quarta-feira, 2 de agosto de 2017

NEM MESMO O SAGRADO INTERVALO PARA AS REFEIÇÕES FICOU IMUNE AOS ATAQUES DA REFORMA TRABALHISTA BRASILEIRA


É de se prever que muitos dos que estão lendo esse texto nesse momento devam ter assistindo algumas vezes a célebre comédia Tempos Modernos protagonizado por Charles Chaplin que interpretou Carlitos. No filme há uma cena hilária em que os funcionários da companhia testam com o próprio Carlitos, funcionário da empresa, uma máquina que lhe permite trabalhar mesmo durante as refeições. Mas o equipamento apresentou falhas frustrando seus inventores.
 A mensagem do filme, cujo roteiro foi escrito pelo próprio protagonista Chaplin, foi revelar ao mundo moderno as transformações tecnológicas em curso e seus reflexos na estruturação e no relacionamento entre capital e trabalho.  Quase cem anos depois do seu lançamento em 1936, o filme ainda se mestra extremamente atual, fazendo refletir o cotidiano das atuais organizações produtivas liberais, a mentalidade dos proprietários e dos governos, abertamente insensíveis ao trabalho humano.  
Em se tratando de Brasil tais insensibilidades estão mais expostas nas reformas que estão em curso, algumas já encaminhadas como a PEC dos gastos públicos, lei da terceirização e trabalhista, e a previdenciárias, ainda em estado de incubação. Quanto a reforma trabalhista, observando os mais de cem pontos alterados na CLT, é de se concluir que a mesma golpeou uma legislação com quase cem anos de existência. Não há dúvida de que a legislação teria que passar por alguns ajustes, porém, não do modo como foi articulado, que segundo os seus reformadores, proclamando um discurso quase consensual, afirmavam categoricamente que tornou-se mais moderna, flexível, compatível à atual realidade do sistema produtivo.
É claro que as opiniões dos parlamentares e dos demais setores favoráveis a reforma seriam interpretadas como de uma grande vitória. Mas vitória de quem? Não há dúvida que é do empresariado ganancioso, explorador, que conseguiu se libertar das ditas “agruras” de uma legislação que bem ou mal assegurava aos trabalhadores certos direitos elementares que agora foram solapados. Com a reforma, o Estado tem a sua participação limitada, ou seja, estado mínimo para mediar os impasses envolvendo trabalhadores e patrões. Quase tudo poderá ser negociado agora. Já podemos imaginar seus resultados, pouquíssimos favoráveis aos trabalhadores.  
O negociado se sobreporá ao legislado. Ou seja, o que valerá será o que os sindicatos das categorias negociarem com os proprietários das empresas. Imagine, hipoteticamente, nos finais de semana, trabalhadores, dirigentes sindicais, diretores ou proprietários de empresas, se reunindo para uma partida de futebol ou encontros de confraternização.  São esses “iguais” que anualmente ou durante as datas bases, se sentarão à mesa para negociar reajustes salariais ou outros direitos. Se o respectivo dirigente sindical tiver uma relação um tanto quanto familiar com os diretores da empresa, como ficarão as negociações? Prevalecerá a imparcialidade, a isonomia no momento de negociar.        
 Dentre as aberrações vistas na nova redação e que serviu de inspiração para o título do artigo, está o item que trata do intervalo mínimo diário que o/a trabalhador/a ter direito para descansar ou fazer suas refeições, que poderá ser inferior a 30 minutos caso seja negociado em convenção coletiva. Antes da aprovação da lei, esse tempo era de uma hora.   Veja só, numa sociedade como a brasileira, na qual a atual crise vem minando dia após dia milhares de postos de trabalho é quase que óbvio que em qualquer convenção coletiva, o trabalhador pouco poder terá para fazer aprovar os percentuais de reajustes que tem direito. Ou acatam a proposta/sem proposta ou pedem as contas, pois lá fora há um enorme exército de desempregados esperando a vaga. Não é assim que acontece?
Pois é assim mesmo que o texto da legislação tende a se configurar, extremamente pertinente ou favorável ao seguimento mais forte, o empresariado. Dos 473 deputados presentes no dia 27 de abril de 2017 na sessão da câmara dos deputados para a votação da reforma trabalhista, votaram a favor da mesma 296 parlamentares, sendo que 177 se posicionaram contrários. Num texto visivelmente rentista ao capital como foi confirmado a partir de sua análise, é de se concluir que os parlamentares que referendaram os 120 itens alterados da CLT são empresários ou representam vários seguimentos econômicos congêneres. Além do mais, esses mesmos protegidos pelo Estado, foram avalizados por milhões de trabalhadores, ludibriados no período eleitoral por discursos e promessas vazias de que legislariam pelo povo e para o povo.
Com a vitória do governo na câmara, o documento dificilmente sofreria alterações expressivas ou quem sabe a inclusão de emendas no senado favoráveis aos trabalhadores. O próprio presidente da casa já tinha sido enfático no seu discurso afirmando que o texto vindo da câmara não sofreria modificações. Numa democracia verdadeira, esse tipo de discurso se caracterizaria como uma aberração aos princípios da isonomia de poderes. Nada foi alterado no texto. Isso porque no próprio senado, majoritariamente os parlamentares estavam articulados com o governo, afinados num mesmo discurso de que “as reformas colocariam o Brasil nos trilhos”. Dito e feito, no dia 11 de julho de 2017, por 50 votos a favor e 26 contrários, a CLT enfim estava alterada. Os trabalhadores, portanto, a partir dessa data começariam o longo calvário de submissão aos ditames do capital.
Para avalizar tais observações feitas acima e evitar possíveis críticas desnecessárias ao autor do texto, acusando-o de leviano e antipatriótico, aí vai outros pontos do documento aprovado que reafirma a posição de que a reforma coloca sim a população trabalhadora na ponta do precipício.  A jornada de trabalho de 12 horas diárias por 36 horas de descanso para todas as categorias e insalubridade, tornar-se-á regra a partir de decisões coletivas, ou seja, sobre a jornada de trabalho, perde poder de lei o que estava até o momento descrito na CLT, onde estabelecia extensão de horas apenas para categorias muito específicas.
O item da reforma relativo às gestantes se constitui também outra aberração aprovada pelos congressistas, que permite as trabalhadoras atuarem em ambientes insalubres a partir da apresentação de atestado médico comprovando que o local não oferece riscos às mesmas. É tão insana essa proposta que o próprio presidente, veja só, o próprio presidente Temer, informou que vedará, admitindo que somente será permitido de forma “excepcional” e com atestado médico. O que seria excepcional e quem seriam os profissionais indicados para inspecionar os locais considerados ou não insalubres?
Quanto ao crime de dano moral, a lei agora permite que na hipótese de a justiça assegurar ganho de causa ao trabalhador prejudicado, sua indenização variará de acordo com o salário recebido. Se esmagadora parcela dos trabalhadores é assalariada e reféns ao empregador, é de se prever que “engolirão sapos e lagartos” na empresa ou em outro espaço de trabalho para permanecer no emprego. Não é mesmo? É outro ponto que o governo diz que irá rever, pois admite que a lei limita o trabalhador do direito de uma indenização mais consistente em casos de estrito abuso de sua moral.
Enfim estamos às voltas com um dos maiores retrocessos do ainda embrionário Estado republicano brasileiro. É preciso repensar o atual modelo de governo e toda sua estrutura, o legislativo, executivo e o judiciário, nas diferentes instâncias, que vem mostrando, dia após dia, que se servem do povo para extrair do próprio povo o sangue, o suor e as lagrimas necessárias para fazer funcionar as engrenagens de uma máquina viciada pelo cinismo, corrupção e falta de ética.
E os exemplos são quase que imensuráveis.  Basta assistir diariamente os telejornais e esperar a divulgação dos novos denunciados por corrupção passiva, recebimento de propina, etc. Até mesmo o presidente da republica não ficou imune ao “vírus contagioso” da roubalheira brasileira. É importante saber que somente o voto ou pleito eleitoral não resolverá o problema da crise política e econômica brasileira. É necessária a construção de um plano alternativo de governo popular, que restabeleça a confiança do povo com a política e com os seus representantes.        
Prof. Jairo Cezar
                           




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