domingo, 26 de maio de 2019


CENSO ESCOLAR/2018 DO INEP REVELA UM QUADRO NADA ANIMADOR DA EDUCAÇÃO BÁSICA CATARINENSE

O Diário Catarinense na sua edição impressa do dia 22 trouxe reportagem contendo três páginas divulgando o resultado do censo escolar brasileiro elaborado pelo INEP (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira) cujos resultados, muitos dos quais negativos, não geraram nenhuma surpresa, menos ainda aos profissionais da educação, já habituados com tais adversidades infraestruturais todos os dias. Era quase impossível ter um censo mais animador quando se está num país onde quase a totalidade dos gestores públicos eleitos, independente se é em âmbito municipal, estadual ou federal, o primeiro sinal de crise econômica, os setores apontados para cortes ou contingenciamento orçamentário são educação e saúde. Não é mesmo?
Quando tudo parecia que não teria mais o que piorar na educação, que os governos sob risco de crime de responsabilidade teriam de cumprir as vinte metas do Plano Nacional de Educação, veio a impactante informação do corte de 30% do orçamento para o ensino público superior. Essa notícia caiu com balde de água fria na cabeça dos reitores e milhões de estudantes pesquisadores que podem ter seus trabalhos abortados por falta de recursos. Para qualquer país que ousa se desenvolver, alcançar autonomia e respeito internacional, investimento maciço em educação sempre foi e será um procedimento importante.
 Não para o Brasil onde é eleito governo que ridiculariza professores, chama estudantes de imbecis e idiotas, desrespeita e rebaixa Paulo Freire à categoria de persona non grata, uma celebridade reverenciada no mundo inteiro, porém, aqui no Brasil... A resposta, portanto, a todo esse desarranjo institucional é revelado no censo educacional do INEP-2018, cujos números exibem uma realidade vergonhosa para Santa Catarina, muito aquém das fictícias, mostrada nas apoteóticas e dispendiosas publicidades dos governos passados para fins eleitoreiros.
O resultado do censo deixa qualquer catarinense estarrecido. O que assusta é que o estado, de acordo com os levantamentos, apresenta um dos melhores níveis em estrutura e ensino se comparado com outros estados da federação. Imaginemos como deve ser as estruturas dessas escolas. O censo traz um mapa das condições infraestruturais das unidades de ensino públicas estaduais, municipais, federais e das particulares. Destaca aspectos como funcionamento de salas de aulas em empresas, centros prisionais, templos, igrejas, galpões, se compartilham espaços com outras escolas, etc.
 Desses itens mensurados o que mais chamou a atenção foi que existem no estado de Santa Catarina 15 (quinze) escolas estaduais que funcionam em galpões, podendo ser um antigo supermercado, clube, etc. O documento revela também que 106 escolas estaduais e 699 municipais a água que abastece as mesmas são de ponteira ou poços artesianos. Se a água recebe algum monitoramento permanente das autoridades competentes para avaliar sua potabilidade, se não há contaminação ou não, é algo que deve ser investigado. No estado, uma escola da rede estadual e três municipais declararam que não são atendidas com água por nenhum desses meios, muito menos da rede público. Como são abastecidas, também é outra incógnita. Como essas escolas lidam com esse problema é outro item a ser investigado.
 O bom ou mal IDH (Índice de Desenvolvimento Humano) de qualquer país ou estado depende de inúmeros fatores, dentre eles o percentual de esgoto recolhido e tratado. Santa Catarina se destaca entre os demais 25 estados e o distrito federal, como um dos piores em percentuais de municípios atendido por sistemas de tratamento de efluentes domésticos e industriais. Nesse sentido, mais da metade das unidades de ensino do estado não está conectada a rede pública de esgoto, muito menos ainda ter o esgoto tratado. São 2.686 unidades de ensino que não possuem qualquer tipo de fossa coletora de esgoto. Todo esse material lançado in natura no solo certamente está contaminado os lençóis freáticos do entorno da escola.
Nas primeiras décadas do século XX eram raras as escolas que possuíam banheiros acoplados as mesmas. A grande maioria possuía privada (patentes), localizadas nas suas imediações. O atual censo revelou um cenário um tanto curioso. São 5.710 escolas onde o banheiro fica fora do prédio. Quando é dito fora, se supõe que está acoplado externamente ao prédio da unidade de ensino. Tudo leva a crer que esses “banheiros” podem estão deslocados dos estabelecimentos de ensino, como privadas, que devem seguir o padrão antigo, de madeira, sem vaso sanitário? Será?
Se no aspecto saneamento básico a situação das escolas catarinenses já é quase impraticável para o funcionamento, imaginemos então a infraestrutura pedagógica. O curioso é que mesmo com toda carência e fragilidade estrutural, ainda assim os profissionais da educação impulsionados pelo profissionalismo e competência conseguem se superar nesses ambientes onde tudo falta, assegurando um ensino próximo ao ideal. É claro que ficarão fissuras na aprendizagem difíceis de serem reparadas. Essa deficiência no aprendizado coloca os estudantes brasileiros em patamares desiguais nos exames internacionais como o PISA, onde sempre destacam estudantes de países com melhores IDH e investimentos em educação, com raras exceções, é claro.
Se analisarmos os discursos dos governantes passados e dos atuais, eleitos, quase todos destacam a importância ou a necessidade de o estudante do ensino básico ter boa formação na área de informática. Quanta demagogia, não é mesmo? Para que isso acontecesse seriam necessários investimentos em laboratórios de informática e o aporte de profissionais competentes para monitorá-los em todas as escolas. Os dados do censo escolar revelam um cenário desanimador nesse seguimento.
São 355 escolas estaduais, 2.650 municipais, 557 privadas e duas federais, que não possuem laboratórios de informática. Muitas escolas que estão inseridas no censo como portadoras de salas de informática, esses espaços foram desativados, virando depósitos, cujas máquinas que restaram duas ou três, que ainda funcionam, foram alocadas para outros espaços, bibliotecas, por exemplo.
No quesito internet, veja só, são 74 escolas estaduais sem esse importante equipamento de comunicação. Outro detalhe que não aparece no Censo, embora expressiva parcela das unidades de ensino esteja sendo atendida com banda larga, a potência oferecida em mega bit é insuficiente à demanda de atividades das escolas. Para os professores e demais profissionais cumprirem com os compromissos diários como chamada e postagem de notas, os gestores são forçados a promoverem eventos para arrecadar recursos destinados às despesas extras, dentre eles melhorar a eficiência da internet. 
Quem conheceu, trabalhou ou viveu no tempo dos grupos escolares deve lembrar-se dos impecáveis museus de história natural, laboratórios de ciência, entre outros atrativos que tornaram o ensino muito mais estimulante.  Hoje em dia esses seguimentos são uma raridade nas escolas catarinenses e de outros estados, independente se é pública ou privada. Em tempo de tecnologias de 4 e 5 G nenhum estudante suporta ter de estudar plantas, células, insetos etc, sem tocar, mexer, sentir, ou seja, sem uma interação com o objeto de estudo. É possível que nas 5.709 escolas de Santa Catarina, listadas pelo censo, os professores, com poucas exceções, adotem as mesmas técnicas tradicionais de ensino de repetição, memorização, prova, recuperação, pois essas não possuem laboratórios de ciência. Valeria a ousadia investigar a qualidade do ensino das 740 escolas no estado que possuem laboratórios de ciência.
Há três anos o Brasil sediou os jogos olímpicos, considerado um dos maiores eventos esportivos mundiais do gênero. A expectativa era que com um evento dessa magnitude o Brasil se despertasse no campo esportivo, deslocando investimentos na edificação de ginásios e quadras esportivas em todos os cantos do país. Acreditem, a um ano do inicio dos próximos jogos olímpicos, ou seja, quatro anos depois da Olimpíada do Rio de Janeiro, das 6.449 escolas de todo o estado, 3.709 não possuem quadras de esportes.
Esses números demonstram que a educação física, se existe nessas escolas, é oferecida com extrema precariedade pelo professor. Das quadras existentes é possível que nem todas oferecem condições mínimas para uma satisfatória prática esportiva, pois devem faltar equipamentos básicos como traves, aros e cestas de basquete, redes, bolas, etc, etc. Uma educação de qualidade não se faz apenas com laboratórios de informática, de ciência, quadra esportivas, etc. É preciso estimular a curiosidade e o gosto dos estudantes pela pesquisa e a leitura de boas obras de literatura e outros gêneros literários.
Desde a antiguidade a biblioteca sempre revelou ser um espaço de excelência para o desenvolvimento das culturas. Ainda hoje os países mais desenvolvidos economicamente, todas as escolas, comunidades e cidades, têm uma ou mais bibliotecas disponíveis à população. No Brasil, todos os anos são abertos inúmeros templos religiosos, enquanto que livrarias e bibliotecas lutam para sobreviver e manter-se abertas.
 Se não todas, mas expressiva parcela das crianças que são matriculadas nas escolas públicas em todo o Brasil tem na escola o primeiro contato com livros e o gosto da leitura. Se quisermos formar adultos curiosos, críticos, questionadores, pesquisadores, temos que oportunizá-los a partir da tenra idade a ter contato com livros. Hoje, em pleno século XXI, seria inadmissível imaginar que alguma escola que não possua uma biblioteca em suas dependências. É quase inacreditável, hoje o estado de Santa Catarina 407 escolas estaduais, 2.444 municipais e 409 privadas, não disponibilizam desse importante espaço para seus alunos.
A cerca dez anos, em 2010 o congresso brasileiro aprovou e foi sanciona pelo governo a lei n. 12.244/2010 na qual determinava que todas as escolas no país, tivessem pelo menos uma biblioteca. A própria lei estabelecia prazo de dez anos para que as escolas se adequassem. Uma década quase se passou e tudo continuou igual, como se estivesse congelado no tempo. A proporção de bibliotecas existentes no estado era a mesma em 2018 em comparação a 2010. 
A legislação obriga também que os gestores contratem bibliotecários para gerirem as bibliotecas. De acordo com o secretário de educação do estado de santa Catarina o mesmo informou que as equipes de gerência e coordenação espalhadas pelo estado estão incentivadas a apontar as necessidades das escolas para poder atendê-las o mais rápido possível. Com o corte desmedido de verbas do orçamento para educação pública tudo sinaliza um cenário nada animador para o ensino público catarinense, pior será ainda para 2020 quando irá expirar o prazo de validade do FUNDEB, onde milhares de escolas funcionam devido aos recursos transferidos desse fundo.

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