quinta-feira, 18 de junho de 2020


O GOVERNO BOLSONARO: A METÁFORA ENTRE A CRIATURA E SEUS CRIADORES

O cinema produziu obras espetaculares e marcantes no gênero terror/ficção científica, dentre elas o filme Frankenstein, produção diversas vezes adaptada ao cinema e inspirada na obra escrita pela Suíça Mary Shalley, em 1818. A história de ficção descreve o desejo de maluco de um cientista obcecado em criar um ser humano aproveitando fragmentos de cadáveres humanos.
No entanto, depois de dois anos já extasiado e arrependido pelo esforço empregado, o cientista Viktor perde interesse e deixa de lado a monstruosa criatura. Frankenstein, nome dado a criatura, começa a ter entendimento das suas limitações que lhe frustram com profundidade. Um turbilhão de sensações negativas toma conta de sua mente.  Sai para vingar o seu criador, matando as pessoas próximas de Viktor, inclusive da sua noiva. 
Se prestarmos atenção no contexto da obra, perceberemos que muito do que está escrito tem algum nexo com o atual governo brasileiro. Durante as eleições presidenciais, são incalculáveis os escritos alertando a sociedade do perigo de estar fabricando uma criatura que mais tarde perseguiria os seus criadores.
Em pouco mais de um ano à frente do poder, os índices de satisfação da população ao governo Bolsonaro caíram substancialmente. E os motivos dessa rejeição são perceptíveis aos olhos de todos, menos para uma fração de ideológicos fanáticos apoiadores, que insistem em defender a criatura, usando-se de todos os artifícios possíveis para mantê-lo no poder. Parte da imprensa conservadora brasileira prestou um excelente serviço na condução do candidato do PSL ao posto de presidente.
Na época, durante o segundo turno eleitoral, transformaram o candidato opositor de Bolsonaro, Fernando Hadadd, em um monstro a ser expurgado a todo custo à chance de vitória.  Mesmo não participando de nenhum debate promovido por uma das principais emissoras de TV brasileira, a ausência não foi suficiente para que a população visse no candidato a chefe da nação, atributos negativos à função dos quais seriam conferidos no decorrer de dois anos de governo. Foram muitos os atos inconseqüentes do presidente e de seu ministério, que estão produzindo ressentimentos e dúvidas sobre o futuro de milhões de brasileiros que hoje reconhecem que foram iludidos e enganados.
Será que alguém ainda duvidava que fosse diferente no poder, alguém que reverenciava figuras desprezíveis como, por exemplo, o militar Brilhante Ustra, que durante o regime militar atuou na perseguição e tortura de pessoas que se opunham ao regime? O ataque à imprensa, ao STF e ao Congresso Nacional, esse último composto majoritariamente por representantes das poderosas e tradicionais oligarquias, é um demonstrativo de que a criatura completou sua metamorfose, transformando-se num monstro, devorando qualquer um que o ameace.
Os fragmentos ou pedaços que compõem o conjunto do “corpo” do qual recebeu vida são membros doentes, alguns já necrosados que atuam produzindo atos irresponsáveis que alimentam o ego da criatura. São incontáveis os desarranjos administrativos cometidos pela turma do planalto, no entanto, nada disso consegue conter o ímpeto de crueldade da criatura, que se sente mais fortalecido diante do caos, da desordem, da crueldade.  
Durante a campanha à presidência da república, uma das possíveis causas que levaram à vitória do candidato fabricado pela mídia e transformado em personagem mítica, foi à desesperança da população com o modelo político tradicional vigente. Na realidade essa população desassistida, desesperançosa, foi mais uma vez transformada em massa de manobra das elites dominantes, como é de praxe.
A elite sempre adotou historicamente instrumentos sórdidos para manter o status quo econômico e político. Para essa camada privilegiada da sociedade é inconcebível imaginar rupturas de regimes. Uma sociedade constituída por mais de 80% de analfabetos estruturais, é muito fácil manipulá-las, e a vitória do candidato fabricado pela elite é um bom exemplo dessa arquitetura construída.
Era necessária a todo custo impedir qualquer possibilidade de um candidato à esquerda ter alguma chance de vitória ao posto de presidente. Quem assistiu os debates dos candidatos presidenciáveis, mesmo as pessoas com o mínimo de instrução, tinham clareza de quem propalava discursos alinhados aos verdadeiros ensejos da sociedade. A pouca clareza e o medo proliferado de que o Brasil poderia ser governado por comunistas, fez a mídia e as elites econômicas prepararem o terreno para dar posse àquele que mais tarde agiria contra os seus criadores, reivindicando vida eterna.  
Prof. Jairo Cezar     



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