domingo, 26 de julho de 2015

Anos Luz, a distância que ainda separa Astronomia e ensino nas escolas públicas

Os mistérios que envolvem o universo, o surgimento das galáxias, das estrelas, dos planetas, das luas, asteroides, meteoros, meteoritos, cometas e outros tantos milhares de elementos que orbitam o cosmos, continuam desafiando físicos, astrônomos, matemáticos e uma gama incalculável de curiosos que tentam colocar por terras as lendas e mitos que cercam o assunto. Mesmo com todo arcabouço tecnológico existentes, com satélites e telescópios com potentes lentes de alta definição, depois de quase mil anos de Galileu ter inventado o telescópio, há poucos dias a humanidade teve acesso das primeiras imagens tiradas por uma sonda que viajou bilhões de quilômetros até chegar ao minúsculo plutão, reclassificado como planeta anão.
Nas escolas, o ensino de astronomia, ou noções de astronomia, sempre ficou sob a incumbência dos professores das áreas de física e geografia. Porém, nas séries iniciais, do primeiro ao quinto ano, o assunto é de exclusividade do/a próprio/a professor/a pedagogo/a que leciona as demais disciplinas. Compreender todo conjunto dos complexos sistemas cósmicos, movimentos, distâncias, brilhos, temperaturas, massas, dimensões, requer uma formação mais refinada do educador, bem como reciclagens periódicas para se inteirar das descobertas recentes e uso de metodologias inovadoras. Como tornar as aulas sobre sistemas solares, planetas e dos demais elementos cósmicos, um momento prazeroso capaz de instigar a imaginação e a curiosidade das crianças e adolescentes. Como aplicar à matemática, à física, à geografia, à história, à química, à literatura, no estudo do universo e dos elementos constituintes? Esse foi, portanto, uma das propostas oferecidas pelo IV Simpósio Catarinense de Astronomia, ocorrido entre os dias 23 e 24 de julho no auditório do IFSC, campus Araranguá.
O que chamou a atenção no encontro foi constatar que dos mais de cento e cinquenta escritos, possivelmente menos de dez inscrições eram de professores/as da região de Araranguá. Para o simpósio vieram delegações de várias partes do estado como Chapecó, Brusque, Florianópolis, Joinville, até mesmo do estado de São Paulo. Afinal, o que realmente motivou a pouca presença no simpósio de professores da região do sul do estado? A falta de divulgação, o pouco interesse ou as barreiras criadas nas escolas que dificultam a liberação para participar de cursos de reciclagem? A última hipótese certamente é a mais convincente. Convém salientar, que qualquer simpósio, congresso ou seminário, é costume o pagamento das inscrições, no caso do simpósio em Araranguá, foi totalmente gratuito.
Nos dois dias que transcorreram o encontro foram apresentadas seis palestras e dez comunicações orais. Das palestras exibidas uma das que chamaram atenção do público foi a que discorreu sobre o modo como contemplar ou investigar o universo, tendo por título Observação visual: ontem, hoje e sempre! O autor do tema, Alexandre Amorim, fez uma retrospectiva histórica sobre o conhecimento que se tinha e que se tem hoje do cosmos, rememorando os clássicos Galileu Galilei, Nicolau Copérnico, entre outros, que desafiaram os dogmas da época para que hoje tivéssemos oportunidade de saber um pouco mais do mundo extraterrestre. Foram instrumentos muitos simples usados como o telescópio de Galilei, sendo de qualidade inferior aos binóculos comprados hoje em dia nos camelôs, que as portas do mundo se abriram para a humanidade. Ainda hoje as observações visuais, ou seja, sem o emprego de engenhos sofisticados, ainda proporcionam descobertas surpreendentes.
Dentre os nomes que deixaram relatos úteis que para astronomia, foi citado o cidadão nascido em Desterrense/Florianópolis e erradicado em Araranguá, Bernardino Sena Campos. Por ser um aficionado por fotografia, no livro Memórias de Araranguá, escrito pelo padre João Leonir Dallalba, tem um trecho onde cita a ocorrência de um eclipse solar parcial em outubro de 1912. O que chamou atenção nessa passagem do livro e que tornou objeto de estudo para a astronomia foram as informações descritas por Bernardino onde deu detalhes do fenômeno, descrevendo o início, meio e o término. O que intrigou os pesquisadores na análise do fenômeno citado na obra foi quanto aos horários descritos que eram incompatíveis com os cálculos feitos atualmente. Pesquisando o sistema longitudinal da época do eclipse, ou seja, linhas verticais imaginárias do globo que interligam os polos norte e sul, o mesmo que fuso horário, a conclusão que se chegou foi que o cálculo de horas citado por Bernardino, obedecia a um único fuso horário existente que prevaleceu até o ano do eclipse, 1912. Em 1913, o então presidente Hermes da Fonseca instituiu decreto criando mais quatro horários que prevaleceu durante um longo período. Quem imaginaria que Bernardino Sena Campos, Euclides da Cunha entre outros tantos nomes da literatura fosse contribuir para astronomia, como também para outras ciências, com relatos de observações feitas em suas obras de eclipses, cometas, meteoros, etc.
As oficinas proporcionaram aos presentes, momentos de prazer, contemplação e contato com um público apaixonado que dedica parte do seu tempo na pesquisa e observação dos fenômenos astronômicos no estado e fora dele. A dedicação é tamanha que na Universidade Federal de Santa Catarina foi disponibilizado curso de formação de intérpretes em Libras para o ensino da astronomia para surdos. Além do mais o próprio planetário da universidade sofreu algumas alterações estruturais oferecendo acessibilidade e condições para que o público surdo tenha as mesmas informações de astronomia que os demais. No município de Brusque graças ao empenho de uma equipe de voluntários coordenada pelo professor Silvino de Souza, foi construído há trinta e seis anos o observatório astronômico Tadeu Cristovam Mikowski. Mesmo com todas as dificuldades para mantê-lo funcionando, o observatório representa para o estado um dos espaços importantes para o conhecimento da astronomia, recebendo público de todas as idades, oferecendo oficinas especialmente para crianças do ensino infantil.
O município de Chapecó também tem o seus aficionados por astronomia. No simpósio foi apresentada oficina intitulada estação de monitoramento de meteoros de Chapecó, cujo autor do trabalho relatou que instalou em sua residência uma pequena estação para monitorar os meteoros que caem na terra periodicamente. Algumas imagens e vídeos de meteoros com poucos segundos, foram exibidos. É a partir dessas pequenas frações de imagens que é possível fazer uma avaliação mais precisa da dinâmica desses objetos, seu tamanho, massa, etc. Um casal de colombianos, estudantes da UFSC, empolgou o público com a explanação de uma oficina onde mostraram como trabalhar a astronomia nas escolas a partir do uso de textos e instrumentos históricos como o astrolábio. Para concluir foram mostradas algumas técnicas simples que possibilita o público leigo a observar alguns fenômenos como eclipses, cometas, meteoros, com o uso de instrumentos simples.
Para concluir deixo registrada minha crítica à Secretaria Municipal de Educação e a Gerencia Regional de Educação, para que, na ocorrência de eventos importantes como o do Simpósio de Astronomia, que seja feita divulgação nas unidades de ensino, para que a escola possa se organizar liberando seus professores ou um ou dois representantes para que possam participar. Se quisermos realmente uma pátria educadora como é o desejo da presidente da república, é necessário, antes de qualquer coisa, ter professores preparados, bem remunerados, estimulados, sempre buscando informações e conhecimentos novos, para tornar suas aulas atraentes. Certamente o Simpósio de Astronomia poderia ter sido esse “UP” a mais que faltava, se a estrutura das escolas não tivesse amarrada ainda as regras tradicionais de ensino que pouco contribui para a emancipação do indivíduo.
Prof. Jairo Cezar

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