sexta-feira, 23 de outubro de 2015

Projeto de Plano de Carreira do Magistério Catarinenseque seguirá a lógica Neoliberal

Com o fim da última e maior greve ocorrida no magistério público estadual de Santa Catarina,com duração de 72 dias,integrantes da executiva do SINTE estadual Erepresentantes do governo iniciaram as discussões com vistas a construção de um plano de carreira condizente as expectativas dacategoria. No entanto, desde o término da greveintegrantes da ala oposicionista do sindicato, bem como parcela expressiva da categoria admitiam que a decisão do retorno às atividades docentes foi um equívoco, pois havia reais possibilidades de avançar nas negociações.
Durante as mais de dez reuniões realizadas, pós-greve, entre os dois seguimentos,ficava cada vez maisperceptível que os trabalhadores da educação estavam às portas de mais um calote do atual governo, situação semelhante a de 2011 quando em Lages uma assembleia estadual do sindicatoencerrou a paralisação de 62 dias. Naquele momento se soube que o desfecho que pôs fim ao movimento se deudevido a um acordão com a promessa do governo de iniciar a descompactação da tabela, entre outras ações beneficiandoà categoria.A partir do encerramento dasduas paralisações, 2011 e 2015, até o momento, a promessa de descompactação não se concretizou, menos ainda a concessão do piso aos demais níveis da tabela.
Com a conclusão do pleito eleitoral de 2014, que confirmou a reeleição de Colombo, no seu discurso tanto de campanha como de posse em 2015 expressava com todas as letras a necessidade de profundas reformas estruturais na máquina administrativa do Estado. Segundo sua fala, a educação seria o primeiro seguimento a sersubmetido àsreformas estruturantes.
Na expectativa de sofrer novas perdas, o magistério inicia seu processo de mobilização na tentativa de forçar o governo a recuar na sua política de desmonte da carreira docente e da escola pública. A intenção do governo agora é adequar às contas públicas seguindo o Plano de Ajuste Fiscal do governo federal. Asupressão de direitos históricos como regência de classe, remuneração com base na lei nacional do Piso do Magistério, entre outros, promoverá uma economia substancial aos cofres públicos, recurso suficiente para viabilizar o plano de carreira do magistério. No entanto, não houve qualquer avanço nos debates, fato que resultou na paralisação da categoria por mais de dois meses.
Durante a longa paralisação, o governo do estado representado pelo secretario da educação sempre procurou manter um tom de indiferença ao movimento limitando-se àabertura de qualquer canal de negociação com a categoria. Sua estratégia sempre foi na tentativa de manipular a sociedade catarinense com informações responsabilizando os educadores pela paralisação e não culpa do governo. Com maior adesão à greve das regionais do litoral, e pipocando no resto do estado, o retorno às atividades se deu, mais uma vez, seguindo acordo como governo de discutir o plano conjuntamente.
Durante toda a trajetória de encontros para discussões das propostas do plano, até a última reunião do conselho do sindicato, ocorrido em Dionísio Serqueira no começo de outubro, a ala situacionista da executiva do Sinte estadual, demonstrava certa simpatia com o teor do plano, alegando que a proposta avançaria no momento que adentrasse na casa legislativa. Admitiam a tese que seria possível persuadir os parlamentares, mesmo os da base de sustentação do governo, a inserirem emendas em prol de um plano favorávelà categoria. É, de certo modo, um posicionamento um tanto quanto equivocado, pois todos sabem que a composição de forças da assembleia é totalmente favorável ao plano do governo, portanto, sem qualquer expectativa de vitória.
Um exemplo que comprova o fortalecimento da base governista em defesa do plano foi a debandada da deputada do PCdoB, Ângela Albino, para o lado do governo, onde assumiu a secretaria de bem estar social. Durante seu mandato como deputada sempre se posicionou do lado do magistério, porém, agora, é aliada de Raimundo Colombo, favorável ao plano. A posturaconfusa e contraditória de seguimentos da executiva do Sinte, durante as duas últimas paralisações, tem relação com a conjectura política nacional e estadual. O fato é que integrantes dessa ala são vinculados ao partido daatual presidente da república, que por sua vez integram uma corrente sindical de base cutista. Em âmbito federal, tanto a central única dos trabalhadores como outras centrais, vem respaldando as ações ou reformas do governo federal, pró-capital, sendo o governador do Estado, Raimundo Colombo, um dos principais apoiadores.
Portanto, se opor ao plano reformista de Colombo, poderia abalar as boas relações seladas com o governo federal. A ruptura desse alinhamento comprometeria acordos políticos já firmados em escala federal, regional municipal para as eleições do próximo ano e de 2018.Quanto ao plano, segundo notícias divulgadas pelo executivo estadual, a intenção é encaminhar até o final de outubro para apreciação e votação antes do recesso do legislativo.
Nessa perspectiva, se seguir os mesmos trâmites de projetos importantes do passado aprovados no apagar das luzes das sessõesdo legislativo como o polêmico código florestal catarinense em 2013, o projeto de reforma do magistério poderá seguir para apreciação e votação no último dia de sessão quando os professores estarãoenvolvidos com os processos de exames e fechamento do ano letivo.A justificativa do governo pelaaprovação do plano na assembleia, parte do argumento que desse modo será possível assegurar os reajustes dos salários da categoria para o mês de maio do próximo ano. O pretexto apresentadonão condiz com o teor do documento, que tem por finalidade promover uma engenharia estrutural no qual visa remanejar recursos do próprio seguimento, ou seja, transferir de um nível do magistério para outro.
A proposta de incorporação dos 25% da regência de classe aos vencimentos é uma delas. A categoria que sofrerá mais os efeitos da reforma será, sem dúvida, os aposentados das séries iniciais que perderão 15% da gratificação. Além da supressão da regência, que proporcionará substancial economia aos cofres do estado, o plano reduzirá os percentuais pagos às aulas excedentes, hoje de 2.5% para um ou um e meio percentual. A reenturmação é outra manobra perversa do governo para arregimentar recursos disponíveis a implantação do plano. Somente comessa medidacentenas de turmas serão extintas em todo o estado. O reflexo disso será certamente milhares de salas de aulassuperlotadas comprometendo a qualidade do ensino.
O governo vem insistindo que deverá haver redução dos repasses de recursos do Fundeb para a folha do magistério. Sua alegação é responsabilidade fiscal. Não hána fala do governo certa contradição pontual? Pois vejamos: ao mesmo tempo em queafirma que o plano melhorará substancialmente ossalários do magistério, admite que haverá redução dos repasses do Fundeb. Seguindo essa linha, onde o governo buscará os tais recursos prometidos? Não há mágica alguma, a resposta é simples: “tirar de mim para pagar a mim mesmo”.
Durante a greve, o governo sempre batia na tecla de que o novo plano haveria recursos novos para viabiliza-lo. A pergunta que não quer calar é: recursos da onde, se o governo cancelou a efetivação de mais de mil servidores das polícias civil e militar, previstos para esse ano, alegando incapacidade financeira.
Outro detalhe importante do plano é que o mesmo terá prazo de três anos para sua concretização, com início a partir de maio de 2016, na hipótese, é claro, do projeto ser aprovado na assembleia. No transcorrer desse período, a categoria não terá qualquer reajuste salarial ficando condicionado aos desdobramentos do plano, que será parcelado em cinco etapas, sendo a ultima em 2018. Para se ter noção do tamanho das perdas salariais, basta simular e comparar alguns valores. Para 2015 o reajuste do magistério deveria ser de 13.01%, conforme a lei do piso nacional. No entanto, o governo do estado não garantiu nem a reposição da inflação de aproximadamente 8%. Para 2016, o reajuste do piso está previsto para 12.72%, e 2017, seguindo a lógica inflacionária o índice não será inferior a10%. Se somado ospercentuais acima citados, o montante absoluto de perdas alcançará os 35%. O plano, portanto, por si só, é um verdadeiro e terrível instrumento desmonte da carreira e arrocho salarial dos trabalhadores da educação.
Na nova tabela proposta, o vencimento do professor nível 10 e referência G ficará assim designado: para esse não,2015, o vencimento está sendo de 2.566 reais, sem os 13.01% (lei do piso). Se fosse acrescentado esse índice, o valor seria elevado para 3.318 reais. A diferença ou perda é só calcular. Para o próximo ano 2016, o valor previsto será de 3.400 reais, com os 12.62% do piso, chegaria a4.079. A não incorporação dessecoeficiente ao vencimento proporcionará economia substancial de 680 reais/mês de cada servidor do magistério.
Sobre a lei do piso aprovada em 2008 no congresso, muitos governosapós sua homologação protocolaram junto ao Supremo Tribunal Federal ADIN (Ação Direta de Inconstitucionalidade)alegando inaplicabilidade da mesma, pelo fato da mesma desconsiderar peculiaridades financeiras de cada ente federado e município. O governo de Santa Catarina foi dos que entraram com a ADIN. Depois de tramitar por algum tempo no supremo, a decisão da cortefez com que o governo de Santa Catarina a interpretasse do seu modo,elevando os salários dos professores com vencimentos abaixo do piso. Os demais, com vencimentos acima do piso, não foram contemplados. Portanto, com essa decisão o governo desencadeou um dos maiores achatamentossalariais de toda a história do magistério público, reduzindo drasticamente a diferença salarial entre os de nível médio (magistério) e os de final (doutorado).
A proposta de plano defendida pela categoriapropunha ainserção de um percentual que somado atinge os 50% nas referências horizontais de A ao G. O novo plano não define qualquer percentual. Para os níveis verticais, a partir do médio ao doutorado, a proposta seria de 100% de diferença de vencimento.E os ataques aos direitos dos professoresnão sessaram. O item a seguir mostra a astúcia de um governo que sem titubear impõe uma mine reforma previdenciária, acrescentando duas letras a mais, H e I na referência horizontal. Os novos servidores a partir do novo plano deverão trabalhar mais seis anos para terem direito ao salário integral. No plano que está em vigor, as mulheres garantem aaposentadoria com 25 anos de trabalho e 50 anos de vida, enquanto os homens, 30 anos de trabalho 55 anos de vida.
A notícia nada agradável é que os aposentados, que estão inseridos do modelo de plano atual, não serão contemplados com as duas novas letras, ou seja, permanecerão com seus salários congelados. Quanto a tabela de progressão horizontal, em vigor até 2011, a diferença de percentualentre uma letra e outrachegava a 2.5%, já no novo plano, o governo não estabelece qualquer percentual, dependerá de sua própria vontade. Outra atitude desfavorávelàs promoções é o aumento de horas de cursos de aperfeiçoamento, passando de 80 para 120 horas. O coeficiente de faltas injustificadas também pode ser determinante na garantia ou perda desse benefício. Num modelo de administração que paulatinamente vem suprimindo direitos dos servidores públicos, cujas mobilizações e paralisações se constituem como únicas estratégias possíveis de assegurá-lasou conquistas, ocritério quanto ao número de faltas injustificadas certamente servirá de trunfo dos governantes para inibir futuras mobilizações.
Paralelaàs negociações em curso entre Sinte e Governo, a assembleia legislativa, sem muito alarde, aprovoua reforma previdenciária dos servidores públicos estabelecendo teto máximo de remuneração para os próximos servidores que contribuem para o IPREVE. Para assegurar o salário integral,os trabalhadores terãoquedispor parte de suas economias aplicando em um fundo previdenciário paralelo.
O episódio do Paraná no começo do ano quando o governo Beto Richa,autorizou à polícia militar a agir com truculência contra os servidores estaduaisna praça em frente à sede do governo,serviu de ensaio para o governo catarinense, entre outros, para viabilizar as reformas, dentre elas a previdenciária, sem turbulência,sem qualquer manifestação que obrigasse o governo a aplicar o uso da força policial, como ocorreu no estado vizinho.
Quanto aos ACTs, nenhum avanço substancial foi notado, como um dispositivo que lhes assegurem nas vagas até a realização de provas de concurso de acesso. Para piorar ainda mais, não há qualquer previsão de novos concursos públicos para os próximos anos, com riscos até de extinção tendo em vista as políticas de terceirização do serviço público que estão em andamento em âmbito federal. O exemplo são os hospitais estaduais já administrados por OS (Organizações Sociais). O plano diz que os futuros concursados do magistério, no decorrer do estágio probatório, perceberão apenas 30% do total de 50%do efetivo. Sobre os módulos horários, o professor para ter garantia de um contrato integral, ou seja, incorporado ao módulo 10, por exemplo, deverá ter no mínimo oito aulas disponíveis. Na inexistência desse montante de aulas, a contratação se fará por hora aula, cujos valores a serem pagos não estão explicitados.
O projeto de plano de carreira do magistério que tramita no executivo estadual, como outros tantos planosque seguem na direção da reforma do Estado, são partes de um projeto mais amplo, com objetivos de ajustar a máquina administrativa segundo a lógica financista global,detentorados fluxos de capitais circulantes pelo planeta.A inexistência de políticas de metas para odesenvolvimento sustentável de médio e longo prazo, associada à onda de denúncias de corrupção em áreas estratégicas como a Petrobras, transformou o Brasil no “patinho feio” dos investidores, que sob a ameaça constante de um possível calote, promove uma revoada de capitais para as economias mais estáveis como os Estados Unidos.
Como tentativa de tirar o Brasil do cerco ameaçador de uma possível crise incontrolável, o governo brasileiro vem aplicando a risca o receituário neoliberal de ajuste estrutural, com impacto direto na vida de milhões de brasileiros assalariados. São os assalariados, os violentados pelo ajuste, no qual deverão arcar com as irresponsabilidades e incompetências das administrações públicas. Se os bilhões de reais que sumiram dos cofres de empresas públicas e outros tantos bilhões sonegados anualmente do fisco da receita federal fossem corretamenteinvestidos, o Brasil hoje certamente seriauma das nações mais desenvolvidas do mundo, dividindo com outras nações como Noruega, Suécia, Finlândia, o título de melhor IDH.
É pura ilusão querer acreditar que o Brasil num médio prazo poderá se aproximar aos níveis de maturidade política e social de nações como as acima mencionadas. Uma grande revolução na estrutura educacional deverá ocorrer literalmente. Uma pátria educadora jamais será possível com cortes bilionários como os9 bilhões do orçamento da educação realizados no começo do ano. Muito menos ainda com a possível aprovação de um plano de carreira que arrocha salários de professores porquatro anos. Se a Noruega, Suécia, Finlândia, entre outros, se orgulham de liderar o ranking de nações com melhores IDH, o segredo está na educação. O salário de um professor da rede pública da Noruega é de aproximadamente cinco mil euros mensais. Se multiplicarmos esse valor pela cotação do euro de hoje, 23/10/2015, cotado em mais ou menos 4.30 reais, o salário atinge 21.500, reais. No Brasil, em nível de comparação, as remunerações médias pouco ultrapassam os novecentos euros/mês.
O objetivo dos ajustes do governo é cumprir com as metas inflacionárias realocando recursos para pagamento dos juros dadívida pública orçada em quase três trilhões de reais. O caminho, portanto, é o da recessão, do arrocho salarialque desestabiliza a vida de milhões de brasileiros. O ajuste isenta de prejuízos pequena fração da população, banqueiros, a classe política, os sonegadores de impostos, etc. É muito mais prático descontar a incompetência política/administrativa e os privilégios de uma classe abastada, nos professores, bancários e demais servidores públicos assalariado. Os últimos cortes de recursos do orçamento federal afetam direta e indiretamente qual seguimento social? É claro que não são os grandes empresários, proprietários de bancos, muito menos os latifundiários. São os trabalhadores, que perderam o seguro desemprego e recursos para construção de escolas, melhoria de hospitais, rodovias, compra de merenda escolar, etc.
Umas das questões que certamente milhares de professores gostariam de respostas se ainda é possível reverter esse quadro quase catalítico de terra arrasada no qual está submetido o plano de carreira. A resposta é sim. Porém, a realidade traz uma sensação de pouca preocupação da categoria. Na última assembleia do sinte regional de Araranguá, o que poderia ter sido um dos encontros com expressiva participação de professores, limitou-se a um número inexpressivo depouco mais de 20 participantes. Parece que os professores despertam maior interesse em discutir temas como plataforma curricular mínima do que um plano que afetará violentamente sua vida profissional.
Temos pouco tempo, e a mobilização é necessária. Além das ações elencadas na assembleia estadual do sinte do dia 21 de outubro como a elaboração de panfletos denunciando as atrocidades do governo com a educação, é necessário dar continuidade com os encontros com os integrantes das APPs e Conselhos Deliberativos. Somente com o envolvimento desses dois seguimentos que representam a esmagadora parcela da sociedade catarinense que se utilizam da escola pública, é possível acreditar em mudanças do tortuoso caminhodo qual o ensino público estadual catarinense está seguindo.
Prof. Jairo Cezar

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