O
CICLO VICIOSO DOS AGROTÓXICOS NO MUNICIPIO DE ARARANGUÁ
Num
passado recente eram comuns no campo e até mesmo nos perímetros urbanos,
pessoas limpando suas lavouras e seus pátios com enxadas, foices, capinadeiras
e outros instrumentos agrícolas. É visível que esses equipamentos quase não
fazem mais parte do cotidiano do campo. Nas lojas agropecuárias esses
departamentos são ocupados atualmente por dezenas, centenas de recipientes de
agrotóxicos e outros insumos de uso agrícola. Lembro, na minha infância, que
quando era colhido feijão, milho, amendoim, arroz, etc, sempre reservávamos uma
pequena quantidade de semente para a próxima safra.
O
único veneno utilizado, isso raramente, era o tal de “carvin”, para eliminar
pulgas e bichos de pé. O tempo passou, o número de famílias no campo diminuiu e
extensas áreas de florestas nativas desapareceram cedendo lugar a monoculturas,
a exemplo do fumo e do arroz. A ciência também evoluiu, grandes laboratórios
conseguiram desenvolver sementes “melhoradas” capazes de produzir muito mais
que as convencionais. A transgenia, certamente, foi o marco determinante dessa
evolução.
Paulatinamente
sementes de milho, arroz, geneticamente alterados, passou a conquistar a
preferência dos agricultores e o desespero dos agroecologistas, ambientalistas,
pelos riscos que tais variedades de sementes poderiam causar aos ecossistemas.
Essas mudanças levaram praticamente a extinção das sementes crioulas e de
equipamentos de uso tradicional como enxadas.
A
vantagem de cultivar sementes modificadas se deve a praticidade e a sua “elevada
produção”, relatam os seus defensores. O milho, por exemplo, possui certas enzimas
na sua genética que o torna resistente ao ataque de certos insetos. No lugar da
enxada e capinadeira, o glifosato, princípio ativo do roundup passa a ser
aplicado para combater o mato. Imagine uma planta resistente ao veneno.
É
claro que toda essa evolução e praticidade trouxeram ganhos bilionários às
poderosas corporações que tem o monopólio sobre a produção e a comercialização
desses venenos, sementes e insumos. No
Brasil não há legislação que restringe o cultivo de sementes transgênicas, nem
mesmo a obrigação das empresas alimentícias de estamparem o símbolo transgênico
nas embalagens. Já os agrotóxicos são muitas as legislações que disciplinam a
comercialização e aplicação nas lavouras. Entretanto, o que mais se observa é a
pouca efetividade dos órgãos fiscalizadores para coibir as infrações, que são
muitos.
É
possível que quase todos os municípios brasileiros tenha descrito nos planos
diretores ou códigos ambientais artigos e parágrafos que disciplinam o uso de
agrotóxicos no campo. Em relação aos perímetros urbanos, diferente das áreas
rurais, é vedada a aplicação de agroquímicos. A explicação se deve ao fato de
que nas áreas urbanas não ser possível adotar os mesmos protocolos obrigatórios
no campo, ou seja, demarcação da área pulverizada com placas, mantendo-o em
quarentena por um determinado período.
O
município de Araranguá, tanto o plano diretor quanto o código ambiental, ambos
apresentam artigos e dispositivos que tratam sobre o tema agrotóxico. O arroz
irrigado se destaca em Araranguá e no extremo sul do estado de Santa Catarina
como uma das principais culturas. Sendo assim toneladas de agrotóxicos são despejados
todos os anos no solo, contaminando todo o ecossistema, principalmente a água consumida
pela população. A falta de uma fiscalização mais severa não impede que alguns
venenos proibidos sejam aplicados nessa cultura e outras.
Quem
transita pelos bairros e interior do município de Araranguá constata que o
plano diretor e o código ambiental municipal vêm sendo negligenciado pela
população e autoridades. O pior de tudo é que os órgãos fiscalizadores,
municipal e estadual, fazem vistas grossas frente a tais irregularidades. Um exemplo é o Art. 60, § XIX, referente ao
Capítulo III, da lei Lei Complementar 150/2012, que trata sobre Política
Ambiental do município de Araranguá.
O parágrafo impede que seja
utilizado agrotóxico e queimadas para o controle da vegetação como forma de
limpeza no território do município. Se, portanto, é
proibido, por que a prática da capina química vem acontecendo de forma
deliberada, sem que seus autores sejam autuados e penalizados? A legislação
estabelece que para a obtenção de qualquer agrotóxico se faz necessária
prescrição de um profissional habilitado, nesse caso o agrônomo.
Visitando
alguns estabelecimentos que comercializam agrotóxicos e outros insumos no
município de Araranguá, me deparei com opiniões desencontradas relativos ao
tema em questão. Perguntado a um atendente de uma loja que tradicionalmente
comercializa tal produto, o mesmo foi enfático em afirmar que para aquisição de
qualquer agrotóxico, glifosato, por exemplo, que o mais comum, é obrigação do
vendedor exigir do comprador a apresentação de respectivo receituário. Nas
outras quatro lojas visitadas, quando perguntado sobre um tipo de veneno para eliminar
o mato, na ora foi apresentado o glifosato.
Disseram
que não havia necessidade de apresentação de receituário, pelo fato do produto não
ser tão tóxico. Houve até o caso de um vendedor afirmar que só vendia glifosato,
que o Rondup, só era possível de ser adquirido em lojas especializadas. Talvez
por desconhecimento, não sabia o vendedor que o glifosato é o principio ativo
do Rondup, que ambos são a mesma coisa.
A
resposta comprovou o tamanho da desinformação que impera nesses
estabelecimentos, cujos profissionais deveriam estar bem informados sobre como
proceder acerca desses produtos. Afinal, se as legislações vigentes
impossibilitam que qualquer agrotóxico seja adquirido sem a apresentação de
receituário, por que as casas desse seguimento comercializam livremente o
produto? É necessário que as autoridades competentes desse setor venham a
publico esclarecer a população sobre o assunto. O que paira no ar é certo
obscurantismo das autoridades em relação ao assunto agrotóxico.
O
próprio meio jornalístico e jurídico resiste em abordar o assunto. Tais
omissões talvez se devam pelo fato de saberem da existência de irregularidades.
Para solucionar ou acabar com esse ciclo vicioso envolvendo o comércio
irregular de agrotóxicos, o caminho seria a participação da sociedade como
agente fiscalizador. Um exemplo para elucidar aconteceu há cerca de trinta dias
quando um avião agrícola estava pulverizando lavouras de arroz dentro do
perímetro territorial de Araranguá.
Sabendo
que essa prática era irregular, conforme descrito no Art. 60 da Lei
Complementar 150/2012, de imediato um cidadão ligou para o órgão estadual que
tem competência sobre o assunto. A resposta dada pelo representante do órgão
foi de que a eronave não estava habilitada para tal atividade, que caso viesse
persistir a ação seu proprietário seria autuado por crime ambiental.
A
conclusão que se chega quanto ao elevado consumo de veneno pela população está
no seu valor. Enquanto uma enxada o preço médio nas lojas varia entre 35 e 40
reais, um recipiente de agrotóxicos, o glifosato para eliminar mato, por
exemplo, o valor médio é de 16 a 20 reais. Na realidade esse valor baixo é pelo
fato de os agrotóxicos no estado de Santa Catarina serem subsidiados pelo
governo, ou seja, isentos ou cobrança ínfima de impostos.
Prof.
Jairo Cezar
Nenhum comentário:
Postar um comentário