ARGUIÇÃO DE MINISTRO DO STF, NO JULGAMENTO DOS ATOS GOLPISTAS, CITA LEI QUE PODE RESPONSABILIZAR AUTORIDADES MUNICIPAIS POR CRIMES PATRIMONIAIS
No julgamento
do núcleo duro envolvendo o ex-presidente Bolsonaro no ato golpista de 8 de
janeiro de 2023, o Ministro do STF, Luiz Fux, cujo voto foi pela absolvição de
6 dos 8 réus, inclusive do ex-presidente, durante a sua fala, fez menção a uma
lei, que se enquadra muito bem a casos similares ocorridos nas instâncias
municipais. A lei na qual expressou foi a de n. 6905/1998, que trata sobre Crimes
Ambientais, que inclui o patrimônio, cultural, artístico e arqueológico. Na sua
arguição disse que a destruição dos bens tombados no congresso, no judiciário e
no palácio do governo, em Brasília, infringiu o artigo 62 da respectiva lei de
crimes ambientais.
O
ministro, diferente dos demais quatro magistrados, rechaçou a ideia de ter
havido liderança na ação, ou seja, afirmou que a destruição dos bens tombados
se deu por ato voluntário, exclusividade daqueles que adentraram aos respectivos
recintos. Portanto, a responsabilização deve ser imputada aqueles que cometeram
o delito, eximindo terceiros na ação, nesse caso o ex-presidente Bolsonaro.
Por
que a fala do juiz Luiz Fux referente ao Art. 62, da lei de crimes ambientais, merece
uma reflexão mais apurada por parte da sociedade, principalmente no caso por ele
dissertado, a destruição, a inutilização ou deterioração de bens tombados nas três
sedes dos poderes em Brasília. Muitos dos que foram condenados pela ação
golpista de 8 de janeiro, tiveram as suas penas acrescidas, por ter confrontado
o art. 62, da lei n. 9.605/98 que discorre sobre destruir, inutilizar ou deteriorar
bens tombados do patrimônio público. Caso o réu seja enquadrado entre os dois
incisos do art. 62, a pena será de reclusão, de um a três anos, e multa. Na hipótese
de ato culposo, sem intenção, o parágrafo único desse artigo, estabelece pena
de seus meses a um ano de detenção, sem prejuízo de multa.
Vamos trazer
esse caso para a realidade de Araranguá. Infelizmente no município não existe
uma lei especifica que determina o tombamento do nosso patrimônio
arquitetônico, fato que a cada dia estamos perdendo parte expressiva da nossa
memória com a demolição de casarios quase centenários. Outro exemplo importante
de bem arquitetônico ameaçado é a nossa igreja matriz Nossa Senhora Mãe dos
Homens. Uma arquitetura quase centenária, dominada por uma onda insana de
mudança da fachada, que resultaria na sua descaracterização. A alegação da cúria
católica e segmentos conservadores do município, é que o novo formato da fachada
dará um aspecto de modernidade.
A realidade
é que o prédio da igreja matriz não é tombado pela IPHAN, talvez por desinteresse
da própria cúria, fato que dificulta a sua preservação estética. Uma ação
encaminhada à justiça solicitando os reparos da estrutura sem descaracterizar a
fachada, foi deferida pelo TJSC. No entanto, até o momento, o silêncio da cúria
e das autoridades acerca da reforma da matriz dominam o cotidiano do povo
araranguaense. Quem acreditava que o município de Araranguá não possui nenhum
bem histórico tombado, está completamente enganado. Araranguá possui uma
diversidade de sítios arqueológicos datados de 1 mil a 5 mil anos, de grupos
originários como os sambaquianos e os guarani. Sua catalogação no IPHAN, se deu
a partir de investigação realizada por um pesquisador do IPAT/UNESC, no qual
resultou em tese defendida em 2014.
Seus
registros junto ao IPHAN federal resultam em suas proteções por parte de órgãos
como o MPSC e a Fundação Municipal do Meio Ambiente - FAMA, cuja lei n. 2608 de
21 de dezembro de 2007, no seu artigo 4, diz que são finalidades básicas do
órgão, supervisionar, fiscalizar, autuar e executar a política ambiental e
arqueológica do Município de Araranguá, cabendo-lhe: II, implantar, fiscalizar
e administrar unidades de conservação e áreas ambientais e arqueológicas
protegidas no município.
Além
de possuirmos sítios arqueológicos, portanto, espaços tombados, temos também uma
Unidade de Conservação, criada por decreto municipal em 2016, cuja denominação
é Monumento Natural – Unidade de Conservação – MONA-UC. Muitos dos sítios arqueológicos
catalogados estavam situados nos limites da unidade até 2021, quando se deu o início
de redução dos limites da área da unidade. No decreto 7829/16, determinava extensão
de 280.202 há; na LC 447/22 foi reduzida para 109.95 há, já na LC 487/23, a área
foi ainda mais reduzida, passando agora para 83.45 há. O agravante nessas
reduções de extensões é que muitos sítios ficaram ainda mais desprotegidos,
pois se mantiveram fora dos limites de proteção da unidade.
Várias
incursões de denúncias foram encaminhadas aos órgãos responsáveis pela sua preservação,
solicitando medidas emergenciais contra atos de vandalismo envolvendo alguns
desses sítios arqueológicos. É habitual nas áreas de restinga e dunas do município
de Araranguá, o trânsito permanente de veículos tracionados, bem como cavalos, causando
enormes impactos a esse frágil ecossistema. O agravante é que dentro desse
ecossistema estão alguns sítios que já são alvos de depredação.
Conforme
a lei de crimes ambientais n. 9605/98, o seu artigo 63, está assim escrito: Alterar o aspecto ou estrutura de edificação ou local
especialmente protegido por lei, ato administrativo ou decisão judicial, em
razão de seu valor paisagístico, ecológico, turístico, artístico, histórico,
cultural, religioso, arqueológico, etnográfico ou monumental, sem autorização
da autoridade competente ou em desacordo com a concedida: Pena - reclusão, de
um a três anos, e multa.
Reconhecer por parte das autoridades do município que temos um
rico acervo arqueológico e que necessita ser protegido deve ser o primeiro encaminhamento
a ser tomado. Passo seguinte é informar e sensibilizar a sociedade do motivo de
manter protegido esses espaços. Aqui deveram entrar todas as unidades de ensino
do município, do infantil ao médio. Por que esses sítios são tão importantes e devem
ser rigorosamente protegidos? Uma das respostas é porque eles contêm
informações relevantes do nosso ambiente de 4 a 5 mil anos atrás. Restos de conchas,
fragmentos de cerâmica, instrumentos de caça encontrados, podem dar revelações
de como era o clima, a flora, a fauna no passado longínquo e suas mutações ao
longo dos séculos.
Prof. Jairo Cesa
https://www.migalhas.com.br/quentes/439735/fux-vota-durante-13-horas-e-absolve-6-dos-8-reus-da-tram
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