sexta-feira, 14 de março de 2014

Os onze anos de governo Petista pautados na consolidação do Modelo Liberal Periférico

Como já é rotineiro na minha vida, quase que diariamente transito por algumas poucas revistas e jornais digitais confiáveis, cujos conteúdos publicados dificilmente são publicados nas grandes mídias corporativas controladas por meia dúzia de famílias. O que me chamou atenção dessa vez foi um texto publicado pela jornalista Valéria Nader, intitulado “Dilma aprofunda a desregulamentação, liberalização e desnacionalização”, cuja construção se deu a partir da entrevista realizada com o economista e professor Reinaldo Gonçalves da Universidade Federal do Rio de Janeiro.
Durante a leitura do texto, o professor Reinaldo fez menção a um artigo por ele escrito “déficit de governança e crise de legitimidade do Estado no Brasil”, que certamente fundamentou suas respostas à entrevista concedida. Foi enfático em afirmar que tanto o governo Lula como Dilma ambos protagonizaram um modelo de “desenvolvimento” que o caracterizou como Liberal Periférico. Periférico porque se constituiu em um país situado às margens das tradicionais economias, que historicamente vem sendo submetida a toda prova de espoliação e rapinagem, avalizada por um Estado protetor e provedor da riqueza a uma fração de famílias e corporações vinculadas ao agronegócio, mineração, construção civil, sistema financeiro, etc.
Outra diferença marcante entre nações periféricas e centrais é na hipótese de uma crise estrutural. A chance de recuperação dos países centrais é relativamente maior em vista de sua maior homogeneidade social, elevado progresso técnico competitivo e, paradoxalmente, a frequência de guerras cíclicas que impulsionam o emprego e melhorando os ganhos salariais da população. Também as políticas de ajustes estruturais aplicadas para reativar a economia, aparentemente não recaem diretamente sobre os trabalhadores como no Brasil suprimindo direitos e garantias constitucionais.    
Quando se imaginava que, no poder, tanto Lula como Dilma colocariam em prática aquilo que os militantes históricos do PT almejavam, ou seja, um projeto político verdadeiramente popular veio a decepção. Ditado por uma política de defesa incondicional da governabilidade teceu-se um arco de alianças com vistas a atrair políticos e partidos de quase todas as tendências, de moderados a ultraconservadores na perspectiva de neutralizar qualquer forma de reação às políticas liberalizantes.
São esses grupos e partidos políticos, do que tem de mais atrasado hoje, que vem ditando os rumos da nossa política e economia, que segundo o professor Reinaldo estabeleceram no Brasil o modelo de desenvolvimento pauto pela privatização, desregulação, subordinação e vulnerabilidade externa, dominação do capital financeiro, liberação nas áreas de serviços, desnacionalização, desindustrialização, etc. Se o governo FHC deixou sua marca inconfundível de social democrata a serviço do grande capital, os dois governos petistas certamente serão lembrados pelas próximas gerações por terem protagonizado um dos maiores vexames políticos já vistos na história recente do Brasil, o escândalo do mensalão envolvendo figuras históricas do partido dos trabalhadores.
É um país que cresce às avessas (ausência de mudanças ou reformas de longo prazo), porém, para manter certo grau de estabilidade social os dirigentes governistas adotam postura de cooptação das organizações sindicais, estudantis e patronais. Em relação as manifestações de junho de 2013, as centrais sindicais somente articularam promover algum movimento atendendo às reivindicações das vozes das ruas, um mês depois, sem muita representação e resultado significativo.
Além do mais, no poder, transformaram milhares de pessoas em situação de miséria em cabos eleitorais, adotando políticas clientelistas e assistencialistas como a bolsa família e outros benefícios oferecidos. E não para por aí, os governistas vêm se gabando e divulgando na imprensa que nos onze anos de governo petista milhares de famílias adquiriram um padrão de consumo que os qualificaram como “classe média”. O que não é dito é que essa nova classe média está totalmente endividada pelas políticas de crédito fácil, de juros altos que cada vez mais elevam o valor da dívida pública, impagável, financiada pelo fluxo de capitais especulativos que mantém os salários arrochados e os serviços públicos depreciados.
O processo de espoliação social patrocinado pelo grande capital chegou a um patamar insustentável resultando nas manifestações de julho, com milhões de pessoas saindo às ruas contrariadas com tamanha roubalheira e impunidade que tomou conta do Brasil. Havia a possibilidade que o início das manifestações tivesse como estopim o aumento das tarifas do transporte coletivo, que foi confirmado em junho de 2013 quando milhares de pessoas aproveitaram o momento e saíram às ruas mostrando suas indignações às políticas perversas e equivocadas conduzidas pelo regime petista.  
A eclosão das manifestações não teve o passe livre como causa principal, e sim um conjunto de mazelas que podem ser assim classificadas: baixo crescimento da renda, aumento da inflação, PEC-37, demora da punição dos condenados do mensalão, desperdício de recurso para a copa do mundo, enriquecimento de dirigentes políticos, etc. Durante os dias em que o povo saiu às ruas para protestar raros foram os políticos petistas, antes vanguardistas, que ousaram inserirem-se as massas a bradarem palavras de ordem como em épocas memoráveis.
Com a expectativa de que os movimentos de rua alcançassem níveis de acirramentos que pudessem fugir do controle, o governo em cadeia de rádio e televisão propôs pacto com a sociedade com vistas a esvaziar às ruas e restabelecer a normalidade. Dentre as propostas encaminhadas comprometeu-se com a contratação imediata de médicos estrangeiros para suprir o déficit de profissionais nos municípios e a elevação das penas para crimes de corrupção. Quando se esperava que a justiça punisse com severidade todos os envolvidos no escândalo do mensalão uma manobra bem articulada no Supremo Tribunal Federal garantiu aos ditos réus algumas benesses desqualificando-os como criminosos de colarinho branco.
Não é segredo para ninguém que historicamente diante de tensões sociais desencadeadas como a de junho de 2013 os dirigentes políticos sempre adotaram estratégias visando neutralizá-los, como a cooptação de lideranças, concessões marginais de benefícios às populações, reformas políticas inócuas ou a repressão, essa última muito evidenciada ultimamente.
Prof. Jairo Cezar

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