A
HISTÓRIA LICENCIADA DOS HABITANTES DO SUL DO ESTADO ANTERIOR A CHEGADA DOS
IMIGRANTES EUROPEUS
Um
dos jornais de circulação diária no sul de Santa Catarina trouxe na capa
manchete destacando o dia 21 de fevereiro, data comemorativa a chegada de
imigrantes italianos no Brasil. Lendo a reportagem, nota-se que há o claro
propósito de enaltecer os valores e feitos do imigrante italiano, sua
contribuição na construção da civilidade nacional, na gastronomia e técnicas
produtivas.
Em
nenhum momento o jornal fez qualquer menção à presença indígena nas terras
pretendidas e ocupadas pelos colonos, bem como o processo genocida que dizimou
grupos inteiros como os Xoklengs. O texto, por outro lado, contribui para
refletir o modo como certos povos ou acontecimentos são enaltecidos, e outros,
silenciados. Entretanto, as chagas do genocídio indígena no sul do estado,
embora silenciada, jamais poderá ser apagada da história. São muitas obras
contendo relatos das brutalidades cometidas por cidadãos que acumularam
fortunas matando indígenas.
A
proposta, tanto dos governos como das companhias que intermediavam compra e
venda dos lotes era “limpar as terras”, para garantir que o imigrante a
ocupasse sem o infortúnio de sofrer um ataque indígena. A partir de 1850, com a
aprovação da Lei Terras, as áreas sem registro de propriedade ou escritura eram
consideradas devolutas, ou seja, áreas públicas pertencentes ao governo. São
essas terras, principalmente no sul do estado de Santa Catarina, que o governo imperial
entregou as companhias com o intuito de que fossem demarcadas e
comercializá-las.
Quando
aqui chegaram os colonos italianos, alemães, entre outros, não sabiam que os
lotes estavam cobertos por densas florestas, das quais eram habitadas por
indígenas. No entanto, por não possuírem o título de propriedade, esses
indivíduos eram considerados invasores, devendo ser expulsos ou eliminados
imediatamente. Assim surgiram os bugreiros, grupos armados que invadiam
acampamentos indígenas, principalmente à noite, matando-os.
Esses
matadores recebiam das companhias ou dos colonos o pagamento por cada indivíduo
morto. Se observarmos atentamente o nome das ruas ou logradouros públicos dos
municípios colonizados por italianos, alemães, etc, com raríssima exceção
poderá ser identificada uma ou mais ruas que faz menção a um nome ou termo
indígena. Em Criciúma, por exemplo, quem
transita pelas imediações do Parque das Nações irá perceber uma série de
bandeiras hasteadas no seu interior.
Cada
uma delas representa uma nacionalidade da qual o povo criciumense descende. A
sensação que se tem é de que a historia do município somente teve início a
partir da chegada desses imigrantes, que anterior a isso nada existia ninguém
habitava o território. Muitos daqueles que foram e são homenageados com nomes
de ruas e praças, tem suas imagens e histórias forjadas. Geralmente, na leitura
da biografia do postulante a homenagem somente virtudes são expressas.
Parece
que essa cultura de enaltecimento de personalidades com históricos rebuscados
de perversidade vem mudando ao longo do tempo. Um exemplo disso ocorreu no
município de Nova Veneza quando a municipalidade decidiu dar o nome a praça de
um cidadão, que segundo relatos históricos, foi um dos principais matadores de
índios na região. A revelação de tal perversidade contra indígenas partiu de um
professor de História da UFSC, que é natural de Nova Veneza.
Embora
a família do postulante a placa comemorativa tenha acionado a justiça
denunciando-o por injúria e calúnia, o professor manteve sua posição,
fundamentando seu discurso a partir de fontes bibliográficas, que comprovam ser
o cidadão homenageado um matador de índio na região. Sabemos que muito dos
erros cometidos no passado jamais poderão ser reparados, a exemplo do genocídio
contra os indígenas, os verdadeiros donos das terras que hoje habitamos. No entanto, é necessário trazer à luz a
verdade sobre nomes, símbolos, dos quais consideramos imaculados. Revisar fatos
é a grande oportunidade de destruir mitos, uma forma de obscurantismo, cegueira
social.
Prof.
Jairo Cesa
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