sexta-feira, 22 de fevereiro de 2019


O PACOTE DE MALDADES DO GOVERNO BOLSONARO E A REFORMA PREVIDENCIÁRIA



Consultando acervos bibliográficos sobre início de governos, não identifiquei fontes, relatos ou dados que comprovem ter ocorrido período tão conturbado em tão pouco tempo do governo, como o atual governo Bolsonaro. Desde a campanha eleitoral o comportamento nada convencional do candidato e de pessoas próximas, já demonstrava sinais de que dias turbulentos estavam por vir, era só uma questão de tempo. Em texto publicado anteriormente ao resultado eleitoral, “profetizava” que na hipótese de vitória do candidato do PSL à presidência, cerca de um mês ou pouco mais, seus eleitores e simpatizantes já sentiriam na carne a burrada que cometeram.
 Em conversas informais afirmava que o governo Bolsonaro ficaria à frente do cargo de presidente no máximo seis meses, perdendo o posto por meio de processo de impeachment. Quarenta dias depois da romântica e apoteótica solene de posse, com direito de desfilar no famoso Rolls Royce presidencial, além da sua esposa, também teve o acompanhamento de um de seus filhos, o mesmo que se tornou pivô de um episódio cujo desfecho foi a demissão do ministro das relações institucionais, acusado de responsável pela transferência de fundos eleitorais públicos para uma candidata à deputada federal laranja.
Antes da eleição vitoriosa de Bolsonaro, é possível enumerar a quantidade de promessas absurdas ditas pelo governo e seus comandados que, se eleito, colocaria em xeque conquistas históricas do povo brasileiro. Mesmo com tantos absurdos ditos, não foram suficientes para impedir sua vitória.  A liberação do porte de armas; a flexibilização dos licenciamentos ambientais; os desmontes dos órgãos ambientais - IBAMA, ICMBio; a incitação à violência nos seus comícios; as promessas de revisar as demarcações de terras indígenas já homologadas são alguns exemplos de propostas nefastas e anti-sociais.
Não chegou esquentar a cadeira presidencial e a natureza, como um aviso, respondeu aos possíveis absurdos pretendidos pelo governo, como enfraquecer ou extinguir órgãos ambientais fiscalizadores como IBAMA e ICMBio. Como um filme já exibido há três anos, o caso Mariana, no final de janeiro de 2019, outra barragem de rejeitos de mineração se rompe na cidade de Brumadinho, ceifando centenas de vidas e comprometendo para sempre o futuro de outros milhares.
Dias depois outro episódio criminoso também ceifou a vida de outras 10 crianças no centro de treinamento do flamengo, conhecido como o ninho do urubu. Tanto o desastre em Minas Gerais como do Rio de Janeiro, ambos tem relação com a falta de fiscalização e negligência política. Adivinha quem foram presos pelos crimes cometidos, claro, os “bagrinhos”, pois os “tubarões”, costas quentes, são protegidos pelos panos da impunidade.
Lembram que durante a campanha passada a imprensa e seguimentos ligados ao capital gritavam aos quatro ventos da necessidade de renovação política, de combate a corrupção, lavagem de dinheiro, caixa dois, fraudes, etc, etc. A apelação proporcionou a escolha de candidatos novos, vinculados a partidos não associados às tradicionais agremiações viciadas, um congresso e assembleias legislativas renovadas. Muitos dos tradicionais figurões de reeleições repetidas, três, quatro, cinco ou mais mandatos, ficaram pelo caminho, sendo as vagas preenchidas pelos “novos”. Novos no sentido de primeiro mandato, pois vem demonstrando ser tão ou mais tradicionais, conservadores, moralistas, que os anteriores.
São essa "nova” representante do povo que vão atuar na reorganização do país, no enxugamento e moralização da máquina pública, no resgate da família tradicional, no combate a ideologização da educação, enfim, transformar o Brasil num modelo de justiça social. Quem acredita em papai Noel, contos de fadas, etc.? Querem posturas mais conservadoras e retrógradas que essas. Então esse é o governo do discurso moralista e redentor, parecido com o que foi apresentado pelo candidato Collor de Mello há quase trinta anos, que conseguiu hipnotizar, enganar milhões de brasileiros, porém, caiu dois anos depois. Lembra da super-ministra da fazenda de Collor, Zélia Cardoso de Mello?
Quais as semelhanças dela com o super ministro da economia de Bolsonaro, Paulo Guedes? É impressionante como fatos se repetem e a população não aprende, repetindo os mesmos erros. Tanto o plano econômico da super-ministra anterior como do atual, ambos compartilham com o mesmo propósito, reformar e privatizar tudo o que for possível.
A reforma da previdência se transformou a partir da posse do governo Temer num dos principais objetivos e desafios do congresso brasileiro. Não tendo havido tempo suficiente para sua aprovação em 2018, pois teria riscos óbvios de rejeição por denúncias de envolvimento do presidente em atos ilícitos, o assunto foi mantido em stand by, retornando ao cenário dos debates no congresso com força total.
Um governo fragilizado, como foi o de Temer no ultimo ano de mandato custou muito caro para os cofres públicos. Toda vez que um projeto de interesse de seguimentos como a lei dos agrotóxicos entrava para votação ou alguma ação de investigação contra o governo de suspeita de crime de desvio de responsabilidade, entrava em ação os negociadores, barganhando votos ou cargos.   
Mantido o texto original como pretende o governo, a reforma previdenciária proporcionará um dos maiores ataques histórica aos trabalhadores, desconstruindo dispositivos da própria constituição federal de 1988, como o artigo 195 que compreende a aposentadoria como princípio solidário, ou seja, um direito assegurado a todos os brasileiros.[1] O texto propõe desmontar esse princípio, abrindo as portas para o fim definitivo da aposentadoria. Quando o governo diz que o propósito é acabar com privilégios, criminalizando os servidos públicos como responsáveis pela quebra da previdência, ele está mentindo.
No mesmo artigo da CF, acima citado, no parágrafo três, o mesmo veda a concessão de empréstimos públicos ou incentivos fiscais às empresas que comprovem terem débitos com a receita ou seguridade social. Lembram do caso da JBS, que por longo tempo ocupou os noticiários dos tele jornais por envolvimento em crimes da lava jato. Então, essa empresa era na época uma das maiores devedoras da previdência social, mesmo assim continuava obtendo empréstimos federais.[2]
Sobre o mito de que servidores públicos estão quebrando a previdência. Se comparar os proventos recebidos por certas categorias dos servidos públicos: Professores, policiais, médicos, entre outros, os valores percebidos são infinitivamente inferiores aos de outros seguimentos como Promotores, Juízes, desembargadores, Políticos, etc., etc. Outro detalhe importante, a previdência social já passou por várias reformas nos últimos anos. A primeira delas foi no governo Collor, com o aumento das aposentadorias; a segunda no governo FHC, mudança no tempo de contribuição; a terceira no governo Lula, mudança para servidores, cobrando de inativos e pensionistas, e a quarta e última, na gestão Dilma.[3] 
Em 2013, durante o governo de Dilma Rousseff, a previdência sofreu uma reforma acabando com a aposentadoria integral. Para ter direito ao teto previdenciário, os servidores teriam que fazer um fundo a parte, ou fundo de capitalização, o mesmo que é proposto com a atual reforma. Outro detalhe, a contribuição dos servidores públicos para o INSS é superior aos da iniciativa privada, hoje 11% e 8.5%.
Agora imaginamos um/a cidadão/ã, agricultor/a, por exemplo, que começou a trabalhar na tenra idade, que é a realidade para milhões de brasileiros. A legislação hoje estabelece 60 anos de idade, homem, e 55, mulher, para ter direito a aposentadoria integral, um salário mínimo de R$ 998,00. As condições laborais no campo são tão penosas que quando atingem a idade limite para, em fim, aproveitar o pouco que resta do tempo de vida, o ridículo salário que tem direito a receber, mal cobre os medicamentos para manter-se vivo. Ampliar para 62 e 65 é mesmo que assinar um atestado de óbito. O pior de tudo é que terão que contribuir por cerca de 40 anos para ter direito ao salário integral. Hoje apresentando notas de compra e vendas de mercadores já são suficientes para garantir a aposentadoria.   
O que dizer daqueles cidadãos que tem direito a benefícios da Prestação Continuada, idosos e pessoas com deficiências de baixa renda? A regra em vigência concede benefícios de um salário mínimo, a partir dos 65 anos de idade. O texto da nova proposta defende direito ao salário mínimo integral ao idoso quando completar 70 anos. Antes dessa idade, quando completar 60 anos, receberá uma ajuda de R$ 400.00. Pessoas com deficiência, a proposta garante o que está em vigor.  É importante repetir a exaustão o que se espera dos trabalhadores no futuro. Serão poucos os que terão direito à aposentadoria, pois, além da idade, deverão comprovar contribuição por um período determinado de tempo, 40 anos, para ter assegurado provento integral.
Atualmente, mais de 50% da população ativa no Brasil se encontra na informalidade, ou seja, não contribui com nenhum centavo com a previdência. É bem possível que essa demanda de cidadãos/ãs informais jamais irão se aposentar, engrossando a lista dos virtuais beneficiados da prestação continuada do Estado quando completarem 70 anos de idade. É preciso urgentemente desmascarar esse governo, grande parcela do congresso brasileiro e a poderosa imprensa rentista, que estão enganando a população com afirmações falsas de que a previdência está quebrada e que é necessário reformá-la.
A verdade sobre esse tema tem de ser revelada à população, antes que seja tarde demais. O interesse da reforma em questão é beneficiar bancos e o poderoso capital financeiro, que vão abocanhar bilhões, trilhões, dos contribuintes brasileiros. Um dos pontos da proposta que explicita essa intenção de favorecer os bancos é quanto a prerrogativa que estabelece o teto máximo para aposentadoria integral dos trabalhadores públicos e privados.
Para assegurar um futuro mais tranqüilo quando atingir o limite de idade, o trabalhador é forçado a criar um fundo previdenciário paralelo, denominado fundo de capitalização privada. Hoje em dia mais da metade dos trabalhadores da iniciativa privada recebem cerca de três salários mínimos. Com que dinheiro esse seguimento da população fará o seu fundo previdenciário privado?
O fato é que se a previdência está em condições deploráveis, que pode quebrar daqui alguns anos, como apregoam os reformistas, a culpa disso não é e nuca foi dos trabalhadores, tanto da iniciativa pública e privada. Em nenhum momento governo, parcela do congresso e setores da imprensa, teve a coragem de tirar as máscaras e explicar a população o motivo da necessidade da reforma da previdência social.
Há muitos anos os governos vêm fazendo a política de desmonte da previdência e de outros setores do seguimento público. E como isso acontece? O caminho se dá pela RENÚNCIA FISCAL e outros dispositivos generosos que beneficiam poderosas empresas, principalmente do seguimento petrolífero que atuam no Pré-Sal. O governo brasileiro abriu mão de um trilhão de reais em receitas nos próximos 10 anos, a mesma economia que terá a previdência, nesse período, segundo seus defensores.
 Em 2017, o governo Temer instituiu o REFINS (Programa de Refinanciamento de Dívidas Tributárias) para donos de empresas e produtores rurais. Esse instrumento legal proporcionou generosos descontos aos devedores da previdência. São inúmeros os casos comprobatórios de recursos previdenciários desviados ou que jamais foram cobrados de empresas.
Quando relatos preocupantes como o da reforma da previdência é postado em blogs e outros meios convencionais e digitais, geralmente é costume dos seguimentos conservadores da sociedade, desmoralizar ou taxá-lo de subversivo, comunista, petista, quem o escreve. Em 2017, o senado federal concluiu investigação sobre a previdência social, cujo relatório com dezenas de páginas trouxe à luz o falso déficit da seguridade social.[4] Desde a sua conclusão, esse relatório jamais foi apresentado ao público.
Na leitura do resumo do texto conclusivo na comissão do senado em 25 de outubro de 2017, cuja mesa foi coordenada na época pelo senador Paulo Paim, do PT/RS, o relator da CPI, o senador Hélio José da Silva e Lima, do PMDB, fez algumas considerações extremamente relevantes acerca do relatório O relatório da CPI, que deve ser de conhecimento da sociedade, traz um histórico da previdência e seus desdobramentos ao longo do tempo.
Segundo o relator, a mesmo afirmou que o documento teve a participação de dezenas de senadores, outros tatos profissionais e mais de trinta audiências públicas. O que se apurou foram erros, imprecisões e fraudes cometidos não por assegurados comuns, mas por quadrilhas especializadas. O próprio governo é cúmplice desses vícios praticados a previdência, como o desvio de recursos para gastos de interesse do governo.
Empresas públicas como bancos também estão na lista dos inadimplentes com a previdência. A leniência ou abrandamento de dívidas também foi outra constatação.  Muitas empresas devedoras com a seguridade social tiveram seus débitos parcelados ou perdoados. Sem contar os vários casos de sonegadores que burlam documentos para isentar-se do pagamento de tributos.
Outro equívoco encontrado no relatório foi quanto ao envelhecimento da população, que conforme constatação na CPI, os números ficam aquém do anunciado pelo governo de se ter menos contribuintes à previdência e mais beneficiados. A afirmação é que o governo vem exagerando nos números em comparação ao crescimento do PIB.[5]
Na explanação, o relator lançou algumas proposições que poderão reverter esse quadro nada positivo da previdência. A revisão das políticas de desonerações e renúncias fiscais são uma delas. A cobrança de dívidas ativas e a ampliação do número de auditores fiscais intensificariam o controle mais efetivo junto as empresas no combate as fraudes tributárias. O próprio TCU, Receita Federal, teriam que promover mutirões no combate aos crimes da previdência, lavagem de dinheiro, entre outros.
O relator da CPI citou três instrumentos de medições sobre déficit e superávit da previdência que demonstram incompatibilidade entre ambos. De acordo com levantamentos feitos pelo governo federal a previdência social possui um rompo estimado das contas de 258 bilhões de reais. O TCU trouxe outros números. Déficit existe, porém é menor que o apresentado pelo governo, que é de 240 bilhões.
O relatório conclusivo da CPI da previdência trouxe dados de outro instituto, a ANFIP (Associação Nacional de Auditores Fiscais), que é merecedor de respeito devido a sua representatividade no cenário investigativo dos tributos transferidos do setor produtivo ao Estado. Diferente do TCU e do governo, a ANFIP apresentou dada que mostram ter havido superávit de 11,2 bilhões de reais. O único momento crítico que confirma ter havido déficit foi em 2016, durante a longa crise recessiva vivida pelo Estado, cuja previdência teve prejuízo de 58,99 bilhões de reais. Portanto, esses números lançados pela ANFIP, deveriam ser considerados como respostas contrárias à reforma previdenciária.  
Outro mecanismo usado pelos governos para reduzir o aporte de recurso para fundos sociais, nesse caso a previdência social, foi a criação da DRU (Desvinculação das Receitas da União). Com isso governos podem transferir parte dos recursos destinados à educação, saúde e seguridade social, para outros fins. Entre 2005 a 2015, a DRU retirou ou desviou recursos destinados a previdência na ordem de 519 bilhões de reais. Em 2016, emenda constitucional foi aprovada prorrogando esse dispositivo de desvio para até 2023, cujo percentual saltou de 20 para 30%.
Somando, portanto, renúncia de receitas, sonegação fiscal, DRU e a não cobrança de dívidas de empresas, municípios e estados, à previdência, o volume de dinheiro seria suficiente para garantir uma previdência social a todos os brasileiros por décadas. E por que o governo não corre atrás e soluciona esse problema? Por que tudo é uma farsa, um jogo de cena. Quem está por trás de todo cenário teatral é o capital especulativo, sedento por abocanhar os trilhões de reais oriundos do regime de capitalização dos desatentos e dóceis contribuintes.    
Prof. Jairo Cezar


[1] Art. 195. A seguridade social será financiada por toda a sociedade, de forma direta e indireta, nos termos da lei, mediante recursos provenientes dos orçamentos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, e das seguintes contribuições sociais:
[2] Art. 195, § 3º A pessoa jurídica em débito com o sistema da seguridade social, como estabelecido em lei, não poderá contratar com o poder público nem dele receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios.
[3] https://www.nexojornal.com.br/expresso/2016/09/08/Brasil-j%C3%A1-teve-grandes-reformas-na-Previd%C3%AAncia.-Em-que-contexto-elas-ocorreram
[4] https://www.bing.com/videos/search?q=cpi+da+previd%C3%AAncia+senado&qs=AS&pq=cpi+da+previ&sk=AS7&sc=8-12&cvid=F4BC8CD832EC4006B296069E7517A49F&sp=8&ru=%2fsearch%3fq%3dcpi%2bda%2bprevid%25c3%25aancia%2bsenado%26qs%3dAS%26pq%3dcpi%2bda%2bprevi%26sk%3dAS7%26sc%3d8-12%26cvid%3dF4BC8CD832EC4006B296069E7517A49F%26FORM%3dQBRE%26sp%3d8&view=detail&mmscn=vwrc&mid=2BEB985D8BFB4B8E15C82BEB985D8BFB4B8E15C8&FORM=WRVORC

Um comentário: