domingo, 4 de fevereiro de 2024

 

A SOJA TOMA CONTA DO SUL DE SANTA CATARINA

Entre as décadas de 1970 e 1980 quem transitava pelas estradas do interior de Araranguá deve lembrar-se do colorido da diversidade de culturas agrícolas que tomavam as terras dos vales férteis. Feijão, milho, batata doce, amendoim, fumo, cana, aipim, mandioca, arroz, cebola, além de hortaliças e plantas frutíferas em geral, garantiam ao pequeno agricultor sustento e renda extra nas vendas aos armazéns e pequenos supermercados do município. 

Com o tempo, com a revolução agrícola, o pequeno agricultor teve que deixar de cultivar, deixar o campo, vendendo ou entregando suas terras aos bancos para o pagamento de dívidas contraídas de financiamentos. O caminho para não morrer de fome e sustentar a família foi botar tudo em um caminhão e tentar a vida na cidade, juntando-se aos demais moradores nos bairros que crescem vertiginosamente, bem como os problemas.

Rapidamente o interior de Araranguá foi mudando sua geografia, florestas e pequenos morros foram suprimidos cedendo lugar a um vasto deserto verde de arroz irrigado, era o pró várzea que viria mudar a configuração do modelo agrícola que predominaria nas décadas seguintes. As centenas de trabalhadores necessárias durante as safras anuais foram substituídas por potentes máquinas: tratores, plantadeiras, colhetadeiras, etc.

As enxadas, as foices, as pás, os arados e as capinadeiras de tração animal, equipamentos esses imprescindíveis nas décadas passadas passaram a ter um concorrente poderoso, os venenos/agrotóxicos, de todos os tipos e graus de contaminação. Tudo isso é resultado da revolução verde ocorrida após a segunda guerra mundial que transformou tanques e venenos em equimamentos e insumos agrícolas. Foram os países periféricos os laboratórios dessa revolução levando a estagnação de milhões de pequenos agricultores.  

A diversidade de culturas que sempre dominou os campos no passado tem hoje tomado por duas ou três cultivares: a soja, o milho e a cana de acurar. São essas e outras culturas de menor impacto que tomam anualmente do governo federal, fabulosas somas de recursos do Plano Safra. Acredite, tanto a soja quanto ao milho, que lideram as áreas de cultivo são as principais commodities de exportação, das quais são transformadas em ração para alimentar as vacas, porcos, frangos na China, União Europeia e ouras nacionalidades.

Outro aspecto surpreendente na região sul de Santa Catarina é o crescimento da cultura da soja em terras antes tomadas pela atividade da mandioca, do feijão, até mesmo do arroz. Claro que tudo isso tem relação com as políticas agrícolas implementadas pelos governos de plantão. Claro que junto com a soja vem as doenças até então desconhecidas e que começam a afetar culturas tradicionais, bem como a fruticultura local.

Tanto a soja quanto o arroz que hoje lideram o cenário agrícola regional utilizam anualmente toneladas de agrotóxicos no combate de plantas “indesejadas”, fungos, insetos, etc. Se levarmos ao laboratório os alimentos que a população consome diariamente, principalmente hortaliças e frutas, é quase certo que serão detectadas a presença de partículas de agrotóxicos e outros metais pesados em índices bem elevados do permitido. Também a água que a população consome tem presença de partículas de agrotóxicos em grau assustadoramente superior ao recomendado pelas agências de saúde.

A presença da suja no litoral de santa Catarina é um sinal de alerta para os ecossistemas da mata atlântica. Se as expectativas se confirmarem do aumento de 85% da área cultiva no Brasil nos próximos vinte anos, ou seja, de 43,8 milhões de hectares hoje para 55,8, extensas áreas de florestas da mata atlântica poderão ser suprimidas a exemplo do que está ocorrendo no bioma do Serrado. Junto com a soja e outras culturas novas vêm também outros problemas, doenças, como fungos, insetos, até então desconhecidos.

Um exemplo foi o que ocorreu com a pitaya no sul de Santa Catarina, safra 2022/2023. Um inseto conhecido como TRIPS atacou as casas dos frutos afetando a qualidade estética. Toneladas tiveram que ser descartadas ou vendidas a um preço muito baixo. De acordo com observações feitas pelos órgãos de inspeção estadual da agricultura do estado, há fortes indícios que esse inseto tenha sido trazido pela soja e se espalhado pela região.

Prof. Jairo Cesa      

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