domingo, 4 de agosto de 2013


 

A incansável luta da Oscip  Preserv’Ação pela criação de uma Unidade de Conservação no Baln. Morro dos Conventos

Desde a década de 1990 quando as discussões relativas às questões ambientais ultrapassaram as fronteiras locais se transformando em temáticas globalizadas e inseridas obrigatoriamente nos programas governamentais, no município de Araranguá um grupo de cidadãos (ãs) apreensivos (as) com as incertezas acerca do futuro ambiental do planeta e do extremo sul de Santa Catarina reuniam-se assiduidamente para debater e propor formas alternativas de uso equilibrado dos ecossistemas sem gerar impactos que comprometessem sua existência.

 
 

Embora tenha sido instituída uma enormidade de ações ambas de caráter educativas e legislativas voltadas à normatização das políticas de sustentabilidade sócio econômicas, o que se constata é o continuísmo de atividades predatórias, sobretudo em ambientes fragilizados como dunas, restingas, mangues, etc. Tais ações vêm intensificando as tensões e incertezas sobre os respectivos biomas, fato que obriga as organizações não governamentais ambientais e demais entidades na busca de ações emergenciais que possa conciliar desenvolvimento com preservação ambiental. Enquanto não se define políticas mais transparentes e eficientes para amparar os ecossistemas ameaçados, as práticas destrutivas permanecerão. Já vem se constituindo como hábito, a descaracterização progressiva de APPs como restingas e dunas na tentativa criminosa de ludibriar ou enganar os órgãos ambientais fiscalizadores.

No dia 02 de agosto de 2013, um jornal de circulação diária do município de Araranguá, apresentou reportagem realizada com o superintendente da FAMA e o representante do Ministério Público Estadual sobre as construções em áreas de preservação permanente no município de Araranguá. Quando o superintendente da FAMA foi questionado sobre as construções em APPs, o mesmo argumentou que ambas foram embargadas e que seus proprietários deverão recuperar as áreas de restingas danificadas. É importante salientar que toda vegetação de restinga  retirada era constituída por espécies herbáceo-arbustivas não havendo possibilidade de replantio. Portando, sua reconstituição somente se dará mediante remoção das construções irregulares e o  isolamento das áreas degradadas, impedindo o fluxo de pedestres, animais e veículos sobre o local.   

  

Face ao exposto, em especial na vasta área do entorno da formação geológica Morro dos Conventos, torna-se imprescindível a participação das entidades governamentais e não governamentais para debater coletivamente caminhos que possam transformar a área em questão num dos principais roteiros turísticos do sul de Santa Catarina e ao mesmo tempo mantê-lo protegido. É importante salientar que se tratando da cultura de participação coletiva dos debates sobre os rumos do município, em Araranguá o processo continua tênue, não havendo ainda rompido a tradicional cultura do poder verticalizado que insiste em manter decisões importantes submetidas aos interesses do corporativismo parasitário presente nas instâncias do executivo e legislativo. Quando se trata de debater as questões ambientais mais emergentes se sabe que não há como encontrar respostas convincentes sem o envolvimento da sociedade. É o que vem se sobressaindo no município quando o assunto é Balneário Morro dos Conventos. Nos últimos dois anos foram inúmeras as reportagens noticiadas pela imprensa escrita e falada sobre projetos ou “projetinhos” sem que a comunidade local soubesse de antemão o seu teor. São visões ou atitudes um tanto quanto equivocadas de quem pouco conhece a região, sua história, o cotidiano, os desejos, as aspirações e o que pensam em relação ao futuro do bairro e do município.

Quando se pensa em desenvolver projetos para o balneário, além dos aspectos acima mencionados cabe ao legislador ou empreendedor conhecer sua dinâmica geográfica e geológica cuja formação data de centenas de milhões de anos quando a terra passou por processos de instabilidade geológica, de ininterruptas erupções vulcânicas que resultaram na formação dos continentes, dentre eles o Americano. De acordo com alinhamento geomorfológico da América do Sul num passado remoto o mesmo estava interligado com o continente africano, porém, em decorrência da deriva continental houve um abrupto deslocamento horizontal das placas tectônicas, cujos choques violentos formaram a Cordilheira dos Andes na extremidade oeste da América do Sul.  A falésia, monumento, tabuleiro ou paredão do Morro dos Conventos, como queiram definir, são resquícios ou testemunhos de que num passado distante toda a região foi palco de intensos e ininterruptos movimentos geológicos, cujas pressões advindas do interior da terra resultaram no erguimento ou soerguimento do relevo onde rochas incandescentes se esparramaram sobre a planície formando a Serra Geral, sendo o Monumento Morro dos Conventos e outros pequenos morros espalhados por toda planície resquícios ou testemunhos desse processo.

O Morro dos Conventos, de acordo com Aujor Ávila da Luz é uma verdadeira página aberta da geologia da região, onde se pode perceber nitidamente, através das camadas de rochas sobrepostas, os inúmeros derramamentos basálticos ocorridos, sua intensidade e durabilidade. Nesse sentido o respectivo tabuleiro é constituído por rochas sedimentares destacando os siltitos, argilitos e arenitos finos, com pigmentações  esverdeados, arroxeados e avermelhados.  

 

No topo e na base do tabuleiro constitui-se uma cobertura vegetal de espécies endêmicas como a palmeira Trithtinax brasiliensis cuja integridade está ameaçada pelos sedimentos que vem progressivamente erodindo o paredão em decorrência da abertura de canaletas para o escoamento da água e do trânsito intermitente de veículos e pedestres nas ruas situadas na borda superior. São essas espécies de vegetação na sua maioria frutíferas que faz proliferar uma diversificada e rica fauna responsável pela disseminação de sementes garantindo a regeneração da floresta local.

  

Convém salientar que há 12 mil anos aproximadamente, fase final da última glaciação, ocorreu os depósitos quartenários derivados de ações marinhas e eólicas resultantes da oscilação do nível do mar que formaram os cordões arenosos responsáveis pelo isolamento de lagos costeiros como os mananciais Lago da Serra, Lago Dourado, Lago Mãe Luzia, entre outros. O que chama atenção é a estreita faixa de praia que se estende a partir da foz do rio Araranguá em direção a divisa do estado gaucho cujos sedimentos recobrem depósitos de turfas. A formação turfeira se deu devido ao avanço do nível do mar, superando os cinco metros e cobrindo toda extensão em direção oeste. Com o recuo da água formou-se uma barreira arenosa soterrando banhados e transformando-os em áreas de turfa, que é o primeiro estádio do carvão mineral, e extensivamente utilizado na queima dos fornos das indústrias da região.

Com a ação do tempo, o avanço e o recuo do mar toda área a frente do monumento denominada faixa costeira ou zona de amortecimento foi adquirindo características peculiares. Diante da dinâmica natural a região costeira, considerada área de amortecimento natural e palco de um extraordinário ecossistema, está ameaçada pela ação antrópica, na qual as leis e órgãos ambientais existentes não conseguem conter. Dentre as mais afetas são as áreas de restingas constituídas por uma rica e complexa vegetação cuja existência está associada às inúmeras variações microclimáticas e geomorfológicas que atuam no local durante todo o ano. Ações como queimadas, deslocamento de veículos, caminhadas, etc, comprometem todo o equilíbrio ecossistêmico do local.   

 

 

Se foi necessário centenas de milhões de anos para constituir o que é hoje o fascinante e magnífico monumento geológico e seu conjunto de mosaicos ecossistêmicos situados no seu entorno, não havendo uma reversão na dinâmica depredatória, talvez na terceira ou quarta geração quem visitar ou residir no local encontrará apenas resquícios do que foi um dia uma das paisagens cênicas mais belas e deslumbrantes do Brasil. No final da década de 1990, ambientalistas já debatiam   insistentemente a possibilidade de criar instrumentos propondo dar um basta às atividades destruidoras no balneário. No entanto os resultados não foram tão promissores. A situação tornou-se mais preocupante quando a imprensa noticiou que uma empresa criciumense, proprietária de vasta extensão de terras constituída de APPs estava interessada em construir mega empreendimento turístico no local.

A reação dos ambientalistas, do ministério público federal, estadual e da própria comunidade acerca das propostas apresentadas foi de refutá-las, visto que segundo Vera L. C. Bedinoto, Promotora de Justiça e Curadora de Defesa do Meio Ambiente da época alegou que vários empreendimentos, e até mesmo cidades, se expandiram invadindo restingas, criando um quadro preocupante, visto que como conseqüência direta teve-se uma drástica redução das áreas que ainda conservam os atributos naturais desses ecossistemas. Foi com essas e outras justificativas que a referida autoridade do judiciário sentenciou parecer embargando o respectivo empreendimento por considerar nocivo ao ecossistema.

A ação embargatória ou proibitiva também surtiu efeito para as demais propriedades ou lotes situados em toda extensão. As iniciativas para tentar burlar as decisões judiciárias acerca das proibições de construções  foram constantes e muitas delas frutíferas, cujas autorizações foram concedidas apenas para reformas ou reparos, porém se constituindo em novas construções, com ampliação até da área construída.  Esse “afrouxamento institucional” abriu precedente para ações deliberadas de cortes de vegetação de restinga e construções de residências à revelia da lei.

  

Do ponto de vista do solo da região em questão a construção de novas ruas, residências e de arborização com espécies exóticas resulta na formação de uma barreira que bloqueia a circulação dos ventos produzindo considerável desequilíbrio entre deposição de sedimentos, ventos e recursos hídricos. Além do mais, novas construções reduzem a infiltração hídrica, a impermeabilidade do solo e a obstrução dos cursos d’água gerando alagamentos em áreas isoladas e desequilibrando os próprios lençóis freáticos que comprometem a recarga dos mananciais próximos.

  

As tentativas visando à revogação dos atos proibitivos às construções no Balneário tornaram mais freqüentes a partir do final do ano 2000. Como forma de neutralizar que ações desse teor fossem levadas a contendo, um grupo de cidadãos (ãs) do balneário apreensivos com o futuro do local juntaram forças e fundaram uma organização ambiental para tratar dos problemas de forma mais sistematizada. Nos quase dois anos de existência da Oscip Preserv’Ação, dezenas de denúncias de irregularidades ambientais foram encaminhadas à justiça, resultando em processos crimes, muitos dos quais ainda em andamento. Porém, embora a entidade tenha como princípio norteador a luta e o embate a todas as formas de agressões aos ecossistemas, seus membros vêm paulatinamente debatendo nos encontros quinzenais estratégias que possibilitam a homologação definitiva de uma unidade de conservação no balneário.

                

              A certeza de que tal unidade está cada vez mais próxima de se tornar realidade, foi constatada quando dos vários encontros realizados entre a “Prerserv’Ação” e o Ministério Público Federal. O próprio órgão federal insiste da extrema necessidade de envolver a sociedade araranguaense nas discussões e encaminhamentos de ações visando o amadurecimento da proposta como garantia da participação ativa na sua gestão, tanto direta como indiretamente.

 Ministério Público Federal, Instituto do Patrimônio Histórico Artístico nacional  e o tombamento do Monumento Morro dos Conventos

Em janeiro de 2013 a entidade recebeu da assessoria da Procuradora da República, secção Criciúma, E.mail comunicando que o respectivo órgão encaminhou ao IPHAN/SC (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional) documento apresentando considerações para que a entidade tomasse as medidas cabíveis e necessárias para a proteção do monumento natural Morro dos Conventos e dos sítios arqueológicos situados no seu entorno. A principal inquietação do Ministério Público Federal é quanto a condição de depredação e abandono do local, cujas ameaças advêm da pressão imobiliária, práticas desreguladas de atividades esportivas radicais e o projeto de fixação da barra do rio Araranguá, que o próprio IBAMA alega inviabilidade  ambiental, pois representa sérias ameaças à preservação do ecossistema Morro dos Conventos.

  

As razões ou justificativas referendadas pela procuradora para fundamentar o pedido foram assentadas em inúmeras legislações existentes como também na própria Constituição Federal, Art. 225, caput, que ordena de forma resumida que todos têm direito ao meio ambiente equilibrado, imputando ao poder público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações. Somente este artigo seria suficiente para justificar os esforços da Preserv'ação na luta em defesa do ecossistema do balneário. Além da garantia constitucional na defesa e integridade dos ambientes frágeis, o Ministério Público Federal, atendendo os dispositivos do Art. 5, II, d; III, d, da lei complementar n. 75/93 que dispõe sobre a organização, as atribuições e o estatuto do ministério público da união, lhe é outorgado totais poderes para atuar em causas ambientais podendo interceder diretamente em casos conflituosos ou de risco iminente à sobrevivência de espécies endêmicas da fauna o da flora.

  

No que tange ao monumento natural do Morro dos Conventos a iniciativa tomada pelo Ministério Público Federal tendo em vista encaminhar providências para sua preservação e dos sítios arqueológicos existentesno seu entorno foi fundamentada no Art. 46 da lei n. 378/37, observada a lei n. 6.293 que dá competência ao IPHAN providenciar ação de tombamento de bens imóveis de interesse histórico e cultural. Em resposta as advertências do Ministério Público, o IPHAN discorre que quanto aos sítios arqueológicos situados na área de interesse, os mesmos já se encontram legalmente protegido, portanto, pertencentes a união. Quanto ao tombamento do monumento, o órgão esclarece que não há meios legais para que se seja feito mediante decreto, sendo tal dispositivo adotado pelos municípios ou estados mediante leis específicas. O IPHAN não descarta a possibilidade de o mesmo ocorrer a partir da instância federal, porém, mostra que o procedimento poderá ser moroso exigindo o cumprimento de diversos trâmites como o estudo do local, relevância, admissibilidade jurídica e parecer de aprovação pela área central do IPHAN em Brasília, que deverá ser aprovada em sessão do Conselho Consultivo do órgão, além de homologação feita pela Ministra da Cultura.

O que o órgão federal explana caso o tombamento seja procedido sob a forma de decreto é que sua atuação se dará após sua efetivação, tendo ingerência sobre sua preservação. O próprio IPHAN catarinense evidencia que as esferas estaduais e municipais de preservação deveriam ser instadas a preservar o local, ou seja, o monumento geológico Morro dos Conventos, visto que mais que uma beleza natural, um patrimônio que pode a vir a ser considerado nacional, é, sem sobra de dúvida um patrimônio local e regional.

 

As respostas do IPHAN às demandas do ministério federal acerca do pedido de tombamento não foram recepcionadas com otimismo, pois apresentam questões que necessitam de maiores esclarecimentos como, por exemplo, os sítios arqueológicos situados no entorno que segundo o IPHAN já são protegidos por lei, porém, o ministério questiona quais os critérios elencados para sua proteção. Nesse aspecto a Oscip vêm alertar que o instituto estadual desconhece a realidade dos sítios existentes, que embora estejam legalmente protegidos, ambos encontram-se danificados como a “furna de abrasão marinha” situada na base do monumento que exibe registros de ocupação humana pré-colombiana.

  

Se deslocando em direção a barra do Rio Araranguá, transpondo as restingas e dunas, é possível visualizar pequenos amontoados de cascas de mariscos, resquícios ou vestígios da presença dos povos sambaquianos na região anterior a chegada dos tupi-guaranis, por vota do século XIII. Diferente de outras regiões da faixa costeira brasileira, intensamente povoada e cujos sítios foram totalmente destruídos, na região de Araranguá esses exemplares arqueológicos ainda estão aparentemente conservados podendo se configurar em mais um dos tantos atrativos que integrarão o monumento geológico ou a unidade de conservação Morro dos Conventos.

  

Outra interpelação levantada pelo Ministério quanto ao tombamento do monumento que embora o IPHAN insista que o processo pode seguir dois caminhos distintos, um via Ministério da Cultura e outro sob a forma de decreto municipal, o próprio órgão não fez menção algumaquanto a um processo de tombamento em curso na região intitulado Parque Ecológico Sul. O IPHAN reconhece que as dificuldades em dar sequência aos procedimentos que visam regularizar áreas destinadas a tombamentos sãodecorrentes as restrições orçamentárias do próprio instituto, que possivelmente para o próximo ano, 2014, haverá condições de contemplar projetos como o previsto em pauta. A articulação dos debates envolvendo todos os seguimentos da sociedade civil organizada, órgãos ambientais e poder público, na discussãode soluções emergências aos problemas que comprometem a existência dos ecossistemas em discussão vêm se tornando uma necessidade cada vez mais premente, visto que, já é consenso que tombamento e unidade de conservação ou ambos de forma integrada restabelecerão a harmonia do local garantindo as futuras gerações os mesmos direitos usufruídos às atuais no que tange asbelezas cênicas do Balneário Morro dos Conventos, consideradas únicas, singulares, porém, frágeis, cuja existência e preservação dependerão do grau de consciência e do empenho de cada indivíduo.




Transformar áreas que apresentam certas peculiaridades ambientais e belezas cênicas em unidades de preservação tornou-se matéria obrigatória tanto do poder legislativo como do executivo. São atitudes que demonstram certa maturidade ou consciência quanto a necessidade de garantir uma condição legal de que tais ambientes serão realmente protegidos. Foi isso que ocorreu em 2000 quando foi instituída a lei n. 9.985/00 que regulamentou o Art. 225, I, incisos I, II, III, VII da Constituição Federal, que homologa o Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza. A lei, além de definir parâmetros para a implantação das unidades também esclarece dúvidas quanto a existência de áreas particulares na área a ser pretendida para o projeto em curso. Segundo o Art. 12§ 2, não havendo acordo com o proprietário às condições propostas, a área deve ser desapropriada, de acordo com que dispõe a lei. Outro aspecto importante da lei é a sua condição de facultar a sociedade civil de interesse poderes para gerir a unidade, mediante instrumento a ser firmado com o órgão responsável por sua gestão.
Com vistas a assegurar a condição de gestão as organizações da sociedade civil, em 2002, o governo federallançou o Decreto n. 4.340/02, que regulamenta artigos da lei n. 9.985. Dentre os dispositivos elencados cabe destacar o Cap. VI, que trata da gestão compartilhada com as Oscips, cujo critério preponderante para sua escolha deverá ser a comprovação de ter realizado atividades de proteção do meio ambiente ou desenvolvimento sustentável, preferencialmente na unidade de conservação ou no mesmo bioma. 
Prof. Jairo Cezar












































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