sexta-feira, 12 de setembro de 2025

 ARGUIÇÃO DE MINISTRO DO STF, NO JULGAMENTO DOS ATOS GOLPISTAS, CITA LEI QUE PODE RESPONSABILIZAR AUTORIDADES MUNICIPAIS POR CRIMES PATRIMONIAIS

 

No julgamento do núcleo duro envolvendo o ex-presidente Bolsonaro no ato golpista de 8 de janeiro de 2023, o Ministro do STF, Luiz Fux, cujo voto foi pela absolvição de 6 dos 8 réus, inclusive do ex-presidente, durante a sua fala, fez menção a uma lei, que se enquadra muito bem a casos similares ocorridos nas instâncias municipais. A lei na qual expressou foi a de n. 6905/1998, que trata sobre Crimes Ambientais, que inclui o patrimônio, cultural, artístico e arqueológico. Na sua arguição disse que a destruição dos bens tombados no congresso, no judiciário e no palácio do governo, em Brasília, infringiu o artigo 62 da respectiva lei de crimes ambientais.

O ministro, diferente dos demais quatro magistrados, rechaçou a ideia de ter havido liderança na ação, ou seja, afirmou que a destruição dos bens tombados se deu por ato voluntário, exclusividade daqueles que adentraram aos respectivos recintos. Portanto, a responsabilização deve ser imputada aqueles que cometeram o delito, eximindo terceiros na ação, nesse caso o ex-presidente Bolsonaro.

Por que a fala do juiz Luiz Fux referente ao Art. 62, da lei de crimes ambientais, merece uma reflexão mais apurada por parte da sociedade, principalmente no caso por ele dissertado, a destruição, a inutilização ou deterioração de bens tombados nas três sedes dos poderes em Brasília. Muitos dos que foram condenados pela ação golpista de 8 de janeiro, tiveram as suas penas acrescidas, por ter confrontado o art. 62, da lei n. 9.605/98 que discorre sobre destruir, inutilizar ou deteriorar bens tombados do patrimônio público. Caso o réu seja enquadrado entre os dois incisos do art. 62, a pena será de reclusão, de um a três anos, e multa. Na hipótese de ato culposo, sem intenção, o parágrafo único desse artigo, estabelece pena de seus meses a um ano de detenção, sem prejuízo de multa.

Vamos trazer esse caso para a realidade de Araranguá. Infelizmente no município não existe uma lei especifica que determina o tombamento do nosso patrimônio arquitetônico, fato que a cada dia estamos perdendo parte expressiva da nossa memória com a demolição de casarios quase centenários. Outro exemplo importante de bem arquitetônico ameaçado é a nossa igreja matriz Nossa Senhora Mãe dos Homens. Uma arquitetura quase centenária, dominada por uma onda insana de mudança da fachada, que resultaria na sua descaracterização. A alegação da cúria católica e segmentos conservadores do município, é que o novo formato da fachada dará um aspecto de modernidade.

A realidade é que o prédio da igreja matriz não é tombado pela IPHAN, talvez por desinteresse da própria cúria, fato que dificulta a sua preservação estética. Uma ação encaminhada à justiça solicitando os reparos da estrutura sem descaracterizar a fachada, foi deferida pelo TJSC. No entanto, até o momento, o silêncio da cúria e das autoridades acerca da reforma da matriz dominam o cotidiano do povo araranguaense. Quem acreditava que o município de Araranguá não possui nenhum bem histórico tombado, está completamente enganado. Araranguá possui uma diversidade de sítios arqueológicos datados de 1 mil a 5 mil anos, de grupos originários como os sambaquianos e os guarani. Sua catalogação no IPHAN, se deu a partir de investigação realizada por um pesquisador do IPAT/UNESC, no qual resultou em tese defendida em 2014.

Seus registros junto ao IPHAN federal resultam em suas proteções por parte de órgãos como o MPSC e a Fundação Municipal do Meio Ambiente - FAMA, cuja lei n. 2608 de 21 de dezembro de 2007, no seu artigo 4, diz que são finalidades básicas do órgão, supervisionar, fiscalizar, autuar e executar a política ambiental e arqueológica do Município de Araranguá, cabendo-lhe: II, implantar, fiscalizar e administrar unidades de conservação e áreas ambientais e arqueológicas protegidas no município.  

Além de possuirmos sítios arqueológicos, portanto, espaços tombados, temos também uma Unidade de Conservação, criada por decreto municipal em 2016, cuja denominação é Monumento Natural – Unidade de Conservação – MONA-UC. Muitos dos sítios arqueológicos catalogados estavam situados nos limites da unidade até 2021, quando se deu o início de redução dos limites da área da unidade. No decreto 7829/16, determinava extensão de 280.202 há; na LC 447/22 foi reduzida para 109.95 há, já na LC 487/23, a área foi ainda mais reduzida, passando agora para 83.45 há. O agravante nessas reduções de extensões é que muitos sítios ficaram ainda mais desprotegidos, pois se mantiveram fora dos limites de proteção da unidade.

Várias incursões de denúncias foram encaminhadas aos órgãos responsáveis pela sua preservação, solicitando medidas emergenciais contra atos de vandalismo envolvendo alguns desses sítios arqueológicos. É habitual nas áreas de restinga e dunas do município de Araranguá, o trânsito permanente de veículos tracionados, bem como cavalos, causando enormes impactos a esse frágil ecossistema. O agravante é que dentro desse ecossistema estão alguns sítios que já são alvos de depredação.

Conforme a lei de crimes ambientais n. 9605/98, o seu artigo 63, está assim escrito: Alterar o aspecto ou estrutura de edificação ou local especialmente protegido por lei, ato administrativo ou decisão judicial, em razão de seu valor paisagístico, ecológico, turístico, artístico, histórico, cultural, religioso, arqueológico, etnográfico ou monumental, sem autorização da autoridade competente ou em desacordo com a concedida: Pena - reclusão, de um a três anos, e multa.

Reconhecer por parte das autoridades do município que temos um rico acervo arqueológico e que necessita ser protegido deve ser o primeiro encaminhamento a ser tomado. Passo seguinte é informar e sensibilizar a sociedade do motivo de manter protegido esses espaços. Aqui deveram entrar todas as unidades de ensino do município, do infantil ao médio. Por que esses sítios são tão importantes e devem ser rigorosamente protegidos? Uma das respostas é porque eles contêm informações relevantes do nosso ambiente de 4 a 5 mil anos atrás. Restos de conchas, fragmentos de cerâmica, instrumentos de caça encontrados, podem dar revelações de como era o clima, a flora, a fauna no passado longínquo e suas mutações ao longo dos séculos.

Prof. Jairo Cesa

 

https://www.migalhas.com.br/quentes/439735/fux-vota-durante-13-horas-e-absolve-6-dos-8-reus-da-tram

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