domingo, 21 de fevereiro de 2021

 

A HISTÓRIA LICENCIADA DOS HABITANTES DO SUL DO ESTADO ANTERIOR A CHEGADA DOS IMIGRANTES EUROPEUS

Um dos jornais de circulação diária no sul de Santa Catarina trouxe na capa manchete destacando o dia 21 de fevereiro, data comemorativa a chegada de imigrantes italianos no Brasil. Lendo a reportagem, nota-se que há o claro propósito de enaltecer os valores e feitos do imigrante italiano, sua contribuição na construção da civilidade nacional, na gastronomia e técnicas produtivas.

Em nenhum momento o jornal fez qualquer menção à presença indígena nas terras pretendidas e ocupadas pelos colonos, bem como o processo genocida que dizimou grupos inteiros como os Xoklengs. O texto, por outro lado, contribui para refletir o modo como certos povos ou acontecimentos são enaltecidos, e outros, silenciados. Entretanto, as chagas do genocídio indígena no sul do estado, embora silenciada, jamais poderá ser apagada da história. São muitas obras contendo relatos das brutalidades cometidas por cidadãos que acumularam fortunas matando indígenas.

A proposta, tanto dos governos como das companhias que intermediavam compra e venda dos lotes era “limpar as terras”, para garantir que o imigrante a ocupasse sem o infortúnio de sofrer um ataque indígena. A partir de 1850, com a aprovação da Lei Terras, as áreas sem registro de propriedade ou escritura eram consideradas devolutas, ou seja, áreas públicas pertencentes ao governo. São essas terras, principalmente no sul do estado de Santa Catarina, que o governo imperial entregou as companhias com o intuito de que fossem demarcadas e comercializá-las.

Quando aqui chegaram os colonos italianos, alemães, entre outros, não sabiam que os lotes estavam cobertos por densas florestas, das quais eram habitadas por indígenas. No entanto, por não possuírem o título de propriedade, esses indivíduos eram considerados invasores, devendo ser expulsos ou eliminados imediatamente. Assim surgiram os bugreiros, grupos armados que invadiam acampamentos indígenas, principalmente à noite, matando-os.

Esses matadores recebiam das companhias ou dos colonos o pagamento por cada indivíduo morto. Se observarmos atentamente o nome das ruas ou logradouros públicos dos municípios colonizados por italianos, alemães, etc, com raríssima exceção poderá ser identificada uma ou mais ruas que faz menção a um nome ou termo indígena.  Em Criciúma, por exemplo, quem transita pelas imediações do Parque das Nações irá perceber uma série de bandeiras hasteadas no seu interior.

Cada uma delas representa uma nacionalidade da qual o povo criciumense descende. A sensação que se tem é de que a historia do município somente teve início a partir da chegada desses imigrantes, que anterior a isso nada existia ninguém habitava o território. Muitos daqueles que foram e são homenageados com nomes de ruas e praças, tem suas imagens e histórias forjadas. Geralmente, na leitura da biografia do postulante a homenagem somente virtudes são expressas.

Parece que essa cultura de enaltecimento de personalidades com históricos rebuscados de perversidade vem mudando ao longo do tempo. Um exemplo disso ocorreu no município de Nova Veneza quando a municipalidade decidiu dar o nome a praça de um cidadão, que segundo relatos históricos, foi um dos principais matadores de índios na região. A revelação de tal perversidade contra indígenas partiu de um professor de História da UFSC, que é natural de Nova Veneza.

Embora a família do postulante a placa comemorativa tenha acionado a justiça denunciando-o por injúria e calúnia, o professor manteve sua posição, fundamentando seu discurso a partir de fontes bibliográficas, que comprovam ser o cidadão homenageado um matador de índio na região. Sabemos que muito dos erros cometidos no passado jamais poderão ser reparados, a exemplo do genocídio contra os indígenas, os verdadeiros donos das terras que hoje habitamos.  No entanto, é necessário trazer à luz a verdade sobre nomes, símbolos, dos quais consideramos imaculados. Revisar fatos é a grande oportunidade de destruir mitos, uma forma de obscurantismo, cegueira social. 

Prof. Jairo Cesa         

             

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