
na região, o volume de chuva precipitando em poucas horas no alto da escarpa da
serra foi superior a 500 mm. Esse gigantesco volume de água, derramado em pouco
tempo, foi suficiente para provocar uma forte erosão nas encostas da serra,
arrastando toneladas de pedras e árvores em direção a planície.
Residências,
lavouras e animais foram devastados pela força da água. Foram contabilizados 16 indivíduos mortos
nessa enxurrada, sendo que quatro jamais foram encontrados. A quantidade de
árvores arrancadas pela violência da enxurrada foi de tal intensidade que
cobriu toda a orla marítima, entre a barra do rio Araranguá ao Balneário Arroio
do Silva, ambos localizados a mais de 60 km do local do ocorrido.
As ocorrências desses fenômenos climáticos como
de outros tantos, vendavais, estiagens prolongadas, ciclones extratropicais, ambos
de maiores ou menores intensidades, não são acontecimentos desconhecidos da
sociedade. O fato é que estão nos últimos anos estão se tornando mais e mais
freqüentes e com elevada carga de energia destrutiva.
O
furacão Catarina, que assolou o sul do estado em 2004, mudou definitivamente o equivocado
conceito de território brasileiro livre de furacões, tornados, etc., visão
romantizada pelas mídias tradicionais e governantes, que perdeu sentido. Os
próprios meteorologistas são categóricos em afirmar, se as médias de
temperatura global continuar subindo, acreditam que há reais possibilidades da região
sul ser afetados por novos furacões, talvez mais violentos que o Catarina.
O que traz apreensão quando o assunto é
fenômenos climáticos desse porte, é que existem protocolos no estado de Santa
Catarina para instruir a população acerca de medidas que deverão ser tomadas
para se protegerem. Porém, a população desconhece esses protocolos. Existem
outros agravantes como a redução ou corte de recursos para programas de
monitoramento e prevenção de desastres ambientais, bem como a descontinuidade
de ações institucionais motivado por trocas de governos. Na hipótese de um novo furacão se abater
sobre a região, pode, sim, provocar perdas de vidas humanas.
Quase
vinte anos depois da passagem do Catarina, houve, de certo modo, o avanço nos
sistemas de monitoramento climático em toda a extensão do território
catarinense. Três potentes radares
meteorológicos foram instalados em pontos estratégicas do estado. Mesmo com
todo esse aparato técnico a disposição e de elevado custo financeiro aos cofres
públicos, a população se mantém desprotegida dos perigos do tempo.
O
que se percebe a cada nova tempestade sobre o estado, é o elevado número de
vítimas fatais. São mortes que poderiam ter sido poupadas se as vítimas
tivessem tomado as precauções devidas. Também não dá para culpar exclusivamente
o governo por fragilidades nos protocolos. A própria população tem
responsabilidade, pois não tem levado muito a sério os alertas sobre
tempestades que são emitidos por meteorologistas ou órgãos do governo.
Esse
comportamento negacionista também é constatado quando o assunto é aquecimento
global. Isso é fato e merecedor de todos os créditos. Tanto o Furacão Catarina,
as longas estiagens e os seguidos ciclones extratropicais, como o “bomba”, que
causou a morte de 12 pessoas e deixando um prejuízo de quase um bilhão de
reais, um e outro têm relação direta com o que está se sucedendo no clima
global. O Brasil é, sem dúvida, um dos protagonistas da elevação da temperatura
média do planeta, que por conseqüência está se traduzindo em mais gastos com
ações reparatórios de estiagens, tempestades, que ações preventivas.
Com
a posse do presidente Jair Bolsonaro, o que se vê é a contenção vertiginosa de
recursos para a área ambiental. Só o plano Nacional de Mudanças Climáticas,
teve corte brutal dos aportes financeiros, reduzindo de 436 milhões em 2019
para 247 milhões em 2020. Esse plano tem
por finalidade a implementação das medidas acordadas na COP 15, realizada em Paris.
Dentre elas, reduzir o desmatamento ilegal para nível zero até 2030 e a
restauração de 12 milhões de hectares de floresta na próxima década, ou seja,
2020 em diante.
O
cenário descortinado nos quase dois anos de governo está sendo catastrófico na
área ambiental. Não há em um horizonte próximo qualquer sinal de garanta que
essas metas e outras acordadas na COP-15 terão os prazos cumpridos. Além da
redução de recursos públicos para a execução do plano de mudanças climáticas,
países como Noruega e Alemanha prometeram cancelar o repasse de quase dois
bilhões de reais para o Fundo da Amazônia em resposta ao descaso do governo
federal com a preservação da Amazônia.
Diante
da forte pressão sofrida pelo governo federal para o combate imediato das queimadas
criminosas na Amazônia, o Vice Presidente Hamilton Mourão, criou uma força
tarefa enviando para a Amazônia centenas de militares para atuar no combate dos
incêndios ilegais. Para essa ação, o
governo federal está desembolsando dos cofres públicos nada menos que 60
milhões de reais ao mês para o financiamento do plano. Em termos comparativos,
o orçamento anual do IBAMA pouco supera a 80 milhões de reais. O causa
estranheza é que mesmo com plano amazonas, com o envio de um grande contingente
de militares para coibir o desmatamento e as queimadas, estudos apresentados no
mês de julho de 2020 confirmam que o mês anterior, junho, bateu novo recorde em
desmatamento.
O
acordo assinado em 2015 na COP 23 em Paris, que foi referendado pelo governo
brasileiro, era para que fosse reduzida em 3,990km quadrados a área desmatada.
A conclusão que se chegou foi, em vez de ter reduzido o desmatamento, o que houve
foi o aumento vertiginoso. Os relatórios mostraram que foi três vezes superior
ao acordado, ou seja, 10 mil km quadrados de floresta tombada. Mas há algo
estranho nisso tudo. O programa GLO (Garantia da Lei e da Ordem), que é o Plano
Amazonas, instituído em agosto de 2019 e coordenado pelo Vice Presidente Mourão,
não era para fiscalizar e punir os desmatadores e incendiários da floresta
amazônica?
Como
explicar o aumento da devastação recorde com todo esse aparato humano e gastos milionários.
O que é revoltante é saber que essa força tarefa tem poder de emitir autos de
infração, confiscar e tornar sem uso equipamentos como tratores de esteiras e
outros maquinários. Essas condutas
administrativas são conferidas ao IBAMA e ao ICMBio. Com a GLO, esses órgãos
federais perderam tais competências, sendo agora subordinados aos militares.
Muitos
devem se lembrar das operações empreendidas pelo IBAMA, apreendendo e
incendiando equipamentos usados nos desmatamentos pelos infratores. O governo
federal tomou medidas severas contra os profissionais do IBAMA, por ter agido
de acordo com o que determina as legislações ambientais. Além da demissão de
chefias executivas do órgão, provocou um profundo desmantelamento, tornando
quase impossíveis a execução dos serviços de fiscalização e autuação.
Quem
acreditava que com a GLO haveria o controle definitivo das invasões e destruições
da floresta amazônica, se equivocou. A sensação que permanece é que o envio das
forças armadas para a Amazônia foi para proteger os criminosos, para que prosseguissem
a todo vapor a extração de madeira em terras públicas, a grilagem e o garimpo.
A certeza de que há algo muito sinistro nessa ação do exército na Amazônia é
revelado na postura favorável do Vice Presidente na PL 910/2019 da grilagem.
Essa PL tem por finalidade regulamentar áreas públicas invadidas na Amazônia.
As
notícias da devastação do bioma da Amazônia correram o mundo provocando
indignação tanto das entidades que atuam na contenção do aquecimento global,
como de países onde a população tem uma compreensão mais critica, sensata dos
impactos da perda desse ecossistema ao equilíbrio do clima do planeta. As
respostas dos governantes europeus vieram com ameaças, como o possível rompimento
dos acordos de integração entre o MERCOSUL e a Comunidade Econômica Européia.
Diante
da forte pressão vinda de todos os lados, principalmente de grandes importadores
de commodities que poderá impactar o agronegócio, Mourão prometeu agir com mais
severidade, implantando outro instrumento de combate aos incêndios, batizado de
“moratória do fogo”. A moratória do fogo
será adotada por meio de decreto que proíbe, por 120 dias, todas as queimadas legais
na Amazônia.
É
mais uma daquelas regulamentações para inglês ver, ou seja, não terá qualquer
resultado positivo. Se com todo o arcabouço de leis e material humano
disponibilizado para tal fim, não obteve resultado desejado, será que agora o
criminoso ambiental, incendiário, vai se sensibilizar e acatar o decreto por
120 dias? Não há qualquer dúvida que no próximo ano, no mês de julho, as
notícias que teremos serão de mais um recorde de desmatamento. Se o governo Bolsonaro não for freando em
tempo, o clima do Brasil e o Planeta Terra estarão sobre sérios riscos.
Não
havendo como já era esperando a execução das metas relativas à redução do aquecimento
global, há sinais evidentes que a temperatura média do planeta ultrapassará os
dois graus centígrados antes do tempo previsto. Os desleixos do governo federal
no enfrentamento das mudanças climáticas já estão revertendo em elevados
prejuízos à infraestrutura e a economia de muitos estados e municípios
brasileiros em decorrência de episódios climáticos extremos.
Na
última década do século XX o professor Carlos Afonso Nobre, um dos mais
respeitados estudiosos do clima global, com ênfase no aquecimento global,
escreveu que se o desmatamento continuar ocorrendo na Amazônia, aquele bioma
ficará de 5% a 20% mais seco, com a prorrogação de até dois meses do período de
estiagem. Na mesma linha, a temperatura média também se elevará entre 1,5 graus
a 2,5 graus, com a redução dos ciclos de chuva em até 20%.
Parece
que as previsões do professor Nobre estão se confirmando. Trinta anos depois de
ter feito tais alertas, é exatamente isso o que está ocorrendo na Amazônia.
Nada disso sensibiliza o governo federal e setores do agronegócio. A pouca
umidade produzida pela floresta, limitará o fluxo de água transportado pelos “rios
voadores” às regiões centro oeste e sul, ambas grandes produtoras de grãos. O
centro oeste depende exclusivamente das florestas da Amazônia para garantir a
germinação das plantas. Sem o ciclo normal das chuvas, não tem como a região produzir.
O uso de técnicas de irrigação dificilmente poderá ser adotado para áreas tão
extensas, constituídas de grandes latifúndios.
Nesse
sentido caberão aos estados, a exemplo do estado de Santa Catarina, desenvolver
estratégias para, pelo menos, tentar minimizar os efeitos negativos dos fenômenos
extremos, que estão conduzindo a um novo normal na cultura do estado. Desenvolver planos mais eficientes para
assegurar o empoderamento da população na condução correta de ações frente à
divulgação de alertas provenientes de órgãos oficiais.
Outra
medida, que talvez pudesse ser adotada nos municípios mais suscetíveis a
desastres naturais, é a instalação de sirenes sonoras. Esse recurso mostrou-se
eficiente e é amplamente difundido em países acometidos por terremotos, a
exemplo do Japão. Mas, de modo prático, o que é possível de execução hoje é a
formação de força tarefa integrada, coordenada pelas defesas civis municipais e
estaduais, oferecendo à população informações básicas para se proteger das
tempestades extremas. Também, seria salutar a criação de uma lei obrigando que
todos os smarts fone fossem instalados aplicativos de órgãos que monitoram o
clima para que todo cidadão recebesse informações de alertas sobre tempestades
severas.
Frente
a tais fenômenos climáticos no extremo sul de Santa Catarina, estudos comprovam
que toda essa mudança da dinâmica comportamental do micro clima local tem
relação também com a atuação humana sobre a região. O desmatamento vertiginoso para
dar lugar às extensas áreas com arroz irrigado pode estar influenciando toda a
dinâmica microclimática local. A extração de seixos rolados nos leitos dos rios
da região também são fatores agravantes dos problemas. Com a ocorrência mais
freqüente de enxurradas, a falta dos seixos que amortecem a velocidade das
águas, podem ser um agravante a mais na soma dos prejuízos.
Projetos
como construção de barragens a montante dos rios próximos as encostas das
escarpas da serra geram devem ser avaliadas como empreendimentos de alto risco
às populações que vivem a jusante. A enxurrada de 1995, e outras tantas de
menor ou igual intensidade, ocorridas após essa data, são fatores que devem ser
considerados na tomada de decisões para obras estruturantes na região.
Prof.
Jairo Cezar
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