quarta-feira, 13 de fevereiro de 2019


O JEITO ERRADO DE CONSUMIR ÁGUA E ENERGIA ELÉTRICA NAS ESCOLAS DA REDE PÚBLICA ESTADUAL DE SANTA CATARINA



Há cerca de um ano o governo do estado de Santa Catarina em parceria com a ACAERT (Associação Catarinense de Emissoras de Rádio e Televisão) e outras entidades como a própria FIESC (Federação das Indústrias do Estado de Santa Catarina) lançaram programa Jeito Catarinense de Fazer as Coisas Certas, cujo objetivo era “motivar a sociedade a tomar atitudes que visassem o bem coletiva no dia a dia, estimulando ações positivas e desencorajando ações negativas”. Toda vez que um governo ou entidade se lançarem a promover programas desse nível é importante a população, antes de tudo, refletir sobre os tipos de serviços oferecidos, se realmente os dirigentes públicos estão isentos de vícios administrativos que possam desmoralizá-los.
O programa envolveu 892 escolas estaduais totalizando 120 mil estudantes matriculados com idades de 8 a 12 anos. É bem provável que metade ou mais da metade dessas escolas sofram alguma carência tanto estrutural quanto pedagógica da qual dificulta a promoção de uma educação no mínimo decente. É um tanto difícil até mesmo desmoralizante para essas crianças saírem à rua, munidas de cartões vermelho e apresentarem a alguém que tenha cometido algum ato negativo, quando sabem que na sua escola pouca coisa funciona por negligência do próprio governo.
Dentre os temas abordados nas cartilhas distribuídas às respectivas escolas estão: o tratamento às pessoas, a natureza, no trânsito e o cuidado com a saúde. Poderia aqui destacar todos os temas correlacionados acima, mostrando o farto repertório do jeito errado como o governo catarinense vem tratando à saúde, educação, segurança, mobilidade, meio ambiente, etc. Vamos focar nossa reflexão na temática ambiental no estado e verificar no final qual dos dois cartões o governo estadual deveria merecer.
Em 2016 a EEBA de Araranguá/SC iniciou projeto ambiental tendo por objetivo despertar a sensibilidade da comunidade escolar acerca dos cuidados com a escola, chamando a atenção para o não desperdício de água e energia elétrica na instituição de ensino. No primeiro ano do projeto, o empenho foi mobilizá-los, instruindo-os à necessidade de mudar posturas quanto ao uso dos equipamentos elétricos e hidráulicos da unidade de ensino. A idéia também era fazer com que as ações executadas na escola pudessem refletir no cotidiano doméstico dos estudantes, prestando mais atenção aos erros cometidos diariamente em suas casas (desperdícios de água e energia) que corroem parte significativa a renda familiar.
Sem qualquer apoio financeiro do estado, o projeto foi levado a diante  com o esforço da equipe coordenadora e de pequena subvenção financeira do governo federal. Esse valor proporcionou algumas atividades extraclasses como visita a uma das nascentes da bacia hidrográfica do rio Araranguá, a comunidade tradicional de ilhas onde desemboca a água da bacia e as principais estações de tratamento de água que abastece o município.
Se o projeto em questão era para a contenção de desperdícios de água e energia elétrica na EEBA, o grupo necessitava ter acesso aos estratos dos valores para poder saber e comparar o quanto de água e energia se consumiu e o montante desperdiçado. O primeiro erro detectado pelo grupo foi perceber que a equipe gestora da escola não recebe mensalmente os estratos de ambas as contas, portanto, não tem conhecimento do consumo e dos possíveis problemas que afetam os sistemas. Para ter acesso a tais informações foi necessário ir à ADR (Agência de Desenvolvimento Regional de Araranguá) e solicitá-las. Os números apresentados nos extratos comprovavam que cerca de 40 ou 50% da água e energia da EEBA eram desperdiçadas. A troca de lâmpadas convencionais por econômicas, limpezas dos ar- condicionados e intensa campanha de conscientização nas salas contribuiu para reduzir significativamente os desperdícios. Em cinco ou seis meses de intensa campanha o valor financeiro economizado alcançou os 5 mil reais.
Tendo identificado em uma instituição de ensino vinculada a rede pública estadual de Santa Catarina desperdícios acentuados no consumo de energia e água, era de se  supor que nas demais 42 escolas que integram a 22 GERED/Araranguá, também houvesse desperdícios similares ao da EEBA. O acesso às cópias dos estratos das contas de energia elétrica e água das 42 escolas, de 2013 a dezembro de 2018, gerou apreensão aos integrantes do projeto escola sustentável da EEBA no instante que depararam com valores de faturas pagas à CELESC, CASAN e SAMAES.
Eram números mostrando consumos incompatíveis à real necessidade da escola, que hipoteticamente teria o elevado consumo relação com problemas na estrutura elétrica e hidráulica ou, o mais provável, práticas equivocadas no uso dos equipamentos. Analisando os estratos do consumo de energia elétrica de 2013 a dezembro de 2018, foi conveniente destacar alguns casos particulares de escolas cujos valores cobrados pelo consumo em um mês extrapolaram as médias toleráveis. Em fevereiro de 2013 tivemos o exemplo da EE.B Maria Garcia Pessi, cujo extrato discriminava valor pago em um único mês de 9.313,65 reais em energia elétrica. Entre 2014, 2015, 2016,  a EEB Castro Alves, com cerca de 1000 estudantes matriculados, durante seis meses intercaladas, o total pago a CELESC foi de 63.477 reais.
Também em 2014, 2015, 2016, 2017 e 2018, a EE Macário Borba, com cerca de 800 estudantes, em seis meses intercalados, gastou o equivalente a 51.779  reais.  A EE Maria Garcia Pessi, num único mês, em 2016, o extrato totalizou consumo de 14.377 reais em energia elétrica. Admite-se que pelo fato da escola na época estivesse passando por reformas, o valor elevado presente no demonstrativo tivesse alguma relação a construção do empreendimento. Porém, os valores excessivos nos extratos não se limitaram somente a tais unidades. As escolas EEB Timbé do Sul e João Colodel, do município do Turvo, aparecem também na lista dos desperdícios.
A do Timbé, os números aparecem nos meses de outubro de 2016, abril de 2017 e março de 2018, cuja soma totalizou 15.267 reais. Convém destacar que a respectiva escola foi inaugurada há cerca de três anos, totalizando  500 estudantes matriculados. A segunda escola da lista com valores abusivos, a João Colodel,  também foi inaugurada no mesmo instante que a EEB Timbé do Sul. Totalizando 720 estudantes matriculados, os estratos de energia, entre 2016 e 2017,  permitiu pensar que falhas no sistema elétrico ou descuidos estivessem contribuindo para somas tão elevadas. Foram cinco meses com valores superiores a cinco mil reais na conta de energia, que totalizaram 26.876 reais.
Algumas observações são necessárias para que o público compreenda com clareza a metodologia aplicada e os seus resultados. No aspecto consumo de energia elétrica foram destacadas as escolas que tiveram nos seus extratos valores acima de cinco mil reais. Se fossem também acrescentados os valores próximos aos citados, nessas mesmas escolas, se chegaria a um valor 40 a 50% superior ao apresentado acima. Quanto às demais unidades ficou nítido que quase todas apresentaram alguma anormalidade no consumo, resultando até em valores exorbitantes cobrados no mês de janeiro, período em que as escolas estão em recesso. Somente isso exigiria uma atenção mais atuante da equipe gestora da escola e da Gerencia regional.
Não há dúvida que a elevação do consumo de energia conforme o relatório apresentado é mais pertinente nos meses com maior incidência de calor, pelo fato dos ar condicionados estarem em funcionamento. Entretanto, a relação estudantes matriculados vezes valores elevados pagos por algumas escolas, lançam dúvidas sobre o funcionamento dos sistemas elétricos, que deveriam ser monitorados e detectados possíveis falhas.
Isso também vem ocorrendo em relação ao consumo de água nas 42 escolas da 22 GERED, muitas das quais apresentando terríveis falhas de abastecimento, com valores assustadoramente elevados pagos pelo Estado. A distribuição e o consumo da água, nos últimos anos, vêm se tornando um problema para muitos municípios brasileiros e catarinenses devido a baixa demanda de chuvas, poluição dos mananciais e desperdícios.
Cada vez mais os governos estão concentrando esforços e promovendo campanhas publicitárias, educativas, para sensibilizar a população sobre práticas corretas de uso eficiente da água. Ao mesmo tempo em parcerias com entidades e recursos públicos são disponibilizados para mobilizar a população sobre a necessidade de evitar desperdícios, escolas públicas e outras repartições do Estado não estão dando exemplos de como fazer a coisa certa.
Além do relatório dos extratos de energia elétrica pagos pelo governo, de 2013 a dezembro de 2018, das 42 escolas da 22 Gered, o grupo que integra o projeto escola sustentável da EEBA também teve acesso aos relatórios relativos aos pagamentos das faturas de água dessas mesmas escolas. O que se percebeu avaliando os números foi que também havia coisa errada no uso da água e que precisavam ser corrigidas urgentemente.
O que gerou mais indignação na observação dos relatórios foi que o custo financeiro da água cobrado por metro cúbico, comparada a da energia elétrica, é bem inferior. No entanto, durante  meses contínuos ou intercalados, os valores apresentados nos extratos comprovam ter havido falhas técnicas ou descuidos do corpo gestor ou da ADR, pois se verificou que é absurdamente impossível uma unidade de ensino com cerca de 300, 400 ou 500 estudantes consumirem num ano água com valores pagos de 22, 24 a 46 mil reais. É possível num único mês uma escola pública recém inaugurada, com cerca de 750 estudantes, consumir tamanho volume de água  que resultaram em absurdos  onze mil e seiscentos reais? Esse debate sobre tais valores exorbitantes ocorreu numa das reuniões ordinárias da equipe integrante do projeto escola sustentável.
Em encontro ocorrido na sede da ADR com os gestores das 42 escolas estaduais da região de Araranguá, os integrantes do projeto fizeram explanação dos resultados das investigações e recomendaram que as demais escolas estaduais promovessem atividades semelhantes para despertar hábitos saudáveis de consumo de água e energia elétrica. Aproveitando-se do momento em que os gestores das escolas, secretário da ADR, subsecretário de infraestrutura e a gerente regional de educação estavam  presentes no evento, foi divulgado os relatórios contendo os extratos do consumo de água e energia das escolas que apresentavam valores abusivos.
A reação de todos/as foi de espanto quando souberam dos números. Alguns responderam não terem conhecimento dos gastos relativos às contas de água e energia de suas respectivas escolas pelo fato dos extratos ficarem retidos na ADR. Diante dos fatos, a equipe gestora da ADR se prontificou a remeter mensalmente cópias dos extratos às escolas para que a comunidade escolar prestasse mais atenção aos valores cobrados, se os números são compatíveis ao que é realmente é consumido mensalmente.
Na EEBA, depois de ter ocorrido substituição de cerca de 30 lâmpadas convencionais por Led e a mobilizado estudantes e demais trabalhadores para contenção de desperdícios, o resultado foi uma economia de mais de cinco mil reais com energia elétrica. o Estado, conforme análise dos números dos extratos, poderia minimizar desperdícios na ordem de 50% ou mais na conta se projetos desse nível fosse abraçado por cada unidade de ensino, argumentou um dos coordenadores do projeto. Somente com o dinheiro economizado, por ano, os valores seriam suficientes para reparar as demandas estruturais e a aquisição de insumos necessários ao satisfatório funcionamento das unidades.
Em todo o estado de Santa Catarina, são cerca de 1100 escolas que integram a rede pública estadual. Desse total, talvez 80% apresentem alguma deficiência estrutural no setor elétrico e hidráulico. Supondo que todas sejam envolvidas num amplo programa de práticas sustentáveis como a EEBA, o recurso financeiro economizado, talvez  cinco ou mais anos, seria capaz de restaurar e construir novas escolas, dispensando  recursos externos que tornam o Estado mais endividado. Esse é sem dúvida o Jeito Certo de Fazer as Coisas.
Prof. Jairo Cezar

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